Colônias Galácticas escrita por Aldneo


Capítulo 17
homens gostam de se sentir mais importantes do que realmente são




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CAPÍTULO 17

— O conde Guilhermo Jatemburgo Ferrani é o administrador das colônias desta área. - o chanceler Quintine explicava a sua jovem acompanhante enquanto o maglev em que viajavam, já a umas três horas, adentrava a região de vales conhecida como “Labirinto da Noite” - Ele até possui algumas colônias de mineração, porém seus negócios se concentram na área de saneamento. Ele é o principal responsável pelo fornecimento de água para a maioria das colônias. É um negócio bem lucrativo, mas creio que ele não dispensaria uma oportunidade de aumentar sua lucratividade. O conde Jatemburgo é o tipo de homem que gosta de se sentir mais importante do que realmente é.

— E todos os homens não são assim? - Karine comentou jocosamente.

— Bem, infelizmente, creio que isto seja verdade - o chanceler respondeu, também em tom de brincadeira, mas um pouco incomodado, percebendo que em tal comentário a jovem o incluiria também. – Mas creio que, neste quesito, o conde supere a média dos demais homens. Apenas para se ter uma amostra, ao conversar com ele, você deve sempre tratá-lo pelo título, nunca chamando-o apenas pelo nome. Ele consideraria isto ofensivo. Porém, não creio que teremos dificuldades ao lidar com ele, apesar de tudo, ele não é dos mais inteligentes, e, com o que lhe podemos oferecer, será fácil convencê-lo.

O maglev seguiu viagem por mais algum tempo, atravessando desfiladeiros e vales de rocha avermelhada. Seus trilhos magnéticos chegavam, algumas vezes, a correr por sobre a superfície do planeta, acima de dunas que pareciam ser feitas de ferrugem, o que permitia a seus passageiros deslumbrarem-se com belos panoramas marcianos. Chegando a estação de destino, os dois eram aguardados por um funcionário que usava um uniforme simplório e via-se em seu crachá o logo da empresa Ferrani. Este os conduziu pela colônia, que parecia mais precária, com uma aparência mais suja e degradada, do que a que haviam estado anteriormente. As pessoas com as quais cruzavam pelo caminho estavam, em sua maioria, mal vestidas, magras e não pareciam nada saudáveis. Escutavam-se tosses constantes do meio da multidão e viam-se diversas pilhas de lixo e entulho nos cantos das vias.

Não demorou muito para chegarem ao destino a que eram conduzidos, um prédio de escritórios, que se mostrava o mais bem conservado e limpo de toda aquela área. Havia soldados na portaria do prédio, com os quais o funcionário precisou se identificar e pediu que seus acompanhantes também o fizessem. Passada a portaria, o funcionário os guiou e acompanhou até o elevador, através do qual foram conduzidos até o último andar, onde se localizava o escritório do conde Guilhermo, que já os aguardava. Mesmo sem se levantar de sua mesa, e a uma certa distância, percebia-se que era um homem de baixa estatura, de constituição robusta e feições quadradas. A face achatada e o cabelo curto, penteado com excesso de gel, faziam com que sua cabeça realmente parece um cubo, que estaria montado em cima de um retângulo, que seria a forma aproximada de seu corpo truculento. Usava roupas sociais aparentemente caras, e mesmo assim mantinha uma aparência vulgar. Ao sorrir, recepcionando seus visitantes, deixava bem visível seus dentes incisivos, que eram bem grandes e possuíam um espaçamento exagerado entre eles.

— Conde Guilhermo. - Quintine o cumprimentou, em um tom que denunciava que já o conhecia.

— Conde Jatemburgo - Karine o cumprimentou em seguida, assumindo uma tonalidade extremamente cordial, inclusive curvando levemente a cabeça em sua direção.

— Embaixadores, sejam bem-vindos, vamos, sentem-se. Fiquem a vontade. - o conde os respondeu, indicando-lhes as cadeiras à frente de sua mesa. Ele possuía uma voz levemente áspera e um pouco irritante. Ao perceber que o funcionário que acompanhara os dois visitantes até ali permanecia em pé próximo a eles, estralou os dedos para lhe chamar a atenção e, conseguindo-a, lhe gesticulou para que saísse, o que foi obedecido pelo rapaz, mas não sem antes assumir uma expressão irreverente no rosto.

O conde e o chanceler logo se puseram a conversar frivolidades, com o primeiro fazendo as perguntas básicas de “como estava” e “como havia sido a viagem”, e o segundo dando prosseguimento no diálogo de conveniências. Ignorar toda aquela ladainha cordial se mostrou extremamente fácil para Karine. Ela se distraiu olhando discretamente os arredores daquela sala. O escritório se ressumia a alguns poucos móveis, todos de metal, e uma série de quadros espalhados pelas paredes. Quadros estes que apresentavam fotos, certificados, desenhos esquemáticos e gráficos. Nada ali poderia se comparar com o escritório de Mallus-Bernard. Não havia nenhuma ornamentação, nada de enfeites, nenhuma ostentação ou opulência. Tudo ali era simplório e cumpria uma função única: contar a história e os “grandes feitos” do conde Jatemburgo, que se mostrava exatamente com a mesma expressão e sorriso sem graça em todas as fotos.

— … e esta é a duquesa Karine – Quintine chegara ao ponto da conversa que já não podia ser ignorada. Percebendo-se introduzida no diálogo, a jovem prontamente voltou sua atenção ao conde, que voltado para ela, não conseguiu disfarçar um olhar analítico que a correu da cabeça aos pés.

— É um grande prazer, duquesa! - o conde falou, abrindo um sorriso, no qual era impossível não se centrar no largo espaçamento entre seus dentes, com um tom de voz que dificilmente se encontraria uma palavra que melhor o descrevesse do que “bobo”, enquanto estendia a mão para cumprimentá-la.

— Igualmente. Conde. - ela respondeu cordialmente (quase se esquecendo de acrescentar o tratamento pelo título), com um sorriso automático e político, estendendo o braço para o aperto de mãos que lhe era oferecido. Porém, o conde Guilhermo Jatemburgo apanhou a mão da jovem, em um movimento que provavelmente planejava-se ser cortês, se levantou e a beijou, a moda que se acreditava que era feito pelos nobres da antiga aristocracia que governou os reinos medievos da Terra. Atitude a qual a jovem teve que se esforçar para não demonstrar certo constrangimento (para não dizer repulsa, palavra que certamente descreveria melhor o que ela sentiu).

Percebendo não ter agradado tanto quando planejava, o conde fechou seu sorriso, se endireitou em sua cadeira e buscou assumir uma expressão mais séria e política, buscando se mostrar um grande homem de negócios.

— Bem, o que vocês têm para me dizer, digam. - ele falou, magnânimo em sua nova postura.

Diante da brecha que lhe fora aberta, Karine iniciou seu discurso:

— Como o senhor conde sabe, somos representantes do IICE. O senhor também deve saber sobre o trabalho do Instituto, que desenvolve importantes pesquisas para a exploração e colonização espacial. Muitas das quais tem se desenvolvido em aplicações práticas para a melhoria das colônias já estabelecidas, como as suas e todas as demais aqui em Marte. O IICE é uma instituição de capital misto, sendo subordinado e financiado pelo Ministério de Exploração Extraterrena e também recebendo apoio e financiamento da iniciativa privada. A qual, nos últimos anos, tem se mostrado crucial para o prosseguimento e aceleração de suas pesquisas e consequentes resultados. Sabemos que, como todo concessionado em Marte, o senhor já contribui com uma alíquota de quinze por cento do faturamento líquido de suas colônias. Porém, visando que é mutuamente benéfico, e portanto do interesse de todos, o desenvolvimento e incentivo das pesquisas do Instituto, gostaríamos de oferecer ao senhor a oportunidade de uma maior contribuição junto ao mesmo. Obviamente que isto deve ser encarado como um investimento de médio e longo prazo e como tal trará também seus benefícios aos aderentes. O senhor e suas colônias receberiam as novas tecnologias desenvolvidas no Instituto antes das demais, o que por si só já lhe concederia incontáveis vantagens competitivas. Mais do que isso, inclusive, o Ministério nos autorizou a ampliar a concessão dos direitos exploratórios a todo aquele que se decidir por aumentar suas contribuições. No seu caso, conde, caso aceite nossa proposta e aumente para no mínimo vinte por cento sua contribuição, podemos lhe entregar a concessão de exploração de todo este quadrângulo de Phoenicis Lacus, ou o do Mar Austral. Podendo ainda, inclusive, dos dois, caso opte por uma porcentagem maior.


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