Colônias Galácticas escrita por Aldneo


Capítulo 45
Todos aqui já estão mortos




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/793456/chapter/45

A viagem desde a superfície até o espaço levara pouco mais de 20 minutos (o que fora bem menos do que o tempo que levaram para ir do “mercado” no centro da colônia em que estavam até o hangar onde haviam pousado). Uma vez em órbita, o trio de tripulantes buscaram pelo sinal da nave principal, para se guiarem até ela.

— Estranho… - Marcus comentou, não disfarçando certo humor na voz. - O transpônder da nave já está ligado. Agora estou preocupado mesmo, para nem precisarmos lembrar o Iuri de ter que ligá-lo…

— Não faz piada com isso. - Ivana o censurou severamente. - Estou preocupada com ele ter nos chamado de volta tão rápido. Se fosse algo sem importância, ele mesmo resolveria…

A nave que haviam deixado algumas horas antes continuaria orbitando Europa a uma velocidade de alguns milhares de quilômetros por hora (o que era necessário para impedir que a gravidade a puxasse contra a superfície e a fizesse cair), de forma que os três tiveram que voar por quase uma hora até se aproximarem do local onde ela agora se encontrava. Quando a nave já aumentava visualmente de volume diante das janelas da suborbital, Marcus tentou contatá-la pelo sistema de comunicação, havendo a indicação de que sua mensagem fora enviada e recebida, porém sem nenhuma resposta. Ainda assim, as comportas do hangar da nave se abriram com a maior aproximação deles, como costumeiramente ocorria. Porém, o silêncio no comunicador fez com que a preocupação crescesse entre os que regressavam. A suborbital adentrou lenta e cuidadosamente o hangar inferior, o pouso fora simples e sem dificuldade, porém, após tocarem o chão e desligarem os motores, enquanto se preparavam para desembarcar, algo lhes chamou a atenção: não houve nenhum acionamento do tubo de desembarque que usualmente utilizavam ao regressar a nave. Algo ainda mais estranho lhes chamou a atenção no painel da suborbital: um sensor começou a piscar, indicando que, naquele hangar, estava sendo injetada atmosfera. Após poucos minutos, o mesmo sensor alterou sua indicação, informando que o hangar estava com atmosfera respirável e que o desembarque estava liberado. Os três seguiram para a comporta sob um perturbador silêncio, violado apenas por um cometário de “isto é muito estranho...”, solto por Ivana. Ao desembarcarem, algo ainda mais preocupante os tomou.

— A gravidade da nave… - comentou Marcus, chamando a atenção dos demais assim que saiu e não sentiu nenhuma sensação de desequilíbrio ao firmar os pés no chão. - Está ligada… e normal.

Qualquer resquício de humor ou cinismo desapareceu imediatamente dos três, e a reação automática foi a de correr na direção da comporta que dava acesso aos corredores da nave. Porém, ao se aproximarem dela, uma nova surpresa os deixaria sem reação. Um par de soldados, empunhando rifles e com uma atitude hostil, lhes interceptou o caminho, dando-lhes ordens para que ficassem parados e se rendessem. Um terceiro homem veio ao encontro deles, após um dos soldados informar que a situação estava sob controle e que nenhum dos três parecia estar armado. Este terceiro era um homem de estatura mediana, relativamente magro, com um rosto comprido, testa larga e alta, nariz aquilino e pele bronzeada, usava os cabelos e a barba bem feitos e trajava uma farda de oficial, na qual podia se ver platinas com a insígnia de três estrelas douradas sobre cada ombro e o sobrenome Rademaker identificado em sua lapela direita. Ele se mostrava com uma atitude bem altiva, em um claro esforço para ser identificado como líder.

— Que bom que vocês já chegaram – comentou o kaptein, como havia sido tratado por um dos soldados, Rademaker. - Os estávamos esperando.

Os três recém-chegados foram conduzidos, em silêncio, pelo tal Rademaker através dos corredores da nave, com um dos soldados os escoltando à esquerda e outro os seguindo um pouco atrás, até chegarem ao refeitório. Ali, se encontravam outros soldados, os quais vigiavam Karine, Iuri e Zara. A duquesa estava sentada em uma das mesas, demonstrando um misto de impaciência e preocupação, mas sem abrir mão completamente de sua aparência de superioridade, enquanto que o jovem casal, em outra mesa, não aparentavam estarem nada bem. A garota estava debruçada sobre a mesa, aparentemente desorientada e enfraquecida, com uma poça do que parecia ser vômito se espalhando nas suas proximidades (e chegando já a escorrer para o chão); enquanto Iuri, ao seu lado, parecia tentar reanimá-la, embora ele próprio dava sinais claros de estar igualmente zonzo e enfraquecido.

Ao se deparar com o irmão em tal estado, Ivana se adiantou para ir em seu socorro, chamando-lhe. Porém, um dos soldados que os acompanhavam, percebendo que ela ameaçava se separar do grupo, a agarrou por um dos braços e a empurrou para junto dos demais, de forma que ela teria caído ao chão, se não tivesse sido segurada por Klás, contra quem ela havia sido lançada. O pequeno alvoroço atraiu a atenção de Rademaker, que, parando sua caminhada e se voltando para os três, os censurou desdenhosamente:

— Mas que coisa desnecessária. Eu gostaria de pedir que vocês se colocassem em seus devidos lugares e passassem a colaborar mais, para evitarmos que se repitam situações desconfortáveis como esta. Agora entrem, e tomem assento em alguma das mesas - Os três obedeceram ao “pedido” e se dirigiam para a mesma mesa onde estavam Iuri e Zara, porém, ao perceber tal direção, o capitão lhes chamou a atenção: - Esta daí não. Desejo conversar com vocês, e não o quero fazer perto destes moribundos.

A visível contragosto, os três desviaram o caminho que seguiam e foram até outra mesa, onde tomaram assento. Os três se assentaram do mesmo lado na mesa e mantiveram o olhar fixo em Iuri, que permanecia abraçado a Zara, embora parecesse cada vez mais enfraquecido. Ivana mostrava-se visivelmente perturbada com aquela cena e a previsão de término que tinha de tal situação.

— Os dois passaram tempo demais em gravidade zero, precisam… - ela tentou iniciar um apelo, sua voz mostrando clara e sincera preocupação, beirando ao desespero, um tom que nenhum dos companheiros jamais haviam visto naquela garota.

— Sim, eu sei o que está acontecendo com eles. - Rademaker a interrompeu com total indiferença e desprezo. - Não é a primeira vez que presencio alguém com “mal do espaço” morrer sufocado pelo próprio peso… - enquanto o capitão ainda falava, Zara iniciaria uma crise de tose, que logo seria tomada por golfadas repletas de sangue, diante do que Iuri a tentou envolver com os braços, enquanto balbuciava um “aguenta firme, amor”. - Ainda assim, isso não deixa de me enojar.

— E você não vai fazer nada?! - Ivana insistiu.

O oficial respondeu um simples “não” em um tom de frieza e indiferença imensurável, o qual levou Ivana, em um acesso de raiva, a se levantar bruscamente e se arremeter em um ataque contra ele, gritando-lhe “svolatchi”, porém, um dos soldados lhe interceptou, atingindo-a em cheio com uma coronhada no rosto, que a jogou ao chão. Ao vê-la caída, Klás se levantou, intencionando ir em seu auxílio, porém, Rademaker lhe chamou a atenção, ordenando-lhe:

— Nada disso, você fique no seu lugar, para que não tenhamos mais nenhuma cena de violência desnecessária. Além do que, qualquer um pode ver claramente que esta ai não é nem de longe uma donzela que precise do socorro de algum cavaleiro.

Klás hesitou um pouco, alternando o olhar entre o capitão e a companheira caída, mas, ao perceber o soldado mais próximo, o mesmo que derrubara a garota, engatilhar e mirar-lhe a arma, acabou cedendo e obedeceu, voltando a se sentar, ainda que continuasse a acompanhar Ivana com o olhar que mesclava preocupação e indignação. Com certo esforço e visivelmente transtornada, ela se levantou e retomou o assento que antes ocupara, tendo nos olhos a mais visível e inquestionável expressão de ira. Diante da cena, Karine, desde seu acento, se pronunciou em censura ao oficial:

— Você não pode agir assim, é violência arbitrária e negação de socorro…

— Ora, não desperdice nosso tempo com algum de seus discursinhos decorados e frases de efeito, jovem duquesa. Não se deixe enganar, todos aqui já estão mortos. O casalzinho ali apenas nos economizará dois projéteis. Na verdade já estariam mortos, porém, não sabíamos quanto tempo os demais levariam para se juntar a nós, e como as armas registram o momento em que são disparadas… Seria trabalhoso explicar a qualquer comissão investigadora o porquê de dois disparos ocorrerem muito antes dos demais…

— Se você pensa que poderá se safar do que está fazendo, está enganado, eu… - a duquesa tetou insistir, sendo novamente interrompida bruscamente por Redemaker, que a encarava friamente:

— Ah, diga-me, duquesa, porque a senhorita acha que não está incluída no “todos aqui já estão mortos”?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Colônias Galácticas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.