Inquebrável escrita por Danielle Alves


Capítulo 16
Dezesseis




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De vez em quando precisamos sacudir a árvore das amizades para caírem as podres. — Mário Silva Brito 

FERNANDO MENDIOLA

Omar me encara com os olhos esbugalhados e incrédulos. Eu dou de ombros e absorvo o peso que aquelas palavras implicavam.

Admiti que estou apaixonado pela Letícia.

Mas eu também sou presidente da Conceitos, tenho um trabalho a ser feito.

Subitamente começo a travar uma guerra dentro de mim mesmo. Romper o casamento é de fato uma boa ideia? Eu não sei, a todo momento entro em contradição. Não consigo me compreender, estou o tempo inteiro oscilando entre o certo e o errado, entre Letícia e a Conceitos. No entanto não suporto a ideia de perdê-la. Parecia simples na minha cabeça a princípio a ideia de esquecer-me dela. Porém as circunstâncias me provaram do contrário quando a vi com aquele Cassian. Minha mente se encheu de pensamentos dolorosos, me torturando e me enfurecendo. Estou convicto que não serei capaz de vê-la com um anel de compromisso no dedo que não seja dado por mim.

Queria que tudo fosse mais simples, prático. Por que Márcia tem que ser tão apaixonada por mim? Se esse amor não existisse, seria tão simples. Eu poderia ficar com a Letícia, e ainda continuar como presidente na Conceitos, sem a iminente ameaça de Ariel. Com o embargo ainda em segredo, sem chances de ser descoberto.

Estou de mãos atadas, mas não estou disposto a abrir mão da Letícia. Preciso arranjar um jeito, e se para isso preciso terminar meu relacionamento com a Márcia... Espero ter forças para conseguir. E só então vejo como prosseguir sem o Ariel querendo romper a sociedade.

— Você está falando sério? – pergunta Omar por fim. Eu o fito e vejo apreensão nos seus olhos. Eu suspiro.

— Estou. Eu a amo... Carvajal.

Ele levanta o queixo e enruga o nariz como se estivesse sentindo um cheiro repugnante.

— Então... Você prefere... Ficar com a Letícia ao invés da Márcia?

— Não se trata de preferir ou não. – Enchi meu copo novamente. – Eu simplesmente amo a Letícia, e eu jamais senti um sentimento como este na vida.

Omar fez um barulho esquisito com a boca, como se estivesse prestes a vomitar. Eu grunhi.

— Você está ficando maluco, não é possível.

— Pelo contrário, nunca estive tão lúcido. – Repeli.

— Ah, é? – Murmurou com descaso. – Quem em sã consciência troca uma beldade como a Márcia por uma... Uma... Pela Letícia Padilha Solis?

Meneio a cabeça para os lados, ficando irritado.

— Não seja um babaca, Omar. Eu não quero perder o respeito que tenho por você.

Ele solta um riso seco.

— Não, estou mesmo curioso. O que a Letícia esconde por baixo daquelas roupas que te deixou tão alucinado?

Eu trinco o maxilar.

— Olha como você fala. – Eu aviso.

Ele gesticula na minha direção, dispensando meu aviso.

— Ah, qual é? Vai, Fernando. Nunca foi um problema pra você expor a vida íntima de vocês dois. O que ela tem? Ou melhor, o que ela faz?

— Que merda, Omar, cala essa boca! – Esbravejo. Minhas mãos agarram o colarinho daquele babaca. Meu rosto estava quase encostando no dele quando sibilei entredentes: — Escute bem, Carvajal. É a última vez que aviso. Nós crescemos juntos, somo amigos desde sempre, e eu o considero um irmão. Mas se eu ouvi-lo repetir essas palavras ou se eu souber que está insultando a Letícia de novo, não respondo por mim. Eu vou acabar com a tua raça sem pensar duas vezes. Estamos entendidos?

O choque no rosto dele se transforma em raiva. Ele me empurra.

— Você está me ameaçando? – A voz dele sobe uma oitava.

— Não estou ameaçando, estou te avisando.

Omar balança a cabeça, a expressão no rosto dele num misto de incredulidade e raiva.

— Quem diria que meu melhor amigo se viraria contra mim por causa de uma feia.

Eu o fito com ódio, meneando a cabeça para os lados. Aponto na sua direção.

— Não me teste. – Alerto-o.

O barman, Isaías, tocou meu ombro e se colocou entre mim e meu suposto melhor amigo. Disparei um olhar rápido ao redor e percebi que tínhamos plateia, embora não estivesse dando à mínima.

Não permitirei que ninguém mais insulte a Letícia.

Movi o ombro abruptamente, me soltando do toque dele. Eu encarei Omar, a fúria zumbindo nos meus ouvidos. Eu estava vendo tudo vermelho. Decepção lampejou nos olhos dele, rápido demais para que sequer me desse conta de fato. Não me importo. Cheguei no meu limite e não sei se vou perdoá-lo tão cedo.

— Senhores, se acalmam. – Intervém Isaías, colocando a mão espalmada no peito de Omar quando ele se aproximou.

— Você é um moleque mimado, é isso que você é! – Omar gesticulou no ar. – Sabe o que vai acontecer com essa sua atitude, Fernando? Vai levar todos nós para o buraco!

— Isso é o que você acha.

— Não, Fernando. Eu tenho certeza. Olha... – Ele fecha os olhos, respira fundo e o semblante dele se suaviza. – Estou disposto a pedir perdão pelo meu comportamento, se você quiser eu até falo com a Letícia, mas não estrague sua vida desse jeito. Você não quer mais a Márcia? Tudo bem. Mas mantenha-se atado a ela pelo menos até a Conceitos se erguer. Não é por isso que estamos lutando desde o início? Pelo seu plano de negócios?

Quando suas pálpebras se abrem, eu nego.

— Qual a parte de que estou apaixonado pela Lety você não entendeu? Quer que eu desenhe?

Omar levanta a cabeça, encarando o teto por uns segundos. Então se volta para Isaías, falando alguma coisa com ele. O barman nos fita, receoso, mas assente e acena para as pessoas que assistiam tudo. A pequena multidão se dispersa, e Omar toca no meu braço.

— Não me toque.

Ele ergue as mãos.

— Tá, mas sente-se, vamos conversar como homens civilizados.

— Eu sou civilizado, Omar, você que começou com essa porcaria. – Digo com acidez.

Ele suspira e aponta para banqueta.

— Escute ao menos a minha proposta.

Eu analiso seu rosto, considerando.

— Está bem, mas não vou te perdoar.

— Tá, tá, só senta aí.

Depois que me sentei, ele tomou o lugar ao meu lado.

— Fale logo!

Omar faz uma careta.

— Irmão, ouça. – Eu arqueio a sobrancelha com impaciência e ele continua. – Como seu amigo, – eu bufo. – Eu gostaria de poder... Alertá-lo das consequências que esse seu ato pode gerar.

— É mesmo? – Eu cruzo os braços e abro um sorriso cínico. – Pois então, querido amigo, alerte-me.

— Isso é pro seu bem, Fernando. É pro seu bem. Vejo que está confuso, que tudo que está acontecendo a sua volta tem te deixado estressado. E acho que o fato de Letícia lhe garantir apoio e te ajudar com tudo, tem gerado conflito com relação aos seus sentimentos. Não já passou pela sua cabeça que talvez esse amor seja apenas afeto fraternal?

— Não. – Declaro rapidamente.

— Tem certeza? – Eu franzo a testa.

— Sim, seu imbecil.

— Está bem, então. Digamos que você está mesmo apaixonado pela Letícia, acha que é certo passar todo esse tempo com a Márcia, enganando-a, para no final, deixa-la pela sua assistente?

Eu viro um pouco meu rosto, os olhos apertados.

— A onde você quer chegar?

— Na parte onde você coloca essa sua cabeça pra funcionar. Nós estamos todo esse tempo fazendo de tudo pra conseguirmos levantar a Conceitos, inclusive usando os sentimentos da Márcia a seu favor, pra no final tu estragar tudo, e ainda magoá-la nesse nível?

— Você não vai fazer chantagem emocional comigo, seu bastardo. – Rebato, entendendo a intenção dele.

— Isso não é chantagem emocional. É te mostrar a realidade. – Ele se inclinou na minha direção. – Que tipo de mulher ficaria feliz ao ser trocada por alguém como a Lety?

Pressiono os dedos nos meus braços.

— Você pode até amar a Lety, mas não é cego. Vai me dizer que ela é um colírio para os olhos?

— Isso é o de menos, Omar. Eu não a vejo pelo que é ela por fora.

— Agora, né? Porque até poucos meses, você tinha horror a ela.

— Eu não a conhecia como conheço agora.

Ele junta as mãos e fecha os olhos, inspirando e expirando.

— Está certo. Então, como seu amigo, a única coisa que eu gostaria de pedir é que você pense bem. Será que realmente vale a pena uma vida inteira jogada fora por causa de alguém como Letícia Padilha Solís?

Não o respondi. Em seguida, Omar deixou uma nota de cem dólares no balcão e partiu, sem olhar para trás.

Apoiei os cotovelos no balcão e cobri meu rosto. Estou desconcertado. O conflito dentro de mim cada vez mais se intensifica, os lados opostos brigam o tempo inteiro, é uma guerra que parece não ter fim.

Meu Deus, quando terei paz?


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