Colônias Galácticas escrita por Aldneo


Capítulo 27
temos que ser o que devemos ser, ou não...




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A luz brilhante dos escaneadores parecia cegar Karine, ela havia sido aconselhada a permanecer de olhos fechados durante a análise, mas a curiosidade não lhe permitiu. Os feixes de luz a percorreram da cabeça aos pés, e depois no sentido inverso, antes de serem desligadas. Marcus, diante do computador que os controlava, informou assim que ela saiu do cubículo formado pela estrutura do analisador:

— Bom, segundo isso aqui, realmente não há nada em você que possa ser rastreado.

Ivana, sentada em uma cadeira, um pouco para atrás dele, e encostada junto a um balcão, completou:

— O aparelho portátil também não possuí nenhum rastreador adicional. Mas, como qualquer aparelho em rede, ele pode ser rastreado quando em uso. Por isso, vai permanecer desligado, e guardado em um lugar seguro, até o final da viagem.

Após ser analisada na “enfermaria” da nave, Karine fora guiada por Ivana através dos estreitos (e não muito limpos) corredores até uma cabine, que lhe fora apresentada como seus aposentos. Não era grande, e não tinha nada além de uma cama (na verdade um beliche) e um armário simples, cada um embutido nas paredes de cada lado daquele espaço.

— Devo encarar isto como uma cela? - Karine perguntou enquanto adentrava naquele recinto, forçando um tom ameno na voz.

— Não - a outra garota, que permanecia do lado de fora, junto a porta, respondeu um tanto contrariada. - é simplesmente sua cabine, seu quarto, se assim preferir. Você não é obrigada a ficar o tempo todo aqui, mas, não preciso dizer que não iríamos ficar muito felizes se a pegássemos mexendo nos comandos da cabine ou da sala de máquinas… Mas fora isso, fique à vontade, mi nave, es tu nave.

— Você não confia em mim não é?

— Não leve para o lado pessoal, quando se tem uma vida como a minha, se aprende a não confiar tão fácil.

— Imagino que deva ser difícil. Viver fugindo e se escondendo. Também deve ser muito solitário, não é?

— É, é bem complicado - Ivana não conseguiu segurar um suspiro e uma amenização da expressão desafiadora que era comum em sua face. - Mas, duvido que você seja realmente capaz de entender como é isso…

— Bem, talvez eu entenda. Por que você não me dá uma chance de mostrar que você pode confiar em mim? - Karine falou em um tom insinuante, enquanto, passou a mão suavemente no rosto da outra, acariciando-a. Ivana lhe devolveu um olhar confuso. De fato, ela realmente demorou um pouco até entender o que a garota a sua frente estava lhe propondo. Quando percebeu, sua expressão confusa não diminuiu, mas ela perguntou indiscretamente:

— Você é lésbica?

— Na verdade, não. Mas tenho a mente aberta… E gosto de ter novas experiências.

Um novo período de silêncio se instalou entre as duas. Karine mantinha um olhar receptivo, demonstrando uma certa ansiedade enquanto aguardava que Ivana lhe respondesse, esta por sua vez, parecia ponderar sobre muitas coisas em sua mente. Por fim, após parecer ter compreendido totalmente o que estava se passando, ela soltou:

— Então, está dizendo que eu sou?

— E você não é?! - o olhar confuso se transferiu automaticamente de uma para a outra, fazendo Karine corar ao receber a resposta negativa, diante do que, ela, envergonhada e sem jeito se pôs a justificar-se: - Mas, você parece… o seu jeito de…

— Quer dizer que, pelo meu jeito, eu TENHO que ser lésbica? É isso que está dizendo? É isto que você acha?

— Nossa. Está falando como se eu a tivesse xingado. Eu só me enganei, você que está agindo como se fosse uma ofensa.

— Não estou achando que você me ofendeu. Só estou irritada por essa sua… - Ivana se pôs a pensar alguns instantes na palavra que queria, aquele mal entendido parecia lhe perturbar de uma forma indescritível. - …imposição. Não só sua, também… falam como se eu fosse obrigada… O quê? Acha uma garota não pode ser mecânica, ou entender destas coisas, botar uma nave para funcionar? É isso?!

— Não, nunca! Pelo contrário, eu defendo a independência das mulheres. Sou feminista e tudo! - Karine iniciou uma defesa desconexa.

— É mais eu tenho que ser lésbica, não é? - já não sabendo para onde conduzir a conversa, Karine se limitou a se afastar lentamente, adentrando mais o quarto, enquanto repetia um “não, não” como resposta a tudo o que ouvia Ivana lhe descarregar. - É o que então? Para ser mulher eu preciso andar sempre arrumada e enfeitada como uma modelo, é isso? Me desculpe se, trabalhando com motores e vivendo escondida em meio a galerias de manutenção, eu não use roupas bonitas e não esteja sempre maquiada e bela. - Enquanto observava a garota se afastando, Ivana pareceu se dar conta de que estava falando demais, desviou o rosto, olhando por alguns instantes o corredor que se estendia para sua direita e respirou fundo, enquanto se acalmava. Após alguns minutos, sem deixar de olhar para o corredor, ela soltou um “esquece isto”, mais como que falando para si mesma do que para a outra. Acalmada, ela retornou a um tom neutro na voz, agora demonstrando também certo desânimo, e apenas informou, enquanto saia: - O banheiro é no final do corredor, caso precise… E você lembra onde é o refeitório, não é?

Karine, de dentro do quarto, assentiu com a cabeça, ainda mantendo um olhar confuso e ignorando o fato de que Ivana, já se retirando, provavelmente não perceberia o gesto que fazia. Ao perceber que estava sozinha naquele dormitório, soltou um longo suspiro e sentou-se na cama, constatando duas coisas: o colchão não era dos mais confortáveis e aquela realmente seria uma longa viagem.


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