P.O.V Da Jade

Acho que me saí bem na Sweet Holly, a gerente gostou de mim. Passei por uma breve e simples entrevista, saí dali confiante, sabendo que tinha chances de conseguir uma das vagas. Eram dez ao total. À caminho de casa parei numa sorveteria, comprei meu sorvete favorito, uma casquinha crocante com duas bolas bem cremosas sabor café com granulados de chocolate.

Kristie me mandou uma mensagem quando estava sentada numa das mesinhas colocadas lá fora sob a fachada da sorveteria, degustando meu delicioso sorvete.

"Estou indo para a Stella's, me encontre lá se quiser."

Sorri, a loira-morango sempre fazia compras na Stella's. Era uma das boutiques mais antigas da cidade, ela me disse que começou a frequentar a loja de cosméticos desde os 12 anos.

Terminei meu sorvete, limpei a boca após terminar de devorar minha casquinha crocante artesanal. Eram coloridas. Cada cor representava um sabor, levantei ajeitando a bolsa, descartei o guardanapo de papel amassado.

Vi o mesmo rapaz que vi saindo da lanchonete mais cedo, o cara de óculos usando capuz. Ele estava tentando atravessar a rua, segurava uma guia levando um cachorro de pequeno porte, eu não sabia identificar raças.

O sinal ficou verde, o cachorro correu na frente, o puxando.

Ele tropeçou atrapalhado, quase caindo enquanto gritava para o cachorrinho não correr.

Não pude deixar de rir com a cena, dobrei a calçada, rumando para a lojinha indo me encontrar com a minha amiga.

Minutos depois...

— Pensei que não viria, seria um pecado perder a promoção de hoje. - Comentou segurando um cestinha vermelha.

Kristie não era patricinha, um pouco vaidosa e mimada sim. Eu gostava muito dela, por mais que fôssemos opostas, ela havia se tornado uma grande amiga.

— Quais são as novidades? - A segui para a seção de esmaltes.

— Roxo magia e vermelho Halloween. - Apanhou dois vidrinhos de tampas pretas.

— Gostei desse! - Peguei um marrom-café.

Kristie revirou os olhos, rindo.

— Está na hora de deixar o preto e o marrom de lado, que tal esse azul-cobalto? - Sugeriu.

— Melhor que azul-celeste. - Aceitei de bom grado.

— Tive uma ideia! - Parou de repente, arregalando os olhos cor de mel.

— Pode falar, estou preparada! - Fingi um bocejo.

— Que tal uma tarde de garotas, vamos pintar as unhas uma da outra, fazer esfoliação facial e mudar o cabelo? - Acho que baixou o espírito de patricinha maluca nela.

— Não sei não... - Hesitei.

— Por favor, faça por você mesma. Não estou te implorando, estou sugerindo. É o nosso último ano, já tá na hora de mudar o visual. - Tentou me convencer.

— Nada de saltos e roupas coloridas, e eu não vou ficar loira! - Deixei bem claro.

Ela gritou eufórica e quase me derrubou, me dando um abraço pra lá de empolgado.

— Você vai amar, eu prometo, Jay. - Garantiu.

[...]

— Não acredito que vai tingir algumas mechas do seu cabelo. - Falei enquanto ela terminava de preparar a coloração.

— Castanho-dourado, cansei de ter apenas essas madeixas louras-avermelhadas. Enfim, vamos hidratar esse seu cabelo, vou tirar todas as pontas duplas, vou arrumar suas sobrancelhas e mudar a cor dessas suas mechas, verde está fora de moda, além do mais a cor já está desbotando. - Separou tudo que precisava.

Minha amiga começou a missão de embelezamento ou melhor, o processo de tortura. Era caixa de tinta capilar pra lá, tesouras pra cá, pinças espalhadas, meus pés ficaram de molho, recebi o tratamento completo de pedicure e manicure.

Esfoliação. Unhas serradas. Esmalte novinho nas unhas recém-cuidadas.

Lavagem, hidratação, modelagem no cabelo. Mandei remover minhas mechas e escurecer minhas madeixas.

Até meu rosto recebeu um tratamento especial, as sobrancelhas foram feitas. Pele hidratada. Maquiagem feita sem que eu pudesse ver.

Kris pintou as próprias unhas, tingiu algumas mechas do cabelo loiro-morango, mesclando com castanho-dourado. Combinou com ela, ficou legal.

Ela arrumou as sobrancelhas, se maquiou. Trocou de roupa, me emprestou um look, ela só era um pouco mais baixa, mas tínhamos quase o mesmo corpo, exceto o tamanho do busto, e eu era mais curvelínea.

Me vesti, estava proibida de me olhar no espelho antes do tempo. A louca até cobriu o espelho com uma toalha e pregou fita adesiva para segurar...

— Uau! - Exclamou assim que saí do banheiro.

— Como estou? - Perguntei ansiosa.

— Venha aqui, veja você mesma. - Puxou o lençol que cobria o espelho do quarto, era de corpo inteiro.

Me espantei com meu próprio reflexo.

Não me reconheci. Precisei me aproximar para poder me analisar de perto.

— Deslumbrante, né? - Sorriu ao meu lado, orgulhosa.

— Nossa! - Fiquei mesmo sem palavras.

Meu cabelo caía ondulado por meus ombros, madeixas grossas e escuras. Ela destacou meus olhos, assim como a boca, olhos delineados, lábios com gloss que dava volume.

Blusa preta combinando com o jeans justo e acinturado, um pequeno decote realçando meu busto, com detalhes em renda no tecido macio. Eu usava minhas botas sem saltos.

Minhas unhas cor de vinho e minha gargantilha combinavam com o look.

— Vamos! O rapazes estão nos esperando! - Me puxou, indo pegar a bolsa.

— Como é? - Perguntei.

— Deixe para me esganar depois, temos um encontro agora! - Kristie sorriu na cara dura.

— Você não muda mesmo, nunca dá ponto sem nó! - Revirei os olhos.

— Vai ser divertido, eu prometo! - Claro que ia.

Peguei minha bolsa e a segui para fora de seu quarto, aquela era a Kristie sendo Kristie.

[...]

Sanshu's, lanchonete/restaurante, às 17h:37min...

Aquele era ponto de encontro da galera da nossa idade, simplesmente amávamos a culinária japonesa, Kris amava observar os aquários. Seu Crush e meu par de encontro já nos aguardavam ali, sentados.

Eu não conhecia o rapaz de cabelo loiro-escuro lambido, nos aproximamos.

— Vou torcer seu pescoço. - Falei entre dentes, Kris fingiu não ouvir.

O loiro vestindo jaqueta jeans e camiseta da banda Queen levantou para puxar a cadeira pra mim.

— Obrigada. - O encarei, forçando um sorriso.

Ele tinha olhos acizentados, eram escuros com algumas manchinhas douradas. Olhos bonitos, chamativos. E não eram lentes.

— Esse é o Roy, é meu primo de consideração, é o entediado da minha tia Sally, a gente sempre esquia juntos nas férias de inverno. - Explicou Tyler, apresentando o rapaz.

— Roy é apelido, me chamo Rubens, nome do meu tataravô. É um prazer conhecê-las. - Nos cumprimentou.

— Meu primo aqui faz parte do time de patinação da Tate High School, o cara é uma fera na pista de gelo. Já ganhou 5 medalhas em campeonatos estaduais. - O idiota do Kyler amava se gabar dos amigos/parentes.

— Que legal! - Kristie exclamou.

Roy ficou vermelho, olhou para os lados acanhado, pouco confortável com o traste que era seu primo de consideração. Os comentários exibidos não iam parar por ali...

— Ano passado, esse cara venceu os...

— As meninas não querem ouvir sobre campeonatos, nem esportes e não estão interessadas nesses assuntos! - O cortou.

Bem feito. A cara do Tyler foi a melhor.

— Credo, primo. Só estou te elogiando. - Se fez de ofendido.

— Valeu, irmão. Tô de boas, fica na sua, vamos fazer os pedidos agora? Não sei vocês, mas estou com fome! - Gostei dele.

O Crush da minha amiga deu ombros após concordar.

— O que fizeram? Foram ao salão? - Kyler voltou a atenção para nós, alternando os olhares entre Kris e eu.

— Oh, você notou! O que acha? Estamos lindas, né? - Minha amiga indagou.

— Gata, você ficaria linda até mesmo careca e com as sobrancelhas raspadas. - Eu segurei o riso, Roy apertou o punho contra a boca, vermelho.

— Own. - Ela se derreteu toda.

Só faltaram trocar saliva na nossa frente.

— Enquanto à você, West, que milagre que soltou o cabelo! - Sorriu e logo voltou a olhar para a Kris.

— Valeu. - Ele só tinha olhos para ela e aquilo era um bom sinal.

— Gostei da sua pulseira. - Roy puxou assunto, elogiando minha pulseirinha prateada com pingente.

— Obrigada. - Toquei no meu pingente, era uma rosa vermelha.

— Só para você saber, eu também não queria estar aqui. Foi ideia dele. - Cochichou.

Que ótimo, ele havia percebido que eu fui arrastada para aquele encontro duplo.

— Um encontro amigável, fica tranquilo, estou de boas. Então, você estuda na THS? Que legal. Ouvi falar que eles têm um ótimo programa para receber alunos estrangeiros. - Comentei.

— Com certeza. A garota que gosto chegou da Suíça faz 3 meses, ainda não me declarei. - Confidenciou.

— Por quê não? - Arrastei a cadeira para mais perto.

— Ela está em outra, gosta do capitão do meu time. - Disse triste.

— Que barra! - Toquei seu ombro.

Kyler e Kristie estavam na própria bolha.

— Mas e você? Tá gostando de alguém? - Indagou.

— Amor impossível. - Respondi.

— Eu pago a sua sobremesa. Vamos nos esbaldar no doce hoje, acho que seremos bons amigos. - Sorriu para mim.

Eu também tinha aquela intuição.

[...]

— Não sei como se segura esses pauzinhos. - Roy estava todo atrapalhado com os hashis.

— É assim, você pega desse jeito. - Mostrei manuseando os meus.

— Vocês fazem parecer tão fácil. - Resmungou nos fazendo rir.

— Primo, espeta logo. Assim, óh! - Kyler usou um dos hashis para espetar o Sashimi.

— Pare com isso, palhaço! - Minha amiga riu dando um tapinha no grandalhão, ele riu com gosto.

Roy estava corado após rir, pedi tirinhas de peixe empanado com molho agridoce, Bolinhos Primavera e Sushi.

— Olhem quem acabou de chegar, muito bem acompanhado por sinal. - O babaca do Kyler soltou um baixo assobio, ou aquilo foi um uivo?

Minha amiga olhou em direção à porta curiosa, virando o pescoço numa tamanha rapidez. Fiz o mesmo, sendo um pouco mais discreta.

Professor Oliver havia acabado de entrar no estabelecimento, lindo como sempre, estava vestindo uma jaqueta ao invés do costumeiro suéter de lã, ele também costumava usar moletom e calças folgadas no trabalho.

Mas ele estava bem mais arrumado, havia caprichado. Jaqueta marrom, camisa branca de gola alta, calça jeans despojada e coturnos pretos, não usava echarpe e sim um gorro azul, parecia mais jovial, descolado.

Estava de mãos dadas com uma loira, oxigenada obviamente, os fios quase platinados pareciam reluzir. Ela usava um vestido de lã vermelho, botas com salto agulha, era bem alta, esguia com longas pernas cobertas por uma meia-calça preta quase transparente.

Para a minha surpresa, o Crush da minha amiga acenou, chamando o nosso professor, todo entusiasmado. Sr. Oliver olhou para nós, avistando os dois lugares vazios em nossa mesa, a lanchonete/restaurante estava quase lotada.

Quase cavei um buraco e enfiei a cabeça quando a Kris se juntou ao Kyler chamando o Sr. Oliver e sua bela acompanhante para se juntar à nós.

Simpático e educado como sempre, ele aceitou o convite. Era só o que me faltava, eu não esperava jantar com o nosso professor, pelo sorrisinho da Kris, ela parecia se divertir com toda a situação.