Poeta anônimo escrita por Artemísia Jackson


Capítulo 5
Cupido Uravity: Gravidade zero!


Notas iniciais do capítulo

Yey, VOLTEI!



Primeiramente, desculpem meu sumiço, realmente aconteceu muita coisa nesse cenário de pandemia e eu fiquei desmotivada. Mas não desistam de mim, agora eu voltei pra valer, juro! Já tô escrevendo o último capítulo (ou penúltimo? Ainda não sei se vou ter que dividi-lo hihihi). Então a partir desse capítulo eu volto com força, só preciso esperar a beta linda e anjo salvador terminar de avaliar e betar os capítulos, agradeçam a Júlia por tudo!



E sim, eu mudei meu nome, e sim, eu sou mulher gente KKKKKK geral achava eu era menino, but no. Quem quiser saber os motivos da mudança, tá no mural.



E aliás, os últimos capítulos foram revisados após dicas da Ju, e eu fiz alguns acréscimos importantes, então recomendo a releitura pra quem quiser se inteirar mais com os sentimentos dos personagens.



É isso, desculpem essa senhora nota, obrigada por continuarem aqui e boa leitura :)



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Shoto soube que havia algo muito errado assim que acordou e sentiu o frio arrepiar seus pelos da nuca. As estações no Japão eram conhecidas por serem muito pontuais, portanto, não era comum aquela baixa temperatura em plena primavera. 

 

O jovem despertou de súbito, saindo do transe pós sono que sempre o prendia por minutos a mais na cama. Sentia um terrível aperto no peito que espantou toda a letargia da manhã. Na sua mão (que dormira embaixo do travesseiro) ainda estava a poesia que lhe fora tão acolhedora na noite anterior, bem amassada. Notou que vestia o uniforme, então apenas enfiou sua pequena relíquia no bolso enquanto pulava da cama, agitado. 

 

 

O sentimento de desespero aumentou quando seus pés sentiram a leve camada de gelo no chão. Estava presente por todo seu quarto, subindo em sutis veios pela parede, embora não tivesse ninguém ali no cômodo. 

 

 

Shoto correu com o coração na boca, imaginando se aquele homem teria feito algo com sua irmã. Se fosse isso, não responderia por si. 

 

 

Quando chegou na cozinha, observou da porta uma Fuyumi com os braços apoiados na mesa e rosto escondido entre eles. Seu corpo tremia, e Todoroki sentiu o sangue ferver ao assistir a cena. Porém, ao procurar ao redor, não viu sinal de Enji ou qualquer violência causada por ele — nada de copos quebrados, artigos de cozinha queimados ou móveis fora do lugar, apenas o gelo pelo chão e veios sutis pelas paredes. Seu pai não era o motivo do frio ou do choro. 

 

 

Andando devagar, Shoto se aproximou o suficiente para tocar o ombro da irmã gentilmente como poucas vezes fazia, atento a cada movimento e expressão dela ao levantar o rosto para encará-lo com olhos vermelhos e chorosos.

 

 

— O que aconteceu? — perguntou enfim, sem saber se realmente queria ouvir a resposta. 

 

 

Um longo silêncio se instalou, interrompido somente pelos soluços de Fuyumi. Apenas muito tempo depois a jovem Todoroki conseguiu força suficiente para responder o irmão caçula, com a voz mais quebrada do que nunca: 

 

 

— A mamãe… Ela está morta. 

 

 

—______

 

 

Izuku estava apreensivo, mal conseguia prestar atenção às aulas. Ninguém parecia ligar a mínima para a ausência de Shoto, mas Midoriya achava-a de extrema importância. Perguntava-se frequentemente entre uma aula e outra o que poderia ter acontecido, temendo que tivesse algo a ver com aquele homem abominável. 

 

 

— Relaxa, Deku, não deve ser nada demais — sussurrou uma voz familiar em seu ouvido. Uraraka agachava-se ao seu lado, aproveitando o intervalo entre a troca de aulas.

 

 

— Não sei do que você tá falando — resmungou, tentando disfarçar. A última coisa que precisava era de mais alguém na sala de aula sabendo de sua situação

 

 

— Você não precisa mentir pra mim, Izuku, sabe que não vou comentar com ninguém. Mas se não quer ser notado, pelo menos melhora essa cara, porque tá nítido que você não tá bem — Uraraka ainda cochichava, mas aos poucos outros alunos voltavam sua atenção para o assunto que conversavam; afinal, não podiam ver um segredo que já queriam se meter. 

 

 

Ochako se levantou sem dizer mais nada e voltou ao seu lugar. Alguns lhe perguntaram se Midoriya estava bem, mas ela apenas fugiu do assunto. 

 

 

Esperava que Todoroki estivesse bem, não só por ele próprio, como também por Izuku. Olhando de longe, Uraraka só pôde imaginar o transtorno que teriam caso Deku interferisse. E, bem, ela sabia que o amigo era intrometido o suficiente para fazer isso. 

 

 

"Está tudo bem, não precisa ficar se preocupando à toa" — ralhou consigo mesma, mentalmente. Mas, por algum motivo desconhecido, ela não conseguia acreditar nas próprias palavras. 

 

 

—______

 

 

Fuyumi observava o irmão com o canto dos olhos. O táxi andava lentamente pelas ruas da cidade, de forma que esta se desdobrava pelas janelas, caótica e movimentada como sempre, alheia ao sofrimento da sua família. Suspirando, a Todoroki mais velha resolveu se pronunciar. 

 

 

— Não foi culpa sua, Shoto — disse baixinho, com o braço esquerdo se esticando para encontrar a mão do irmão. 

 

 

— Mal súbito durante o sono, provavelmente causado pelo estresse e fragilidade emocional, tudo isso logo depois me ver. É, realmente não é culpa minha — retorquiu o caçula, se esquivando. 

 

 

— Isso ia acontecer a qualquer momento, eu já desconfiava — confessou Fuyumi repentinamente, com pesar. — Independente da sua visita ou não, Shoto, porque a mamãe tava se lembrando de muitas coisas ultimamente. Tudo começou com uma flor estúpida que mandaram, parecia uma que o papai sabia que ela gostava e tudo o mais. Desde então, ela vinha enlouquecendo, surtando, tendo lapsos de memória e toda essa merda, inclusive pesadelos. Ela morreu dormindo, pode muito ter sonhado com o Enji e atingido o ápice do estresse ali. 

 

 

— Ou sonhou comigo — teimou Shoto, pequenas lágrimas brotando no canto dos seus olhos. — E se essas memórias só voltaram por minha causa? As piores, quero dizer… é muita coincidência, ela morrer logo após minha visita e…

 

 

— Para com essa merda! — esbravejou Fuyumi, quase gritando enquanto batia os pés no chão do veículo, assustando o irmão e o taxista, que os olhava nervosamente pelo retrovisor interno. — Para de se culpar, para de tornar isso mais difícil, para de pensar que a responsabilidade é sua! Eu tenho certeza que mamãe preferiria morrer depois de te ver do que viver muitos anos sem você. Se for culpar alguém, culpe o Enji, aquele desgraçado. Mas eu não vou aceitar mais isso, entendeu? Mais um de nós se destruindo e se culpando pelas coisas que aquele podre fez, mais um de nós fodido e incapacitado mentalmente. 

 

 

As lágrimas jorravam pelo rosto da Todoroki mais velha, que nem fez esforço para contê-las. Subitamente, a razão atingiu Shoto e ele percebeu que não tinha motivo para entristecer a irmã com mais uma coisa, porque ela estava certa: a culpa não era dele e muito menos dela, o único culpado de toda aquela merda era o pai deles. 

 

 

Meio desajeitado, o caçula se aproximou da irmã e a envolveu em seus braços num abraço apertado, deixando que ela chorasse em seu ombro. Por algum motivo, agora que a razão o atingira, Shoto não conseguia mais sentir vontade de chorar, então ele apenas se permitiu ser o apoio de Fuyumi pelo resto do caminho de volta para casa, que pareceu longo e interminável enquanto o carro rodava e rodava pela cidade brilhante e primaveril, tão bonita que mais parecia um insulto ante ao sofrimento daqueles que lamentavam a perda de Rei Todoroki. 

 

 

—______
 

 

 

Izuku caminhava de forma decidida até a sala dos professores, com um desespero visível no olhar. Ninguém fora capaz de dissuadi-lo da ideia, então deixaram-no para trás — afinal, nenhum deles queria trombar com Aizawa ou Nemuri na sala de professores depois de provas tão difíceis, que certamente haviam causado desgosto em ambos após a avaliação dos resultados. 

 

 

Mas Midoriya pouco se importava com isso, estava preocupado com algo muito maior que provas de matemática ou física; sua aflição tinha a ver com a ausência de Shoto por três dias, o que era muito tempo, se a lista de presença impecável de Todoroki significasse algo, e certamente significava. 

 

 

O jovem estava disposto a descobrir o que havia acontecido, e se tinha relação com Endeavor. Não sabia bem o que faria caso tivesse, mas definitivamente não podia não fazer nada. 

 

 

Os corredores da U.A estavam lotados com os alunos que se dispersavam ao final de mais um dia letivo. Midoriya lutava contra a maré de corpos que tentava lhe arrastar para a direção oposta, obstinado em sua missão de chegar até a sala dos professores. 

 

 

Finalmente, uma grande porta ao final de um corredor apareceu, com a uma plaquinha branca marcando "sala dos professores" em seu kanji caprichado. Meio ofegante devido aos passos apressados que o levaram até ali, Izuku adiantou-se para bater, pensando que, com sorte, poderia falar com All Might, em quem mais confiava dentro da U.A. Mas antes que o pensamento fosse concluído e ele batesse, a porta se escancarou, revelando uma figura feminina que não parecia nada contente. Ela parou ao ver os olhos verdes enormes lhe encarando, parecendo levemente sobressaltada. 

 

 

— Midoriya? — indagou, piscando e parecendo confusa. Então, ela pareceu ser tomada de compreensão e fechou a cara novamente. — Sinto muito, mas não irei revelar os resultados dos exames até semana que vem, mas posso adiantar que o 1°A me decepcionou muito e…

 

 

— Na verdade, eu não estou aqui por isso, professora — Midoriya interrompeu, muito constrangido, com as bochechas coradas e olhar culpado voltado para o chão. Sabia que tinha sua parcela de culpa na decepção da professora, uma vez que negligenciara os estudos necessários para o exame, mas a culpa não era sua (ele não havia pedido para se apaixonar e ficar abestalhado, oras).

 

 

— Então por que está? — Nemuri indagou novamente, o olhar estreito e desconfiado. Não convidou o jovem para entrar, pois a sala estava um caos: os professores ainda choravam os resultados péssimos dos exames dos primeiros e segundos anos, expondo as piores notas (sem citar nomes) e perguntando coisas como "onde foi que eu errei?", ou "o que fiz pra merecer isso?".

 

 

— Por Shoto — murmurou, encarando a professora. Pavor tomou conta de si ao observar o contrair de lábios da mulher, que agora parecia triste ao invés de brava. Incapaz de se conter, deu vazão as suas preocupações: — Professora, aconteceu algo com ele? Fizeram algo com ele? 

 

 

Nemuri o olhou e dessa vez, a compreensão realmente lhe atingiu. Por um momento, pensou que a notícia acerca da morte de Rei havia vazado, mas o entendimento acertou seu rosto como uma pedrada na cara assim que percebeu que ele não sabia, mas, mesmo assim, supunha que algo de ruim havia acontecido, e que alguém tinha feito mal ao amigo. Ela não podia culpá-lo; não quando era de conhecimento geral que Shoto era filho de Endeavor, assim como também era de conhecimento geral que o herói número dois tinha péssimo gênio e zero tolerância com quem quer que fosse. 

 

 

Os boatos acerca de seu comportamento violento com o filho e futuro substituto só cresciam, e Shoto não afirmava, mas tampouco negava. Era uma situação alarmante, e claro que amigos próximos iriam se preocupar e procurar notícias.

 

 

— Ele está bem, querido — Nemuri disse enfim, num tom doce e maternal. Agachando-se, a professora ficou de joelhos no chão, quase na mesma altura de Izuku, para acariciar os cachos rebeldes e verdes como copas de árvores enquanto lhe encarava de forma intensa e terna. — Ninguém fez nada contra Shoto, mas quando voltar, ele vai precisar de todo apoio. Não deixe que o pressionem com perguntas, só se certifique de estar lá, certo? 

 

 

Izuku apenas assentiu, meio assustado com o comportamento meigo da professora — ela costumava ser irritada e bem general em suas aulas, principalmente em matemática. Sorrindo meio sem graça, ele agradeceu e saiu após uma exagerada reverência (como as do lida), realmente grato pela gentileza de Nemuri. 

 

 

Voltou pelos corredores, agora silenciosos e vazios. Não estava menos preocupado, mas poderia dizer que sentia certo alívio por ter uma ideia do que poderia fazer. Ainda assim, saber que o amigo não estava machucado não era o suficiente para lhe tranquilizar — e, definitivamente, os olhos marejados da professora não haviam ajudado. 

 

 

Com ombros caídos, Izuku suspirou quando alcançou a saída da escola. Nem sabia como tinha conseguido chegar ali, tão absorto estava em seus pensamentos. Observou o sol se pondo além dos prédios e suspirou mais uma vez, imaginando como poderia ajudar. 

 

 

Bem, só conhecia uma forma: escrevendo. Era o que fazia de melhor, afinal. 

 

 

—______

 

 

Shoto não conseguia sentir nada, ou então sentia tanto que mal conseguia discernir. De toda forma, lhe parecia impossível ficar triste pela morte da sua mãe agora que tinha voltado ao seu estado racional de sempre. Sentia-se horrível por isso, mas para o Todoroki caçula, a mãe havia se livrado de um fardo. A morte não devia ser pior que a vida que ela levava naquele sanatório, com lembranças e culpas que nem deviam lhe pertencer assolando seu espírito. Desde que vira o aspecto doentio da mulher na clínica, Shoto havia pensado que a morte lhe seria mais agradável que sua situação. 

 

 

Ao redor da sala no qual o ritual se findava, haviam apenas familiares: Fuyumi e Natsuo eram os únicos ali além dele próprio. Shoto agradeceu por aquele homem não estar presente, pois, se estivesse, não responderia por si. Esperava não vê-lo por no mínimo uma semana. O desgraçado sequer tomara à frente para resolver as burocracias, tendo deixado tudo na mão da filha mais velha — era mesmo um insensível que só se importava com seus próprios objetivos individuais. 

 

 

Sozinho do lado esquerdo, o jovem Todoroki apenas observava os irmãos ao lado direito. Natsuo confortava a irmã num abraço de lado, derrubando algumas lágrimas. A irmã chorava inconsoladamente e o lenço disposto em sua mão parecia encharcado. Shoto se sentiu pior com essa cena, pois não derrubara lágrima alguma naqueles quatro dias que se passaram desde a notícia, com exceção daquele brevíssimo momento no táxi. Nem no Otsuya, nem agora na cremação — era como se não fizesse parte daquele momento, daquele luto. 

 

 

Tais sentimentos — ou melhor, a falta deles — o faziam sentir ainda mais como seu pai, que também não havia chorado, tampouco parecera abalado. Claro que Shoto sentia uma certa melancolia e vazio ainda maiores que o habitual, mas, de certo modo, não sentia tristeza pela morte da mãe — embora seus motivos estivessem longes de serem egoístas como os de Enji. 

 

 

Com o rosto inexpressivo, Todoroki apenas observou todo o desenrolar do ritual tradicionalista, e apesar de sua estranha apatia, ele desejou que sua mãe enfim tivesse paz no pós morte, se é que existia algo após ela. 

 

 

E, num súbito momento de tristeza, desejou que pudesse encontrá-la logo. 

 

 

—______

 

 

— Por que não foi com o Izuku? — indagou Katsuki para Ochako, parecendo muito mal humorado.

 

 

— Porque ele ficou pra falar com os professores e eu não quis correr o risco de descobrir minha desgraça antes do tempo — respondeu a garota, em tom de obviedade. 

 

 

Era uma mentira, mas Bakugou pareceu engolir, resmungando algo tão baixo que a jovem não pôde ouvir — de qualquer forma, tinha certeza que não queria mesmo escutar. Ignorando a bombinha resmungona ao seu lado, Uraraka voltou seus pensamentos para Izuku e Shoto. Esperava mesmo que o amigo não se metesse em encrenca por ser tão enxerido e preocupado. 

 

 

Quer dizer, ele queria ser herói, como todos queriam, obviamente. Mas precisava de tudo aquilo? Se preocupar tanto a ponto de se deixar de lado? Afinal, tudo aquilo era o complexo de herói do amigo ou era efeito da paixão? Difícil saber, ainda mais quando Deku tinha altas tendências a ser igual com todo mundo, dificultando assim a percepção de sinais. 

 

 

Aliás — Ochako interrompeu a si mesma em seus devaneios —, pensando em sinais, será que Shoto sequer percebia? Ela duvidava muito, visto que o garoto era um lerdo. E por falar em lerdeza…

 

 

Ochako saiu de seus debates internos para encarar os dois amigos idiotas que se bicavam feito duas galinhas velhas, andando um do lado do outro na sua frente, provocando-se e brigando pela milésima vez naquele dia. A garota se perguntou, também pela milésima vez, quando os dois idiotas iam se dar conta da vontade que tinham de se beijar. 

 

 

Naquele momento, Eijirou e Katsuki estavam falando sobre quem na sala gostava de quem, confabulando casais — só parando as conspirações para se insultarem e discordarem um do outro. 

 

 

— E você, Ochako, acha o quê? — indagou Kirishima, finalmente a incluindo na conversa. 

 

 

— Acho que vocês deviam ser menos perdedores — respondeu ela, de forma irônica, tentando disfarçar o fato de que não sabia nada além da ideia geral do assunto.

 

 

— Não sou um perdedor, cara redonda — rosnou Katsuki. 

 

 

— Claro que não — cantarolou Uraraka, sarcástica. — Mesmo assim, prefere perder tempo cuidando da vida amorosa alheia ao invés de cuidar da sua. Você também, Kiri, não adianta rir — acrescentou mordazmente ao ver que o outro gargalhava. 

 

 

Depois de recuperar a postura, Eijirou lançou um olhar rancoroso para a amiga, aprumando os ombros de forma pomposa antes de responder:

 

 

— Eu cuido da minha vida amorosa muito bem, obrigado! 

 

 

— Cuida, é? — a garota arqueou as sobrancelhas de forma incrédula, tentando não rir ao ouvir o som do familiar rosnado de Bakugou e de suas passadas apressadas.

 

 

— Sim, eu cuido! 

 

 

— Me conte então, quais as novidades? Sua vida é muito mais interessante que a do pessoal da sala — incentivou Ochako, na esperança de que o ruivo fosse esperto e aproveitasse a oportunidade para flertar com o pretendente irritadiço que andava à sua frente.

 

 

— Bom… eu… eu acho que tô gostando de uma pessoa — revelou num fôlego só, sem notar a careta de Katsuki. — Mas não sei se ela gosta de mim também — acrescentou rapidamente, com as bochechas coradas e olhar baixo em puro constrangimento. 

 

 

— Claro que não, quem vai gostar de você e desse teu cabelo de merda? — resmungou o amigo rabugento. Embora dissesse em tom de brincadeira, Eijirou pareceu totalmente abalado, e o seu lábio inferior tremeu. 

 

 

Contudo, Katsuki estava imerso demais em qualquer que fosse o sentimento desagradável que lhe tomava, então não percebeu. Mas claro que Uraraka havia reparado, e estava muito brava com tudo aquilo. A coisa pendente entre eles era tão óbvia que chegava a ser ridícula, mas ambos eram tão cegos que lembravam Izuku e seus dilemas. 

 

 

— Você acha? — Kirishima perguntou, em tom choroso, embora tentasse disfarçar.

 

 

— Não acho, tenho certeza. 

 

 

Aquilo foi a gota d'água. Indignada com o modo como Katsuki respondeu o amigo, Ochako aproximou-se dele por trás de forma traiçoeira. Antes que qualquer um dos garotos percebesse sua intenção, a bombinha raivosa já flutuava, atingindo uma altura superior a cada segundo que se passava. 

 

 

Sorrindo, Uraraka contemplou seu trabalho, imensamente satisfeita. 

 

 

— Que porra é essa, cara redonda, me bota no chão! — esbravejou Katsuki, muito irritado. 

 

 

— Não, você não merece caminhar do nosso lado com esses maus modos, ainda mais sendo ridículo desse jeito com Eiji. Só vai descer quando pedir desculpas — disse ela, com as mãos pousadas no quadril, encarando o outro de modo crítico.

 

 

Eijirou não sabia se ria, chorava ou acabava com a brincadeira. Decidiu que mesmo que quisesse a última opção, não conseguiria nada, porque uma Ochako determinada era como um mar revolto; só Jesus na causa. Ficou só ali, parado, tentando se manter neutro. 

 

 

— Nem fodendo! — exclamou Katsuki, pairando no ar. 

 

 

— Certo, então vai ficar aí em cima mesmo — comentou a jovem, num tom de grande descaso. 

 

 

Sem nem olhar para Katsuki, ela rumou para um banco bem ali na calçada. Já estavam perto da estação, e Uraraka realmente não se importava em ficar a tarde toda ali. Mandando uma mensagem para os pais — acompanhada de uma foto de Bakugou no ar —, ela explicou brevemente a situação. Depois, pegou uns salgadinhos dentro da bolsa e ofereceu para Eijirou, que acabara de se sentar. 

 

 

Alguns minutos se passaram em silêncio, com um Katsuki flutuando no ar, exalando ódio. Algumas pessoas que passavam encaravam a cena estupefatas, divididas entre expressões de riso e reprovação. Uraraka ignorou todas. 

 

 

— Hmm, Ochako, não acha que já deu? — perguntou Kirishima, de forma cautelosa, olhando o amigo com pena. 

 

 

— Mas cadê a sua resistência? Como vai punir vilões se não consegue ver seu amigo flutuando? — ralhou ela, alto o suficiente para que Katsuki também ouvisse. — Se quiser ir, pode ir, mas eu não saio daqui até saber que esse bostinha se arrependeu. 

 

 

— Bostinha? — vociferou ele. — Me tira daqui pra eu te mostrar o bostinha, sua…

 

 

Um pão de queijo mastigado voou da boca de Ochako quando ela subiu no banco e mirou no rosto de Bakugou, acertando-o em cheio — suas aulas de cuspe alado tinham mesmo valido a pena. O loiro explodiu em xingamentos efusivos, enquanto Eijirou chorava de rir ao lado de Uraraka, que havia sentado novamente para gargalhar com segurança. 

 

 

— Você… vai… aprender, Suki, por bem ou por mal, mas vai — disse ela, entre ofegos e mais risos. 

 

 

—________

 

 

Mal humorado, Bakugou observava os dois amigos no banco. Ochako e Eijirou jogavam algum jogo online e soltavam gritinhos histéricos conforme a partida se desenrolava. 

 

 

Já estavam naquela palhaçada cerca de duas horas e meia. Quando cara redonda dissera sobre os treinos intensivos, Katsuki não levara muito a sério e agora pagava por subestimar a garota. Ele apenas se lembrava da época em que participaram da prova de admissão — tendo durado menos de duas horas —, na qual Ochako passara mal e vomitara em Izuku no final, porque não conseguia usar muito da sua individualidade sem sentir os efeitos colaterais. Agora, os tais efeitos não davam nem sinais de existência. 

 

 

Mas desde o ataque da Liga dos Vilões na USJ, todos começaram a se empenhar muito mais, e com a sombra do Festival Desportivo logo à frente, o esforço redobrava significativamente. 

 

 

Na primeira uma hora, Katsuki tinha mesmo ficado puto, e sua mente eram só gritos e xingamentos, tudo que fosse possível para calar a voz da razão — que soava irritantemente como a voz do nerd de merda. Porém, a segunda hora trouxe cansaço e o silêncio em sua mente, que fez aflorar aquela que tentara tanto calar. 

 

 

Bakugou sabia que estava errado, sua razão tinha gritado alto o suficiente para que ele aceitasse a verdade. Mas agora, com mais meia hora de reflexões, começava a realmente se sentir culpado. Seu ciúme estúpido o fizera proferir uma mentira descarada sobre Eijirou — afinal, com ou sem cabelo de merda, ele era incrível e qualquer um que não gostasse dele ou era burro, ou era cego. 

 

 

E a cara do amigo quando dissera aquilo… mas ele era burro por acreditar, isso irritava Katsuki ainda. Quer dizer, Eijirou sabia que era lindo, não sabia? Ele tinha que saber, porque, porra, ele era! Então por que se deixar abalar pelas suas palavras estúpidas? Por que fazer uma expressão tão triste e até mesmo ameaçar chorar? Francamente, Bakugou não entendia. 

 

 

Voltou seu olhar para o ruivo novamente, o surpreendendo e o pegando no flagra encarando descaradamente. Viu o rosto dele corar e se tornar tão vermelho quanto os cabelos e quase riu — Eijirou era tão adorável que chegava a ser patético. 

 

 

Bakugou odiava pedir desculpas, odiava mesmo. Na verdade, não sabia como fazer aquilo, e mesmo assim, sentiu uma necessidade enorme de desculpar-se. Ah, Eijirou era um desgraçado por causar aquelas coisas estúpidas nele, essa era a verdade. 

 

 

— Ei, cabelo de merda… — chamou baixinho, a voz rouca. — Na verdade, eu quero dizer que você é um grande idiota por se perguntar se a pessoa gosta de você, porque não tem quem não goste desse teu cabelo cagado e desse teu sorriso do caralho. Você só faz pergunta idiota, merece respostas imbecis. 

 

 

Eijirou e Ochako piscaram, surpresos, sendo que o primeiro tinha lágrimas de emoção nos olhos. E, embora dificilmente achasse que aquilo era um pedido decente de desculpas, Uraraka se deu por satisfeita — afinal, quem precisava de desculpas quando fazia um bom trabalho de cupido e conseguia uma declaração? Sorrindo, ela guardou seu celular no bolso e subiu no banco novamente, esticando-se toda para alcançar Bakugou e tocá-lo, quebrando por fim o efeito da sua individualidade. 

 

 

O garoto caiu estatelado no chão, porque não teve tempo de se recompor. Xingando alto, ele se levantou e agarrou a própria mochila, já começando o caminho para a estação, morto de raiva, fome e vergonha. Cara de lua iria pagar, ah, se ia!  

 

 

Mas mal dera dois passos, já se via sendo interrompido de novo, dessa vez por braços fortes em volta de seu pescoço, que o abraçavam. Corando ainda mais, Katsuki ficou ali, parado, sentindo o calor do corpo de Eijirou contra o seu. Na rua, algumas pessoas olhavam de forma estranha, porém nada daquilo tinha importância. Bakugou se deixou ser abraçado, perplexo demais para sequer retribuir — o que não parecia abalar Kirishima, que parecia abraçar pelos dois. 

 

 

Um pouco atrás, Ochako observava a cena, imensamente satisfeita com o fruto de seu árduo trabalho. Sorrindo, a garota decidiu que talvez tentasse mesmo a tal carreira de cupido. 

 

 

"Cupido Uravity: gravidade zero! Soa bem" — pensou com seus botões enquanto gargalhava e seguia a dupla de marmanjos, ouvindo os infinitos resmungos de um envergonhado Bakugou. Ela podia se acostumar àquela rabugenta trilha sonora de amor dos dois, podia mesmo. 

 

 

***


*Otsuya: evento parecido com o nosso tradicional velório, onde geralmente um budista canta sutras enquanto amigos acendem incensos, tudo isso com o corpo do falecido ainda no caixão.

 

 


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Não deixem de expor suas opiniões! E podem me xingar pela crueldade também :')



Sobre as atualizações: vão depender da disponibilidade da Beta. Assim que ela revisar, eu solto, mas podemos ter dois capítulos numa semana e uma semana sem nenhum. Por isso, peço paciência e compreensão a todos ;)



É isso, vejo vocês no próximo!



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