Inquebrável escrita por Danielle Alves


Capítulo 23
Vinte e Três


Notas iniciais do capítulo

Demorei, mas aqui está mais um capítulo. ♥
Espero que me desculpem.
Estou passando por uma época de bloqueio criativo, mas não desistirei da fanfic. ♥



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A traição nunca triunfa. Qual o motivo? Porque, se triunfasse, ninguém mais ousaria chamá-la de traição. - J. Harington

 

LETÍCIA PADILHA SOLÍS

Ansiei pela felicidade que a vingança prometeu que traria, mas a única coisa que recebi foi o vazio. Um interminável e sombrio vazio.

Mas eu estava determinada abandonar o que fosse preciso para recuperar os únicos cacos que sobraram de mim.

Ao chegar a Conceitos, minha cabeça se encheu de inúmeras memórias. A maioria delas vividas com o seu Fernando. Mas além de todo o inferno que vivi nos últimos meses, pude ser amparada pelo Quartel. Encontrei muitas vezes conforto naquelas mulheres e as levaria no coração pela eternidade. Entretanto, jurei que jamais retornaria.

Caminhei vagarosamente o trajeto até a presidência e minha visão se fixou na cadeira de seu Fernando. Aquele horripilante vazio me corroía por dentro, mas eu estava livre. Livre daquela culpa que me consumia dia após dia. E livre dele.

Mas por que eu me sentia tão miserável?

As lágrimas começaram a descer pelo meu rosto e eu não as contenho.

Eu havia me preparado mentalmente para ser expulsa, para suportar qualquer que fosse o resultado da minha decisão, mas nunca imaginei que seria recepcionada por uma inescrupulosa insatisfação.

Suspirei e liguei meu computador, considerando que seria sensato excluir todas as fotos ou evidências de nosso relacionamento. Mas meu coração pesou duramente.

Quando me convenceria que reter memórias era auto sabotagem?

Me rendi e decidi que guardaria pelo menos aquela única foto nossa. 

Eu a fitei sem muito entusiasmo, absorvendo a melancolia. Odiava o gosto amargo que subia pela minha boca, o aperto no peito angustiante que não me largava. No entanto, nada era tão frustrante e sufocante quanto o amor que eu sentia por ele. Eu sei que a vingança é um prato que se come frio, mas estou desesperada.

Desesperada para fazê-lo sentir-se tão estúpido quanto me senti quando confiei nele.

Desesperada para fazê-lo pagar pela dor que me corroía, e esperava não ser decepcionada pelo acaso embora estivesse na ruína.

Sequei as lágrimas e enfiei a nossa foto na bolsa, disposta a não ficar remoendo uma relação que na verdade nunca existiu.

Em meio aos soluços, me despedi da empresa. A sombra do arrependimento me rondava, mas era tarde demais para voltar atrás. Eu abandonaria o inferno finalmente.

Surpresa se instaurou em mim quando vi Cassian me esperando na portaria.

Raiva se alastrou pelo meu corpo. Trinquei o maxilar, totalmente afetada pelo espírito heroico que havia nele. Por que aparecia sempre que eu precisava? Por que estava ali?

Fiquei mais furiosa ainda quando ele sorriu. Passei reto com os nervos a flor da pele, segurando tão firmemente nas sacolas que sentia meus dedos ficarem dormentes. Eu estava arrasada, meu coração desfeito em mil e um pedaços e aquele era um péssimo momento para jogar conversa fora.

Esperava que entendesse a mensagem por trás da minha atitude e me deixasse em paz.

— Letícia, espera!

Sinto remorso por ignorá-lo, mas continuo fingindo que ele não está ali, porém uma mão agarra meu braço e eu mordo a língua para não gritar.

— Lety, não me ouviu?

Inspiro com força e o encaro.

— O que você quer, Cassian?

Os olhos claros brilharam de uma hesitante preocupação.

— O que aconteceu? Você fingiu que não me viu, — desviei a visão pro nada. — eu fiz alguma coisa?

 Não gosto da expressão que ele faz quando me viro. Eu balanço a cabeça com os lábios pressionados, me sentindo uma megera.

— Você não fez nada. — cicio com dificuldade. — Mas não é um bom dia pra conversarmos, Cassian.

Ele fica em silêncio e eu lhe dou as costas. Quase suspirei de alívio quando novamente sua mão agarrou meu braço. Fechei os olhos com força.

— Espera. Ao menos... me deixa te levar pra casa. — sua voz tremulou.

— Acho melhor não, — puxo meu braço com força. — não quero a companhia de ninguém.

Um pequeno sorriso cresceu no canto de sua boca.

— Finja que sou ninguém, então.

Argh.

Eu o encarei consciente do que minha expressão enunciava. Por que aquele homem lindo se importava comigo? E por que eu me sentia tão afetada?

— Não ultrapasse a linha, Cassian. — aviso com a voz alterada. — Não é porque contei meia dúzia dos meus problemas que quero que aja como meu protetor. Por que está aqui?

Cassian arqueou a sobrancelha e puxou uma das sacolas. Aparentava estar disposto a ignorar meu rompante de emoções. Uma lágrima deslizou pelo meu rosto e eu a puxei a sacola de volta.

— Você não me respondeu! — gritei.

Ele suspirou e me fitou por um longo momento. Eu odiei que fosse tão controlado.

— Eu permito que desconte toda sua frustração em cima de mim, Letícia — Ele estava visivelmente escolhendo as palavras. — Mas nestas condições você não irá para casa sozinha. Entre nesse carro e direi por que estou aqui.

Olhei bem para ele.

— Você não manda em mim.

Cassian riu com escárnio.

— É claro que não mando, mas hoje você vai me escutar e vai sentar essa linda bunda na droga do banco.

— E se eu não quiser?

Um sorriso malicioso surgiu nos seus lábios.

— Te coloco a força no carro. E vou adorar cada segundo.

Pressionei os lábios resistindo à vontade de dar-lhe um tapa, mas acabo optando por bater os pés até o maldito carro luxuoso. Eu não daria a ele a satisfação de me humilhar.

— Você vai se arrepender disso.

Cassian gargalhou enquanto se aproximava, e dei-lhe as sacolas pretas quando suas mãos se estenderam.

— Te ajudar é uma honra, Letícia, ainda que tenha que aturar esse humor ácido, — zombou. Ele colocou as sacolas no porta-malas e depois se dirigiu a mim com uma expressão divertida. — Posso abrir a porta para você? Ou esse ato cavalheiresco irá te incomodar também?

— Faça o que quiser — retruco, mas me afasto da porta. Ele a abre com uma piscadela. Entro com truculência, querendo bagunçar tudo.

— Boa garota.

O caráter malicioso no seu tom de voz me deixava no limite da irritação. Cassian tomou o assento ao meu lado e inclinou-se na minha direção, para sussurrar no meu ouvido:

— Você fica linda com raiva.

Minha nossa.

Minha mão voou no braço dele. Meu coração saltou no peito de arrependimento no mesmo instante. O estalo foi auto o suficiente para indicar que meus dedos ficariam marcados na sua pele, mas ao invés de uma reprimenda, fui surpreendida por uma risada estrondosa.

— Certo, acho que mereci.

Meu rosto todo estava super quente, e eu não sabia se era por vergonha ou por ódio.

— Aparentemente ser um cretino é sua especialidade!

FERNANDO MENDIOLA

Não estava lá. Nenhum dos pertences dela.

Nem mesmo qualquer resquício da existência dela naquela pequena sala.

Eu tremi apesar de não estar frio. Comecei a entender aquele pressentimento esquisito, aquela sensação de que algo estava fora do lugar. Minha primeira reação foi ir até o quartel, e nenhuma delas me deram a resposta que eu queria. O medo começou a me consumir enquanto eu ponderava sobre muitas possibilidades que poderiam tê-la feito desaparecer. Minha segunda reação fora ligar para sua casa, mas ninguém atendia. Senti uma eminente dor na cabeça. A sobriedade disparando para fora de mim dando lugar à loucura. Não consegui mais conter meu desespero. Onde diabo estava a Letícia? Voltei a questionar o quartel, mas desta vez diretamente a Martha. Minhas mãos tremiam e suavam.

— Letícia entrou em contato?

Não precisei de muito para entender que aquelas mulheres também começaram a se preocupar.

— Não, seu Fernando. Liguei para a casa dela umas três vezes, e ninguém atendeu.

Neste ínterim, meu pai surgiu de braço dado com a Márcia. Ela se aproximou e agarrou minha mão, me fitando com os olhos claros receosos e preocupados. Meu corpo estava ficando entorpecido.

— O que está havendo, Fernando? Por que essa cara?

Ao invés de fitar Márcia, encarei meu pai. Notei seu olhar analítico sobre mim e decidi espantar aquele sentimento de inferioridade.

— O senhor estava na sala da Lety, — apontei sem rodeios, tentando conter meus nervos. — o que estava fazendo lá?

Ele arqueou a sobrancelha.

— Eu estava me certificando que ela havia ido embora como eu ordenara. — disse simplesmente, totalmente impassível. Senti que ia ter um sincope.

— O senhor o quê?! — gritei.

Ouvi as funcionárias arfarem com espanto. 

— Nossa, Humberto! Que maravilha. — Márcia não escondeu seu contento, sorrindo abertamente.

 — Não tem nada de maravilhoso nisso, Márcia! — esbravejei.

— Se acalme, Fernando. Quero que convoque os acionistas para uma reunião às 11h. — seu tom é ríspido e autoritário. — Depois conversamos sobre a Letícia, temos assuntos muito mais importantes para tratar.

Eu engoli o súbito nó que subiu a minha garganta. Puxei o ar com sofreguidão e em silêncio aquiesci, disparando para o escritório. Se antes estava apavorado, agora estava em pânico. Minha cabeça se encheu de paranoias. Não consegui me sentar na cadeira, meu corpo tremia. E agora ele decide fazer uma reunião. O que havia acontecido?

Mas apesar do medo de ter sido descoberto, me importava mais com o bem estar de Letícia.

Pedi a Alice que informasse a todos os acionistas sobre a reunião e reuni toda força possível para não ir atrás da Letícia. Eu estava desesperado para vê-la.

Foi uma tarefa extremamente difícil, mas eu consegui suportar até todos estarem reunidos em seus determinados lugares. Todos pareciam curiosos para saber do que se tratava esta reunião, eu, entretanto, estava apreensivo e com um péssimo pressentimento.

— Você fez alguma besteira, Fernando? Porque Humberto não costuma nos reunir as pressas sem um bom motivo — Ariel ironizou com um sorrisinho. — Onde está sua assistente? Finalmente se deu conta de que este lugar não combina com ela?

Tive que me esforçar para manter uma atitude indiferente.

— Eu não sei do que se trata esta reunião, embora você continue insuportável como sempre, Ariel.

— Parem os dois. Será que não podem ficar um dia sem discutirem por qualquer coisa? — ralhou minha mãe, alternando o olhar entre nós. — Se comportem. 

Ariel continuou com o sorrisinho irônico dele.

— Desculpe, Teresinha, é que não espero nada de bom do seu filho, exceto é claro, se ele finalmente decidir renunciar o cargo da presidência — bufei e meneei a cabeça, o ignorando.

Que cara mais medíocre e insuportável.

— Cheguei. Esperaram muito?

Humberto Mendiola contornou a mesa e se inclinou para beijar minha mãe. Ele sentou ao meu lado e só então notei as pastas que trouxera consigo. Meu coração começou a disparar quando ele distribuiu uma pasta para cada um.

— Vocês devem estar se perguntando por que os convoquei tão antes da reunião do conselho, — começou seriamente virando-se para mim, — mas acredito que a única pessoa que pode explicar isso é o Fernando.

Minha pulsação acelerou.

— O que quer dizer, papai?

Senti o chão se abrir abaixo de mim quando seu olhar endureceu como pedra.

— Na primeira página, vocês irão ver o verdadeiro resumo do balancete geral da empresa.

Não ousei sequer abrir a pasta diante de mim porque eu já sabia do que se tratava.

Meu estomago revirou conforme eu finalmente entendia o motivo da demissão da Letícia. Não tentei me defender conforme todos me questionavam — eu não conseguiria mesmo se quisesse. Mergulhei num abismo profundo de tristeza, compreendendo o que estava bem abaixo do meu nariz.

Letícia leu a maldita carta do Omar.

E eu não precisava de outra suposição senão esta — ela jamais me trairia sem um bom motivo. Fazia sentido o olhar cabisbaixo e triste, as lágrimas derramadas nos nossos últimos beijos, a falta de calor nos seus toques... Ela sabia.

Sabia que eu a estava usando.


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