A Criada Francesa escrita por Claen


Capítulo 23
Mais um duro golpe




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Por mais que Holmes quisesse evitar, (e certamente negaria até o fim de sua vida se alguém perguntasse) ele também havia sido tocado momentaneamente pela emoção e tinha deixado de ser o costumeiro detetive implacável por alguns instantes. Para mim, que o conhecia bem, aquilo tinha sido bastante nítido, mas os demais provavelmente sequer perceberam a mudança em seu semblante, até que a pergunta de Gregson o trouxe de volta à normalidade.

— Oh, sim, já estava me esquecendo! Sr. Hyde, temo que a senhora sua mãe também tenha sido a responsável pelo “desaparecimento” de seu pai. – acusou Holmes, sem maiores rodeios. – Os rumores de que ele havia sido visto na cidade antes de ser declarado desaparecido sempre me intrigaram e por isso nunca acreditei que ele tivesse sumido durante aquela famigerada expedição à selva amazônica. Eu acredito que ele realmente tenha retornado, como as testemunhas disseram, e seu sumiço se deu quando já se encontrava em solo britânico.

“Desde que li a notícia nos jornais, anos atrás, pensei que havia algo estranho nessa história, e agora que conheço melhor a índole da Sra. Hyde, e sua “obsessão” pelo senhor, tudo começa a fazer sentido. Tenho certeza de que o Sr. Hyde disse ou fez algo que a desagradou tão terrivelmente, que ela acabou perdendo o controle, como perdeu agora, só que de um modo bem mais nefasto. Embora o senhor não tenha culpa de nada, temo que esta outra tragédia, infelizmente, também tenha sido motivada pelo senhor.”

Sem entender muito bem o que Holmes queria dizer, o empresário se virou para a mãe, que agora ria descontroladamente amparada pelos policiais.

— O que a senhora fez com o meu pai?! – perguntou Ethan Hyde, perdendo realmente a compostura e elevando seu tom de voz pela primeira vez.

— Meus parabéns, Sr. Holmes, o senhor está certo. – respondeu ela sarcasticamente, enquanto tentava aplaudi-lo desajeitadamente com os pulsos algemados. –  Alexander era um bom marido, mas não devia ter falado aquilo...Ele poderia ter feito ou falado qualquer coisa que eu o entenderia e o perdoaria, mas aquilo, jamais. Ele estava decidido e eu não ia deixá-lo cumprir o que havia dito. Nós discutimos e como ele estava nervoso, eu lhe servi um chazinho calmante para que ele “dormisse”. Agora, ele está descansando no fundo do lago.

As pernas de Ethan Hyde nitidamente enfraqueceram ao ouvir aquilo e ele precisou se apoiar no encosto do sofá para não cair. Também fiquei chocado ao vê-la relatar algo tão hediondo tão friamente.

— C-como? – perguntou o filho, incrédulo e em completo choque. – Por quê?

— Como, por quê? Por que mais seria? Por você, meu filho. – respondeu ela, tranquilamente, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

— Por mim? – continuava o homem, sem entender.

— Sim. O seu pai vivia dizendo que você jamais assumiria a empresa, que era fraco e não tinha capacidade para seguir com os negócios da família. Ele queria te mandar para estudar na América, sozinho, do outro lado do mundo. Dizia que eu o mimava demais e que você tinha muitas regalias aqui, por isso precisava encarar a vida sem ajuda para se tornar um homem. Toda vez que ele dizia isso, nós discutíamos. Como ele se atrevia a falar assim do meu menino perfeito? Quando ele voltou daquela expedição e disse que havia decidido que te mandaria para longe e que em seguida se aposentaria e contrataria alguém para ocupar a direção da Flora Cosmetics, foi a gota d’água. Eu não podia deixar que ele te impedisse de cumprir o seu destino de se tornar o homem mais importante desse país.

— A senhora está completamente louca! – explodiu Ethan Hyde. – Eu era um adolescente na época e nunca quis ocupar o lugar dele! Ele tinha toda razão, eu não estava preparado para assumir a empresa. Não era capaz nem de assumir os rumos da minha própria vida! Hoje eu vejo como eu fui mesmo um idiota fraco e manipulável. Você tirou tudo de mim, meu pai, minha mulher e a minha vida! Por sua causa eu vivi apenas para a empresa e agora eu vejo que essa foi a forma que você encontrou de me manter preso a você por causa desse seu amor doentio. Aposto que também foi por sua culpa que nenhum dos meus relacionamentos deu certo.

— Mas é lógico, nenhuma daquelas mulheres estava a sua altura. Todas aceitaram te largar por dinheiro. Nenhuma delas prestava. Eu sou a única digna de estar ao seu lado.

— Já chega! Por favor, Inspetor, leve essa mulher daqui. Essa não é a minha mãe. Eu não reconheço esse monstro. – pediu Ethan Hyde, completamente chocado. Sua voz e suas mãos tremiam enquanto ele falava.

Gregson atendeu ao pedido e ordenou aos policiais que a levassem.

— Bem... senhora, senhores. – disse o policial, ainda atônito. – Admito que esse foi um caso e tanto. Jamais imaginei que a hospitalização de Lestrade nos traria até aqui! Eu ainda precisarei de um depoimento oficial, então Holmes, vá a Scotland Yard o quanto antes para podermos abrir um inquérito contra a Sra. Hyde. Peço também a todos vocês que façam o mesmo. Agora, se me dão licença, tenho muitas coisas a fazer. Algo me diz que teremos dias agitados pela frente...

— Sim, nós iremos. Já conhecemos as formalidades. – respondeu Holmes, também em meu nome.

— Eu só preciso esclarecer mais algumas coisas aqui e logo estarei lá também. – disse Ethan Hyde, se despedindo de Gregson com um aperto de mão. – Obrigado, Inspetor.

Assim que o Detetive Inspetor saiu levando consigo a prisioneira, que para mim, deveria ter sido conduzida imediatamente a uma instituição psiquiátrica, Ethan Hyde desabou.

Ele se sentou no sofá e já não conseguiu mais se conter. Tantas coisas haviam acontecido dentro daquela família, que era até mesmo difícil de imaginar o que se passava pela sua cabeça naquele momento. Ele olhava para o garotinho ao lado da mãe e não sabia o que fazer. Aquela seria uma aproximação bastante complicada, mas o tempo certamente se encarregaria de juntar pai e filho de alguma maneira.

— Srta. Bennet, eu não sei como agradecê-la por tudo o que fez pelo Jules. – falou o empresário, tentando se recompor. – E não se preocupe, porque apesar de ser o pai dele, sei que não tenho direito de exigir nada, afinal, se dependesse de mim e da minha covardia, ele provavelmente nem estaria aqui hoje. Não se preocupe, porque não tenho nenhuma intenção de tomá-lo de você, porque você é a mãe dele. A única coisa que eu peço, é que me permita vê-lo de vez em quando e ajudá-la com suas despesas. Me deixe ser um amigo e, quem sabe, algum dia, ele me aceite como pai.

— O senhor poderá vê-lo quando quiser, mas vamos dar tempo ao tempo. Eu conversarei com ele com mais calma e explicarei tudo o que aconteceu. Apesar de ele ser ainda uma criança, o Jules é um menino muito inteligente e sei que vai entender a situação.

— Eu posso te dar um abraço também, Jules? – perguntou Ethan Hyde timidamente, com medo de ser rejeitado, mas, curiosamente, dessa vez foi o menino quem se aproximou dele.

— O senhor tem os olhos coloridos, como os meus. – disse Jules, pela primeira vez, achando interessante ver outra pessoa que também possuía um traço genético tão incomum como o dele. Certamente aquela era a primeira pessoa que ele havia encontrado na vida parecida com ele.

— Sim, eu tenho os olhos coloridos, assim como você. – respondeu Ethan Hyde, com os olhos marejados e um sorriso. Ele não se conteve e o pegou no colo, dando-lhe outro abraço apertado, assim como o tio recém-descoberto havia feito. Depois colocou o menino de volta ao chão.

— Agora se os senhores nos derem licença, nós precisamos ir. – disse Corine Bennet.

— Eu gostaria de acompanhá-los. Eu posso? – perguntou Gilbert Renard. – Eu tenho tantas perguntas, se a senhorita me permitir...

— Mas é claro, Sr. Renard. Eu ficaria muito feliz em finalmente poder conversar com o irmão de quem a Juliette tanto falava. Quando nos conhecemos, o senhor era apenas um garoto e hoje fico feliz ao ver o homem bom que se tornou, mesmo diante de tudo o que aconteceu. A Juliette ficaria muito orgulhosa.

— Já está tarde. Eu pedirei ao cocheiro que os leve até em casa. – ofereceu Ethan Hyde.

— Eu agradeço a gentileza, Sr. Hyde.

Dito isso, o Sr. Renard, Corine e o filho deixaram a Mansão Hyde, enquanto Holmes e eu permanecemos, pois ainda havia um último mistério a ser revelado: afinal, onde estava o corpo de Juliette Renard?


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