A eterna guerra contra si mesmo. escrita por Ninguém


Capítulo 4
O homem está condenado a ser livre


Notas iniciais do capítulo

Não confio na minha revisão, por isso novamente peço desculpas por erros de português.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/788891/chapter/4

 — A própria sociedade nos deixa com um parafuso a menos. Ninguém percebe os valores errôneos que estão sendo adotados por uma linha de pensamento utópica. Acredito que tenha sido Sartre quem disse que o homem está condenado a ser livre, sinceramente não pesquisei mais a respeito, mas creio que ele faz referência à angústia que a liberdade provoca.

Disse o homem de sobretudo negro e mascara sentado em uma cadeira de fórmica a frente de uma janela observando a lua cheia.

— Uma linha de pensamento utópica é uma falácia, algo não condizente com a realidade adotada pelo ser humano, quando digo isso me refiro a compulsão das pessoas por querer serem felizes sem perceber que o que chama de “felicidade” é uma química de prazer que dura breves momentos. Ela deve durar poucos minutos ou segundos e então voltamos para um estado neutro de ser, a paz original com a qual nascemos e que deriva da energia natural pura antes de ser maculada pela energia ruim. Como viciados, buscamos esse prazer tolo que chamamos de felicidade, e para piorar, esse agrupamento de humanos ocidental criou uma cultura de consumismo como forma de personificar o tal prazer.

Ele ergue à luz do luar um punhal de cabo dourado com pequena pedras azuis e suspira pesadamente analisando os próprios pensamentos. Depois vira a cabeça para o canto escuro do quarto onde podia ouvir o gemido e as batidas da cabeceira da cama contra a parede.  

— Peço perdão se minhas palavras são confusas, mas essa necessidade compulsória por ser feliz é alimentada pelo Ego, e sabe o que ele é? Ele é uma voz na sua cabeça que não apenas fala, mas cria micro cenários de antecipação de um futuro ruim... isso gera ansiedade. Sabe por que ele faz isso?

O homem de máscara negra se pôs de pé.

— Essa coisa chamada Ego é como um demônio astuto ainda sim fraco, é nervoso e ansioso e para sobreviver ele precisa que você continue gerando sentimentos ruins mesmo quando está tudo bem, não, principalmente quando está tudo bem ele tende a fazer sua cabeça um pequeno inferno para que sua alma produza energia que o fortaleça, que fortaleça sua falsa imagem te fazendo esquecer quem você realmente é, fazendo-o crer que essa imagem fraca, ansiosa, temerosa, medrosa é você.

Ele se aproxima da cama onde um rapaz estava amordaçado nos punhos e tornozelos tendo uma meia enfiada na boca para conter os gritos de desespero.

— Cada pessoa viva tem potencial para fazer o que quiser, ela tem um pleno controle da mente para fazê-la produzir metas, objetivos, planos favoráveis para o que sua vida vai ser e ainda que não seja capaz de elaborar isso, ela é livre para pensar coisas boas, mas o ego se apodera dela e usa para fabricar pensamentos ruins e com esses pensamentos vem os sentimentos ruins, afinal os pensamentos são a origem das emoções. Dependendo do nível de estresse a energia ruim vai consumir completamente a energia natural e então as pessoas mergulharão em um inferno pessoal. Tudo a sua volta pode estar bem, mas na cabeça dela estará de alguma forma... ruim. A sociedade ocidental caminha para esse caos e cada dia mais e mais humanos estão sucumbindo.

 Ele olha para o garoto estirado na cama.

— Cansei de observar você se destruir por causa desse mal, Alector. – ele ergue o punhal – vou te dar a paz que tanto almejou, a paz que talvez nem se lembre como é...

A primeira punhalada foi direto na barriga, Alector berrou de dor enquanto sentia o sangue quente escorrer do ferimento para os lençóis, a segunda facada veio bem no meio do peito quase em cima do coração e esse atingiu um dos pulmões o fazendo tossir o líquido vital. A terceira e última veio direto na testa fazendo a lâmina afundar no crânio duro como se ele fosse feito de manteiga.

***

Eren teve de erguer a cabeça para poder olhar nos olhos do homem a sua frente. O sujeito deveria ter uns dois metros de altura, braços e pernas grossas fazendo o tecido da calça e da camisa social quase estourarem com a pressão, a pele negra contrastava bem com o rosto quadrado e era impossível discernir a idade pois a melanina tende a preservar a epiderme, mas talvez o que mais tenha chamado a atenção no seu “par” para esta noite fosse os olhos castanhos claros como um filete de mel derramado de uma colher pequena.

— Então! – disse Sabrina, sua prima – se divirtam muito hoje! Nos encontramos meia noite!

Eren observou sua prima sair saltitante com a namorada shopping afora e o deixar com o trator bem vestido.

— Lerek. – disse ele estendendo a mão num cumprimento.

Eren não pode deixar de notar que a mão do sujeito era enorme e começou a se arrepender do dinheiro que tinha ganho de sua prima para ela acobertá-la hoje a noite enquanto saia com a namorada.

Lerek e Eren tinha a simples missão de acobertar as meninas por uma noite, serviriam de álibi para as famílias não descobrirem sobre o “romance proibido” das duas. Como elas se conheceram na igreja e ambas as famílias são do tipo conservadores relacionamentos homossexuais não são tão aceitos assim apesar dos novos tempos. Enquanto iam ao cinema e assistiam um filme Eren se perguntou várias vezes se Sabrina havia dito que ele era heterossexual, não gostaria de pensar num homem do porte de Lerek sendo rejeitado.

Saíram do cinema e foram até a praça de alimentação comer alguma coisa. Demorou mais do que a maioria, mas Lerek fez a pergunta que todo mundo faz ao conhecer Eren por mais de dez minutos.

— O que houve com seu braço?

O braço direito de Eren estava enfaixado desde a junta do ombro até o pulso.

— Fui atacado por um cachorro há alguns dias.

Após se acomodarem nas cadeiras e pedirem a comida Lerek cruzou os pesados e musculosos braços sobre a mesa e olhou diretamente para Eren que desviou o olhar casualmente fingindo ler um letreiro.

— Sua prima me falou bastante de você, afinal Loren, ela e eu estamos na mesma turma na faculdade. Sabrina... hum... o chama de robozinho. Disse que você é um pouco... hã... antissocial.

Eren olhou para o sujeito.

— Deixe-me adivinhar: ela disse que sou um recluso social, um ser humano traumatizado que desenvolveu fobias pela vida e que vou me tornar um homem gordo, sozinho e infeliz para sempre.

Lerek sorriu sem graça.

— Minha prima sempre teve um humor ácido, mas no fim é boa pessoa. Embora só esteja aqui esta noite por causa do dinheiro.

— Eu soube, a avó de vocês não aceita muito bem a escolha sexual dela.

— Vovó Cacilda é uma velha rica de família tradicional, uma relação de duas mulheres e dois homens vai contra as leis de Deus de acordo com ela. Não é possível fazê-la mudar de ideia, décadas de um puritanismo exacerbado criaram uma opinião sólida e altamente preconceituosa.   

— E você não concorda com sua avó.

Eren deu de ombros.

— Cada um é livre para viver sua vida. As consequências virão não importa a escolha, logo por que não escolher algo que te faz feliz? A velha usa da doença de coração para nos manipular e funciona bem com Sabrina.

— Mas não com você. Não se importa se sua avó morrer por um desgosto? Afinal pelo que eu soube ela e Sabrina são suas últimas parentes vivas.

Eren cruza os braços a frente do corpo e suspira. Geralmente evita falar com pessoas por que suas opiniões geram polêmica e ele é alvejado com muitos adjetivos pejorativos, só que Lerek é um estranho então qual o problema?

— Privar minha liberdade de escolha pela chantagem da minha avó é insano. Eu a amo e se ela morrer por que estou vivendo minha vida do meu jeito e não do dela não posso fazer nada, a culpa é dela por não me amar e respeitar minhas escolhas. Apesar de eu dizer isso a Sabrina ela gosta demais da vovó Cacilda para correr esse risco.

Lerek sorriu, um sorriso sincero de orelha a orelha como se tivesse gostado muito de ouvir aquelas palavras.  

 — Realmente... – disse o homem acomodando-se melhor na cadeira – quando sua prima me contou sobre você sabia que tinha de conhecê-lo.

Eren suou frio.

— Hã... eu gosto apenas de mulheres, perdão.

— Ora, isso é perfeito. Escute, eu tenho uma amiga que precisa muito sair com alguém que dê certo com ela. – Lerek balança a cabeça tentando encontrar palavras apropriadas — digamos que minha amiga tem uma personalidade forte.

Tradução: é uma chata de alto nível, alguém que alcança a definição de insuportável.” Pensou Eren.  

— Perdão, não estou interessado.

Lerek franziu o cenho.

— É solteiro não é?

— Sim, mas já estou apaixonado por uma mulher.

— Ah.. Sabrina disse algo assim. Ela disse que você inventou se apaixonar por uma mulher só para não ter de sair com as pretendentes da sua avó.

Eren levou uma mão a cabeça. Sabrina realmente é um pé no saco às vezes.  

— Escute – disse Lerek — minha amiga vai ficar na cidade um dia, só quero que ela saia com alguém que... “aguente o tranco” do humor dela por uma noite. Só isso, e você parece ser a pessoa perfeita.

— Não, obrigado. E com a relação à mulher pela qual estou apaixonado é real. As pretendentes da minha avó eu rejeito na cara dela.  

O homem musculoso voltou a cruzar os braços e levar uma mão ao queixo como se estivesse meditando.

— Quanto Sabrina está te pagando por essa noite?

Eren piscou várias vezes tentando entender onde aquilo ia levar. Ele ia pagar para que fosse a um encontro com a amiga?!

— Cem reais.

Lerek ponderou por alguns segundos.

— Te pago mil reais.

— Mentira.

O sujeito puxou o celular do bolso.

— Faço a transferência agora pra sua conta se quiser.

Os dois se olharam por um tempo como se conversassem pelos globos, por fim Eren cedeu.

— Isso é sério?

— Com certeza. Veja bem, vá busca-la para um encontro as 19h fiquem juntos até pelo menos meia noite e depois leve-a de volta para casa, simples não? Mil reais por cinco horas do seu tempo.

Eren engoliu seco.

— Tudo bem, mas não garanto que ela vá se divertir, não sou sociável o bastante.

— Alguém sociável não duraria meia hora. – rebateu Lerek.

A comida e as bebidas chegaram e enquanto comiam Eren fez uma pergunta casual.

— O que essa sua amiga faz?

Lerek engoliu o que estava mastigando e voltou a sorrir sem graça.

— Bem... lidera milhares de anjos em um mundo paralelo a este, é uma general absurdamente forte designada pelo próprio arcanjo Miguel a comandar as forças militares do nosso mundo.

Eren ficou calado olhando para a cara de Lerek que deu algumas risadas.

— Estou brincando, ela tem uma patente alta do exército. É militar.

— Militar? Faz sentido ser rígida como você diz. Qual o nome dela?

— Liana.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!