Inquebrável escrita por Danielle Alves


Capítulo 17
Dezessete




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Enquanto os sábios pensam sem certeza, os idiotas atacam de surpresa. — Henfil

 

LETÍCIA PADILHA SOLÍS

 

Chega de chorar, Letícia. Chega.

Esfrego as mãos no rosto ansiando com desespero sumir de vez. Encosto a nuca na porta e ofego, meu rosto fica virado para cima. Fito o teto.

— Meu Deus, o que foi essa merda? – sussurro pra mim.

Eu estou muito confusa, ainda é difícil assimilar tudo o que acabou de acontecer. Por que o seu Fernando veio até aqui? Por que insinuou que saio com três? Senhor, não consigo acreditar. Não consigo compreender, minha cabeça está recebendo uma informação atrás da outra. Qual foi a intenção do seu Fernando ao vir aqui e me humilhar? Não basta brincar com meus sentimentos? Me usar como um brinquedo? O que mais ele quer de mim? Apaixonar-me por esse homem foi como cavar minha própria cova. O que mais seu Fernando quer tirar de mim? Minha sanidade? Eu não tenho mais nada.

— Filhota? – Grita minha mãe lá de cima, me tirando da inércia.

— Oi, mamãe! – Grito de volta. Rapidamente me recomponho, forçando minha boca se alargar num sorriso quando eu a vejo descer as escadas. Coloco minha bolsa no sofá e suspiro com um pouco de alívio ao abraça-la.

— Como está, minha filhinha?

— Estou... bem, mamãe. – Minto. – Um pouco cansada só.

— Ah, minha filhota. – Dona Julieta pega meu rosto com as mãos. – Quer um suquinho? Ou uma vitamina?

— Um suquinho de laranja, pode ser?

— Claro, filhota. – Ela pisca para mim e a sigo até a cozinha.

Encosto minhas costas no balcão e cruzo os braços, observando enquanto mamãe prepara meu suco.

— Papai já foi dormir?

— Não, ele foi visitar um parente, lembra? Um primo ou coisa assim, o velho está muito doente, e seu pai vai passar uns dias por lá.

Faço um biquinho.

— Puxa, ele nem se despediu de mim. – Minha mãe ri baixinho.

— Depois você pode ligar pra ele.

— Claro – digo.

Seguiu-se um silêncio confortável enquanto mamãe preparava meu suco. Minha mente vagou para a minha discussão com o seu Fernando. O rosto dele se retorcendo de surpresa e vergonha quando revelei que estava ciente do casamento me estraçalhou. Não argumentou, sequer quis explicar ou negar. É definitivamente verdade, seu Fernando vai se casar com a dona Márcia. E não há nada que eu possa fazer para mudar isso. Ele não me ama. E eu tenho de me acostumar com isso, tenho que me esquecer dele.

— Lety, minha menina, posso te perguntar uma coisa?

Pisco e retorno minha atenção para mamãe tentando ignorar o doloroso aperto no peito. Discutir com ele me dói mais do que qualquer dor que provei nessa vida.

— Sim, mamãezinha, claro. O que?

Ela me estende minha caneca de vidro favorita com meu suco. Bebo observando seus olhos escuros e amendoados me examinarem como apenas uma mãe pode fazer. Fiquei desconfortável de supetão, então desviei meu foco para meus dedos envoltos no copo.

Após um momento, ela suspira e se vira para lavar a louça recém-sujada.

— Nada, deixa pra lá.

Franzo a testa.

— Mamãe, pode me perguntar. O que foi?

Dona Julieta virou-se para mim e seu rosto se torceu num esgar.

— Se eu perguntar... Promete me responder com sinceridade?

Eu a fito e assinto apreensiva.

— Hãn... Tudo bem. O que é?

Ela me encara novamente com apreensão, mas por fim expira e sorri fracamente. Neste momento, retorno a sorver meu suco.

— Certo, vou direto ao ponto. Você e o seu Fernando estão juntos?

Sou neutralizada pela surpresa e a encaro com espanto. Começo a ficar nervosa.

— O-O que? – solto um riso esganiçado. – Por que está me perguntando isso? É claro que não, Seu Fernando é noivo de uma linda mulher. Por que teríamos alguma coisa?

Seus olhos se estreitam na minha direção.

— Então... Me explica o beijo que ele lhe deu lá fora.

Eu arquejo, mas balanço a cabeça em negação de forma frenética.

— N-Não, mamãe! – gaguejo. – A senhora viu errado.

— Letícia Padilha, eu sei o que eu vi!

Minhas mãos começam a tremer e sinto que terei um sincope ou algo do tipo. Coloco o copo sobre o balcão.

— Puxa, mamãe, eu não sabia que a senhora ficava bisbilhotando os outros pela janela!

As bochechas dela ficaram ruborizadas, mas seus olhos faiscaram de reprimenda.

— Não me aborreça, Letícia! Me diga a verdade!

Isso não pode estar acontecendo.

— Não, mamãe. Não estou com ele. – Blefo, dando um safanão no ar com um sorriso largo demais para ser real. – A senhora está confundindo as coisas porque ele é gentil comigo, só isso.

Ela bateu em mim com o pano de prato.

— Ai! – guinchei, passando a mão no braço.

— Não brinque comigo, mocinha! Acha mesmo que não sei ver entre as entrelinhas? É claro que há alguma coisa entre vocês, pare de fazer cara de paisagem e me diga logo, ou juro que vou até ele e faço um escândalo, porque é inadmissível que um homem comprometido fique se arrastando para saia da minha filha! – Seu rosto inteiro ficou vermelho.

— E-Eu... – passei a mão no cabelo e lhe dei as costas. Caminhei até a sala, andando de um lado para o outro. Eu fui muito descuidada, é claro que eventualmente mamãe ou papai descobriria meu caso com seu Fernando.

Minha mãe me seguiu, a austeridade estampada no seu rosto. Pousei a mão na minha cabeça e gesticulei na sua direção, tentando me explicar. Abro e fecho a boca diversas vezes, até que se rompe dentro de mim a barreira que me impedia de desabar. Mamãe já havia testemunhado tudo, não há mais como esconder. Fingir apatia não mudaria nada, ela me conhece muito bem. Perco o controle das lágrimas, e elas descem pelo meu rosto. Minhas pernas tremem e eu gaguejo, embargada. Estou subjugada e sobrecarregada com o sofrimento.

Com preocupação, dona Julieta veio até mim e segurou minhas mãos. Fui conduzida até o sofá.

— Desculpe, mamãe... – sussurro. – Estou saindo com um homem comprometido.

— Ah, minha filha... – nós sentamos uma do lado da outra. Mamãe pegou as minhas mãos e beijou meus dedos. – Me conta, filhinha, o que houve?

Respiro com dificuldade, minhas palavras saem arrastadas.

— É uma longa história...

— É por causa dele que você tem estado tão triste, não é?

Fecho as pálpebras com força e assinto lentamente.

— Sim. Como a senhora sabe?

Mamãe toca meu rosto com uma das mãos e roça o polegar na minha bochecha. Não consigo olhá-la.

— Minha filha, você pode tentar esconder tudo das outras pessoas, mas a mim não engana.

— A senhora me conhece bem, né?

Minha mãe puxa meu rosto para que eu a olhe.

— Claro, minha filhota. Agora vamos, – ela dobrou a perna no sofá. – Me conte como tudo aconteceu, inclusive a discussão que tiveram agora pouco.

Soltei um gemido.

— Ah, não. A senhora ouviu isso também?

Seus ombros caíram e ela me lançou um sorriso fraco.

— Acho que a vizinhança inteira ouviu.

Um som esquisito sai da minha boca quando puxo minhas mãos e cubro meu rosto.

— Céus, que vergonha.

Dona Julieta acaricia minha cabeça.

— Bom, ao menos agora vão engolir tudo que disseram a seu respeito. Você, sim, sabe conquistar um bom partido. – A presunção na sua voz me faz sorrir um pouquinho. Quem me dera àquelas palavras fossem reais. Eu não conquistei ninguém. Não poderia mesmo nos melhores sonhos.

— Mamãe, eu sei que a senhora gostaria que eu te contasse como tudo aconteceu, mas... – não termino a frase, mordendo o lábio. Eu não queria lhe contar porque sei que vai ficar ainda mais decepcionada.

Mamãe toca meu rosto novamente e se inclina para me dar um beijo na testa.

— Claro, minha filhota. – Concorda com um sorriso no rosto, mas revira os olhos. – Só não demore muito, estou muito curiosa para saber como isso começou.

Eu faço uma careta sabendo que quando conhecer a verdade...

— Não está decepcionada?

Ela pensa por um segundo, e fita meu rosto com atenção quando diz:

— Quando você me contar o que está havendo eu penso se vou ou não me decepcionar.

Tento não fazer outra careta.

— Obrigada, mamãe. – Suspiro e sorrio timidamente. – Ainda bem que seu Erasmo não está aqui, senão...

Minha mãe riu.

— Pois é, você estaria muito encrencada.

Depois disso, passamos um bom tempo conversando como não fazíamos há tempos por conta da constante presença do papai, que sempre queria saber de tudo. Eu me senti razoavelmente bem, esquecendo-me por um momento da minha vida drástica.

No entanto em determinado momento batem na porta. Eu e minha mãe nos entreolhamos espantadas.

— Quem será essa hora? – pergunta ela.

Nós duas nos levantamos. Comecei a ficar apreensiva, meu coração batendo descompassadamente. E se for o seu Fernando?

De qualquer maneira, minha pergunta é respondida quando mamãe abre a porta e Omar surge com uma expressão de poucos amigos.

Eu ofego, surpresa.

— Olá, boa noite. No que posso ajudar? – Pergunta minha mãe, alternando olhares entre mim e ele.

Omar Sujo Carvajal abre um meio sorriso quando dá um passo para dentro e se vira para mim. Seus olhos escuros cintilando de diversão ao ver minha expressão.

— Boa noite. – respondeu ele educadamente ao voltar-se para minha mãe. – Vim conversar com a Letícia, sou Omar, o vice-presidente da Conceitos.

Eu comprimo os lábios.

O que esse cara faz aqui?


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