Traços Marcantes escrita por Leonardo Souza


Capítulo 2
Seis Meses Antes




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Rafael

Cheguei da academia e fui direto para o banho, estava saindo do banheiro quando meu celular vibrou, uma mensagem, Augusto.

"Vai demorar?"

"Saindo de casa."

Terminei de me trocar, um short jeans, uma camiseta com branca e chinelo. Meus pais não estavam em casa, peguei o carro da minha mãe emprestado, eles não se importavam, as únicas condições eram: encher o tanque quando devolver e não bater o carro. Quando estava saindo da garagem, outra mensagem de Augusto.

"???"

"Chegando aí."

Jaqueline também mandou uma mensagem.

"O que vai fazer hoje?"

"Vou na casa do Augusto, passo aí depois?"

"Vou ficar esperando."

André

Corri até meu ponto de ônibus, quando virei a esquina, ele estava saindo, corri atrás dele enquanto gritava para ele parar, mas ele me ignorou.

— Merda!

Peguei meu celular e liguei para meu patrão.

— Alô. — Ele falou irritado.

— Oi, Jonas. Só liguei para avisar que vou me atrasar. Meu ônibus quebrou. — Menti.

— Quanto tempo?

— Uma hora, no máximo.

— Quanto mais demorar, mais vai ficar depois das seis.

— Tudo bem.

Desliguei o celular e comecei a correr para outro ponto de ônibus. Com sorte conseguiria pegar esse.

Jaqueline

Acordei com o barulho do menino que dormiu na minha casa ontem tentando sair sem fazer algum som alto.

— Escapar sem fazer barulho, sério? — Falei sem abrir os olhos.

— Tenho que ir, trabalho. Te ligo depois?

— Não precisa, eu te ligo.

Ele foi embora, fiquei um tempo deitada na cama, tomei coragem, me levantei e fui ao banheiro escovar os dentes. Voltei para cama. Peguei meu celular e mandei uma mensagem para Rafael, perguntando o que ia fazer hoje, ele respondeu que ia passar no Augusto e perguntou se poderia passar em casa, respondi que sim. Augusto também havia mandado mensagem perguntando se queria sair com eles. Deixei a mensagem como lido e ignorei. Ele entenderia.

Aline

— Bom dia. — Falei, entrando no escritório.

Trabalho no administrativo de uma empresa de transporte. 

— Bom dia. — Ricardo, meu chefe, respondeu.

— Os documentos já chegaram? — Perguntei, quando vi que eles não estavam na minha mesa.

— Chegaram, estão na minha mesa. Pode ir lá buscar.

— Tenho que ir em outro setor, não poderia trazer eles para mim?

— Sem pressa, quando tiver tempo, passa lá para buscar.

— Tudo bem. Sai da sala.

Henrique

Não consegui dormir, toda vez que tentava, os pensamentos invadiam minha mente, tentei colocar música nos fones de ouvido, mas não adiantou. Tentei desenhar alguma coisa para me distrair, mas isso acabou virando outra bola de neve onde confirmava que nunca seria bom o suficiente. Olhei para o relógio, oito horas da manhã, peguei meu celular e mandei mensagem para minha namorada, Aline.

"Bom dia."

"Melhor?" Ela respondeu.

"Sim." Menti. "E você?"

"Problemas no trabalho, mas posso resolver."

"Devo me preocupar?"

"Não precisa se preocupar, com nada."

Ler aquela mensagem me jogou em outro loop de preocupação, será que Aline acha que não consigo lidar com os problemas dela por causa da minha depressão? Ou estava pensando demais sobre isso?

"Tudo bem." Respondi e voltei para minha cama.

Bruno

Quando estava saindo do meu quarto e indo para o banheiro, vi minha mãe na cozinha, ela fingiu que estava preparando café, mas eu sabia que não era só isso, ela não dormiu a noite toda, esperando meu irmão chegar. Minha irmã e eu já havíamos conversado com ela sobre como ter um filho viciado em drogas era complicado e tudo o que ela respondeu foi que nós precisávamos ter filhos para entender. Não falamos mais sobre isso.

 

— Bom dia. — Falei quando saí do banheiro e dei um beijo na testa dela.

— Bom dia, meu filho.

— Café já vai sair?

— Já, vai chamar sua irmã.

— Hoje ela dorme até mais tarde, não tem as primeiras aulas.

— Então vai se trocar para não perder o horário.

— Nunca perco, dona Maria. — Fui para o meu quarto.

Victoria

Meu celular despertou, esqueci de programar para mais tarde, mas tive a satisfação de programar para outro horário e voltar a dormir, antes de cair no sono, escutei minha mãe e meu irmão conversando.

Levantei quando o despertador tocou pela segunda vez, fui até o banheiro, quando saí, procurei minha mãe em todos os cômodos, mas não estava em nenhum, fui até porta da sala e encontrei ela no portão, olhando para rua. Voltei para dentro de casa e mandei uma mensagem para Bruno.

"Ele não voltou?"

"Não, ela estava desde manhã esperando, acho que não dormiu."

"Ok, vou perguntar pela vizinhança antes de ir para a faculdade."

"Beleza."

Me troquei, coloquei uma calça jeans, tênis e uma camiseta branca, tomei café, minha mãe estava no mesmo lugar.

— Bom dia. — Falei.

— Bom dia, minha filha.

— Tudo bem?

— Tudo, Bruno foi de ônibus? O carro está aqui.

— Carona, mas vamos voltar juntos. — Comecei a caminhar em direção ao carro. — Tchau.

— Vai com Deus.

Desci a rua que normalmente desco, mas dessa vez virei a esquerda e não a direita, se fosse encontrar meu irmão, um bom lugar seria o campo do bairro, quando cheguei lá, não vi ele, apenas alguns meninos fumando. Desci do carro e me aproximei.

— Viram o Pablo? — Perguntei.

— Não. — O mais velho deles, cabelo raspado, short de estampa e sem camisa respondeu.

— Se ver ele, pode avisar que eu e Bruno estamos procurando ele?

— Pode deixar.

Voltei para o meu carro e fui para a faculdade.

Augusto

Estava esperando Rafael em frente de casa, ele chegou, vestido casualmente, sua pele morena, seu cabelo preto cortado em estilo undercut, seus 1.78 de altura e músculos que ele fazia questão de mostrar como trabalhava por eles. 

— Achei que não chegaria hoje. — Falei, tentei parecer irritado, mas não conseguia ficar realmente bravo com Rafael.

— Antes tarde do que nunca. — Ele piscou para mim.

Entramos em casa, minha mãe saiu cedo para trabalhar, ela é funcionária pública, meu pai nunca quis saber de mim então desde pequeno é apenas eu e minha mãe. Rafael se sentou no sofá e pegou o controle do videogame.

— No que vai querer perder hoje? — Ele perguntou.

— Ha, ha,ha. Coloca alguma coisa de luta, já que não posso te bater na vida real. — Me sentei ao lado dele.

— Você pode tentar. — Ele se inclinou para trás e me encarou.

— Hoje não.

— Respeito sua escolha.

Jogamos por algum tempo, conversamos sobre faculdade, ele está cursando engenharia e eu, publicidade. Ambos querendo desistir do curso. Fui até a cozinha esquentar o almoço que minha mãe havia deixado.

— Como vão as coisas com a Jaqueline? — Perguntei assim que coloquei o primeiro prato no microondas.

— Ótimas. — Rafael estava claramente animado. — Esse tipo de relacionamento é perfeito.

— Eu sei que vocês tem essa coisa de ficar juntos e também ficar com outras pessoas. Não quero ser careta. Mas isso não está destinado a dar problema?

— Qual seria o motivo do problema?

— Mesmo que vocês falem "apenas relação carnal, sem sentimentos" pra mim isso é impossível. — Tirei o primeiro prato do microondas e coloquei o segundo.

— Você fala isso porque é desiludido e acredita na alma de cada um. Falando nisso, já pegou aquela menina da faculdade ou vai continuar admirando de longe?

— Primeiro: acreditar no amor é uma coisa boa e não vou ser ridicularizado por Isso. Segundo: não vou pegar a Victoria, quero ter algo a mais com ela.

— Só precisa informar isso para ela, até onde eu saiba, ninguém consegue ler mentes. — Joguei o guardanapo no Rafael e o microondas apitou quando a contagem chegou a zero. — Vai se ferrar.

Rafael 

Saí da casa de Augusto e fui direto para casa da Jaqueline, enquanto estava com ele, ela mandou algumas mensagens, pedindo para comprar sorvete no mercado pois estava com vontade e perguntando se iria demorar. O porteiro do prédio dela já me conhecia então deixou subir direto. Bati na porta dela.

— Eu trouxe sorvete. — Falei assim que ela abriu a porta. Ela estava de pijama, um short curto e uma camisa de pano fino com uma estampa de urso, seu cabelo preto e comprido estava solto, sua pele branca era visível a marca dos lençóis em algumas partes.

— Ótimo. — Ela me pegou pelo braço, me deu um beijo e fechou a porta com o pé.

André

Estava correndo para o ônibus, virei a esquina e dei de cara com uma viatura, não parei de correr, não podia parar, naquele bairro ter uma reação de surpresa quando se encontrava com a polícia não era uma boa idéia, dei uma olhada na minha camiseta. Não era a da loja, merda. Assim que passei pela viatura escutei um dos policiais gritar.

— Pode ir parando aí. 

Obedeci.

— Bom dia, senhor. Estou indo pegar meu ônibus. — Falei, tentando ser o mais inofensivo possível.

— É mesmo? — O policial saiu do carro. Uns trinta anos, 1.65, branco, careca e com um bigode. Sua mão estava no coldre da arma, já destravado.

— Sim. — Sorri.

— Posso ver sua bolsa?

Aquilo não era um pedido, não precisa obedecer, mas se não desse a bolsa para ele, poderia ser um motivo de desconfiança. Meus olhos encheram de água. Entreguei a bolsa para ele, que começou a revirar, jogou meu uniforme no chão e então pegou meu livro da faculdade.

— Está estudando?

— Sim, veterinária.

— E consegue acompanhar a matéria?

— Consigo. — Usei toda minha força para manter o tom neutro.

— Tudo bem, pode ir. 

Ele me entregou a bolsa, e ficou me encarando, esperando que pegasse o que ele jogou no chão. Fiz o mais rápido possível, segurando as lágrimas de raiva.

— Vou indo. — Falei e comecei a andar.

— Cuidado viu! — Ele gritou. — Muita gente perigosa nesse bairro.

Jaqueline

Acabamos dormindo, acordei eram cinco da tarde, olhei meu celular e um menino que conheci em uma festa havia mandado mensagem.

 "Vai fazer algo hoje?" Ele perguntou.

"Não tenho nada marcado."

"Queria te ver."

"Jantar?"

"Pensei em assistirmos alguma coisa aqui em casa."

"Posso tentar passar aí mais tarde." 

— Que horas são? — Rafael perguntou com voz sonolenta.

— Cinco da tarde.

— Merda! — Ele se levantou da cama. — O carro, preciso devolver.

— Achei que eles não ligavam para o carro.

— Não significa que posso ficar com ele o tempo todo sem ouvir reclamações.

— Justo. — Me levantei. 

— Faculdade hoje? — Ele perguntou enquanto colocava a cueca.

— Não, encontro marcado.

— Mais bonito do que eu?

— Nunca. 

— Ótimo. — Ele começou a caminhar em direção a porta e antes de sair do meu campo de visão, piscou para mim.

— Tchau. — Ri, com aquilo.

— Tchau!

Aline

Só consegui ir buscar os relatórios a tarde, Ricardo não havia movido eles do lugar, respirei fundo. Comecei a avaliar a papelada e conseguiria fazer metade até o fim do expediente.

— Aline. — Fabiana, a secretária de Ricardo entrou na minha sala, seu cabelo loiro preso em um coque, pele clara e óculos redondos no rosto.

— Oi, Fabiana. — Sabia que ela estava ali para trazer problemas.

— Ricardo precisou sair e perguntou se você pode verificar alguns documentos para ele.

Respirei fundo, aquela não era a primeira vez e estava ficando cada vez mais frequente.

— Claro. — Coloquei um sorriso no rosto.

Henrique

Dormi boa parte do dia, em alguns momentos fiquei apenas deitado olhando para o celular, assistindo algumas séries. Uma mensagem de Aline chegou.

"Acho que não vou conseguir passar aí hoje, muito trabalho. Desculpa."

"Tudo bem."

Não estava bem, queria ver Aline, mas não podia tirar ela do trabalho. Coloquei a coberta por cima da cabeça e voltei para minha série.

Bruno

Pablo não apareceu em casa, não era a primeira vez que ele sumia por dias, mas dessa vez tinha alguma coisa diferente, um sentimento estranho. Minha mãe estava claramente preocupada e tentando esconder isso. Já havia derrubado alguma coisa na cozinha mais vezes do que podia contar. Me levantei e fui dar uma volta no bairro para procurar por ele mais uma vez.

Victoria

Quando cheguei na casa de André, ele estava chorando, falei oi para a mãe dele e fui direto para o quarto dele. Ele me contou o que aconteceu com o policial. Me segurei para não chorar de raiva.

— Vai ficar tudo bem. — Falei.

— Não vai, você sabe que não vai, não para mim.

Ele estava falando sobre o fato de ser negro, cabelo cacheado e morar em bairro próximo a comunidade.

— Eu posso te dar carona se quiser. — Ofereci.

— Não vou deixar você sair do seu caminho para me levar no trabalho.

— Não é problema nenhum e você sabe disso.

Conheci André no ensino médio, ele foi o único que conversou com a garota nova, talvez por minha pele ser morena e me destacar no meio dos alunos brancos, talvez o destino nos uniu ali, estávamos juntos desde então, não em um relacionamento, André é gay e isso nunca foi um problema para ninguém a nossa volta.

— Obrigado, mas não quero.

— Tudo bem. O que posso fazer agora por você?

— Só fica aqui e seja o ombro pra eu chorar.

Augusto

Estava na aula, não estava prestando atenção, a matéria não parecia ser importante, minhas redes sociais no momento estavam mais divertidas. Rafael mandou uma mensagem.

"Me tira daqui!!!!!!!!"

"Só se você me levar também."

"Cantina?"

"Estou descendo."

Nossos blocos eram diferentes e a cantina ficava no meio da faculdade, era uma caminhada de cinco minutos. Enquanto descia as escadas do bloco, resolvi ligar para Aline. Depois de um tempo ela atendeu.

— Oi! — Falei.

— Oi, não posso falar agora, problemas com amigo, posso ligar depois? — Ela desligou antes que pudesse responder.

Sabia que ela tinha problemas para resolver, então não liguei muito para isso. Cheguei na cantina e Rafael estava sentado em uma cadeira, com um salgado na mão.

— Cadê Jaqueline? — Perguntei enquanto me sentava.

— Encontro com alguém.

— Entendi. Tudo bem com você?

— E porquê não estaria?

— Nada. — Peguei o salgado da mão dele e dei uma mordida.


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Notas finais do capítulo

Espero que gostem.



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