Alvie & Artie escrita por Lyubi


Capítulo 1
Bom Dia Vizinho


Notas iniciais do capítulo

Inspiração: https://www.youtube.com/watch?v=U1tRT08CgEg
Thunderclouds, LSD ft. Sia Labrinth & Diplo



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Cada manhã em Sunset Village conseguia ser mais incrível que a outra! O céu azul e límpido estendia-se radiante até o horizonte montanhoso que cercava o leste da cidade e de onde o sol despertava preguiçosamente todas as manhãs. O clima era temperado na maior parte do ano, apenas uma brisa outonal e o inverno ameno, sem neve. O condomínio ficava numa área extensa e plana, os telhados eram de cor escura juntamente com a estrutura de madeira detalhada que embelezava os beirais e contrastavam com as paredes em tons claros de branco a cinza. Grandes janelas e portais de vidro denotavam a boa condição dos seus residentes.

Cada residência não era grande o suficiente para denominar-se "casa", mas era como um apartamento com dois quartos, cozinha, sala e grandes banheiros. E nenhuma construção era inteiramente igual à outra. Algumas tinham varandas e jardins, algumas tinham até espaço para piscina e churrasqueira. Todas as ruas tinham pelo menos dez árvores de altura média, de variados tipos que quando floresciam na primavera ou verão enchiam o lugar de cor e perfume. Ao nordeste havia uma praça calçada de pedras com uma corrente de água no centro e muitas árvores antigas de grande porte.

Devido à extensão, dentro do condomínio havia também uma academia que oferecia hidroginástica dentre outras atividades, uma mercearia, uma banca de jornal, uma barbearia, uma cafeteria (que apelidaram de refeitório), uma biblioteca, um caixa eletrônico e um restaurante.

Às seis da manhã Artie já havia tomado sua xícara diária de chá Oolong, comido suas frutas com chia e uma fatia de bolo integral feito com kefir. Às seis e meia estava na calçada de casa e rumava para a praça onde havia uma pitoresca pontezinha e de onde gostava de ver o sol nascer. Às sete era o primeiro a comprar os jornais na banca. Sempre pegava três ou quatro e tinha a honra de dizer que foi mérito seu terem trazido o Times para o condomínio.

Voltava para a praça onde encontrava os amigos de sempre nas mesinhas de sempre já prontos para os jogos do dia; xadrez, damas, cartas... Independente do que fosse, sabia-se que às nove e meia em ponto estariam todos aos berros uns com os outros por qualquer motivo que fosse. Então meia hora antes, Artie voltava para casa onde; às dez horas em ponto, encontraria sua acompanhante do dia. Alice, uma mulher jovem de trinta e dois vinha nas terças, quintas e sábados. Dora, uma jovem senhora de cinquenta e poucos, vinha nas segundas, quartas e sextas.

Coincidentemente, às nove e quarenta e três seu vizinho Alvie, que provavelmente tinha acabado de acordar, saia para a luz do dia a fim de buscar sua correspondência — era um grande fã dos entregadores e deliverys. Alvie era um velho alto e magro com uma ossatura quadrada que destacava seus ombros e cotovelos pontudos e lhe dava um vigoroso maxilar. Ainda tinha todos os cabelos na cabeça num belo tom prateado que contornavam sua testa num quadrado perfeito, sem entradas de calvície.

Artie sabia que Alvie ia ao barbeiro toda a semana, portanto nunca estava com a barba por fazer mais do que sete dias nem o cabelo mais longo do que três dedos da nuca, mas apreciava muito quando ele aparecia com a barba de dias por fazer como agora... E juntamente com aquele cabelo amassado de quem acaba de acordar... E o jeito rude de andar rápido olhando para baixo meio encurvado, o cenho franzido, a boca amarrotada, uma camisa branca e uma calça de moletom com um casaco de crochê que ia até seus joelhos e a pantufa de couro sem se preocupar se pisava na grama.

Como todos os dias, Artie esperou na calçada o vizinho se aproximar para lhe dar bom dia.

— Laralalá!

Ao que, como todos os dias, Alvie rolou os olhos irritadiços para o vizinho resmungando qualquer coisa que com certeza não era resposta a um "bom dia".

— Rwalzawazarw...

Ao que Artie apenas alargou o sorriso a ponto de quase fechar os olhos empapuçados.

— Wa! Laralalalarala! — pediu gentilmente (antes que Alvie tentasse fugir) que lhe ajudasse a subir a calçada com a cadeira de rodas, pois já tinha andado muito naquele dia.

Alvie respirou fundo rolando os olhos para o céu (como todos os dias...) e arrumou o sapato de Artie que saia do pé antes de empurrar sua cadeira pela calçada e caminho até a porta vizinha. Eram nesses breves momentos que Artie desandava a falar sobre o quão bonito estava o dia ou sobre a continuação de alguma rivalidade entre os velhos jogadores ou algum comentário sobre as correspondências de Alvie ao que o velho nunca respondia e sempre resmungava um "xereta", "tagarela", "enxerido", "irritante"... Que deixava Artie sorridente pelo resto do dia.

Mas hoje Artie ficou em silêncio. Quando estavam próximos da varanda, Alvie parou um momento para arrumar a manta que Artie levava sobre o colo. Artie deixou a cabeça pender para trás e rolou os olhos muito azuis para observar o vizinho que estava inclinado na sua direção. O outro encrespou ainda mais a carranca.

Irritado, o mau-humor em pessoa nem esperou pelo agradecimento antes de virar as costas ossudas e partir no seu gingado característico para dentro de casa onde bateu a porta com força. Artie apenas sorriu. Embora amasse o tempo bom, não tinha medo das nuvens tempestuosas. Inclusive, observando aquele velho vizinho ranzinza, as achava adoráveis.


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