Após muitas horas de sono, Pedro suspirou fundo. Era normal sentir-se levemente atordoado depois de acordar, mas então, instantes em seguida, sua consciência o relembrou de onde estava e o que tinha acontecido. Suspirou de susto e para seu desespero, Domitila estava bem ao seu lado, ainda dormindo.

Apressado e afobado, Pedro terminou de se vestir, sem saber o que fazer ou o que dizer com a moça que estava ali. Queria sair correndo, disposto a fugir do seu erro e fingir que nada tinha acontecido, mas não podia fazer isso. Na mesma hora, a raiva de si mesmo o dominou e então se espalhou até atingir Domitila.

—Pedro? - murmurou ela, acordando, como se adivinhasse que era melhor acordar logo - o que foi?

—Como assim o que foi? - ele cuspiu de volta, enquanto ela se espreguiçava lentamente, sentava-se na cama, focando os olhos nele, alisando a camisola que usava - você tem a menor noção do que me fez fazer?!

—Calma, calma aí, eu não tô entendendo nada - ela ficou confusa e brava, se levantando de uma vez - eu achei que você queria passar a noite comigo, nós jantamos juntos e você não rejeitou meu beijo, tá dizendo que você não queria nada disso? Se não queria por que não me avisou antes?

—Não me venha com essa, você ficou me espreitando, me cercando, eu não queria ser mal educado - ele procurou uma desculpa esfarrapada.

—Você podia ter falado que não queria ficar comigo educadamente - ela respondeu indignada, aquela seria uma resposta óbvia.

—É por isso que nós nunca daríamos certo, nós nunca tínhamos limites, meu pai, Teresa, Leo, estavam certos o tempo todo - ele murmurou mais para si mesmo do que para ela.

—Escuta aqui - ela se levantou de uma vez, ousando apertar o queixo dele - tá claro que você não me queria, então me diz logo o porquê e mesmo assim, ficou comigo!

—Porque eu estou noivo, sua oferecida! Eu vou me casar com quem eu amo de verdade! - ele gritou para ele, afastando a mão dela do seu rosto.

—O que? Você não me contou que estava noivo, seu animal! - ela se revoltou ainda mais - acha que eu continuaria com as minhas investidas se eu soubesse disso? Você me subestimou muito. E eu não sou oferecida!

Domitila quase o esbofeteou, mas Pedro foi mais rápido e segurou o braço dela.

—Eu não sou oferecida, nós dois, esse joguinho de sedução entre nós, sempre foi assim nosso relacionamento - ela explicou - eu confesso que senti saudade de você desde que terminamos em aberto, eu achei que deveria aproveitar essa oportunidade e você não me disse não!

—É, eu sei, eu me deixei levar por você, mas o que aconteceu, a culpa é minha também... - ele conseguiu ao menos se acalmar um pouco - quando você me beijou eu simplesmente não consegui me conter, era como se desse um branco na minha cabeça e eu esquecesse de tudo... Como... Como eu pude esquecer a Leo dessa forma? Ela é realmente melhor do que eu, eu nunca vou merecê-la...

—Espera, você tá noivo da Leopoldina, a austríaca aluna de intercâmbio? - Domitila mal pôde acreditar naquilo - o que è que deu em você? Por que quer casar com ela?

—O que é que você está insinuando com isso? - ele estreitou os olhos furiosos para ela, perigosamente.

—Ora, ela não tem nada a ver com você, está claro que ela veio para o Brasil para estudar e não namorar - ponderou ela - só que você se apaixonou de verdade por ela, pelo que estou vendo.

—Ela nutre os mesmos sentimentos por mim e é por isso que vamos nos casar - Pedro disse firmemente, nem uma sombra de dúvida em sua voz.

—Então, acabou pra nós, não é? - murmurou Domitila, custando a acreditar na verdade.

—Eu pretendo nunca mais vê-la - Pedro foi sincero - eu traí minha noiva com você, não quero me lembrar disso.

—Vai me rejeitar assim então? - ela deu de ombros, sem perder seu orgulho - vou ter que achar outro solteiro charmoso, lindo e em boa forma física.

—Era só isso que via em mim então? Nenhum apreço por quem eu era, minha personalidade? - Pedro ficou curioso - como disse que teve saudade de mim, achei que tinha se apaixonado por mim.

—Pode ser que foi, por um tempo, você é divertido, admito, e todas essas outras coisas que eu falei - ela confessou - mas você é bem mandão quando quer, autoritário, meio sem apego...

—Você se apegou a mim mais do que eu a você - admitiu ele.

—Como eu disse, foi por um tempo - ela reafirmou - quando ei te vi de novo só quis relembrar os velhos tempos e consegui.

—Para minha desgraça - ele acrescentou com pesar.

—Ei, eu já entendi, se entender com sua noiva vai ser problema seu - ela fez um gesto de desdém - eu só fico feliz por você ter admitido que a culpa não foi só minha.

—Porque não foi - Pedro soou muito arrependido.

—Não se preocupa, Pedro, não vou te procurar mais, foi bom enquanto durou - ela se aproximou, tentando roubar um último beijo, mas ele virou a cara, ela ainda o beijou no rosto - nada dura pra sempre. Adeus, Pedro.

Ela reuniu suas coisas, se trocou e sem olhar para ele, saiu do quarto do hotel. Pedro caiu de joelhos, chorando. Estava contente por saber que Domitila sumiria de sua vida se vez, mas sabia que o que tinha feito com ela mancharia o relacionamento que ele tinha com Leopoldina. Sabia que teria que contar a verdade à noiva, enfrentando as consequências disso.