My Work Here is Done escrita por Labi, MrsNobody


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Estamos ainda a tentar superar a aparição do Viktor Nikiforov no episódio 9...
Creio que da próxima vez que postarmos alguma coisa vamos estar em sofrimento pelo último episódio :')



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Foi numa cinzenta  e fria manhã de terça-feira que Saeki bebia o seu chocolate quente com tranquilidade enquanto que ouvia Haru recontar-lhe o sucedido do baile. Ela suspirava encantada, só de imaginar os vestidos, o drama, a música… 

Haru narrava os acontecimentos com uma clara irritação na voz, parando apenas para bebericar o seu café. Falou-lhe de Kambe, como ele era esnobe e implicativo e quando começou a falar do Mascarado, começou a atrapalhar-se e a enrolar.

Saeki logo percebeu que havia algo que ele estava a ocultar. Mas dava uma boa história para o Clube de Fãs. As meninas amavam uma boa fanfic.

“Oh, Haru-chan! Foste dançar com o Mascarado!”, ela interrompeu, pousando a chávena na mesa e juntando as mãos com todo o entusiasmo do mundo.

“Não!”, Haru corou e resmungou, “Ele obrigou-me a dançar com ele! E fala baixo.”

Saeki ignorou, “Ele dança bem?”

Haru esfregou a testa em frustração, “Sim-  Não! Não importa, não é esse o problema-”

“Dançaram muito tempo?”, pousou os cotovelos na mesa e apoiou as bochechas nas mãos, já a suspirar pelos cantos.

“Saeki-”

“Isso parece tirado… sei lá, de um filme da Disney! A Bela e o Monstro!”, sorriu mas logo ficou pensativa, “Não espera, tu nesse filme serias o Horloge.  Hum… Se tinha muitos ricos bem que podia ser Ouran Host Club, tu bem que tens a voz parecida com o Tamaki, mas serias a Haruhi! É isso. O Haru-chan seria a Haruhi.”

“Saeki!”, resmungou de novo, “Eu não o consegui apanhar e ele esteve perto, entendes?!”

“Eu sei que ele esteve perto.”, Saeki sorriu, “Por isso é que estás irritadinho.”

“Irritado?! Eu estou furioso! Ele conseguiu escapar, chatear-me e assediar-me!”

Ela pestanejou, “Assediar? Tu não me contaste isso.”

 

Boa Haru. Boa. Olha a merda que foste fazer.

 

O inspetor corou até as orelhas, bebericando seu café (e queimando a língua no processo) para esconder seu embaraço. “E-ele… Você sabe, a mesma coisa de sempre: os flertes idiotas”, comentou, mas a garota de cabelos rosados espreitou os olhos, analisando seu amigo com enorme curiosidade, “Pela minha amada Sailor Moon, vocês se beijaram!”.

Haru deixou o queixo cair, quase virando o café quente no colo quando se levantou de forma abrupta e ainda mais envergonhada para cobrir a boca de Saeki. Seus demais colegas olharam para si, e o moreno forçou um sorriso antes de sequestrar a amiga e sair com ela da sala. Ao chegarem no corredor, Haru a soltou, “S-Saeki, não diga essas coisas embaraçosas!”, ele ralhou, mas os olhos dela brilhavam enquanto a garota colocava ambas as mãos nas bochechas e corava, “Oh, que sonho! Um beijo do Mascarado! Haru-chan, ele está apaixonado por você!”

Ele franziu o cenho, “Apaixonado? Saeki, ele é um lunático! E um pervertido!”, disse, “Eu não autorizei que ele me beijasse, isso é assédio!”.

“Tu retribuiste? O que ele disse? O que tu disseste?”

“Eu não-!! Saeki! Ele roubou-me o beijo eu nem sequer-”

“Ahhh~”, ela suspirou, ainda num tom muito sonhador, “Ter primeiro beijo roubado, num baile de máscaras, por um homem misterioso! Que romântico! Que clássico!”

“Não-!”, voltou a corar e tapou o rosto com as mãos para bufar, “Não foi o meu primeiro beijo mas que-”

“Tenho tantas ideias para escrever histórias para o fórum do clube de fãs!”, disse animada, “Posso fazer uma personagem baseada em ti, não posso? Claro que posso!” , sorriu, “Mas não prometo que a cena se fique só por um beijo. Eu sei que nunca vimos a cara dele, mas um homem de terno justo é um homem de terno justo, Haru-chan, é de aproveitar. E há coisas que não precisam de mais explicação nem de muita imaginação. Diz-me, quem venceu a batalha pela dominância do beijo?”

“Saeki, por favor!”

Saeki sorriu, tirando de qualquer lugar um bloquinho de anotações e uma caneta, “Diga, Haru-chan, qual foi a duração do beijo? Vocês usaram a língua?”. Havia um divertimento estranho nas feições de sua amiga, e Haru queria fugir!

“S-Saeki, isso é comprometedor!”, ele disse e se encolheu em seus ombros, “F-foi só um beijo idiota. E pare de anotar essas coisas como se fosse uma declaração criminosa!”, reclamou, e Saeki riu, “Mas é! Criminosamente adorável! Awn, tenho tantas ideias para fanfics!”.

“Que ideias o que, sua boba!”, Haru resmungou, dando um peteleco gentil na testa da amiga, “Saeki, independente do que tenha acontecido naquele baile, eu preciso que guarde segredo. Não sabemos a gravidade da situação, e dessa vez o Mascarado feriu um inocente!”.

Saeki suspirou, guardando o bloquinho e assentindo, ficando séria pela primeira vez naquela manhã, “Você está certo, Haru-chan. Prometo que vou fazer as perguntas sobre o beijo depois do expediente”.

“Saeki, não--”

Ela riu, lhe agarrando o braço, “Já que estamos fora da sala, que tal um café? Eu pago dessa vez!”

Haru suspirou, mas acabou por concordar.

Afinal, ele não tinha dinheiro para o café mesmo…

 

 

Naquela tarde, os agentes da Divisão de Crimes Modernos tiveram o seu trabalho interrompido por um muito aflito Kiyomizu a entrar porta dentro ofegante.

“Temos visitas!”

“Quê?”

Ele abanou com a cabeça e apressadamente tentou arrumar a sua mesa (escondendo as peças do puzzle em forma de barco que construía fazia uns dias e substituindo o caos por folhas de relatórios), “Vem aí o Chefe Takei!”

O burburinho começou logo. Kamei fechou o Facebook, Saeki guardou o mangá,  Yomoto tirou os pés de cima da mesa. Só Chosuke e Haru continuaram a fazer o que já estavam a fazer: ler relatórios.

Takei entrou nem cinco minutos depois, acompanhado, e foi então que Haru o viu pela segunda vez, agora sem todos os brilhantes e purpurinas das fantasias: um homem jovem com uma postura muito direita e um terno impecável negro que lhe assentava perfeitamente. Era muito mais baixo que o chefe da Primeira Divisão, mas a sua expressão neutra, um tanto séria e aparentemente entediada, faziam-no parecer igualmente assustador.

Haru pensava quanto é devia ter custado aquele terno ou o relógio que ele trazia quando Kambe cruzou o olhar consigo.

Por meio segundo aqueles olhos muito azulados, fixaram em si, com uma intensidade que deixava Haru desconfortável.

Não conseguiu evitar baixar o olhar, e logo o chefe Takei se pronunciou:

“Inspetor Katou, pode vir aqui?”

Haru piscou, erguendo o rosto, e Saeki e Kamei trocaram um olhar de ‘o que ele aprontou agora?’. O inspetor, então, se levantou, e Takei apresentou.

“Inspetor Katou, esse é Kambe Daisuke. Ele veio até a minha sala à sua procura, mas eu disse que você não trabalha na 1ª divisão”.

Por instinto Haru endireitou-se. A sua descida de divisão era ainda um assunto muito cru e humilhante para si, não queria dar parte fraca.

Não que tivesse: ele gostava do seu novo cargo, mesmo que o salário fosse menor. Pelo menos naquela divisão os seus colegas eram simpáticos. O seu antigo chefe sequer o cumprimentou.

Fez um breve aceno de cabeça, “Bom dia. Em que o posso ajudar?”

Kambe levantou uma sobrancelha e parecia fazer algum tipo de julgamento que Haru naturalmente não conseguia adivinhar.

“Bom dia, Inspetor. Precisava da sua ajuda, já que é o responsável pelo caso do Mascarado.”

Haru piscou, a sobrancelha esquerda erguida em confusão, “Minha? Mas eu achei que você não precisasse da minha ajuda, já que tinha diversos seguranças!”. Não era suposto sua frase soar tão ácida, mas o inspetor não conseguiu morder a língua a tempo.

Takei lançou-lhe um olhar de censura, mas Kambe sorriu de lado, malicioso, “Oh, eu com certeza tenho.”, ele lhe piscou o olho, e Haru sentiu as bochechas corarem, “Mas acho que você me deve um favor, já que mantive nosso segredinho”.

Takei olhou de um rapaz para o outro, “Qual segredinho?”, questionou, e antes que Kambe pudesse dizer qualquer coisa, Haru se intrometeu (ele não poderia deixar que descobrissem que ele estava a ‘invadir’ festas alheias para prender um idiota mascarado), “N-nada! Kambe-san, estou à sua disposição!”.

"À minha disposição?", Kambe voltou a sorrir malicioso, "Fantástico." 

Haru sentia as suas bochechas arderem de humilhação e não ajudava que Takei o encarava num julgamento silencioso. 

"Do que precisar para o caso.", Haru resmungou num tom de correção e tossiu levemente ao perceber que o seu antigo chefe parecia insatisfeito com seu comportamento. Que maneiras eram aquelas de falar com um dos homens mais ricos e influentes do Japão? 

"Excelente. Preciso que me acompanhe nuns eventos. Receio que o Mascarado me vá atacar de novo." 

Takei encarou-o surpreso, "Senhor Kambe, podemos mandar alguém mais competente da 1a Divisão, se isso o deixar mais seguro." 

Para a surpresa tanto de Haru quanto de Takei, Kambe abanou a mão direita e retirou uma caixa de charutos do bolso interno de seu paletó, “Desejo apenas os serviços do Inspetor Katou, obrigado”.

Takei abriu a boca para protestar, mas Kambe acendeu o charuto e deu uma longa tragada, “Eu disse obrigado, Takei-san”, disse, o olhar gélido.

Haru precisou de todo o esforço do mundo para evitar dar um sorrisinho satisfeito ao seu antigo chefe. Mas a sua sensação de vitória não durou muito porque logo Kambe voltou a encará-lo. Katou não era tímido por natureza, nem era pessoa de baixar o queixo, mas havia qualquer coisa nos olhos do milionário que o faziam ter vontade de desviar o ar (e bufar como um gatinho irritado).

Takei pigarreou, descontente, “Nesse caso, Sr.Kambe, não creio que o chefe Kiyomizu se oponha às suas vontades.”

Kambe soltou a fumaça do charuto mais uma vez e assentiu, “Tenho certeza de que não.”, e olhou para Haru, “Inspetor Katou, preciso que trabalhe direta e exclusivamente comigo”, olhou para Takei ao avisar: “Pagarei pelas horas dele, não se preocupe. Vamos, Inspetor?”

Haru abriu a boca, fechou, voltou a abrir, fechar e franziu o sobrolho, “Espera- O quê?”

O mais jovem voltou a sorrir, “Ouve mal inspetor? Estou a dizer que está contratado para trabalhar para mim.”

“Mas-! Eu quero resolver o caso do Mascarado!”

“E vai poder resolver, ele provavelmente vai tentar invadir a mansão de novo.”

“Como pode ter a certeza disso?”

“Palpite.”

“Eu não acho-”

“Inspetor.”, Takei chamou-lhe a atenção num tom de censura, “Quantas vezes tenho de te dizer para não discutir de volta?”

Haru mordeu o lábio inferior, visivelmente contrariado, e assentiu, “Sim, Takei-san”, disse. Voltou sua atenção à Kambe, que continuava a fumar sem cerimônias (e num lugar fechado, a audácia!), “Quando começo?”

“Nesse exato momento, inspetor. Já sei o que o Mascarado roubou de mim”, disse, e o semblante de Haru ficou sério, “Vou só pegar minha jaqueta”.

Assim que ele virou costas, Takei encarou Kambe, “O senhor tem a certeza disso?”

Ele sorriu e soprou mais fumo, “Absoluta.”

 

 

Saeki e Kamei observaram Haru pegar nas suas coisas rapidamente e Kamei questionou-o, “Vais voltar para a primeira divisão?”

Haru encarou-o surpreso, “Claro que não!”

De uma maneira muito rápida explicou a proposta de Kambe e Saeki rodou na cadeira, “Não é justo, Haru-chan. A ti acontece tudo como nos contos de fadas! “

“Ou como nas 50 Sombras.”, Kamei rolou os olhos.

Haru fez um biquinho, tentando ignorar os comentário do loiro.

Verificou que tinha todos os seus pertences e olhou para Saeki, “Promete não deixar o Kamei usar o meu computador?”, questionou, e enquanto Kamei reclamava consigo, Saeki riu e assentiu, “Pode contar comigo, Haru-chan! Eu não deixo!”. Haru sorriu, e a sua amiga lhe deu alguns doces antes que ele seguisse até o estacionamento, onde Kambe o aguardava.

Embora esperasse que o bilionário estivesse em uma limusine com chofer, foi com uma certa surpresa que Haru viu-o num belíssimo Porsche preto, e ele se aproximou com cautela.

“Entre, Inspetor”, Kambe disse, e a porta do passageiro abriu automaticamente.

Haru ficou com medo de entrar: o interior era de pele branca e ele já receava sujar alguma coisa só de se sentar. Era isso e o tom de ordem que o milionário usava. O inspetor detestava que fosse mandado a fazer coisas só porque sim.

“Eu pensei que os milionários tinham motorista privado?” , disse sem conseguir morder a língua a tempo e colocou o cinto de segurança, ainda meio desconfiado com tudo.

O banco daquele carro era mais confortável que a sua cama.

Provavelmente custava mais que ela também.

“E temos.”, Kambe disse com um dar de ombros e ligou o carro. Haru não teve tempo de dizer mais nada porque o lunático (definitivamente era um desses) arrancou a toda a velocidade e o inspetor sentiu-se a ser projetado para trás.

Agarrou-se na porta como se a sua vida dependesse disso.

Kambe colocou os óculos de sol e sorriu, “É só que eu gosto de conduzir.”

“O senhor sabe que o limite de velocidade numa via rápida é de 90km por hora, certo?”

“Sei, e não sou senhor, por favor.”

“Então se sabes…”  já cortou com os formalismos mesmo, “ POR QUE É QUE VAIS A 210?!

“Porque é um Porshe. Não vai mais ninguém na via, quase.”, disse e desviou os olhos da estrada para encarar Haru em confusão. Haru não conseguia ver exactamente a expressão dele por causa dos óculos de sol.

“Isso é ilegal! Eu sou polícia, lembras?! Olha para a estrada!!!”

“Ah.”, deu de ombros e segurou o volante com os joelhos para acender um charuto.

Haru tinha a certeza que ia ter um aneurisma ali mesmo.

“Kambe!”

“Que foi?”

“Segura a merda do volante, reduz a velocidade e OLHA PARA A ESTRADA.”

Kambe sorriu, “Podes mandar a multa para a minha conta.”, soprou a fumaça na direção dele, mas agarrou o volante com uma mão… e desceu a velocidade para os 180. Não era nenhuma Madre Teresa de Calcutá.

Haru viu toda a sua vida passar diante dos seus olhos, e não conseguiu evitar segurar o volante com uma das mãos quando viu o carro se aproximar de um buraco na pista. Kambe, claro, desviou a tempo, resmungando de leve: “Não pegue no volante, Inspetor”

O policial resmungou, agarrando o próprio joelho, e retrucou: “Então dirija com cuidado!”

“Estou dirigindo com cuidado”

“Não, não está e--”

Kambe aumentou a velocidade e fez a curva fechada mais assustadora que Haru já presenciara, logo trocando de faixa e adentrando uma área florestal, “Estou assim. E chegamos”, avisou.

Haru estava ofegante. Tinha o coração a saltar pelo peito, os batimentos cardíacos fora de ordem. Provavelmente tinha perdido dois ou três anos de vida. Naturalmente que ver aquela mansão, agora de dia, não ajudava. A vida era muito injusta e cruel.

Uns viviam num apartamento minúsculo só com duas divisões, tinham as contas certinhas até fim do mês porque o seu salário tinha sido diminuído depois de descer de divisão e contavam tudo o que sobrava para poderem jantar fora uma vez por mês.  Outros tinham uma mansão cujo salão de baile servia para abrigar dezenas de pessoas e faziam festas cujos aperitivos deixariam qualquer chefe gourmet corado de vergonha.

A vida de rico devia mesmo ser difícil. 

Deu um estalido com a língua, “Não volto a andar contigo de carro.”

Kambe sorriu, retirando o cinto de segurança, “O pagamento pelos seus serviços não cobrem transporte público, Inspetor. Além do mais, preciso que permaneça ao meu lado a todo momento, não é viável que você se aventure com outros tipos de deslocamento.”.

Haru franziu o cenho, saindo do carro atrás dele, “Hey! Eu sou um inspetor da polícia de Tóquio! Não sou seu detetive particular, eu sou um funcionário público e sirvo aos cidadãos japoneses!”.

Kambe meteu as mãos nos bolsos e caminhou tranquilamente até à entrada, fazendo um breve aceno com a cabeça aos funcionários da casa que lhe abriam a porta, “Neste momento, és meu contratado. São ordens da Polícia de Tóquio.”

Haru seguiu atrás dele, fazendo uma vénia atrapalhada aos funcionários antes de entrar no seu já conhecido salão. Parecia ainda maior agora vazio e sem todas as decorações, mais frio e vago também.

“Eu não concordei com isso!”

Kambe parou de andar e pestanejou inocente, “Tudo bem, eu posso pedir a outra pessoa que lide com o caso.”

“Só eu é que lido com o caso!”, bufou, “Ninguém na polícia leva a sério o Mascarado!”

O milionário sorriu, “Exacto. Mas se eu pagar bem, qualquer um pega no caso.”

Haru torceu o nariz, irritado.

“Pagar bem? Acha que o dinheiro resolve tudo?”, ele questionou, e a resposta de Kambe foi direta: “Sim.”.

A irritação de Haru só aumentou, e o inspetor sentiu o corpo todo estremecer, “Pois não resolve! Eu estou aqui pelo bem da cidade, não porque você me pagou.”

“E qual é o bem o da cidade?”, parou de andar para o encarar, “Pelo que sei das notícias, o Mascarado já conseguiu entrar em vários edifícios públicos com facilidade. Não se descobriu ainda o que ele rouba, não é? Como podes ter a certeza que não é só alguém com demasiado tempo livre a causar caos?”

O inspetor engoliu a língua e piscou.

Sinceramente? Nem mesmo ele sabia a resposta daquela pergunta.

Havia meses que o Mascarado estava arranjando confusão e além da bagunça que ele deixava em cada local que ia, não havia nenhuma prova de que algo havia sido roubado. Ele esteve em um museu com centenas de obras caríssimas e num banco de segurança máxima no mesmo mês e nada estava faltando. Nenhuma obra havia sido roubada, e nenhuma conta sofreu saques ilegais.

Realmente, Haru não tinha como provar que o Mascarado estava atrás de alguma coisa além de confusão.

Apenas que…

“Mais cedo, na Agência… Você disse que descobriu o que o Mascarado havia lhe roubado”, Kambe piscou, e Haru sorriu, “Ou seja: você é a primeira pessoa que percebe, ou pelo menos que admite ter sido roubada por aquele lunático. O que quer que ele tenha lhe roubado, pode estar ligado aos demais roubos, e cabe a nós descobrirmos o que é.”.

Kambe voltou a piscar, seus sapatos fazendo eco no enorme salão, e colocou a mão direita na cintura, “Ele roubou apenas o bonsai de minha avó. Não possui valor algum a não ser sentimental.”.

Haru suspirou. Claro que ele ia logo roubar algo sem nexo e atrapalhar a investigação toda.

“Talvez goste de jardinagem, o idiota.”, resmungou amuado e Kambe não conseguiu evitar sorrir, “Talvez, quem sabe? Ainda assim, fica complicado saber onde ele vai atacar porque é aleatório demais.”

Voltou a caminhar, subindo as enormes escadas de mármore no centro da divisão e Haru subiu com ele. Não tinha prestado atenção no dia do baile que havia uma espécie de varanda no segundo piso de onde facilmente se via todo o salão. Provavelmente tinha sido aí que o Mascarado tinha estado antes de o ir importunar.

“Na verdade consigo saber onde ele vai atacar.”

Os olhos muito cinzentos do dono da casa fixaram em si com uma expressão neutra, “Sim? Como?”

“Informação confidencial da polícia.”, disse, com um sorrisinho forçado de quem obviamente não queria falar em cartas embaraçosas endereçadas a si.

Sabia que era ridículo, mas queria guardar essa informação só para si. Ok, Saeki sabia também, mas ela não contava porque só usava isso para fazer posts e teorias nos fóruns do Clube de Fãs do Mascarado. Tinha já milhares de seguidores, a grande maioria senhoras.

Ao pensar nisso talvez tenha feito uma expressão de desgosto porque Kambe pestanejou, “Algum problema, inspetor?”

“Não, nada.”, sacudiu com a cabeça, como se a abanasse com força suficiente as suas memórias do Mascarado pudessem ser apagadas, “Estava só a lembrar que o Mascarado tem um Clube de Fãs e é ridículo. Que raio vêem as mulheres nos criminosos?”

 

Kambe pestanejou de novo e riu.

Alto.

 

Haru ergueu uma sobrancelha, genuinamente confuso com a reação do bilionário, “Hey, qual é a graça?”.

Kambe abanou com a mão, ainda rindo divertido, “Oh, nada, Inspetor. Só acho engraçado que você esteja preocupado com o fã clube do Mascarado.”, disse, colocando as mãos nos bolsos, “A sua namorada faz parte do clube? Por isso o ciúmes?”.

As bochechas do mais alto tingiram-se de vermelho, e ele retrucou: “Eu não tenho namorada! E falo isso porque não faz sentido um pervertido daqueles ter tantos fãs!”

Kambe continuava com um sorriso implicativo, “Pervertido como? Se ele fosse pervertido não teria tantas fãs, não?”

“Ele beija as pessoas sem permissão!”, Haru disse, e Kambe questionou com certo divertimento: “Oh? E como sabe disso, Inspetor Katou?”.

Haru sentiu-se encurralado, percebendo que tinha falado demais e pigarreou para disfarçar o seu desconforto, “Houve...hum, relatos. Algumas pessoas… hum, reclamaram disso. Por isso ele é um pervertido.”, pousou a mão na cintura, muito confiante de si próprio e a da sua mentira.

Kambe sorriu, “Claro, como quiser”, e apontou para uma sala, “Siga-me. O Mascarado conseguiu deletar algumas imagens das nossas câmeras de segurança, mas conseguimos captar o momento que ele fugiu daqui.”, disse, e Haru olhou por sobre o ombro dele, “Ele escapou pela janela do corredor e correu para os jardins traseiros. Infelizmente, as imagens se perdem assim que ele entra no labirinto.”.

Haru franziu o sobrolho em atenção ao ver as imagens. Era sem dúvida o Mascarado. Reconhecia pela maneira de correr, pela roupa, pela postura.

O homem olhava pelo ombro e depois saltava para o labirinto. Ainda dava para o seguir por uns momentos, antes dele se perder entre os arbustos e desaparecer.

“Ele conhecia o caminho.”

Kambe olhou pelo ombro, “Como assim?”

Haru puxou o vídeo atrás e apontou para a imagem, “O labirinto está feito de maneira a que as pessoas se percam. Ele não hesitou ao mudar de direção vez nenhuma. Portanto, foi planeado. Podemos ir lá?”

O bilionário assentiu, “Claro, é por aqui”.

Haru o seguiu, tentando se achar naqueles imensos corredores (todos eram tão parecidos que ele tinha medo de se perder) e olhou para a janela, de onde podia ver o labirinto, “Há quanto tempo existe esse labirinto?”

“Hm… Acredito que a mesma idade da casa: oitenta ou noventa anos.”

“E houve mudanças nele em algum momento?”

“Apenas algumas reformas nos arbustos e na fonte do centro do labirinto. Na primavera, as flores favoritas da minha avó o adornam”

“E onde estava o bonsai que foi roubado?”

Kambe olhou para si, “No jardim interno”.

Haru franziu o sobrolho, “Como assim?”

O mais jovem suspirou, “A minha avó espalhou excertos do bonsai por todo o jardim e acabou por criar clones ao longo de décadas.”, explicou e apontou para um dos bonsais, entre dezenas, Haru notava, que estava num vaso bonito todo decorado.

“Então como é que sabemos qual é que ele roubou?”

“Por causa do vaso. O bonsai original estava num vaso que tinha o símbolo da família.”

O inspetor esfregou o cabelo em frustração, “Isso não faz sentido!”

Kambe olhou para si, “Por que não faz sentido?”

“O que havia naquele Bonsai? Ele vale muito dinheiro ou alguma coisa parecida?”

“Não, como eu relatei, todo o valor dele é sentimental. Embora seja um belo bonsai, não vale nada no mercado, seja ele legal ou ilegal”.

O inspetor esfregou ambas as mãos nos cabelos, soltando um “arg!” enquanto tentava pensar. “Isso simplesmente não faz sentido… por que ele roubaria um bonsai? É a primeira vez que confirmamos que algo foi roubado e é justo uma planta?”, e então ele piscou, “Será… que nos demais locais ele também roubou coisas sem importância, que nem sequer se deram ao trabalho de relatar?”.

Kambe deu de ombros, “O detetive não sou eu.”

Haru deu um estalido com a língua, “Eu odeio aquele idiota!”, bufou, “Vou precisar de voltar à esquadra para rever os relatórios.”

O milionário assentiu, “Tudo bem, amanhã tenho reunião de manhã, vêm alguns empresários importantes, receio que o Mascarado apareça e faça alguma coisa, se tiver intenções de roubar mais alguma coisa.”

“Eu estarei cá.”, disse sério e Kambe assentiu, “Certo, obrigado. Eu dou-te carona para a esquadra-”

“Não obrigado.”, sorriu de lado, “Eu tenho amor à vida.”

 

 

Haru voltou de metro para o centro de Tóquio, sentindo-se sardinha em lata no transporte público. Se vir no carro de Kambe seria melhor? Sim. Se o orgulho deixava? Não.

Assim que saiu na rua novamente, começou a caminhar na direção do escritório. Assim que meteu as mãos nos bolsos sentiu que havia algo lá e franziu o sobrolho, quase resmungando palavrões alto no meio da rua ao reconhecer o envelope.

 

“Inspetor Haru

Parece que tinha toda a razão, sou um criminoso sem escrúpulos. Todas as noites o meu sono se agita cada vez que a culpa do mais terrível dos crimes me assola a alma:  o roubo do seu primeiro beijo.  Amanhã estarei no Jardim Botânico no final da manhã, caso queira vir recuperar o que é seu por direito. Terei todo o gosto em lho devolver em igual medida  ;)

(Outro) Beijo do seu Criminoso favorito, 

Mascarado ."

 

Revoltado, envergonhado e, acima de tudo, chocado com a audácia daquele idiota sem-vergonha, o Inspetor Katou Haru, no auge de seus 29 anos, berrou a plenos pulmões para quem quer que ouvisse: “NÃO FOI O MEU PRIMEIRO BEIJO, SEU PERVERTIDO LUNÁTICO!

As pessoas que passavam ali olhavam todas de lado, uma mãe aproximou a sua criança com receio e desviou do polícia. E Haru fumegava de raiva.

Ia apanhar o Mascarado, desse no que desse.


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