A eterna guerra contra si mesmo. escrita por Ninguém


Capítulo 13
Você gosta de filmes de ação?




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/788891/chapter/13

Alector.

Você gosta de filmes de ação? No geral tais filmes são emocionantes porque levam o espectador a viver uma experiência ilusória de um mundo vívido e intenso que contrasta perfeitamente com a monotonia chata de uma vida diária. Todos nós, arrisco dizer que com certa arrogância, estamos entediados em algum ponto. É como se o simples fato de levantar para mais um simples dia fosse chato... sem sabor. A vida por si só não é... boa o bastante... não, boa não seria o adjetivo, e sim emocionante. A tranquilidade é um fator desejável apenas para aqueles que vivem ou viveram sem ela. Pergunte para um soldado que passou um ano no campo de batalha o que ele acha de estar em casa no sofá vendo bobeiras na tv?

Voltando aos filmes de ação, meu ponto é porque os criamos? Porque criamos realidade alternativas em filmes, séries, livros, desenhos onde o mundo está para ser destruído ou há épicas batalhas envolvendo caos e destruição? Porque criamos eu sei: por que gostamos. A questão é... porque gostamos? Um dos filmes de maior sucesso da atualidade “Os Vingadores” arrecadou uma marca invejável de mais de um bilhão em bilheteria e uma das temáticas do filme é justamente as lutas, a guerra direta entre os mocinhos e os vilões.

Já se perguntou quantas pessoas morreram naquele roteiro? Quantas pessoas faleceram na cidade de Nova York ou antes mesmo quando Loki chegou à Terra? De certo não, eu também não. Não damos a mínima para os figurantes, pelo contrário, quantos mais morrerem mais torna “verídica” a emoção conflitante no cenário desolador. Da onde vem essa apatia? Eu digo: da falta de percepção da realidade.

Sabemos que um filme não é real, as pessoas nele também não... então não nos importamos, correto? Errado. E muito errado. Sabemos que o filme não é real, mas aceitamos a ilusão e por pouco tempo imergimos em seu conteúdo liberando emoções como se os eventos dele fossem de verdade. Acreditamos que é. Precisamos crer senão não nos emocionamos e se não nos emocionamos o filme é ruim.

Não sei se estou sendo claro, mas o que quero que você entenda é que: o cérebro, a mente ou o próprio EGO dita as regras de nossa vida, ele determina que a vida é chata e que precisamos de emoções externas, precisamos de estímulos fora de nós para que as emoções nos revelem algo obvio e facilmente esquecível para um ser humano egoico: que estamos vivos.

— A vida é maravilhosa do jeito que ela é. – disse Deméter – um ser humano sozinho numa sala com comida e água é capaz de estar plenamente em paz e contente.

— Sim – concordou Atena – o mortal de nada precisa para ser feliz, pois a felicidade reside dentro dele. Os grandes avanços da humanidade não vieram por necessidade, mas porque seus criadores sentiam a vontade de dar algo para o mundo para a humanidade como forma de gratidão pela vida que estavam vivendo.

Ares então completa:

— Mas o ego deturpa tudo isso. Ele engole a vivacidade da pessoa e exige que a mesma busque mais estímulos para sentir que está vivo, para sentir que vale a pena continuar respirando. Sem isso, a energia ruim natural do ego causa dor, sofrimento e tristeza. A pessoa egoica sozinha é atormentada, como isso é possível?

O que me faz voltar ao tema inicial. Porque gostamos de filmes de ação? Porque ele dá essa vivacidade e principalmente: nos mantém seguros. Para as pessoas na sala do cinema vendo as explosões é divertido, mas para as que vivem na cidade na realidade daquele filme é agonizante.

Novamente, a mente se desliga por algum tempo acreditando que os eventos cinematográficos são reais e com isso produzimos sentimentos, o que significa que por um curto período de tempo realmente acreditamos que o cenário é real. Assim, porque gostamos de filmes de ação onde pessoas morrem?

— É doloroso saber a resposta – disse Ártemis – gostamos porque não nos importamos com a raça humana. O ego dominou a humanidade a tal ponto que a apatia se tornou a regra e a empatia a exceção.

— E todas aquelas pessoas que prestam ajuda humanitária? Eles são altruístas. – rebateu Apolo.

— Sim Apolo, eles são. Como eu disse, são a exceção. Afinal pegue o total de pessoas no planeta e calcule a porcentagem desses altruístas.

Todos assentiram.

Por isso eu matei aquelas pessoas no shopping. Eu as matei para provar isso para mim mesmo. Pense em alguém no Brasil vendo notícias de milhares de chineses morrendo na China... o que o brasileiro fará? Terá alguns segundos de compaixão pela notícia e mudará para outra notícia. Só nos importamos com quem conhecemos, com quem criamos algum tipo de laço. O resto... são só idiotas consumindo nosso oxigênio.

Respiro fundo assimilando a fumaça e o fétido cheiro de carne queimada. A onda de choque e calor nos acertou sem aviso prévio transformando o prédio onde estávamos em um monte de pedras incandescentes. Instintivamente criei uma barreira para me proteger e quando percebi só estava eu de pé sobre um pedaço de concreto chamuscado.

A movimentação de pedras chamou minha atenção e vi Diego sair debaixo de um monte de escombros com o mascarado branco no ombro. Ambos sujos de cinzas e fuligem, mas vivos. Não reagi, sinceramente não dava a mínima se eles viviam ou morriam.

— Que merda foi isso!? – berrou Diego.

— Você é mesmo habilidoso – disse eu – conseguiu proteger o mascarado e a si mesmo.

— E os outros?

— Acho que mortos.

Olho na outra direção. Pontos de luz desciam do céu escuro e fumacento, uma primeira vista pareciam com vagalumes, mas conforme se aproximavam lentamente dava para observar bem a forma humana com as asas de luz abertas em suas costas.

— Consegui contar 102. – disse Ares em minha cabeça – tem o bastante para nós dois Alector.

— Como se eu fosse deixar Alector combater sozinho ao seu lado. – rebateu Ártemis – vamos fazer isso de modo honrado.

Suspiro lentamente. Um dos alados desceu bem a minha frente pousando em outro pedaço de concreto deslocado que um dia foi uma parede ou um piso sei lá. Agora que vejo bem era uma mulher, ruiva com os cabelos naquele tom laranja. Sua tez branca como leite dava característica pontual dos sardentos. Bonita? Não, perto de Afrodite qualquer mulher é feia.

— Eu escutei isso – disse Ártemis.

— Eu também – disseram Atena e Hera em uníssono.

Certo, perdão. Vocês são as mais belas para mim.

— Invejosas – disse Afrodite num risinho.

A ruiva a minha frente usava um roupa simples de ginástica. Aqueles top preto largo, e calça de elástico também escuro. Estava descalça e tinha um olhar sério e pelo modo como todos os outros alados se postavam em seus flancos e um pouco atrás indicava que era algum tipo de líder.

— Criança, devo dar os parabéns por sobreviver a isso. – disse ela olhando para mim – não foi bem esse o plano, mas minha colega é do tipo de pessoas com uma personalidade questionável.

— Hei, eu ouvi essa!

Descendo ao lado da ruiva veio a mulher de cabelos azuis do shopping, para obviedade de muitos suas asas de energia também eram azuis. Ela vestia trajes simples do cotidiano e carregava como se fosse um saco de arroz em seu ombro um rapaz que gesticulava avidamente.

— Dá pra me pôr no chão!

— Calado! – e deu um tapa em sua bunda do garoto – Kernel! Guarde seus comentários a respeito da minha pessoa em outro momento.

A ruiva encarou Liana.

— Não precisava ter explodido a área.

— Não queria achar os pivetes do Egoinis? Estão aí. Dois deles. Funcionou.

— E porque diabos trouxe sua âncora para o campo de batalha, quer perdê-lo? Tem ideia de como foi difícil achar alguém compatível contigo?

— Ah, ah, ah... larga de ser chata, eu o trouxe porque ele tá com defeito, preciso domá-lo e também quer lugar mais seguro do que ao meu lado?

— Já disse para me pôr no chão! – esbravejou o tal Eren.

— Calado ou o próximo tapa vai ser nas suas bolas.

A ruiva leva a mão ao rosto e volta-se a mim.

— Entreguem-se pacificamente e tem minha palavra que não os machucarei.

Viro a cabeça na direção de Diego.

— Vaza daqui com esse cara. Te encontro mais tarde.

Diego arregala os olhos.

— Está falando sério?

Minha apatia não poderia ser maior. Não me importo com eles, mas ainda devo gratidão a Egoinis por ter me libertado da agonia de minha própria mente.

— Vai.

Ouço a voz da mulher de cabelos azuis.

— Ow,ow,ow,ow.... isso é de verdade? O moleque tá achando que consegue segurar dois generais e mais cem soldados?

— Segurar? – falei – não. Salvo engano vocês são Liana e Kernel, correto? Falta a terceira general Yeken. Egoinis quer que eu mantenha apenas Liana e ela vivas... o motivo eu não sei e também não quero saber. O que significa que o resto morre hoje.

Encaro o garoto no ombro de Liana.

— Ah é, aproveito e levo esse daí de volta também. Natasha tá realmente preocupada com ele.

Liana explodiu em risadas juntamente com alguns soldados atrás dela enquanto a ruiva fechou a expressão ainda mais cerrando as mãos em punho.

— Você realmente parece problemático criança – disse ela – acho que matá-lo é a melhor opção.

Observo o céu. Finalmente as nuvens já estavam se aglomerando e os primeiros raios piscavam no Olimpo.

A encaro.

— Você vai tentar... e vai falhar miseravelmente.

***

Eren.

O zumbido em minha orelha ainda ressoava em minha cabeça como se uma abelha estivesse viajando no meu crânio. Sei que estava sujo de barro, restos de grama, sangue e vísceras... entendia que uma parte do meu ombro tinha se queimado e o gosto de ferrugem tomava minha boca quando quebrei o dente após a queda brusca. As dores dos cortes e dos hematomas não realmente importavam... tudo o que existia nesse exato momento era eu deitado com a bunda no chão olhando para o sujeito de pé a poucos metros de mim.

Ensanguentado, com as roupas um trapo após os inúmeros cortes e queimados ele se sustentava de pé olhando para o céu. A chuva tinha parado a pouco, mas o tempo continuava fechado como se uma nova torrente fosse cair.

Não sei quanto tempo a luta durou... horas? Um dia inteiro? A destruição se alastrou da área da faculdade para uma região de fazenda chegando até a rodovia 67 que ficava uns quatro km da cidade. Um a um os soldados alados foram caindo... mesmo a ruiva atacando junto com Liana não foram capazes de fazê-lo parar... pelo contrário, parecia deixá-lo mais forte.

E quando ele matou Kernel eu vi Liana gritar num ódio tão forte que algo dentro de mim estremeceu. Agora a mulher de cabelos azuis encontrava-se caída ao meu lado, tão machucada e suja que não sabia dizer se estava viva ou morta. Parecia respirar e o sujeito de pé não tinha intenção de finalizar o serviço.

— Ah... isso foi cansativo. – disse ele pousando os olhos em mim – levanta, vamos indo.

Não me movi, não por rebeldia ou coragem... era porque não lembrava como levantar.

O homem sujo e machucado caminhou até parar rente a mim, pegou em meu braço direito e me pôs de pé num solavanco. Agora bem de perto conseguia ver que seus olhos... seus olhos tinham um brilho fraco de cores distintas.

Ele me empurrou e voltei a mexer as pernas, enquanto nos afastávamos olhei para trás na direção de Liana no chão inconsciente. Não sabia dizer o que senti com esta visão, sei que havia um sentimento só não podia nomeá-lo.

— A propósito – disse ele – você gosta de filmes de ação?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Comentários são bem vindos. :D



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A eterna guerra contra si mesmo." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.