What if? escrita por Bianca Rogers


Capítulo 5
Moondust


Notas iniciais do capítulo

Olá! Voltando apenas para dizer que já estamos chegando na metade dessa história.

Espero que gostem do capítulo tanto quanto gostei de escrever. As coisas vão começar a amenizar entre esses dois daqui para frente...

Musica do capítulo: https://www.youtube.com/watch?v=xs8aAaO7OFU

Playlist completa: https://open.spotify.com/playlist/7dD4sxl82HbG94FR6yzY65?si=exwAsJ9fTAud4DwObUmUEg



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/791563/chapter/5

A manhã chegara e Jane mal fechara os olhos.  Passara a noite pensando sobre tudo que aconteceu nos últimos dias. Ainda se surpreendia com a forma que seu caminho se tornava tão conturbado de uma hora para outra. Todos os seus planos de repente jogados sobre a fogueira que se transformou aquele que era seu novo lar.


 

Mesmo conseguindo recuperar algumas de suas coisas, ainda restava aquela sensação de perda e abandono. 


 

Sabia que não era o material que lhe importava. Eram as memórias; os sentimentos. 


 

A até então desconhecida sensação de conforto e normalidade que começara a construir nos meses em que esteve por si só, e que agora fora arrancada de si como fora com suas memória meses atrás ao sair daquela mala.



 

Conforto...



 

Foi inevitável para sua mente não pensar nele.


 

Estava acordada quando ele chegou pouco depois da meia noite, entrando no quarto em silêncio. Lembrava-se de vê-lo acender o abajur de costas para ela, livrando-se do terno que o sufocou durante o dia. O tecido despencou por suas costas nuas e levemente curvadas que demonstravam o cansaço e o peso do qual carregava. 


 

Prendeu a respiração por alguns segundos quando o viu sentar-se à beirada da cama. “Converse comigo, Kurt…”


 

Notou pelo pelo reflexo do espelho que ele parecia observá-la, e agradeceu pela sombra que lhe permitia retribuir o olhar clandestinamente. Aquele olhar. Já o sentira antes.


 

O mesmo olhar que lhe fora lançado na primeira vez que se encontraram, e o mesmo do dia em que ele a prendeu. Um olhar carregado por  dúvidas e palavras das quais ele não sabia como ou se deveria dizer. Já o conhecia o suficiente para entender o que aquele olhar significava.



 

“Você não me quer aqui, e eu não quero estar aqui tanto quanto.”



 

Sentindo-se culpada por invadir um momento que deveria ser pessoal, tentou ao máximo não entregar seu despertar quando seu corpo deitou-se ao seu lado. Ele não abraçou dessa vez.


 

Mesmo horas depois, ela ainda sentia o vazio e a angústia que a falta daquele simples gesto gerou em seu coração.


 

Cansada de esperar pelo sono que não viria, decidiu sair para correr. Seria bom uma carga de adrenalina, já que não estava autorizada ao campo.


 

Weller ainda dormia profundamente quando deixou o cômodo na ponta dos pés, evitando acordá-lo e iniciar uma de suas guerras matinais. 


 

Estava escuro lá fora, e o apartamento seguiria em completo silêncio se não fossem os barulhos vindo do quarto de hóspedes. Natasha estava certa sobre os roncos do amigo.


 

Na sala, Patterson parecia comer uma tigela de cereais enquanto observava algo no televisor, e Rich babava algumas almofadas logo ao lado. A outra agente se encontrava encolhida na poltrona, e Jane já imaginava as reclamações futuras que viriam sobre dores no corpo.



 

— Bom dia…


 

 Hey, bom dia! Já está de pé? Ainda é cedo… - A resposta veio em um sussurro, acompanhadas por alguns olhares às suas vestimentas. — Vai sair?


 

— Vou sair para correr, preciso de um pouco de ar. - Ela disse ao voltar da cozinha, levando uma garrafa d'água e uma maçã em mãos. — Volto antes de despertador tocar.


 

— Leve o segurança e mantenha o celular ligado, okay? 


 

— Okay.


 

Ao deixar o apartamento, seguiu acompanhada por um dos seguranças que faziam a ronda no corredor. Precisava dessa sensação de liberdade e controle de seus atos novamente, mesmo que não fosse uma verdade absoluta.


 

A madrugada era mais fria do que imaginava, e uma leve garoa  frustrou seus planos de correr até o parque. Seu braço ainda estava em recuperação e não poderia arriscar uma queda; teria de caminhar.

 

Colocou os fones de ouvido e fez um trajeto pelo aplicativo de corrida. “50 minutos.” Daria tempo suficiente para ir e voltar antes que o despertador denunciasse sua ausência


 

A corrida pelas manhãs fora um hábito adquirido muito antes de morar sozinha, e virou parte de sua rotina quando notou a falta que a adrenalina do trabalho ativo lhe proporcionava. Por diversas vezes se pegou acordando no meio da noite com o peito transbordando ansiedade, como se toda energia estivesse acumulada pela abstinência da correria que sua vida costumava ser em Nova Iorque.


 

Nova Iorque.


 

Incontáveis foram as vezes em que se questionou se havia feito a escolha certa em partir. Em alguns momentos, precisou conter-se para não ligar, ou pedir a Keaton qualquer tipo de informação sobre os amigos. Chegou a checar seus nomes online apenas por curiosidade, e não soube explicar o quão sofrido para ela fora ver suas fotos sobre a tela. Queria abraçá-los, ouvir as provocações e alfinetadas de Tasha e Reade, as explicações incompreensíveis de Patterson, e até mesmo as ordens de Kurt. Queria estar com eles de verdade, sem nenhuma Sandstorm fazendo com que duvidassem de suas verdadeiras intenções. 


 

Ela amava esse time, verdadeiramente.


 

Aprendeu a entender e conviver com cada um deles ao ponto de questionar seus próprios instintos. Não era apenas ele quem mexia com todo seu sistema; eram eles. Individual e unicamente. Ela os amava.


 

Quando percebeu, já havia acelerado seus passos e iniciado uma corrida. Seus pés pareciam flutuar sobre o piso levemente escorregadio.


 

O segurança se mantinha há uma certa distância a acompanhando, e agradeceu mentalmente por isso. Não gostaria que ninguém a visse em tal estado. Estava chorando.


 

Não havia chorado nos últimos meses. Não por falta de motivos, mas sentia-se indigna disso.


 

Não achava justo chorar pela ausência de conforto, quando desconhecia tal sentimento. 


 

Não achava justo chorar por tudo que passou, quando a vida de outras pessoas foram tiradas por sua influência. 


 

Não achava justo chorar pela falta do que deixou para trás, quando isso sucedeu de uma escolha sua.


 

Não achava justo chorar, por diversas vezes não reconhecer-se ao olhar-se no espelho.


 

Não achava justo chorar.


 

O sol já nascia ao horizonte e as ruas começavam a se habitar quando sua visão ficou embaçada e precisou parar para enxugar as lágrimas. O ar parecia tóxico à seus pulmões, queimando a cada inspiração que dava ao tentar controlar sua respiração. Sentia-se confusa, mas de certa forma, revigorada. O segurança aproximou-se apenas para averiguar se estava tudo bem, e logo retornou à sua distância quando voltara a correr, dessa vez desviando de algumas pessoas que já tomavam as ruas próximas ao prédio.


 

O caminho lhe pareceu mais longo do que podia se lembrar, e começara a achar que provavelmente havia desviado sua rota naquele momento de distração. 


 

Entrou e saiu do elevador às pressas ao checar o horário em seu relógio. Restavam apenas alguns minutos de folga até o despertador tocar e dedurar sua pequena fuga. Mas antes mesmo que virasse ao corredor, vozes invadiram sua mente. Soavam como Kurt e Zapata.


 

— Não deviam ter deixado ela sair!

 

— Ela não é uma prisioneira, Kurt, não podemos tranca-la aqui dentro o tempo todo!


 

Sentiu a onda de tensão arrebata-la quando cruzou para dentro da sala, agradecendo a companhia do rapaz que se manteve ao lado de fora. O suor escorria por seu rosto e seu corpo ainda tremia… mas algo em seu interior lhe dizia que tais resultados não eram da corrida extremamente longa que havia feito, mas sim, do medo pelo que viria a frente. 


 

— Onde você estava?  Por que não atendeu o telefone? Você não pode simplesmente sumir assim!


 

— Eu… saí para correr um pouco. - com a garganta ainda entalada pelo ar gelado, tentou se explicar — O segurança estava comigo...


 

— Kurt, man, calma. Ela está aqui, está bem, isso que importa. — A voz de Reade ecoou aos fundos, e finalmente algo a despertou de seu transe, para só então conseguir mover os olhos sobre o ambiente.


 

Todos estavam de pé e devidamente vestidos, até mesmo Rich, que comia uma rosquinha no canto de sua visão. A TV não parecia noticiar nada de importante e honestamente, não conseguia detectar nada de anormal para justificar sua euforia.


 

— Alguém a seguiu? Jane! Talk!


 

Talvez fosse apenas preocupação. “Ou força do hábito.”


 

— O que está acontecendo? — Ainda confusa e arredia, preferiu se manter no mesmo lugar desde que chegara, temendo que qualquer passo em falso desencadeasse um despencar de cartas em seus ombros logo cedo.


 

— Seu amigo está aqui. - Prontamente, a loira se colocou frente ao homem pronto para iniciar outra discussão, e lhe mostrou a imagem no tablet — Quero dizer, lá no escritório. 


 

— Quem? Clem? Ele está aqui? - Sentiu o estômago embrulhar dentro de si, provavelmente pelo esforço que havia feito em jejum. A imagem era mais nítida dessa vez e pode vê-lo com clareza aguardando na sala de reuniões. — Como ele me achou aqui? Ele sabe meu nome verdadeiro?


 

— Não sabemos. Keaton o encontrou no radar agora cedo, ele estava procurando por você na embaixada.


 

— Por mim?! Como ele poderia saber que vocês me trouxeram para Nova Iorque?


 

 É isso que gostaríamos de saber. - Percebendo a confusão se formando a sua frente, Zapata interveio, pegando a garrafa d'água de sua mão gentilmente — Acho melhor ir se trocar, tem café pronto. Quanto mais rápido sairmos daqui mais rápido teremos essas respostas.


 

Para sua mente, segundos se passaram desde o momento em que seus pés descalços pisaram o chão do banheiro, e suas botas adentraram o elevador do escritório. 


 

Ouviu o time se comunicando algumas vezes mas era incapaz de distinguir palavras de meros murmúrios e balbucia. Sentia-se extasiada. 


 

Uma mão repousou sobre seu ombro e em sobressalto, lhe despertou para realidade. Sua mão. Firme mas suave. 


 

— Você está bem?


 

A pergunta lhe pegara e surpresa. Fora a primeira vez desde que chegara que ele lhe perguntava isso. Dessa vez, não haviam gritos ou ironias em seu tom.


 

— Se eu disser “eu não sei”, estarei sendo repetitiva? - arriscou um sorriso singelo. Não sabia se o gelo estava congelado suficiente para que seu pés se firmassem sem cair na água fria de suas palavras novamente. 


 

Ele riu. Fraca e curtamente, daquele mesmo jeito que fazia meses atrás ao ficar sem graça com alguma coisa que ouviu. Deus… como sentia falta daquela risada. — Talvez, mas nessas circunstâncias, acho que precisamos ouvir algo familiar.

 

Aquilo a pegou de jeito, talvez mais do que ele intencionara ao dizer. Algo familiar. Como sua risada? Sim, estava realmente precisando.


 

Sentiu seus dedos se afastarem quando as portas de metais se abriram, e teve de contentar-se com aquele breve momento de conforto antes da tempestade. Sua tempestade. 


 

Keaton encontrava-se na sala de interrogatórios já há alguns minutos tentando obter alguma informação do rapaz quando eles chegaram, observando por trás do vidro. Ele estava exatamente do mesmo jeito de quando o vira há uma semana atrás. Mesma jaqueta, mesmo cabelo levemente bagunçado e barba por fazer. Era realmente Clem.


 

Então por que parecia diferente para ela? Mal conseguia manter seus olhos sobre si.


 

Sentaram-se e aguardaram, ouvindo cada palavra proferida. Perceberam que o agente optou por manter o sigilo em sua verdadeira identidade e agradeceu mentalmente por isso. Seria mais fácil assim.


 

— Eu já disse… conheci Olívia alguma semanas atrás em um café e ficamos próximos. Ela da aula perto de casa e bom, descobri um interesse por artes marciais…


 

Um suspiro pesado pode ser ouvido ao seu lado, e Jane podia jurar que Kurt estava mais incomodado com ela sobre a situação

 

— …Demorei um tempão para convencê-la a sair comigo esse fim de semana, e quando apareci na academia e me contaram o que aconteceu, fiquei desesperado! Sai procurando por qualquer informação que pudesse ter sobre a ela.


 

— E isso o trouxe até aqui. Como? 


 

Notou quando desviou seus olhos diante da pergunta e parecia procurar palavras em sua mente. Estreitou os olhos. “Ele está mentindo sobre alguma coisa”, pensou. 


 

 Um amigo meu trabalha com a polícia, tive que cobrar alguns favores. Olha, eu conheço a Olívia, seja lá o problema que acham que ela está metida, não é verdade. Ela é uma boa pessoa, jamais machucaria alguém. Ela é a vítima aqui.


 

— E como pode ter tanta certeza disso? Você mesmo acabou de dizer que a conhece há apenas algumas semanas. 


 

Keaton não iria pegar leve com ele.


 

— Não preciso ser um expert em mulheres para saber que ela é mais do que um rosto bonito. Sempre que pode, está ajudando alguém. Isso é raro hoje em dia, cara. Ela é diferente, eu sei disso. 


 

Sentiu o gosto de cada uma de suas palavras formarem um sabor amargo e sua boca. Não, ele não sabia de nada.


 

Desgastada por toda situação, Jane se retirou da micro-sala. Patterson e Zapata a seguiram, enquanto Edgar e Rich disseram procurar veracidade em algumas das dúvidas levantadas. 

 

 

Kurt permaneceu por ali, prestando atenção em cada palavra trocada em sua frente. A maioria das coisas que disse, ele já sabia. Conhecia Jane, ao menos, um pouco dela. E exatamente por isso seus instintos o alertavam sobre desconfiar de tudo que era ouvido


 

Ele conhecia Jane. Não Olívia Dawson. Jane. Ele a conhecia. E levou meses para colher cada mínima informação que ela lhe permitia saber. Trabalhou ao seu lado por incontáveis horas para conseguir tais detalhes, que ainda sim, eram poucos se comparados ao todo que era aquele quebra cabeça em forma de mulher.


 

Ele conhecia pouco sobre Jane.


 

Então, como aquele estranho, que tivera poucas semanas e momentos ao seu lado, parecia saber tanto sobre alguém que mal falava de si?


 

Algo estava errado ali. E pela cara do interrogador, sabia que não era o único com essa intuição.


 

— O que achou desse cara? - Minutos depois, a pergunta fora lançada por ele ao encontrá-lo no corredor.


 

— Profissionalmente falando? Já vi pessoas mentirem melhor. - cruzando o corredor, Keaton o chamou para o canto e esperou que algumas pessoas terminassem sua passada. — Não achamos nada na ficha desse cara. Nem coisa boa, nem coisa ruim. Algumas formações aqui e ali, mas nada demais. 


 

— Acha que ele é um laranja no ataque contra Jane?


 

— Não podemos descartar a possibilidade. Por hora, não temos motivos para prendê-lo aqui. Disse que ia liberá-lo e ele ficará em um hotel. Vou pedir para uma equipe manter os olhos nele por enquanto.


 

— Ótimo. E se puder, prefiro que isso fique só entre a gente.

 

— Não confia em seu time, Weller? - Brincando, o agente o seguia em direção ao corredor. — Relaxa, sei que está fazendo isso para poupá-la de um turbilhão desnecessário. Mas se algo concreto surgir, o fardo de contar será todo seu.

 

— Como sempre.


 

Intimamente, desejou que tudo não passasse de um mal pressentimento. E talvez, um pouco de birra por sua parte…


 

Quando adentrou o laboratório, todos estavam presentes. Notou o olhar cabisbaixo que viera de seu quebra cabeça, e se não estivesse tão eufórico em seus pensamentos, poderia jurar ter visto seus olhos avermelhados. Assim como hoje pela manhã, quando voltou de sua corrida.


 

Sim, ele notou que ela esteve chorando.


 

 O que temos?

 

Rapidamente, os agentes de prontificaram a atualizá-lo sobre a situação. Houveram alguns progressos. Os hackers conseguiram rastrear um endereço de IP que batia com o horário em que o anúncio da recompensa fora colocado ao ar. Surpreendentemente ou não, era o endereço de um banco na Califórnia. 


 

Kurt a observou por alguns instantes esperando que esboçasse alguma reação, mas ela se manteve calada.


 

Idas e vindas vieram pelas hora seguintes enquanto investigam todos os funcionários e a lista de clientes da instituição financeira. Nada que parecesse incomum surgiu dali. 


 

— Devíamos ir até lá pessoalmente, ver se alguém está trabalhando de fachada. Talvez usando o nome ou a localização do banco para despistar os federais. 


 

 Podemos nos passar por interessados na caçada, alegar algum tipo de informação que só será dada com uma prova de confiança. — o moreno complementou a ideia da ex policial, dado uma última olhada no endereço do estabelecimento. — É um risco mas vale a pena.


 

— É uma boa ideia. Certo, Zapata, Read, essa é de vocês. Levem o Rich junto, o resto de nós ficará daqui ajudando no que for necessário.  Farei contato com o escritório local e garantam reforços para  caso algo dê errado com seu disfarces.


 

— Finalmente um pouco de aventura! — Mais animado do que deveria, Rich apoiou os braços sobre os ombros de seus companheiros de viagem. — Espero voltar com o mesmo bronzeado que a Jane.


 

— Enquanto isso, vou conversar com o Clem. - depois de um longo tempo em silêncio, ela finalmente se pronunciou. — Ver se consigo mais detalhes do que ele disse ao Keaton. 


 

— Certo. - desgostoso sobre o que ouviu, apenas concordou. Não lhe agradava a ideia de ve-la tendo qualquer tipo de contato com alguém de quem havia desconfianças. — Apenas façam o que for preciso e me mantenham informado.


 

Todos assentiram antes que ele se retirasse da sala. Reade e o colega saíram logo em seguida para providenciar as passagens. De soslaio, Tasha acenou para Patterson em direção a Jane, justificando sua saída para arrumar as malas.


 

— Então, você quer companhia no bate papo? - Notando o silêncio que se instalou no lab, a loira encontrou palavras para iniciar uma conversa amigável. 


 

— Isso é sufocante… - Exausta, aproveitou a ausência de todos para deixar suas frustrações a consumirem, apoiando os cotovelos sobre a mesa. O dia parecia nunca acabar. 


 

— O laboratório? E posso ligar o ar condicionado se quiser e..


 

— Ele, Patterson. Kurt é quem está me sufocando.


 

— Hey… não fala assim. Olha, eu imagino o quão frustrante isso deva estar sendo, lidar com esse clima pesado que sempre aparece no final da tarde, mas você precisa entender que as coisas mudariam por aqui quando partiu. — Puxando uma cadeira para seu lado, Patterson colocou a mão sobre a sua. — Eu sei que deve ter sido difícil recomeçar tudo do zero novamente, mas você ao menos teve essa opção. Kurt não. Quando você foi embora, ele não só teve que aprender a lidar e entender sua ausência, como também teve que encarar todas as consequências disso.


 

— Consequências? — levantando o olhar, a observou descrente e confusa.


 

— O que? Achou mesmo que indo embora levaria os problemas junto? Não seja ingênua, Jane. Não faz ideia da série de audiências que ele teve de ir para se explicar, até chegou a perder o controle em uma delas. - um riso fraco seguiu sua frase ao se recordar o episódio. — Shepperd tinha uma conexão com ele, e qualquer que fosse, ele também tinha uma com você. Todo mundo achava que tinha fugido junto com o Roman e que estavam tramando algo novamente, já que nunca o encontramos. Chegaram a fazer o teste do polígrafo para saber se Kurt realmente não estava envolvido com nada do que aconteceu, mesmo quase morrendo para salvar todos nós. E então, Allie foi embora logo depois que você se foi. Reade estava pensando em ir para o Quântico, Zapata à Cia, até eu pensei em deixar o FBI para trás. Weller teve que encarar tudo isso sozinho… foram muitas coisas ao mesmo tempo. Todos nós queríamos e poderíamos ter esse recomeço também, mas ele não. Nunca o deram essa opção. 


 

— Eu não havia pensado por esse lado…

 

— Sei disso. Não estou dizendo que justifica o comportamento grosseiro dele nos últimos dias, mas fica mais fácil de compreender. Por mais que ninguém admita, sabemos que uma hora isso vai acabar e você provavelmente queira ir embora… Acho que ele não quer se abrir novamente e se acostumar com a sua presença sabendo que corre o risco de passar por tudo aquilo outra vez. - Dando de ombros, sorriu internamente ao notar que deixará a amiga pensativa. Era sua principal intenção. — Mas não pense nisso agora. Por hora, que tal irmos conversar com seu tal amigo e ver se a gente consegue alguma coisa? 


 

— É… boa idéia. - ainda atordoada por seus pensamentos, Jane acompanhou a loira para fora da sala. 

 

 

Precisava refletir sobre muitas coisas.



 

— Não devia ter deixado ela sair!

 

— Ela não é uma prisioneira, Kurt, não podemos tranca-la aqui dentro o tempo todo!

 

 

 

— Não é uma boa hora, Tasha. 

 

Ao sair do laboratório Weller seguiu direto para sua sala, podendo ouvir seus passos o seguirem pelo corredor. Jogou o crachá sobre a mesa e afrouxou a gravata, se sentando. A figura feminina adentrou o local em seguida, fechando a porta atrás de si.

 

 

— Eu sei, mas queria me desculpar pela forma como falei hoje de manhã. -Receosa, se aproximou e apoiou os braços sobre a cadeira frente sua mesa. Sabia o quão tenso estava. — Sabemos que só está tentando protegê-la. 


 

— Está tudo bem, talvez eu também tenha exagerado. — Deixando um suspiro frustrado escalar, levantou seu olhar para fora da sala, bem a tempo de vê-la adentrar o espaço a frente e presenciar seu reencontro com o rapaz. Aquilo foi um golpe em seu peito.



 

Notando a direção de seu olhar duradouro, a moça seguiu o caminho. Ele parecia abraçá-la com tanta ternura, enquanto Jane não expressava tanta surpresa quanto esperava. — Acha que tem algo de errado na história dele?


 

 Acho. — Sua resposta foi imediata, sem hesitação. — Mas não temos como provar nada. Teremos de confiar no que ela pensar.


 

O tom em sua voz a fez rir. “Ele está com ciúmes dela?!”


 

— Desde que chegou aqui... tudo que ela mais espera é que você dê um minuto de trégua e converse com ela sem agir como se fosse um suspeito em sua frente. Poderia ser você naquele abraço, sabe disso? 


 

— Eu não quero falar sobre isso.


 

— Você nunca quer, Kurt, por isso eu vim até aqui enquanto a Patterson falava com a Jane. Não tem moleza comigo. - Ela respondeu, sentando-se em meio a seus olhares de protesto. — Agora me fala, o que está te impedindo de ser aquele cara?


 

Sinceramente? Nem ele sabia o que estava lhe impedindo.


 

Já havia aprendido a lidar com sua ausência e estava seguindo sua vida como fazia antes daquela mala aparecer em Times Square. Vivia para o trabalho novamente, saindo vez ou outra e planejando o revezamento futuro que teria de fazer quando sua filha nascesse. Essa era sua rotina, e estava bem com isso.


 

Mas então… “Aquela maldita ligação”. Desde que a receberá dias atrás, algo mudou dentro de si, e nem sequer é capaz de explicar o quê.


 

Seu primeiro pensamento fora manter distância, negar o caso e alegar envolvimento demais com a situação. Mas estava ciente de que não seria capaz de deitar sua cabeça no travesseiro, sabendo que outra pessoa estava cuidando daquilo que ele deveria, e era o mais qualificado para fazer. 


 

Tinha de ser ele. Assim como sempre fora.

 

 

Não soube explicar a euforia irreconhecível que tomara conta de seu peito quando a tomou em seus braços, após meses sem encarar aqueles olhos cor de esmeralda. Mesmo no contexto em que se encontrava, desfalecendo em seus braços, ela estava mais linda do que sua mente era capaz de recordar. Ali, percebeu que não seriam meses que o fariam esquecê-la. Nada o faria esquecê-la. 


 

Mas então, o que estava o impedindo de ser o dono daquele abraço? Não era ela. Todas as grosserias que lhe foram ditas não passavam de mera proteção; respostas para seu comportamento agressivo quando ela estava por perto. Era assim que lidava com sua presença. Ele a afastava.


 

Talvez fosse melhor assim. Eventualmente tudo isso chegaria ao fim e não ficaria surpreso quando a visse embarcando para longe novamente. Melhor manter distância, continuar construindo seus muros e não se apegar a sua presença.


 

Ela o deixaria novamente. “Será que dessa vez mereço ao menos uma despedida?”.


 

Sorrindo satisfeita com a ausência de sua resposta, a morena a sua frente levantou-se, só então o recordando de sua presença. — Sabe onde me encontrar quando souber a resposta. Agora se me dá licença, tenho malas pra arrumar. Califórnia me aguarda. — Dando um leve tapa sobre a mesa, decidiu que seu trabalho por ali já havia acabado. 


 

Finalmente sozinho em sua sala, Kurt se permitiu relaxar sobre a cadeira. Só então demonstrou o quão tenso e cansado realmente estava, sentindo suas costas doerem ao respirar. Essa situação toda estava acabando não só com seu psicológico.


 

Perdido em seus pensamentos enquanto observava a pequena reunião que acontecia na sala a sua frente, não percebera quando a tela de seu celular acendeu sobre a mesa, revelando a recente mensagem de texto recebida por um número não salvo.





“Jantar essa semana? Me ligue quando puder. Estou com saudades.”


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Mais alguém com um pé atrás?

See you soon.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "What if?" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.