Girl Crush escrita por suenacomoyo


Capítulo 2
Not Strong Enough




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Domingo. Último dia antes do retorno ao Studio 21. Era fim de tarde e fiquei na varanda apreciando o céu rosado. Depois do sol se pôr, voltei ao quarto, procurei aquele caderninho antigo no baú e me deitei na cama para ler e reviver memórias.

 

"Eu não sou forte o suficiente para ficar longe

Eu não consigo correr de você

Eu apenas corro de volta para você

Como uma mariposa estou afogado em sua chama

Você diz meu nome, mas não é o mesmo

Você olha nos meus olhos, estou despido de meu orgulho

E minha alma se rende e você trás meu coração aos seus joelhos

E me mata quando você está longe

E eu quero fugir e eu quero ficar

(...)

E eu sei que é errado e eu sei que é certo

Mesmo que eu tente vencer a luta

Meu coração superaria minha cabeça

E eu não sou forte o suficiente para ficar longe"

 

Not Strong Enough — Apocalyptica feat. Doug Robb. Uma música tão boa porém tão triste. E representava bem a minha relação com León durante todos esses anos. Eu me sentia acorrentada a ele. Eu sabia que nossa amizade era problemática, que ele errava muito comigo, mas eu não conseguia deixar de ser apaixonada por dele. Ele também não me deixava tirar as correntes mesmo quando eu tentava. E eu nunca fui forte o suficiente.

 

Quando acabamos o ensino médio eu pensei que eu ia conseguir me livrar desse sentimento, pela distância. Por aproximadamente uns seis meses nós ainda nos falamos virtualmente algumas vezes. Fomos nos afastando aos poucos e cada vez mais. Um dia eu o vi na rua falando com algumas pessoas e fui correndo toda feliz dar um abraço. Apesar dele olhar pra mim sorrindo, não me deixou abraça-lo com a desculpa de que estava suado e voltou a conversar com as outras pessoas como se eu nem estivesse alí. Tinha muito tempo que não nos viamos, eu tinha tanta saudade e ele não me deu a mínima. Aquilo me magoou. Não consegui me sentir a vontade com aquelas pessoas e tinha que ir andando. Falei que tinha que ir e ele levantou a mão para um high five. Novamente sorriu pra mim com cara de inocente. Era tão estranho. "Até qualquer dia" ele falou enquanto eu saí andando. Pude o escutar falando pros colegas "ela é meio grudenta". Aquilo me deixou possessa. E depois desse episódio ficamos aproximadamente um ano e meio sem nos vermos ou nos falarmos. Ele não me procurou. E eu estava decidida a também não procura-lo. Mas se ele me chamasse, eu provavelmente teria sedido. Justamente por motivos de: i'm not strong enough to stay away.

 

E foi nessa época que eu eu achei que o tempo seria o melhor remédio, como sempre me falaram. Claro que o fato de não nos vermos mais todos os dias, como na época do colégio, ajudou de certa forma a aliviar a dor. Mas eu não tinha o superado. Nunca superei. Por mais que eu tentasse. Fico me perguntando se eu não tivesse entrado pro Studio... será que eu teria conseguido me desacorrentar dele?

 

Fechei o caderninho e o guardei de volta no baú. Continuei deitada na cama e fiquei um tempo apenas olhando pro nada. Essa música ainda era tão forte pra mim. Fiquei tentando desviar o pensamento naquele maldito mas logo desisti, peguei meu celular e botei pra tocar Not Strong Enough enquanto me vinha na cabeça mais um flashback.

 

 

xXx

 

 

Uma semana desde que iniciei minhas aulas na famosa escola de artes Studio 21. Até então estava gostando muito. Studio 21 é uma escola de artes para jovens e para adultos. Duas vezes por ano são feitas audições para entrar nele. Você precisa já ter uma noção das coisas pra poder entrar, você mostra seu talento e eles vão avaliar em que nível você está. Lá tem aulas de música, canto, dança, instrumentos, aulas teóricas e práticas, aulas de atuação e além disso, sem precisar de testes eles oferecem cursos para quem quer fazer parte da produção de eventos, montar cenários, fazer as roupas, etc. Esse lugar tem uma vibe tão boa. To amando estar num lugar onde as pessoas são exaltadas por seus talentos artísticos e não por saber fazer contas gigantes.

 

Eu havia chegado um pouco mais cedo do que de costume então o lugar não estava cheio. Passei pela porta de entrada e desci as escadinhas que davam pro pequeno porém largo corredor que tinha apenas uma porta de cada lado, sendo a sala do diretor e a sala dos professores. Passando disso chegamos no que a galera de lá chamava de centro do Studio. Pois era literalmente o centro do Studio. Era uma grande área redonda com alguns pufes e poltronas encostados nas paredes. Essa área era cercada pelas portas de todas as salas de aula dos cursos de música.

 

A primeira porta a direita era uma sala onde ficavam os armários para os alunos guardarem alguns de seus pertences. Dentro dessa sala havia mais uma porta, que dava para uma sala com uma parede inteira de espelho, onde eram dadas as aulas de dança. Voltando ao centro, a segunda porta a direita era a sala das aulas de canto. Entre essas portas havia uma escada que dava para o segundo andar, onde tinham as aulas não relacionadas a música. A primeira porta a direita era um pequeno corredor que dava para os banheiros. A segunda porta a direita era a sala dos instrumentos. E olhando para frente, tinhamos uma porta maior, daquelas de duas partes, que davam para o que chamavámos de salão principal. A maior sala do Studio 21, cheia de cadeiras coloridas e com um lindo palco com cortinas e tudo. Essa sala era usada por todos os alunos. E era lá que de vez em quando rolavam apresentações. Apesar dessa ser apenas minha segunda semana de aula no Studio, eu fiquei sabendo de várias coisas pois o diretor Pablo fez um tour pelo Studio com os alunos novos.

 

Deixei algumas coisas em meu armário e segui em rumo ao salão principal. Assim que passei pela grande porta vi algo que eu realmente não estava esperando. Eu fiquei paralisada como uma estátua e literalmente de boca aberta. León Vargas estava naquela sala. Conversando com dois caras que eu não conhecia. Estava em pé ao lado de uma das carteiras, que eram daquelas que a mesa e a cadeira se separam. Eu fiquei totalmente em choque. Ele me viu. E provavelmente viu a minha cara incrédula.

 

— Surpresa! - León gritou pra mim com os braços pra cima e um sorriso no rosto.

 

— Não é possível. - falei num tom não muito alto, mas que ele ouviu e se levantou da cadeira. Eu consegui me descongelar e sair andando até uma cadeira no fundo da sala. Fingi que não era comigo.

 

— Ei! Vem cá me dar um abraço de boas vindas ao Studio! - ele veio andando calmamente em minha direção com os braços abertos. Deixei algumas coisas minhas na cadeira pra não perder o lugar e sai correndo na direção oposta ao garoto.

 

— Ué? Tá fugindo de mim? - ele começou a correr atrás de mim. Eu ainda não tinha conseguido pensar em nada pra falar. Minha cabeça não tava funcionando direito. Aquilo era muita informação pra mim. Sei lá o porque, meu único instinto foi fugir do  León como diabo foge da cruz. Ele era minha cruz apesar de ser um diabo.

 

Seguimos correndo entre as cadeiras de um lado para o outro como dois doidos. Os dois garotos que conversavam com ele antes apenas se levantaram e saíram da sala, nos deixando sozinhos. Eu como uma boa sedentária que não sabe correr logo me cansei. León pulando por cima das cadeiras conseguiu me alcançar, me puxou e surpreendentemente me deu um abraço. Ele me envolveu de uma maneira que seus braços prendiam os meus, para que eu não pudesse sair. Eu não retribuí de início. Mas em dois segundos senti meu corpo estremecer. Acabei retribuindo e apoiando minha cabeça em seu peito e colocando meus braços em volta de seu corpo. Eu senti falta desse abraço. Enquanto estava sentindo o calor do seu corpo eu até esquecia que tinha raiva dele. Então ele apertou o abraço e logo depois me soltou.

 

— Porque você tava fugindo? - ele perguntou rindo. Logo minha raiva voltou.

 

— Porque você não quis um abraço a um ano e meio atrás! - falei aumentando o tom de voz. — Eu sou grudenta né León Vargas?! Você estava suado pra mim mas não pros amiguinhos que tu baba ovo né León Vargas?!

 

— Ah mas que besteira Natália! Toma vergonha!

 

— Besteira o caralho! Isso foi só a última vez! Você acha que eu esqueci todas as vezes em que você me deixou de segundo plano? As piadinhas ofensivas que você fazia sobre minha aparência pros seus amiguinhos babacas? As vezes que eu fui carinhosa com você e você respondeu com grosseria e logo depois ia ficar de esfregação com umas minas que não davam a mínima pra você? Quando te convidei pra comemorar meu aniversário e a primeira coisa que fez foi perguntar de uma amiga minha e ficou a porra do dia inteiro pendurado nela e não me deu un pingo de atenção nem pra tirar uma foto? - eu falava alto, quase gritando, eu sentia uma mistura de emoções naquele momento. Apenas falei tudo que me veio na cabeça. Então respirei fundo e antes que León pudesse responder eu voltei a falar, dessa vez mais calma:

 

— Tem muito mais.... o tempo pode ter me feito esquecer algumas coisas. Ainda bem! Mas não foi tudo. Nada apaga tudo que eu sofri na tua mão. Eu fui muito mais tua amiga, do que você foi meu amigo. Eu achei que ia conseguir me livrar de você dessa vez.

 

— Cara... tu gosta de mim, não gosta? - León falou cruzando os braços e sorrindo de canto de boca. Eu não podia acreditar que no meio de uma discussão ele simplesmente cagou pra tudo que eu falei e vem perguntar se eu gosto dele. Puta que me pariu!

 

— Não León! Eu te odeio com todas as minhas forças! - eu gritei com o ódio estampado em minha cara. A vontade que eu tinha era de sair no tapa com esse cretino. Enquanto ele ria da minha cara e repetia "calma, calma" eu o dei um empurrão e sai correndo da sala. Dessa vez ele não veio atrás. Fui pro banheiro feminino e me tranquei em uma das cabines pois caso eu chorasse não queria que ninguém me visse. Todo meu esforço de esquecer esse filho da puta estavam indo por água a baixo. Eu não acredito que vou ter que conviver com ele de novo, que eu vou ter que viver esse inferno de novo. Eu sei que não sou forte o suficiente...

 

Fiquei no banheiro me remoendo até que a primeira aula começasse. Joguei uma água no rosto e segui rumo ao salão principal. Quando entrei vi que todos da turma já estavam lá, inclusive o diretor, que tinha algo a nos dizer. Dei bom dia e fui me sentar. Depois de sentar fiquei observando a sala e procurando por León. Ele estava sentado bem longe olhando pra frente. A manhã toda se passou e ele não tentou mais falar comigo. Eu na verdade não sabia se isso era bom ou ruim. Vi ele interagindo com muitas pessoas. Um garoto mostrou o Studio pra ele. Ainda não entendia porque ele não veio na primeira semana. Mas provavelmente estava viajando. Fiquei o observando de longe sempre que podia. Ele tava diferente. Tava com uma beleza mais madura. Agora tinha barba. E ficou tão bem nele. Ele estava mais magro. Mas isso pra mim era indiferente, pois quando me apaixonei pelo León ele era gordinho e eu sempre o achei extremamente lindo. Inclusive sempre deixei claro que o achava bonito. Diferente dele que sempre me botava defeitos. O garoto agora parecia bem padrãozinho. Creio que as meninas que o rejeitaram no passado agora poderiam voltar atrás. Triste que eu sempre o amei do jeitinho que ele era e ele nunca deu valor. Engraçado como no fim das contas nós dois queríamos quem não queria a gente.

 

Chegando em casa eu fiquei o tempo todo com a cabeça nas nuvens. Não parava de pensar nele. Me senti no colégio novamente. E ao mesmo tempo que eu torcia pra ele não vir falar comigo, eu também queria que ele falasse, que ele percebesse que errou e que mostrasse que está arrependido. Que o antigo León Vargas, que era um doce de pessoa, retornasse. Mas ele nunca admitiria que errou. Natália é sempre a errada.

 

E mais uma vez eu me peguei me culpando por isso tudo. Eu tinha que ter postura. Dar uma basta. Mas ele me tinha na palma das mãos. Eu não era forte o suficiente pra ficar longe. Já diria Apocalyptica. Incrível como essa música segue fazendo todo sentindo pra mim.


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