Elas escrita por Karina A de Souza


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Olá, bem vindos à Resistência.



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Dia 1.355 da Guerra de Stichford.

Estávamos preparando o jantar quando bateram na porta. Minha mãe quase derrubou a colher, assustada.

—Quem pode ser uma hora dessas?-Perguntou, em voz baixa.

—Não sei. Mas é melhor abrir.

—Não. E se forem os soldados?

—Se forem, vão entrar de qualquer maneira. E resistir pode acabar nos encrencando mais.

—Mas não fizemos nada de errado.

—E isso alguma vez importou pra eles?

Larguei o pano de prato e corri pra porta principal, lembrando do que meu pai dizia. “Não importa o que façam, eles são a lei e não queremos ser presos. Abaixem a cabeça e façam o que mandam”. Isso não o impediu de levar um tiro e ir preso.

Abri a porta, mas não havia ninguém.

—Olá?-Olhei em volta. A rua estava vazia. O toque de recolher já tinha soado há uma hora. -Olá?

Comecei a fechar a porta quando notei um papel amassado no tapete. Me abaixei, pegando e fechando a porta em seguida.

“Stefflon Rogers, você foi recrutada pela Resistência. Esteja pronta à meia noite”.

Enfiei o papel no bolso da calça e voltei pra cozinha.

—Quem era?-Minha mãe perguntou, preocupada. -Eram os soldados? Falaram alguma coisa do seu pai?

—Não era ninguém. Talvez fosse alguém brincando.

—Não é tempo de brincadeira, estamos em guerra.

—As pessoas precisam tirar isso da cabeça.

—Temos que pensar em obedecer e sobreviver. É só o que podemos fazer agora.

—Podemos resistir.

—Nunca mais repita isso!-Olhou em volta, como se alguém pudesse estar escutando. -Essa história de... De Resistência só faz as pessoas serem mortas mais rápido.

—Morrer agora ou depois. Realmente são escolhas ótimas.

—É como as coisas são. Resistir só vai piorar as coisas.

—O papai não resistiu e agora está morto.

—Ele não está morto.

—O levaram faz um ano, mãe. O que mais poderiam ter feito com ele? O mataram sem ele ter feito nada, assim como fizeram com muitas outras pessoas. Abaixar a cabeça e obedecer não está fazendo ninguém ser salvo. Aquele psicopata está acabando com quem ele quer por que ele pode, por que está no poder e quem vai se opor?

—Stefflon, você não está pensando em... Eu não vou deixar você se envolver com essa história de lutar contra o Mestre. Prometa que não vai. Prometa.

Eu prometi. Mas fugi naquela noite para me juntar à Resistência.

No dia seguinte, minha mãe foi levada pelos soldados.

***

Dia 1.825 da Guerra de Stichford.

—Relatório do dia 1.825, segunda feira, 16:30. Relato pela agente 106, Rogers. Os agentes da base Resistência 1 foram em direção ao castelo. Não há respostas de aliados. Agente 106 é a única na base. Aguardando informações da equipe que partiu.

Desliguei o gravador, me afastando da mesa e suspirando em seguida. Odiava ser a guarda base. Queria ter ido junto, atirado em alguma coisa só para desestressar.

Era o dia 1.825 de uma guerra insistente contra o Mestre. Ele havia tomado Stichford cinco anos atrás e ninguém havia o derrubado do poder desde então.

Resistências foram formadas rapidamente, mas vencer se tornava cada vez mais difícil. Aos poucos várias foram caindo, perdendo, se entregando e morrendo, até a Resistência 1, a base que tinha me recrutado, ser a única que restava.

As pessoas preferiam viver com medo do que lutar.

Eu tinha vinte anos quando me recrutaram. No início da guerra, ninguém com menos de trinta podia participar. Todas as regras foram pro espaço, crianças estavam implorando para lutar, foi assim que a Ordem de Recolhimento começou. As crianças até 14 anos foram todas levadas para uma instituição longe da cidade. Estavam vivas, mas longe de suas famílias.

Olhei o relógio, 16:40. Liguei meu comunicador.

—Equipe Resistência 1, aqui é a base. Qual seu status?-Silêncio do outro lado. -Repito. Qual seu status?-Sem resposta.

Me empurrei até a mesa do computador mais próximo, as rodinhas da cadeira protestando um pouco. Digitei o código de rastreamento do comunicador da equipe e esperei pela localização.

Os sistemas estavam lentos, então demorou um minuto e meio até ter a informação na tela.

A equipe estava no Castelo Vermelho, a nada discreta localização do Mestre.

—Equipe Resistência 1, aqui é a base. Qual é o seu status? Repito. Aqui é a base... -Som de estática. -Agente? Está me ouvindo?

—Eu estou, mas não posso dizer o mesmo da sua equipe. -Ajeitei a postura na cadeira, alerta. -Mortos não ouvem, geralmente.

—Quem é? Quem está falando?

—Você não reconhece a voz do seu líder soberano, agente 106?-A tela grande na minha frente ligou repentinamente, exibindo o Mestre. -Eu devia fazer mais transmissões para os meus súditos.

—O que fez com a minha equipe?-Fiquei de pé.

—Estão todos mortos. Não é uma surpresa. Tentaram entrar na minha casa. O Castelo Vermelho não está aberto para visitação. Acho que isso faz de você a última agente da Resistência.

—Mais de nós vão surgir e vão continuar surgindo até que seja derrotado. A Resistência nunca morre.

—Acho engraçado como se dominaram a Resistência. Se escondendo por aí como ratos, saindo para fazerem ataques que só resultam na destruição de vocês. Cinco anos e alguns ainda não entenderam como as coisas são. Ainda não aceitaram.

—Ditadores não são aceitos.

—Eu não preciso da aceitação de vocês, é por isso que tomei esse país. Acha que alguém vai surgir para salvá-los? Acha que você vai ser a grande heroína que vai me derrotar? Quer ver seu nome nos livros de história, uma estátua sua talvez? Vão se lembrar de você, posso garantir. A última agente da Resistência. Aquela que morreu sozinha.

A tela à minha esquerda começou a piscar. Movi o olhar, confusa. Os sensores em volta da base haviam detectado algo grande vindo na minha direção. Era um míssil. E ele estava bem perto.

—Foi bom conversar com você, agente 106, mas é hora de você explodir. Tchauzinho.

Me virei e comecei a correr, pegando o corredor de emergência em vez da saída normal, o que me faria dar de cara com o míssil assim que abrisse a porta.

Alerta de impacto. A base deve ser evacuada.—O sistema avisou. -10, 9, 8...

Continuei correndo. Eu tinha que sair. Tinha que viver. Tinha que recomeçar outra vez e derrotar o Mestre.

7, 6, 5, 4...

Eu era última. Precisava viver pelos outros. Precisava viver por mim.

3, 2, 1.

O impacto fez um som terrível que eu jamais esqueceria. As paredes tremeram, e o teto começou a desabar. Continuei correndo, mas escombros caíram em cima de mim e eu fui pro chão incapaz de continuar.

Tentei me arrastar pra fora, empurrando, puxando e chutando, mas o peso era demais.

Fechei os olhos. Tudo silenciou.


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Notas finais do capítulo

Se eu tivesse que escolher um tema pra essa fanfic, certamente seria Bella Ciao (obrigada La Casa de Papel por me fazer conhecer esse hino).
Temos mais cinco capítulos pela frente, pessoal...



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