Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 53
XXI - Esse sorriso vermelho




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Lu Han segurou a foto, os dedos se apertaram nela com mais força do que queria realmente e então, suspirou. Sentado à beira da sua cama, na residência que tinha na Alcateia Kim, o ômega estava em silêncio. Fazia bastante tempo desde a última vez que abrirá aquela pequena latinha de biscoitos, onde guardava algumas fotos, uma ou duas cartas e outros pequenos detalhes de quando era só um adolescente ômega com sangue Lu correndo nas veias.

Encarou a foto por bastante tempo antes de decidir aproximar do seu rosto e então, estava meio rindo e chorando da forma patética que sentia a foto tocando-lhe a bochecha. Geralmente, não se torturava assim. Preferia o silêncio das palavras e o vazio da saudade, no entanto, de vez em quando, Lu Han não resistia. Por isso, terminava daquele jeito, segurando uma foto amassada e chorando de saudade por um garoto de cabelo escuro que não existia mais na sua vida.

Eles deviam ter 17 anos naquela época. Verão. Era tudo o que estava escrito atrás da foto, no cantinho esquerdo. A letra não era do ômega e a foto também não. Foi um presente, assegurou a si mesmo. Um presente roubado, então estava meio sorrindo com isso, porque era a verdade. Roubara aquela foto por pura birra, numa vingancinha boba que só divertia-o nas suas memórias. No atual momento, sentia apenas aquele peso no peito alertando-o do mau gosto daquilo.

Mas não se importava realmente. Gostava da lembrança, gostava daquele verão quando tinham 17 anos e esperança no peito. A determinação escorria por seus dedos quando se embrenhavam nos cantos da Academia para dividir informações, contar piadas, trocar caricias...

Lu Han nunca soube explicar o que realmente aconteceu com eles, o real problema que os separou. Talvez, fosse culpa da lei do Conselho, que ditava como líderes não poderiam se casar entre si ou, talvez, fosse culpa das suas personalidades e sonhos e crenças. Não estavam preparados, chegou na velha conclusão que sempre o assombrou. Nunca estiveram preparados, nem mesmo quando Yixing nasceu.

E naquele verão, quando foram autorizados a voltar para suas respectivos Clãs, havia a terrível sensação de que não se veriam nunca mais depois daquilo. Era o último verão de férias antes do Grande Torneio que os tornaria líderes, então não pareceu surpresa para nenhum dos dois quando se entregaram um pro outro. Foi a primeira vez que ficaram juntos como amantes. O começo de um romance sem final feliz e estava tudo bem, Lu Han sempre dizia para si mesmo, estava tudo bem porque tinha seus irmãos, seu pai adotivo, seu clã de ômegas, havia trabalho demais para fazer se realmente se tornasse líder, havia coisa demais para ocupar sua mente. Não tinha tempo pra se apaixonar.

Mas se apaixonou mesmo assim.

No fim daquele ano, quando foi o único a permanecer vivo na arena, o que o concretizou como líder do Clã, o Lu sabia que havia perdido. Perdido-se completamente nas palavras e ações e sorrisos de Jackson. Estava contaminado com a sua presença e só Dal sabia do quanto tentou se livrar disso, no entanto, a cada encontro burocrático que tinha com o outro, se via num estado pior.

Afastou a foto do rosto e fitou-a mais um pouco, comprimiu os lábios e resolveu guardá-la na latinha. Fechou a lata e a colocou dentro de uma caixa de sapatos no alto do seu guarda-roupa. Se torturar com aquelas lembranças não iria lhe fazer bem algum, disse a si mesmo. Andou até o espelho e fitou-se, limpou as lágrimas do canto dos olhos e mexeu no cabelo, estava pronto para sair dali e voltar ao trabalho quando a porta se abriu.

— Oi? — escutou a voz de Jongin e virou-se para fitar o mais novo. — Ocupado?

Lu Han negou e a porta se abriu mais um pouco revelando seu filhote nos braços do irmão. Sorriu pro filho e foi até si, viu-o estender os bracinhos gorduchos na sua direção e o pegou no colo.

— Onde está Henry? — perguntou ao ômega depois de deixar um beijo na testa do filho.

Jongin piscou os olhos, um tanto confuso e depois pensativo, apenas para balançar a cabeça em negação no minuto seguinte. Não sabia. Não tinha visto o irmão desde que acordara e por um momento, achou que o mais velho estava junto de Henry, mas ao constatar Lu Han sozinho, percebeu que não tinha a menor ideia de onde o mesmo poderia estar quando havia se demitido do emprego de secretário de Junmyeon no dia anterior.

Han franzio a testa, aquilo era novo. Não fazia o feitio do irmão sair por aí sem avisar, mas deu de ombros. Henry era grandinho o suficiente para cuidar de si mesmo e além do mais, sabia que ele logo apareceria.

— Eu preciso de ajuda com os preparativos do casamento. — Jongin mudou de assunto, tirando Han dos seus pensamentos.

— Doce. — Yixing falou e o pai sibilou um não baixinho pro filho antes de voltar sua atenção pro irmão mais novo.

— O que há? Achei que tudo estava pronto. — disse.

— Na verdade, ainda não decidi os participantes da Cerimônia das Cores. — confessou, os olhos desviaram-se para baixo e Lu Han achou graça.

— Quantos pretende colocar na sua lista? — usou o tom suave, tinha conhecimento que o irmão estava nervoso com tudo aquilo.

Era o primeiro casamento em anos nos Lu’s, afinal, como estes eram quase que exclusivamente poligâmicos, não havia necessidade de compromissos tão rígidos como o casamento. Mas ainda assim haviam rituais entre aqueles que queriam assumir um compromisso. Lu Han os conhecia de perto, afinal havia participado de alguns por conta da Cerimônia das Cores. Como líder, era sempre solicitado como um dos ômegas de honra. Henry também participara de alguns, apesar de não gostar tanto assim de toda aquela barulheira ao seu redor.

A Cerimônia das Cores não era um ritual obrigatório, mas era tão antigo e praticado há tanto tempo que parecia um crime descarta-lo tão facilmente assim. Por isso, Lu Han entendia o nervosismo do irmão.

— Não muitos. — então, o ômega começou a andar, sumiu pelo corredor e Han foi obrigado a colocar a cabeça para fora do quarto, a fim de saber para onde o irmão foi. — Eu fiz uma lista! — o escutou brandar do quarto e Yixing no seu colo, mordeu-lhe o ombro, um ato de rebeldia não tão rebelde assim quando a mordida não doeu.

— Não morda o papai. — Lu Han pediu ao filho e Yixing deitou a cabeça sobre ombro que mordera.

Seu filho era uma boa criança. Educado e carinhoso além de um tanto genioso quando não tinha o que queria, costumava desejar as coisas com tanta determinação para alguém em tão tenra idade que Lu Han se surpreendia com a forma como encontrava um pedacinho de Jackson em cada detalhe do filhote. Estava estampado no escuro dos seus olhos, no formato das suas mãos e na forma como firmava o queixo. Teimoso demais, pensava. Uma cópia perfeita da personalidade daquele ômega, que ainda era dono das suas melhores lembranças.

Ele saiu do quarto, colocou Yixing em pé no chão e segurou sua mão. Ambos andaram até o quarto de Jongin. Observaram, da porta, o ômega revirando as gavetas atrás da sua lista de possíveis ômegas de honra. Yixing soltou sua mão e correu para dentro do quarto, tentou ajudar o tio na procura e Lu Han riu da tentativa do filho, quando o mesmo olhava embaixo da cama e do tapete.

— Aqui está. — Jongin encontrou e sorriu para o mais velho. Na sua mão havia um caderninho de capa escura. — Bom, eu achei que podia ser legal convidar algum dos irmãos do Jun. — falou enquanto folheava o caderninho e se aproximava. — Até mesmo algum dos seus pais. — estendeu o caderninho pro irmão. — O que acha?

Lu Han ergueu as sobrancelhas enquanto lia a pequena lista ali. Havia mais gente do que achara, mas não era de todo ruim. A Cerimônia das Cores não tinha um número limitado de participantes e além do mais, o intuito daquele casamento era fazer algo grande o suficiente para que todos se divertissem, se distraíssem um pouco da presença dos Byun’s naquele território.

— Está muito bom. — optou por dizer e Jongin sorriu para si. — Só tire Kyungsoo da lista. — apontou. — Duvido muito que ele tenha algum ânimo para participar da cerimônia com uma barriga daquele tamanho.

Jongin riu e Lu Han o acompanhou.

Baba. — Yixing puxou a barra da sua camisa e ergueu os bracinhos na sua direção.

O Lu logo pegou o filho no colo. Desde o ataque ao seu clã, o mesmo se tornara mais dependente de si, precisava tê-lo constantemente no seu campo de visão. E Lu Han não podia culpa-lo, quando toda aquela confusão havia sido traumática para si também. Ainda tinha pesadelos em que perdia Yixing para aqueles humanos horríveis, em que Henry morria e que Jongin era levado para longe de si. Imagens amargas que o faziam acordar ofegante na madrugada.

— Está com fome? — perguntou ao filhote e o mesmo assentiu. — Então, vamos comer.

— Você vai cozinhar? — Jongin pareceu esperançoso, de repente.

— Não. — Lu Han riu do jeito como sua expressão mudou para triste. — Vamos em um restaurante na cidade, que vir também? — estendeu o convite e o irmão voltou a sorrir.

— Deixa eu pegar meu casaco. — Jongin voltou a correr pelo quarto, bagunçando mais aquele lugar atrás do casaco.

Lu Han balançou a cabeça em negação e se afastou com o filho no colo, andou em direção ao seu quarto e procurou um casaco pro filho além de sapatos. Arrumou de modo que ficasse bem aquecido e então, saíram dali apenas para encontrar Jongin os esperando na sala, sentado no sofá. Contudo, diferente de antes o irmão não parecia mais feliz. Havia preocupação estampada no seu semblante.

— O que aconteceu? — perguntou, a voz saiu mais séria do que queria e o Lu mais novo se encolheu dentro do próprio casaco.

— É o Henry. — Jongin começou e Lu Han sentiu seu coração falhar uma batida.

— O que aconteceu? — tornou a repetir, Yixing no seu colo se remexeu incomodado.

— Sehun ligou. — mordeu lábio, não sabia como começar aquele assunto sem parecer desesperado. — Ele... ele disse que você precisa ir busca-lo. — mas não importava o esforço que fizesse, a sentença saiu trêmula na sua voz.

O ômega Lu arregalou os olhos, como se o que tivesse escutado da boca do mais novo fosse uma sentença de morte, mas Jongin não conseguia culpa-lo quando ele mesmo sentia como se estivesse proferindo isso, afinal, Henry nunca foi assim. Eles tinham a mesma idade, mas o outro ômega sempre lhe pareceu mais maduro, mais centrado, mais determinado em seus objetivos. Não havia em Henry nada da essência sonhadora e romântica que existia em si. De alguma forma, apesar de terem sido concebidos no mesmo ano, Henry não como aço temperado. Altamente resistente e pouco maleável como Lu Han costumava ser, as vezes.

E de repente, tê-lo pedindo ajuda como um adolescente que passa mal em uma festa e liga para os pais, só fazia Jongin sentir medo. Um medo frio e enjoativo no estômago, como se ele estivesse chacoalhando numa máquina de lavar. Henry não é assim, pensou mais um pouco achando que isso fosse o tranquilizar, mas, na verdade, só servia para acentuar a forma como tudo aquilo não fazia sentido. Por que Henry estaria com Oh Sehun? Passaram a noite juntos? O que estava acontecendo de tão grave para que irmão não conseguisse nem ao menos fazer o telefonema por si próprio? Seja o que fosse, Lu Han também não sabia. Viu as mesmas questões na face do irmão e quase o viu tremer quando se aproximou para pegar Yixing nos braços.

O mais velho relutou em soltar o filho, mas cedeu no último momento, pois sabia que seja lá o que tivesse acontecendo com Henry, não podia levar Yixing consigo. Aquilo era um assunto para os adultos, se asseguraria a dizer ao sobrinho depois.

— Levo-o para comer. — Lu Han estava tremendo, Jongin notou no momento em que este começou a arrumar a gola do casaco do filho. — Nada de muitos doces. — advertiu naquela fala de paternal que costumava usar consigo também. — Se comporte, huh? — deixou um beijo na testa do filhote e Yixing fechou os dedinhos na corrente do cordão, que Lu Han usava desde que entrara para Academia.

— Quero ir com o baba. — Yixing insistiu, não queria deixar o mais velho ir daquele jeito depois que prometera uma refeição em família.

— Eu não posso ir. — ele tentou mais um pouco e ergueu a mão para tirar o cordão que usava do pescoço. — Mas prometo que vamos brincar juntos quando voltar, tudo bem? — colocou o cordão em volta do pescoço do filho e Jongin mordeu o lábio.

Odiava despedidas tanto quando Yixing.

— Baba. — Yixing choramingou, remexeu-se nos braços do tio e empertigou o corpo em direção ao pai, mas Lu Han deu um passo para trás. — Baba! — começou a chorar, mas Jongin sabia que o irmão não ia ceder do mesmo jeito que Yixing não ia desistir ao continuar fazendo manha.

Lu Han suspirou, deu mais um passo para trás e se afastou de vez, deu as costas para o choro de Yixing, avançou pela porta e correu até o estacionamento, na entrada da Alcateia Kim, onde seu carro estava. Jongin ficou com Yixing nos braços, sacudindo-o ocasionalmente e tentando fazê-lo parar de chorar. Disse coisas bobinhas, tentou fazer brincadeiras, mas pela forma como os lábios do sobrinho se comprimiram em um bico emburrado, sabia que o mesmo passaria o dia inteiro de cara emburrada.

— Vai ficar tudo bem. — Jongin tentou dar um beijo na testa do menino, mas o mesmo o empurrou com as mãozinhas.

Suspirou e deixou Yixing sentado no sofá. O observou cruzar os braços, totalmente irritado com a forma como o pai tinha ido embora e Jongin não conseguiu não se perguntar com quem ele parecia ao agir daquele jeito. Porque Hannie não era assim, havia suavidade nos movimentos do irmão. Ele sempre se dobraria diante de uma melhor alternativa ou faria algo melhor com os ingredientes que tinha, bem diferente de Yixing, que se tornava mais teimoso a cada dia e por isso, um tanto birrento. Jongin acreditava que fosse culpa da idade, afinal ele só tinha 3 anos ainda. No entanto, a cada vez que olhava para o fundo dos olhos do sobrinho encontrava aquela fração de teimosia misturada com determinação que não combinava com o que existia nos olhos do irmão mais velho.

Pegou celular no bolso do seu casaco e decidiu ligar para o noivo, porque se havia alguém que podia mudar o humor de Yixing no mundo, esse alguém era Kim Junmeyon.

Enquanto isso, Lu Han corria contra o tempo enquanto dirigia até a Alcateia Oh.

***

Donghae encarou a filha dormindo no berço e suspirou. Ela parecia bem e saudável, tentou se tranquilizar, mas ainda assim não conseguia. Mesmo que o berço ficasse ao lado da sua cama, não conseguia não ficar ali, em pé, de guarda. Fitando-a e cuidando para que nada de ruim acontecesse. Siwon lhe daria uma bronca se o visse ali, novamente, mas Donghae não se importava. Não, quando já notara tantas vezes, na madrugada, o corpo do marido alfa, em pé, perto do berço.

Sentinelas, pensou. Eles haviam se tornado sentinelas daquela criaturinha cor-de-rosa e esfomeada. Mas não é como se pudessem se culpar com isso quando as circunstâncias do seu nascimento haviam contribuído e muito para isso, os pesadelos estavam aí para provar isso. Suspirou mais um pouco, dessa vez um tanto maravilhado com a forma como Ji Eun se remexia no seu sono de criança, então estava meio sorrindo quando se inclinou sobre o berço para ajeitar a manta sobre filha.

Ji Eun era quietinha. Bem diferente dos seus dois filhos mais velhos barulhentos, apesar de Chanyeol ter sido um bebê mais barulhento que Baekhyun. A filha parecia fazer o tipo curiosa e dorminhoca, costumava chorar apenas quando estava com fome. A cada 3 horas, Donghae havia contado o espaço de tempo, uma maneira meio boba de se tranquilizar. Sabia que ela choraria daqui uma hora e deveria usar esse meio tempo para dormir um pouco, mas não conseguia evitar ficar de guarda quando estava sozinho em casa. Se Siwon estivesse ali, poderia se obrigar a dormir, estaria tranquilo com a certeza de que alguém cuidaria da filha. No entanto, sozinho... com todo aquele silêncio preenchendo aquela casa que não era sua, só o fazia ficar inseguro e um tanto paranoico.

E não que estivesse imaginando coisas ou cenários ou pessoas. Havia uma razão: Os lobos Kim’s. A Alcateia de Junmyeon havia se mostrado mais arisca do que o esperado, se comportavam como animais raivosos quando avistavam Donghae ou Siwon ou um dos seus filhos. O Lee havia visto os olhares, era testemunha de tudo apesar de Siwon fazer um ótimo trabalho para tentar desmentir. Estava o tentando proteger, resguardá-lo enquanto podia apenas para que pudesse se recuperar bem, para que Ji Eun crescesse saudável. Contudo, o Lee sabia. Fora alvo de alguns insultos, cartazes pregados na sua porta, janelas quebradas com pedras quando Siwon não estava.

O ômega estava certo que aquilo era só para assustar. Nenhum daqueles lobos ousaria ataca-lo enquanto estivesse sob o convite de Junmeyon, mas sabia também que tudo aquilo soava como um presságio. Não conseguia se livrar da certeza de que era apenas uma questão de tempo até tudo piorar de vez e como um ômega Lee, tinha consciência de que podia confiar nos seus instintos. Ômegas eram assim, afinal, cheio de instintos. Mais sensíveis que alfas, difundiam por aí. E essa sensibilidade se estendia até os instintos ou como os humanos gostavam de chamar: intuição. E no momento, a intuição de Donghae lhe dizia para se esconder.

Era por isso que não conseguia dormir. Havia aquela sensação amarga no seu peito, sufocando-o devagar desde que Siwon lhe contara sobre a possibilidade de que o prisioneiro Kim Jongdae fosse seu filho. Não ficara chateado com a informação, simplesmente, porque fazendo as contas, eles nem ao menos se conheciam na época que — supostamente — Jongdae fora concebido. Era besteira ficar irritado com algo como aquilo, mas Siwon pareceu tão inseguro ao lhe dizer tudo, que Donghae quase riu. Contudo, contar isso para Baekhyun e Chanyeol foi um pouco mais fácil, mas não menos preocupante.

Chanyeol pareceu chocado e depois, fez um comentário engraçado sobre isso e aquilo, mas Donghae via a preocupação no seu rosto do mesmo modo como viu a preocupação tomar conta do semblante de Baekhyun. Não era bom para a relação Kim-Byun que Jongdae fosse filho de Siwon. Isso implicava em traição, implicava em mais olhares feios dos lobos Kim’s, pois Jongdae havia sequestrado e quase assassinado Kim Kyungsoo e se fosse provada a paternidade de Siwon... Donghae nem sequer conseguia pensar nisso sem querer chorar de frustração.

Eles estavam presos ali. O decreto do Conselho obrigava Siwon a cumprir sua pena no território Kim e o ômega não poderia se afastar do marido, não só por conta da marca, mas também pela forma como eles eram casados. Eram uma dupla. Donghae nunca o deixaria para trás. E ter Jongdae como filho... o filho mais velho de Siwon, um filho que conspirou contra a ascensão de Junmyeon a liderança do Clã, que sequestrou um membro da Família Principal... isso só o fazia conivente com tudo aquilo, como se Siwon realmente soubesse e apoiasse tudo o que Kim Jongdae fez.

Sem perceber, aquele lobo os levara junto para a cova.

Apertou as mãos envolta da grade do berço e fechou os olhos. Não deixaria que ninguém tocasse em Ji Eun, se assegurou. Ninguém naquele mundo machucaria sua filha, disso, ele tinha certeza.

— Senhor Donghae? — escutou e virou o corpo muito rápido em direção a voz, assustado com a forma como foi tirado dos seus pensamentos. — A porta estava aberta, então eu não vi problema em entrar. — Minseok pareceu envergonhado ao olhar para baixo e Donghae relaxou.

— Tudo bem. — falou e soltou a grade do berço, suas mãos estavam doendo do tanto que fizera força ali. — Siwon deve ter esquecido de trancar quando saiu.

Desviou os olhos para o que o outro segurava. Havia uma cesta na sua mão.

— O que é isso? — perguntou e se afastou do berço para olhar de perto o que o genro trazia.

— Ah. — ele falava de um jeito suave, Donghae gostava do tom de voz de Minseok. Era sempre tão educado e quieto, um tanto diferente do seu gêmeo e todos os outros Kim’s da sua família. — Trouxe algumas verduras e frutas da feira, achei que poderia gostar. — explicou e estendeu a cesta em sua direção. — Heechul disse que não pode ficar fazendo tanto esforço, então achei que fosse uma boa ideia.

Donghae esticou o pescoço para ver e acabou sorrindo mais um pouco. Haviam cebolas, tomates, alfaces, rúculas e outras tantas coisas. Realmente, Minseok era doce, pensou ainda com o mesmo sorriso no rosto.

— Obrigado. — agradeceu. — Vamos levar isso para a cozinha. — empurrou o ômega em direção a saída e Minseok riu enquanto era guiado para fora dali.

A cozinha não ficava longe, a casa não era grande. Bem diferente da sua casa no território Byun. Ali não haviam escadarias e quartos de hóspedes e muito menos corredores extensos, o que facilitava a locomoção, mas não afastava a saudade. Donghae se pegava constantemente querendo seus pertences de volta, seu quarto, suas roupas, o quarto da sua filha, a sua cozinha. Esperava poder voltar para casa logo, ao menos lá sabia que teria alguma paz.

Minseok deixou a cesta sobre a mesa da cozinha enquanto Donghae ia até a geladeira. Abriu-a e estendeu a mão na direção do genro, que começou a lhe entregar as verduras e frutas para que pudesse guarda-las adequadamente. Fizeram isso em silêncio até o momento em que acabou, o loiro apoiou o quadril na beira da mesa e Donghae o fitou de canto de olho antes de fechar a geladeira. Não era de agora que notava a forma cabisbaixa com o que o Kim se comportava, como se não estivesse dormindo bem, como se alguma coisa o estivesse incomodando. Donghae reconhecia os sintomas, porque os via em si mesmo, no entanto, consigo era apenas a preocupação com a segurança da sua filhote.

— Está tudo bem? — resolveu perguntar de uma vez, a voz saiu suave demais, o tom que costumava usar com Baekhyun quando o percebia no mesmo estado.

Baekhyun era um tanto fechado demais, sempre achava que podia resolver tudo sozinho. Salvar o dia em um piscar de olhos sem demonstrar nenhuma fraqueza sequer e Donghae confiava que ele podia fazer isso. Com toda certeza. Contudo, ainda era seu filho e não gostava da forma como ele parecia carregar o mundo nas costas, aquelas responsabilidades todas. Quando o alfa casou, o Lee acreditara que aquilo ia destruí-lo de vez, mas depois de alguns meses, se deu conta de que o matrimônio forçado foi a melhor coisa que acontecera consigo, pois nunca o vira tão relaxado quanto na presença de Minseok.

O ômega virou-se de frente para a mesa e apoiou as mãos ali, a testa estava enrugada de um jeito adorável, mas os olhos pareciam sérios demais. O mais velho percebeu que ele pensava, parecia pondera quais palavras usar para responder aquela pergunta, o que só serviu para deixa-lo preocupado. Minseok era recluso, teimoso e orgulhoso como o filho alfa, então não era surpreendente poder lê-lo tão rápido e fácil quando como lia os trejeitos de Baekhyun. Mas então, ele o estava fitando, virou o rosto na sua direção para fazê-lo e os olhos estavam marejados ao encontrar os seus.

Donghae abriu os braços e Minseok correu tão rápido na sua direção, tão ávido por algum consolo, que o mesmo não conseguiu não sentir aquela fração de compaixão por si. O abraçou de volta, com força, as mãos afagaram-lhe os cabelos da nuca e o meio das costas num carinho paternal o suficiente para que escutasse o primeiro fungar do mais novo, contra seu pescoço, Minseok havia começado a chorar. Donghae o aparou, em frente a geladeira fechada, guardou todas as suas lágrimas sem entender muito bem de onde elas vinham. Contudo, não demorou muito até que o Kim se afastasse de si, limpando os olhos um tanto envergonhado com a sua atitude.

— O que aconteceu? — tentou mais um pouco depois de tê-lo feito sentar em um dos lugares à mesa vazia.

Minseok segurou-lhe as mãos e o fitou, os olhos bonitos ainda com os cílios molhados. Parecia ao ponto de voltar a se debulhar em lágrimas, mas mordeu o lábio inferior com força e suspirou, decidido a engolir todo aquele choro. Donghae deixou tapinhas reconfortantes nas suas mãos e se ofereceu para fazer um chá, enquanto o ômega pensava no que falar ou como falar. Escutou-o suspirar mais algumas vezes às suas costas, mas nenhuma palavra saiu da sua boca, o que fazia o mais velho se perguntar se aquela recusa em se mostrar era culpa do orgulho ou da vergonha.

O genro sempre lhe pareceu muito resistente, o queixo firme costumava deixa-lo curioso e um tanto preocupado. Sempre achara que Baekhyun precisava de alguém com a personalidade oposta a si para poder se equilibrar, uma contraparte dócil e obediente para fazê-lo relaxar. Havia sido assim consigo e Siwon, tinham suas particularidades acentuadas a tal ponto que não havia escapatória além de se deixar encaixar e aceitar isso. Contudo, quando Minseok entrou na vida deles, com seus olhos felinos e uma teimosia tão aguda quanto a do filho, Donghae achou que eles seriam infelizes até o fim dos dois anos de contrato.

Mas Dal tinha suas próprias maneiras de escrever as coisas, quando permitiu que Donghae acompanhasse a forma como suas personalidades parecidas se encaixavam tão bem quanto se fossem diferentes. Minseok e Baekhyun combinavam de uma forma engraçada, mesmo que ainda tivessem que aprender alguns detalhes aqui e ali sobre comunicação, ainda se davam mais que bem. O Lee via e duvidava muito que ninguém mais fosse capaz de vê-los, porque Minseok sorria tão brilhante quando estava com Baekhyun, que bem podia cegar um desavisado.

Colocou o chá sobre a mesa, serviu o genro e se serviu. Então, sentou-se e esperou. Minseok torceu o nariz para o cheiro de camomila e Donghae ergueu uma sobrancelha, desconfiado, afinal não fazia o feitio do ômega demonstrar recusa daquela forma. Viu quando a mão dele ergueu-se e tapou a boca, então, ele estava afastando a cadeira e correndo pelo corredor atrás do banheiro mais próximo. O Lee encarou o chá na sua xícara, segurou a alça e aproximou do seu nariz. Estava atrás de algum cheiro estranho que pudesse explicar a o mal-estar do outro, mas não encontrou nada. Camomila continuava sendo apenas camomila.

Bebeu um pouco e resolveu esperar o ômega mais novo voltar, coisa que não demorou muito. Parecia mais envergonhado que antes e um tanto pálido também, Donghae pensou enquanto o via se aproximar da mesa e tomar o seu lugar novamente.

— Sinto muito por isso, senhor Lee. — desculpe-se baixinho numa educação que sempre deixou o mais velho maravilhado.

Gostava de Minseok, essa era a verdade. Gostou dele desde o primeiro momento em que o viu, ainda um filhote nos braços de Heechul. E gostou mais ainda quando o viu em sua forma de lobo, tomando o seu lugar na cerimônia que o tornou marido de Baekhyun. Aquele garoto tinha força, gostava disso também. A teimosia que escorria dos seus poros era facilmente convertida em coragem e determinação, era um pouco assustador, mas não menos maravilhoso. Talvez, fosse isso que Baekhyun via nele. Toda aquela fração de possibilidades que ele tinha, se comportando como se não fosse nada além de um ômega.

— Está tudo bem.  — sorriu e esticou as mãos sobre a mesa para alcançar as do genro. — Baekhyun me disse que está doente. — era mentira, o filho não tinha lhe contado coisa alguma, mas achou que estava na hora de conseguir algumas informações.

— Não é nada demais. — Minseok afastou a xícara de chá, o mais longe que conseguiu.

Aquele cheiro doce estava o deixando enjoado novamente e não havia mais nada no seu estômago que pudesse vomitar. Era frustrante, porque estava com fome. Mas toda vez que tentava colocar qualquer coisa na boca, terminava inclinado na pia mais próxima vomitando tudo.

— Você quer me contar sobre isso? — o tom era terrivelmente suave e o ômega Kim suspirou, estava cansado daquilo.

Não queria contar primeiro para Donghae sobre aquilo, esperava poder encontrar Baekhyun logo e dizer aquilo de uma vez, mas estava tão cansado da forma como sua família o estava tratando. Seus pais e seu irmão alfa, lançando-lhe olhares horríveis como se ele fosse o vilão da história. Não era e muito menos o filhote que carregava no ventre. E ir ali, com os Byun’s... terminar na presença reconfortante de Donghae... só sentia vontade de chorar, porque na sua mente soava como traição, como se estivesse escolhendo a qual lugar pertencia.

Apertou as mãos do sogro em resposta. Se todos iriam o desprezar, no fim das contas, então não importava a ordem com que aquela noticia podia chegar ao ouvido dos outros. Piscou os olhos e mordeu o lábio, suspirou e abriu a boca, estava pronto para chutar o balde de uma vez.

— Eu... eu estou grávido.

A sentença soou mais simples do esperava e o sorriso que surgiu no rosto do mais velho, o surpreendeu. O Lee apertou sua mão com mais força e abaixou a cabeça, meio sorrindo.

— Eu sabia! — subitamente exclamou e Minseok se pegou rindo daquilo tudo, principalmente quando o outro levantou-se e foi na sua direção, abraçou-o desajeitadamente por conta da forma como o Kim continuava sentado. — Isso é maravilhoso, Minseok. — assegurou ao mesmo tempo que o ômega abraçava-o de volta. — Era por isso que estava chorando?

— Eu não tinha certeza se era uma boa notícia. — externou e o Lee acariciou seus cabelos.

— Claro que é uma boa notícia. — sorriu mais um pouco e se afastou para fita-lo. — Eu vou ter mais um neto, é uma ótima notícia.

Minseok sorriu de volta, deixou que o ômega se afastasse até o seu lugar na mesa. Donghae continuava sorrindo para si, orgulhoso do que escutara, fazendo o ômega mais novo aquecer-se inteiro. Não sabia o quanto dependia daquela aceitação até o momento em que sentiu os ombros relaxarem, parecia-lhe que um peso havia sido tirado das suas costas.

— Baekhyun já sabe? — perguntou e o loiro negou. — Quer fazer uma surpresa? — seus olhos estavam brilhando e Minseok achou graça daquilo tudo.

Donghae parecia um adolescente, tão mais novo do que si, ao estar tão cheio de entusiasmo com aquilo.

— Na verdade, não sei como contar algo assim. — confessou. — Nós nunca falamos sobre isso e... — comprimiu os lábios.

— Vai ficar tudo bem. — sorriu-lhe mais um pouco. — Baekhyun é um bom alfa, apesar de ser um pouco ranzinza, as vezes. — Minseok riu.

Mas antes que pudessem continuar com o assunto, escutaram a porta da sala se abrir e logo, Baekhyun estava ali, na entrada da cozinha. Vestido nas suas roupas sociais, a gravata no pescoço e sem o terno do conjunto. Afrouxou a gravata quando entrou na cozinha, cumprimentou o pai e depois o marido, seguiu até a geladeira e pegou uma garrafinha se suco antes de se encostar na bancada da cozinha, os olhos, vez ou outra, passeando pelo rosto do ômega Kim.

— O que estão fazendo? — perguntou apenas para beber um pouco do suco no segundo seguinte.

— Minseok veio me fazer companhia. — Donghae esclareceu ao virar-se na cadeira para fitar o filho.

— Como foi lá? — Minseok perguntou, calmo, colocou as mãos sobre as coxas.

Baekhyun deixou a garrafinha sobre a bancada e comprimiu os lábios ao mesmo tempo que o marido erguia uma sobrancelha e suspirava. Donghae intercalou o olhar entre os dois, de repente, confuso com o que acontecia ali, mas não insistiu, deixou-se esperar.

— Normal. — o filho respondeu, por fim.

Mas soube no momento em que a palavra saia da sua boca, que era mentira. Baekhyun estava mentindo sobre seu encontro com o irmão de Minseok, o líder alfa Kim Junmeyon. Um encontro forçado, o Lee tinha que admitir, quando o filho fora convidado a se apresentar na Sede da Alcateia Kim para prestar depoimento como se fosse um criminoso. Siwon também fora convocado e até mesmo Chanyeol havia recebido sua parcela de atenção do líder Kim, apenas, ele, Lee Donghae, ficara de fora. Agradecia por isso, porque não saberia como se comportar como um bom ômega diante de alguém que tinha suspeitas do caráter dos seus filhos e marido.

— Bom. — o loiro abaixou os olhos para o tampo da mesa, ergueu a mão direita e deslizou a ponta do dedo indicador ali. — Talvez, ele pegue leve comigo também. — falou baixinho atraindo a atenção do ômega mais velho.

— Junmyeon vai mesmo interrogar você? — havia aquela ponta de indignação na sua voz, que deixou o outro ômega um tanto chateado.

Claro, que Junmyeon ia interroga-lo. Como se este não fosse nada além de um criminoso, como se realmente houvesse razão para que não quisesse o irmão na liderança. Era insano, frustrante e um tanto decepcionante ser colocado naquela posição apenas porque seu marido era alguém de sangue Byun. Chateava-o de uma maneira que não deveria acontecer e que só servia para alerta-lo sobre o mau momento para se ter um filhote, contudo, quis acreditar que depois do seu interrogatório, Junmyeon ia poder confiar em si novamente.

— Apenas uma burocracia. — Baekhyun meteu-se no assunto, quis poupar que o pai soubesse da terrível verdade que os rondava.

Minseok lançou-lhe um olhar significativo, quis se aproximar, mas não o fez. Apenas fitaram-se de onde estavam, nada de palavras verbalizadas. Existiam apenas trejeitos tão fáceis de se ler, que fazia ambos se surpreenderem com a familiaridade de tudo.

— Onde está Chanyeol? E Siwon? — agora, Donghae parecia ansioso.

— Chanyeol está com Kyungsoo e Appa foi resolver algumas coisas. — Baekhyun virou-se de frente para bancada, segurou a garrafinha de suco e bebeu mais um pouco, voltou a deixar a garrafinha sobre a bancada e virou-se para fitar o marido. — Nós precisamos conversar. — a voz saiu mais séria do que pretendia, pegando o ômega totalmente de surpresa e fazendo Donghae comprimir os lábios.

— Eu vou ver como Ji Eun está. — o mais velho levantou-se e saiu, apressado.

Os que ficaram, se limitaram se fitarem por tempo suficiente para que o alfa decidisse se aproximar quando Minseok não o fez. Baekhyun fitou o jogo de chá florido sobre a mesa, a xícara cheia, que deveria pertencer ao ômega, um tanto afastada de si. Viu a xícara do pai, meio cheia. O chá parecia ter sido preparado há bastante tempo quando não via mais a vapor subindo do bule. Ele segurou o alto do encosto da cadeira e subiu os olhos até o rosto do Kim.

— Pergunte de uma vez. — Minseok pediu, um pouco cansado de todo aquele silêncio.

— O que havia entre você e Kim Jongdae?

Minseok comprimiu os lábios e desviou os olhos dos do alfa. Não estava esperando por essa pergunta, exatamente, mas também não sabia dizer o que estava esperando. Parecia óbvio que Jongdae contasse sobre eles ao irmão, coisa que só servia para Junmyeon acreditar na ideia boba de que fizera parte de um plano mirabolante para tirá-lo do poder e com adição da paternidade do Kim, tudo parecia convergir para isso. O ômega tinha que admitir que aquela série de maus entendidos estava se tornando cada vez mais interessante ainda mais quando seu nome parecia cada vez mais comum ali. No entanto, a pergunta de Baekhyun, a forma séria como as palavras saíram da sua boca... aquilo o tinha pego de surpresa.

Não pelo conteúdo da pergunta, mas a forma acusatória com que fora proferida. Baekhyun era a última pessoa do mundo que queria desconfiando de si.

—Éramos namorados. — respondeu, de uma vez, numa calma que pegou Baekhyun de surpresa.

O alfa fitou-lhe o rosto mais um pouco e então, decidiu que era melhor sentar. Cruzou os dedos a sua frente, sobre a superfície da mesa e esperou que o Kim dissesse mais alguma coisa, mas não houve nada.

— É isso? — o Byun irritou-se.

— É isso. — Minseok devolveu com o mesmo franzir de testa, igualmente irritado. — Namoramos no passado e fim da história.

Baekhyun bufou e cruzou os braços ao mesmo tempo que Minseok virava o rosto para o lado. Parecia irritado demais por uma coisa tão pouca, Baekhyun notou e quis insistir naquilo, porque Junmyeon havia jogado aquilo na sua cara, fazendo Minseok parecer um vilão, como se ele estivesse enganando-o enquanto estava por aí na companhia de Jongdae armando um golpe. Mas aquilo não fazia sentido, se assegurou. Kim Minseok não se comportaria daquela forma nem em um milhão de anos, simplesmente porque não almejava o lugar do irmão quando era Ômega Principal nos Byun’s e não podia estar tendo um caso com aquele prisioneiro simplesmente porque... porque Minseok não fazia o tipo que brincava com os sentimentos de terceiros.

Havia sido expulso da Academia por um motivo, não?

Ficaram em silêncio. Minseok ergueu a mão e levou até o cabelo, ajeitou o que não estava fora do lugar e Baekhyun, descruzou os braços apenas para estender a mão pela superfície da mesa e segurar a mão do marido, quando esta se abaixou. Eles fitaram-se e Minseok suspirou mais um pouco, ainda irritado e Baekhyun quis rir do jeito como os olhos dele pareciam perigosos, mas se atreveu só a puxar-lhe a mão na sua direção e logo, Minseok estava ficando de pé e indo até si. Terminou sentado sobre suas coxas, o queixo apoiado no seu ombro, pequenos atos que serviram para deixar o silêncio confortável.

— Junmyeon me disse coisas sem sentido. — Baekhyun lhe sussurrou.

Minseok fechou os olhos.

— Eu não estou traindo você. — assegurou no mesmo tom, mas havia uma ponta de divertimento no final da frase, que fez o alfa rir. — Também não quero o cargo do meu irmão ou estou me vingando. — continuou, mas o tom divertido não estava mais ali. Existia apenas a autodefesa. Baekhyun abraçou-o mais forte. — Eu e Jongdae não temos nada.

— Não estou por trás do sequestro de Kyungsoo. — Baekhyun devolveu. — E muito menos Chanyeol ou meu pai.

Isso é impossível. — Minseok teve coragem de imitar a voz do irmão e Baekhyun riu, alto. — Byun’s são maus. — afastou-se para fita-lo.

— Kim’s são traiçoeiros. — Baekhyun devolveu. — Enganadores. — continuou e o Kim sorriu antes de se aproximar para beija-lo. — Acho melhor sairmos daqui. — sussurrou entre um beijo e outro.

— Concordo plenamente.

Eles sorriram mais um pouco antes de realmente ficarem de pé e irem para o quarto em que Baekhyun estava hospedado por aquele período. Minseok sabia que não era para sempre, depois do casamento do seu irmão, o alfa voltaria para a sua Alcateia e toda vez que pensava nisso, não sabia de onde vinha a vontade de acompanha-lo. Nos seus momentos de reflexão, se pegava sentindo falta da Alcateia Byun, do cheiro, dos lobos, da casa. Era estranho, pois nunca realmente a considerara como lar, mas quanto mais tempo passava longe com mais saudade parecia sentir e ficava pior com a forma como sua própria Alcateia se tornava estressante.

E havia lido em algum lugar como estresse não fazia nenhum bem para pessoas grávidas, podia prejudicar o bebê. Não queria perder seu bebê, apesar de todas as circunstancias que o cercavam. Queria tanto aquela criança, que se surpreendia com a força, mas sabia que precisava ser cuidadoso. Precisa fazer os exames corretamente, tomar as vitaminas, se alimentar de maneira saudável. No entanto, acima disso, precisava contar a Baekhyun.

O problema nisso era que contar a Baekhyun, implicava em contar tudo e isso, o apavorava.

— O que foi? — o alfa sussurrou contra seu pescoço depois que chegaram no quarto.

A porta havia sido fechada com um chute e sentado sobre a cômoda, Minseok detinha o marido entre as pernas. Ainda usavam roupas, apesar da pressa. Contudo, o ômega distraíra-se com seus pensamentos, com aquela coisinha crescendo na sua barriga.

— Eu preciso de contar uma coisa. — o loiro se escutou dizer, a voz nervosa.

Baekhyun ainda deixou um último beijo no seu pescoço antes de se afastar para fita-lo. Havia uma sombra no seu olhar, escondia toda a astúcia que o Byun estava acostumado a ver, deixava-o apenas ver a insegurança, flutuando, solitária, ali. Ergueu a mão e acariciou-lhe a bochecha com o polegar, tentando dar alguma segurança ao que marido queria lhe dizer. Parecia importante o suficiente para que Minseok lhe mostrasse aquela face tão frágil.

— Eu conheci o Lu Han na Academia. — começou e o Byun piscou, sem entender onde o outro queria chegar com aquele assunto. — Ele já era líder quando nos conhecemos, estava quase se formando. — molhou os lábios com a ponta da língua.

— Por que está me contando isso?

— Lu Han teve metade da alcateia assassinada na época em que fiquei noivo de Sehun. — continuou e Baekhyun franzio a testa, ainda confuso. — Ele me procurou e pediu ajuda.

— Minseok...

— Lu Han me propôs uma aliança. — a mão do alfa deslizou até o seu ombro, apertou ali, apreensivo. — Meu filho se casaria com Yixing, então nossos clãs sempre estariam juntos. — retirou a mão do marido do seu ombro e guiou-a até sua barriga, a palma de Baekhyun estava quente mesmo sobre o tecido da sua camisa. — E eu... nós... — as palavras travaram na ponta da sua língua, dispersaram-se numa rapidez tão grande que tudo que conseguiu fazer foi observar a forma como a boca de Baekhyun se abria e os olhos se arregalavam. — Me desculpe. — sussurrou, por fim.

O Byun afastou a mão da barriga de Minseok, deu um passo para longe de si. Os olhos ainda arregalados. Colocou a mão em frente a boca e afastou-se mais um pouco do ômega, até sentir a beira da cama bater contra suas pernas, se deixou cair sentado ali e de lá, fitou o Kim mais um pouco. Estava terrivelmente triste, como se ao ponto de derreter-se em lágrimas às primeiras palavras do Byun. Viu-o abaixar a cabeça, as mãos estavam apoiadas na beira da cômoda, segurando a madeira com força. A roupa amassada, as marcas avermelhadas na pele do seu pescoço, onde Baekhyun demorara os lábios e dentes, o corpo inteiro tenso, fazendo força para não se encolher em arrependimento ali em cima.

A história chegou aos seus ouvidos mais uma vez, ganhou uma oitava a mais de arrependimento. Baekhyun se viu analisando as palavras na mente, lembrando-se dos enjoos repentinos de Minseok, da forma como seu cheiro estava diferente e do jeito como foi incrivelmente idiota por não notar. Os sinais estavam ali o tempo inteiro, piscando diante dos seus olhos e mesmo agora, quando a verdade estava estampada em tudo, não conseguia acreditar. Não sobre a gravidez em si, era sobre a historinha por trás dela, era sobre a forma como aquilo tudo soava como manipulação aos seus ouvidos.

Kim Minseok o usara para engravidar.

— Você me usou? — saiu mais baixo do que queria, cheio de uma indagação nervosa que não queria mesmo saber a resposta.

O ômega ergueu o olhar para si, não estava chorando, mas parecia terrivelmente perto disso. O castanho brilhava tanto em desculpas que o alfa nem sequer precisava escutar da sua boca a resposta, estava estampada em cada detalhe daquela pessoa.

— Não é do jeito que parece. — ele respondeu.

— E como devia parecer? Você tinha um trato e cumpriu a sua parte? — o tom ácido não deveria estar ali, mas não conseguiu controlar sua intromissão.

— Eu cumpri a minha parte. — Minseok disse, como se aquilo fosse mesmo um dever, como se não fosse nada demais.

— Parabéns. — Baekhyun ficou de pé. — E qual é a minha parte? Eu tenho alguma parte nisso além de semeador?

— Se estivesse no meu lugar, teria feito o mesmo. — demandou numa firmeza que Baekhyun não entendia de onde vinha.

— Não. — balançou a cabeça, mordeu o lábio e ficou de pé. — Eu teria te contado antes de... de isso acontecer. — apontou pra barriga do ômega.

Minseok mordeu o lábio e abaixou o rosto, a primeira lágrima desceu rápido. Pingou sobre a sua roupa e sumiu, a segunda demorou mais a descer e a terceira, travou no canto dos seus olhos, como que indecisa sobre toda aquela culpa. Havia mesmo usado Baekhyun, essa era a verdade mais terrível de todas. Não importava quantas vezes contasse aquela história, o quanto repassasse as palavras na mente, tudo sempre soaria como uma grande manipulação, tudo que eles construíram até ali se resumiria a ilusão. Minseok apenas brincara com os sentimentos do marido ao ponto de chegar no seu objetivo, mas não era isso. Nunca foi sobre isso, apesar de tudo.

O Byun o observou e quis tanto se aproximar, que tudo que conseguiu fazer foi ir até a porta e sai dali. Saiu de casa numa velocidade avassaladora, entrou em seu carro e dirigiu para o mais longe que podia de Minseok, apenas para terminar em uma beira de estrada qualquer, socando o volante do carro tamanha a raiva que sentia da forma como mesmo com tudo isso, ainda queria voltar lá e abraçar o marido, escondê-lo do mundo, impedir que mais lágrimas molhassem o seu rosto sempre tão bonito.

Uma parte sua queria pousar a mão sobre a barriga do marido mais um pouco, ficar lá por tempo suficiente para que tudo aquilo fizesse sentido. Havia uma vida crescendo ali, apesar de tudo. Havia alguma coisa ali que teria as suas características, que — talvez — nascesse com os olhos de Minseok. Havia um herdeiro Byun crescendo ali. Havia... havia seu filho lá, desenvolvendo-se de tal forma que só fazia Baekhyun acreditar em como aquilo era loucura. Não queria ser pai. Nunca pensara nisso realmente, apesar de saber que precisava de herdeiros, mas tudo sempre pareceu tão distante. Era como uma ideia, um afazer que ele sempre poderia empurrar e empurrar para o dia seguinte à fora sem nunca concretizar ou pensar muito sobre. Contudo, o amanhã tinha chegado. Estava ali.

Estava ali e Baekhyun não sabia o que fazer. Pela primeira vez, não havia um plano estratégico na sua mente, não podia resolver isso com dinheiro ou qualquer outro aparato. Não podia controlar e isso... isso era apavorante.

Segurou o volante com força e deu meia volta. Não estava voltando para a Alcateia Kim, estava indo direto para casa, a sua única casa. Aquela que ficava no território Byun. Pisou no acelerador e tentou chegar lá o mais rápido possível, estacionou o carro do lado de fora do condomínio, em um lugar que lhe pareceu discreto e andou o restante do caminho até a entrada do lugar. O portão havia sido consertado, medidas de segurança haviam sido tomadas para evitar qualquer outro ataque ou a invasão de repórteres humanos. Esses últimos apareciam eventualmente, agindo como se fossem moradores do local, queriam entrar e tirar fotos, queriam uma declaração sobre a bagunça que aquele lugar se tornou da noite pro dia. Mas Baekhyun havia dado ordens contra isso.

Nada de declarações, nada de informação alguma. Kangin o apoiou e nenhum lobo do seu território ousou dizer qualquer coisa, na verdade, maioria deles haviam se tornado reclusos àquele lugar. Alguns poucos ainda saiam para cumprir seus papéis de bons cidadãos humanos, alguns serviam como observadores e traziam informações quando voltavam para casa. Baekhyun tentava participar de tudo apesar de estar longe, não queria dar a entender que havia abandonado seus lobos apenas para se esconder atrás dos muros do território Kim.

Ele andou pelo lugar até chegar em sua casa, passou pela porta e foi em busca de Kangin, o seu Beta Principal, aquele que o auxiliava na tomada de decisões. Subiu as escadas, dois degraus de cada vez, alcançou o corredor e foi até o escritório. Sabia que ele estaria lá, era onde a maior parte do trabalho acontecia, no fim das contas. E como Kangin era praticamente da família, não havia problema em deixa-lo frequentar o local.

O alfa parou em frente ao escritório e segurou a maçaneta, respirou fundo e girou-a. Tinha consciência da sua roupa social sem o terno e a gravata frouxa, mas não se importava realmente. Contudo, ainda assim, quando entrou, levou a mão até o cabelo escuro afim de arrumá-lo. Os olhos encontraram a figura do beta em pé, em frente à mesa, meio inclinado sobre alguma coisa, usando o mesmo estilo de roupas sociais que si e sentada à mesa, estava Dasom. Os cotovelos apoiados ali, a manga da camisa branca dobrada até perto dos cotovelos e o cabelo escuro preso em um rabo de cavalo.

— Baekhyun? — ela falou primeiro, surpresa, chamando a atenção do beta e o fazendo se virar para fitar o líder. — O que faz aqui?

— Eu moro aqui. — respondeu mau-humorado e se aproximou da mesa. — O que você faz aqui? — lançou um olhar para o mapa da alcateia Byun aberto sobre a mesa, notou pontos vermelhos marcados ali assim como azuis e verdes.

Dasom estava o fitando ainda quando corou, mas o alfa não prestou atenção. Voltou a erguer o rosto e lançou um olhar para Kangin, esperando uma explicação para aquilo.

— Kangin, por favor, nos deixe à sós. — a prima se dirigiu ao beta, que lançou um olhar para o alfa, seu lobo, afinal. Respondia ao líder.

Baekhyun assentiu ao outro, liberando-o para sair. Então, puxou a cadeira mais próxima e sentou-se em frente à mesa, apoiou os cotovelos ali ao mesmo tempo que Dasom descansava as costas no encosto da cadeira, a coluna reta. Os olhos estavam dóceis quando voltaram a pousar no rosto do alfa e o sorriso que surgiu no seu rosto pegou-o desprevenido.

— Surpresa. — disse rindo e Baekhyun balançou a cabeça em negação antes de rir também. — Você deveria ter chegado apenas na segunda, não hoje.

— Está aqui desde quando?

— Desde quando soube das dificuldades da sua alcateia e sobre a quebra da aliança Park-Byun. — o alfa suspirou.

— Ele te disse? — cruzou os braços.

— Mais ou menos. — as mãos dela descansaram sobre a superfície da mesa, havia um anel no dedo anelar da mão esquerda, nada simbólico, apenas um capricho. — Você terminou a aliança. — soou como uma acusação.

Baekhyun revirou os olhos.

— Dei ao seu pai o que ele sempre quis. — rebateu. — Não há mais nenhum tipo de vínculo entre Byun’s e Park’s.

— Mas ainda assim você é meu primo, sangue do meu sangue. — devolveu no mesmo tom.

— Meros detalhes.

— Está mesmo nos abandonando? — ela parecia mais ferida com aquilo do que qualquer pessoa ficaria, Baekhyun percebeu que para Dasom não soava como o fim de um contrato, mas o fim de uma família.

— Dasom, eu sempre vou ser seu primo. — decidiu usar um tom mais brando com a ômega. — Ainda sou um Park, apesar de tudo, apenas não temos mais negócios uns com os outros.

— Soa ruim mesmo usando esse tom. — ela soou magoada e Baekhyun mordeu o lábio, ficou quieto e esperou mais alguma coisa.

Dasom era a última das pessoas que queria magoar. A ômega era a próxima na linha de sucessão, ficaria no lugar do pai quando o momento chegasse e Baekhyun confiava nela para tornar aquela alcateia um lugar melhor, afinal a garota era dotada de um coração doce além da vontade de fazer diferente. Não havia ninguém melhor do que ela para limpar toda a sujeira que os Park’s alfas antes dela haviam construído, contudo, acima disso, ela era sua prima. A única pessoa do lado materno da sua família que o tratava como alguém de verdade, que não o julgava e que apenas ficava feliz por Baekhyun ser Baekhyun. Nada sobre o sangue Byun, nada sobre o passado da sua mãe, nada sobre os erros do seu pai.

Eles haviam crescido juntos e por terem idades próximas, haviam desenvolvido pensamentos parecidos. Teriam se casado antes da bagunça feita por Kim Jungsoo e quem sabe fossem felizes, mas com certeza não seriam amantes. O que havia entre os dois não passava de amor fraternal, nada além do amor doce entre irmãos e era por isso, que Baekhyun não queria magoa-la. Havia uma grande nuvem sobre as ações do pai, o amor incondicional e a admiração que ela nutria por ele a impedia de ver as coisas de uma forma clara. Baekhyun admirava isso, a grande capacidade que Dasom parecia ter em confiar nas pessoas, até mesmo pessoas horríveis como Park Hyukjae.

— Ainda podemos nos reunir nas festas de fim de ano, certo? — ela acabou perguntando, por fim, inocente demais para que Baekhyun quisesse estragar seu conto de fadas.

Havia a terrível sensação em seu peito, que não poderia poupa-la por mais tempo. Em algum momento, aquela nuvem sairia dos seus olhos e ela veria tudo na sua maior gama de realidade.

— Claro. — sorriu de volta, determinado a poupa-la o quanto pudesse. — Então, vai me contar o que é isso? — apontou com o queixo para o mapa sobre a mesa.

Dasom pareceu se animar.

— Os pontos verdes e azuis são os lobos da minha alcateia, os vermelhos são os seus. — ela ficou de pé e Baekhyun a acompanhou. — Eu e Kangin criamos um perímetro de guarda além de corrigirmos possíveis falhas, fechamos aqui — apontou para a parte leste onde um grande X estava. — e aqui.  — apontou para outro X perto dali. — Acreditamos que os humanos poderiam ter aproveitado dessa falha para entrar e então, abrir o portão.

— Bom trabalho. — elogiou e a Park sorriu mais um pouco. — Alguma notícia sobre os lobos desaparecidos?

— Kangin encontrou algo. — ela limpou a garganta e sentou-se, Baekhyun a observou de cima. — Na verdade, alguém. — esperou. — Um alfa da sua alcateia. — ela vasculhou embaixo do mapa, entre alguns papéis ali e puxou a foto de um homem de meia idade, o barba por fazer. — Aparentemente, ele foi descartado durante o caminho.

Baekhyun franzio a testa.

— Por que?

— Há algumas inconsistências no seu relato, mas de qualquer forma há algo estranho. — ela suspirou. — Ele disse que aqueles homens estavam atrás de ômegas.

O alfa deixou-se sentar, os olhos confusos para tudo o que a prima dizia. Por que humanos estariam atrás de ômegas? No entanto, no momento em que se fazia essa pergunta lembrava-se do que o pai alfa tinha lhe contado, da forma como eles teriam sequestrado apenas Donghae. Lembrou-se da perseguição deles com os Lu’s, um clã quase inteiramente formado por ômegas. Porém, por que ômegas? Afinal, como eles sequer sabiam da existência desse termo? Porque, se sabiam sobre ômegas, deveriam saber sobre alfas e betas e sobre toda a hierarquia deles. Se eles sabiam sobre ômegas, então com toda certeza sabiam sobre o que eles de fato eram e como viviam entre os humanos. O que surpreendia Baekhyun, apesar de tudo porque chegar nessa conclusão levava-o a perceber que os humanos estavam os observando há bastante tempo quando tinham escolhido justo uma data onde a alcateia estaria com a guarda baixa para atacar.

— Por que ômegas? — externou e Dasom suspirou.

— Talvez, por conta da forma como somos vistos como dóceis. — deu de ombros. — Aqui. — ela fechou um lado do mapa e puxou um papel de baixo do mesmo, colocou sobre o mapa e apontou o indicador nos números grifados. — Eu e Kangin fizemos uma contagem. — Baekhyun inclinou-se sobre o papel. — A quantidade de ômegas diminuiu, mas nada comparada com alfas e betas, maioria velhos e crianças.

Baekhyun comprimiu os lábios.

— Não parecem inclinados a exterminação. — o alfa falou e Dasom assentiu.

Se eles quisessem apenas mata-los, teriam feito isso ali, sem sequestro ou qualquer outra coisa. O Byun voltou a ficar de pé, colocou o polegar da mão direita na boca e mordeu devagar, andou de um lado para o outro, pensando em tudo o que a prima tinha de lhe dito. Da cadeira, Dasom apenas o observou ao mesmo tempo que o rosto do alfa se tornava cada vez mais sério como se uma ideia terrível estivesse se formando em seu pensamento. Ela esperou pelo momento em que ele a compartilharia, mas tudo que Baekhyun fez foi dizer, apressado, como precisava voltar para os Kim’s.

— Por favor, mantenha a alcateia segura para mim. — o Byun ainda pediu e Dasom assentiu.

Baekhyun desceu a escada correndo, esbarrou em Kangin no caminho, pediu desculpas e correu o mais rápido que podia para fora daquela alcateia. Havia um palpite na ponta da sua língua, depois de analisar a forma como os humanos pareciam ter mudado sua tática, a forma como o extermínio não era mais o principal objetivo. Eles estavam sondando os locais, se deu conta. Estiveram atrás dos Lu’s por anos, apenas para poder encontrar mais pistas de outras alcateias. Nunca estiveram os caçando, estavam os estudando, descobrindo falhas, reunindo dados apenas para encontrar o momento certo de atacar.

E haviam atacado os Byun’s. O próximo da lista só podia ser os Kim’s, tinha certeza. Parecia óbvio agora que realmente pensava sobre. Se estiveram os observando esse tempo inteiro, então deveriam saber a identidade daqueles que frequentavam a alcateia, deveriam saber sobre sua posição e por isso, deveriam saber quem era Kim Minseok. E se sabiam disso, conheciam sua família e conheciam o território Kim, a pequena vila afastada da cidade, localizada na estrada entre Incheon e Seul.

***

Jongdae encarou o ômega à sua frente, segurando o que parecia uma cesta de comida. Ficou onde estava, não ousou se aproximar, afinal não entendia o perigo que aquilo podia representar. Talvez, fosse algum tipo de teste, alguma brincadeira macabra que servia apenas para puni-lo no final. Então, permaneceu, mesmo que não tivesse mais o que perder. Alguma coisa em si desejava ao menos ser um bom prisioneiro, ter um bom comportamento.

— Você é Kim Jongdae, certo? — o ômega deu um passo em direção as grades, tentava observa-lo, ergueu a mão e fez menção de se encostar na grade.

— Isso é prata, eu não encostaria se fosse você. — o Kim decidiu falar, pegando o outro de surpresa e o fazendo recuar, envergonhado.

O ômega abaixou o rosto, segurou a alça da cesta nas duas mãos e então, suspirou.

— Você deve conhecer meu marido. — começou a falar, o rosto ergueu-se novamente e Jongdae avaliou seus traços, havia aquela certeza em si de que já o tinha visto. — Eu me chamo Lee Donghae e meu marido é o...

— Byun Siwon. — Jongdae completou e o ômega Lee engoliu em seco. — Meu pai.

A palavra pairou entre os dois, mas Donghae não pareceu nenhum pouco abalado. Jongdae se perguntou se ele não teria ido ali defender a honra do marido ou a sua, qualquer coisa assim. Para si, aquele ômega sempre tinha lhe parecido um tanto bobo além de superficial demais, por isso, não seria uma surpresa se ele pedisse silêncio do alfa, afim de evitar a humilhação de ter sua imagem manchada por conta de um filho bastardo.

— Bom, eu... eu trouxe algumas coisas pra você. — ele sorriu e foi tão doce, que o Kim se viu franzindo a testa, confuso com aquela atitude. — Há roupas e comida, algumas coisas pra sua higiene. — o ômega tornou a se aproximar da grade, inclinou um pouco a cesta de modo a deixar que o alfa visse o conteúdo, coisa que fez o Kim esticar o pescoço de onde estava para olhar. — Eu mesmo cozinhei. — parecia orgulhoso disso. — Talvez, a roupa fique apertada, já que eu peguei algumas peças do guarda-roupa do Baek, mas vocês parecem vestir o mesmo tamanho olhando daqui. — sorriu mais um pouco e Jongdae se sentiu seguro para se aproximar.

— Obrigado. — agradeceu baixinho e o Lee deixou a cesta no chão, perto o suficiente da cela. — Mas por que está fazendo isso?

— Eu só quis ajudar. — Jongdae comprimiu os lábios, esperava mais do que aquilo.

Onde estão os gritos e as acusações? As ameaças? Estava tudo errado, pensou. Todos estavam com raiva de si, ninguém apareceria ali só para ajuda-lo se ao menos tivesse conhecimento de tudo o que fez para prejudicar os Kim’s. Contudo, logo, estava se dando de algo importante: seu julgamento seria naquele mesmo dia, no fim da tarde. Então, de repente, pareceu-lhe óbvio o motivo da presença de Lee Donghae, aquela gentileza toda não passava de encenação. Uma encenação bem feita antes que o alfa fosse condenado a morte.

Chegar nessa conclusão, o fez abaixar o rosto. Mordeu o lábio e ficou em silêncio. Junmyeon estava lhe dando uma dica sobre o veredito? Siwon estava lhe rejeitando mais um pouco? Balançou a cabeça e voltou a fitar o ômega, pegou os olhos curiosos dele sobre si, estava tentand0 ler sua expressão.

— Você acha que eles vão me matar? — externou seu pensamento e Donghae balançou a cabeça em negação.

— Junmyeon não parece o tipo que suja as mãos de sangue só para provar que é o mais forte.

— Ele se sente ameaçado comigo aqui, com todos vocês aqui. — se referiu aos Byun’s e Donghae engoliu em seco, deixando o alfa saber que era verdade.

Junmyeon não poderia controlar seus lobos por tempo suficiente se deixasse Jongdae sair impune, vivo. No entanto, se fosse provada a sua paternidade, não poderia morrer. Isso ia abalar a aliança Byun-Kim, iria prejudicar Minseok e Jongdae duvidava muito que o alfa quisesse tornar a vida do irmão um inferno. No entanto, se Siwon o quisesse morto e tivesse combinado isso com Junmyeon... parecia uma boa saída para o dilema. Todos saiam ganhando no final. Mas havia Mas Lee Donghae negando isso estava bagunçando seus pensamentos.

— Siwon não ia te deixar morrer. — o Lee falou com firmeza.

— Apenas se eu for seu filho. — rebateu.

— E você não é? — ele cruzou os braços e Jongdae comprimiu os lábios.

Ele era. Tinha certeza. Foi a única que lhe restou depois de tudo que perdera, a certeza do sangue que corria em suas veias. A Avó com suas artimanhas o tinha confundido, bagunçado sua percepção de tudo apenas para que ele pudesse cumprir a vingança que ela não podia sendo tão velha e uma ômega. Jongdae, por outro lado, era um alfa e ainda tão novo... podia muito bem destruir sua vida com isso, mas a verdade tinha surgido. Derrubado todas as suas crenças e o tornado esse lobo inútil, amargo e assustado.

Siwon era seu pai. Ele era o mais velho, o verdadeiro líder de uma alcateia inteira. Não Baekhyun, muito menos Chanyeol, mas ele. Kim Jongdae. Havia sangue Byun nas suas veias, havia um proposito na sua vida, havia uma história inteira que foi lhe negada. E pensar nisso era tão frustrante, que tudo que o alfa queria fazer era poder voltar no tempo. Voltar ao dia que conheceu Minseok... Não! Voltar ao dia que aceitou aquilo tudo, queria poder encontrar o pequeno Jongdae de 12 anos e dizer não. Não estrague sua vida assim. Quem sabe, se pudesse fazer isso, poderia impedir que tantas pessoas terminassem machucadas.

— Essa possibilidade te preocupa?

— Então, não tem certeza?

Jongdae riu. Havia alguma coisa na curiosidade de Donghae que soava perigoso e o alfa se viu gostando disso, era melhor do que apenas a gentileza estampada nos seus atos. Fazia-o se sentir melhor sobre a iminência de uma reprimenda do que viver sob o olhar de compaixão, não combinava com aquele cenário. Não combinava com a pessoa que Jongdae acreditava que era.

— O teste de DNA vai me dar certeza.

Donghae não disse coisa alguma, apenas deu um passo para longe da cela ao mesmo tempo que a porta do porão se abria e sentinelas entravam por ali. O alfa levantou o rosto na mesma direção que o outro e os viu se aproximar, os betas vestidos em suas roupas de sentinelas prostaram-se em frente a sua cela antes de abri-la e pedir por sua saída. O Kim obedeceu sem dizer nada, estendeu os braços à sua frente para receber as algemas e só então começou a ser escoltado para fora do porão. O Lee fitou suas costas, totalmente esquecido ali.

O cabelo escuro de Jongdae colava-se na nuca e a barba por fazer escondia um pouco da sua expressão, contudo a camisa rasgada na lateral só servia para lhe conferir um ar de desleixo. Assemelhava-se a alguém miserável, Donghae se deu conta e não por conta do seu estado físico, mas sim, por conta do que havia nos seus olhos. Era apenas o castanho escuro, nada de esperança, nada de além de arrependimento e uma conformidade tão densa que fez o Lee se dar conta de que Kim Jongdae não via salvação alguma para si.

Os sentinelas continuaram a escolta-lo para fora, Donghae quis segui-los, mas não o fez. Manteve os pés onde estavam, desviou os olhos para a cesta que trouxera e depois, de volta, as costas do alfa. Aquele garoto de ombros baixos parecia ter o mesmo tamanho de Baekhyun e tinha um cheiro parecido também. O ômega reconheceu a nota cítrica estampada ali, como que alertando para alguma coisa. Parecia familiar, tinha certeza e não era por conta de Baekhyun, era sobre algo mais profundo, o que era estranho porque Siwon não tinha aquela nota no seu cheiro. Aquela nota cítrica que existia em Baekhyun era herança da sua mãe, Park Jihyun. Franzio a testa diante desse pensamento e mexeu os pés em direção àquele garoto.

— Espera! — exclamou chamando a atenção dos sentinelas e do prisioneiro. — Espera. — parou em frente a ele e subitamente segurou as mãos do alfa, virou as nas suas, procurou alguma coisa. — Onde está?

— O que está fazendo? — Jongdae puxou suas mãos das do ômega.

Donghae ergueu o rosto para si, havia alguma coisa nos seus olhos parecida demais com desespero.

— Vo-você tem uma marca de nascença?

O Kim o fitou totalmente confuso com o que escutava. Não entendia onde o outro queria chegar com aquela pergunta.

— Tem, não tem? No pé. — Donghae voltou a segurar suas mãos. — É uma manchina escura em forma de feijão. — Jongdae engoliu em seco e puxou as mãos para longe de novo.

— Eu não... — começou a dizer.

— Nós temos que ir. — o sentinela disse e começou a empurra-lo em direção a saída e dessa vez, Donghae não o impediu. Os viu sumir porta afora, ficou bastante tempo parado onde estava, tentando entender qual o propósito da sua atitude.

Contudo, a cada segundo que passava não conseguia afastar a certeza de que conhecia muito bem Kim Jongdae. O cheiro dele, o formado dos olhos e das mãos... não havia nada na sua aparência que lembrava Siwon ou o pai deste ou qualquer Byun. Não. Kim Jongdae não era um Byun, Donghae tinha certeza. E foi por ter tanta certeza disso, que ele se viu se esforçando para sair dali. Correu em direção a saída, precisava encontrar uma pessoa. A única pessoa que podia solucionar aquela confusão no seu peito.

Soube que não deveria correr no momento em que foi obrigado a parar, as mãos apoiaram-se nos joelhos e a boca se abriu atrás de um pouco de ar ao mesmo tempo que tudo ao seu redor começava a se tornar escuro. Não soube precisar o que deu errado, mas em um segundo estava tentando firmar os pés e no outro, estava caindo durante o caminho. Totalmente indefeso.

Enquanto isso, Kim Jongdae subia no pequeno palco onde seu julgamento aconteceria. Os sentinelas o guiaram até que ficasse em cima de um alçapão e colocaram uma corda envolta do seu pescoço, quando a sentença fosse dita em voz alta, terminaria batendo os pés no ar e morrendo sufocado. E pela primeira vez desde que pensava sobre isso, Jongdae chegava a conclusão de que estava tudo bem. Não tinha realmente medo da morte e dado os acontecimentos que o levaram até ali, não achava que poderia ter um destino melhor. Ao menos a morte por enforcamento, era melhor do que tortura ou qualquer outro tipo sádico de punição.

Ali, balançaria os pés por alguns minutos e então, morreria. Simples. Sem sujeira, pensou. Era só uma pena que não tivera tempo de usar os acessórios que o ômega de Siwon lhe trouxera, nem ao menos provara a comida do mesmo e isso, isso parecia ser o maior pecado de todos. Quem sabe, Lee Donghae o envenenasse de uma vez, menos dor? Talvez. Deu de ombros para esse pensamento ao mesmo tempo que pegava o olhar de Kim Junmyeon na sua direção.

O alfa havia acabado de subir no palco, escoltado por sentinelas, estava sozinho. Não havia nenhum Kim Principal consigo, o que foi uma surpresa para si porque realmente esperou que ao menos Minseok aparecesse, afinal dentre todos os Kim’s, ele parecia ser aquele que queria a sua cabeça com mais afinco. Junmyeon andou até o púlpito e ficou em pé ali, o rosto sério, determinado a não olhar na sua direção mais do que o necessário. O que era uma pena, Jongdae pensou.

Eles haviam sido amigos. Há um milhão de anos, quando Jongdae abaixou sua guarda, costumavam sair para beber, tinham conversas engraçadas e o Kim cogitara segui-lo até o fim, porque confiava no bom coração do outro. Mas isso pareciam fatos de outra vida, tinham acontecido com outra pessoa. Jongdae não se reconhecia naquelas lembranças assim como não se reconhecia nas lembranças mais ruins. Fora o sequestrador e carcereiro de Kyungsoo, o abusador de Minseok, aquele que mentiu para Ryeowook e para qualquer outro Kim? Era mesmo ele aquele alfa de cabelo escuro com desejo por vingança no peito?

Não via familiaridade nesse Jongdae. Não via familiaridade no Jongdae que ajudou Junmyeon bêbado, não se reconhecia em nenhum momento ao mesmo tempo que chegava a conclusão de que estava por ali. Seus pedaços estavam espalhados entre aqueles dois momentos. Haviam fragmentos seus em algum lugar, só precisava se esforçar para encontrar. Contudo, temia que não tivesse mais tempo para isso.

Seu julgamento estava começando, não havia nenhuma prova contra as acusações que eram feitas e ele mesmo havia admitido tudo. Não havia ninguém para reivindicar seu lado, não havia um lobo sequer do seu lado. Todos aqueles lobos Kim’s de plateia esperavam pelo momento em que seus pés estariam balançando no ar. Eles comemorariam que um criminoso, um traidor, foi morto. Ovacionariam Junmyeon por grande destreza em conduzir aquilo, em se provar um bom líder e não se deixar levar por emoções e lembranças. Líderes eram os mais fortes e por isso, não podiam deixar impune alguém que fez tão mau aos seus familiares.

— Estamos reunidos aqui — Junmyeon começou o seu discurso e Jongdae observou suas costas mais um pouco, não queria olhar para a plateia. — para o julgamento de Kim Jongdae. — na menção do seu nome, os lobos gritaram, animados. — Kim Jongdae está sendo acusado pelo crime de conspiração, sequestro e tentativa de assassinato.

— Traidor! Traidor! Traidor! — a plateia bradou, os punhos erguidos e Jongdae engoliu em seco.

— O acusado admitiu os crimes. — Junmyeon continuou.

— Forca! Forca! Forca! — continuaram esbravejando.

— Não houve nenhum pedido de reivindicação. — O Kim ignorou o que os lobos gritavam. — Por isso, eu, Kim Junmeyon, o líder do Clã Kim, condeno o prisioneiro por traição de sangue.

Jongdae ergueu seu queixo mesmo assim, os olhos estavam sérios apesar da forma como sentiu o canto dos mesmos se tornando úmidos. Junmeyon, não virou-se para fita-lo e o alfa agradeceu por isso, porque havia a terrível sensação de que desabaria em lágrimas de puro arrependimento se o ex-amigo o fitasse com o mesmo ódio que havia nas vozes dos lobos Kim’s. Permaneceu quieto, as mãos algemadas atrás de si, estava pronto para mergulhar pelo alçapão e pagar o seu crime.

Traição de sangue. Soava tão cruel quanto parecia, pois havia mesmo traído o seu próprio sangue, o sangue da Alcateia Kim. Mesmo que não fosse um Kim, ainda assim havia crescido como um, carregara esse sobrenome por tanto tempo e houve uma época que acreditara que não havia lugar no mundo que pertencesse mais do que a aquele Clã. Contudo, jogou tudo isso fora. Conspirou contra a ascensão de Junmyeon  ao cargo de líder, traiu sua confiança de tantas formas diferentes que nem mesmo se surpreendia pela forma como era odiado por todos e principalmente, pela Família Principal Kim.

Junmyeon afastou-se do púlpito, virou-se de frente para si e andou em direção a alavanca ali perto. O líder deveria dar o tapa inicial, Jongdae pensou e admirou a forma como o rosto do outro se tornava uma máscara terrivelmente séria e firme. Quis que o mesmo estivesse acontecendo na sua face, mas duvidava muito. Continuou mantendo o queixo erguido, decidiu desviar os olhos do rosto do líder. Se não olhasse para ele, poderia lhe dar algum conforto naquele momento, era o mínimo que podia fazer.

Deixou que seus olhos alcançassem a plateia. Haviam muitos lobos, em sua grande parte Kim’s. Soube que haviam Lu’s por ali, estavam dividindo o território, tinham construído suas casas e pareciam estar se saindo bem quanto a adaptação. Jongdae conhecera um Lu, uma vez. Fazia tanto tempo que se surpreendia com a forma como aquelas lembranças o encontravam tão rápido, devia ser culpa da morte iminente. Ouvira por aí, que a morte deixava as pessoas nostálgicas, que a vida passava como um piscar de olhos diante de si, que tudo era muito intenso nos últimos segundos de vida e talvez, fosse por isso que quando seus olhos pararam de vagar pela multidão e se fincaram em um único ponto o seu mundo inteiro estremeceu.

A boca se abriu e os olhos se arregalaram, sem perceber, se empertigou para frente. Mas o sentinela atrás de si segurou-lhe as algemas e o puxou de volta, chutou-lhe atrás dos joelhos e Jongdae caiu, arfando de dor. Junmyeon surgiu ao seu lado e pediu para o guarda o colocar de pé, o que ele fez com uma brusquidão que só arrancou mais gemidos de dor do prisioneiro. Contudo, Jongdae não se importou, pois no minuto em que conseguiu, virou o rosto novamente em direção a plateia e encontrou aquela pessoa novamente. Tentou se empertigar para lá mais uma vez, mas foi impedido. Junmyeon segurou-lhe o rosto, fazendo-o fita-lo.

— Junmeyon. — Jongdae implorou. — Me ajude a...

— Por favor, fique quieto. — o alfa pediu numa voz baixa e dolorosa. — Não torne isso mais difícil do que já é.

Jongdae o fitou, ambos pareciam compartilhar da mesma dor. Os olhos, a forma como a testa do líder se franzia, o jeito como a boca se comprimiu, tudo nele denotava o quanto odiava tudo aquilo. Não odiava Jongdae, odiava a situação e perceber isso, só serviu para fazer o alfa prisioneiro engolir em seco e firmar o queixo mais um pouco.

Junmyeon tinha algo na mão, estava brilhando em prata e Jongdae sabia o que era, por isso, não foi nenhuma surpresa quando sentiu aquilo tocando em sua bochecha esquerda, queimando sua pele. Quis gritar, mas segurou o máximo que conseguia, seus olhos nunca deixando o rosto do outro. Nós éramos amigos, pensou. Sentiu o sangue descendo por seu pescoço, quente contra sua pele e cheiro de ferro e sal alcançando seu olfato. Se perguntou se não incomodava o outro, teve sua resposta quando o alfa franzio nariz, mas ele não podia parar a marca no meio. Precisava completa-la e mostrar a todos o quanto Jongdae era um traidor, não passava disso. Estaria — literalmente — escrito em sua pele, no lugar mais evidente de todos, no idioma dos lobos ancestrais.

Depois o enforcariam, baniriam o seu corpo para qualquer outro lugar. Talvez, o jogassem na estrada como uma carcaça qualquer, deixassem os animais se aproveitarem da carne, mas não receberia um enterro. Traidores de sangue não recebiam nada além de indiferença e maldições. Seu espirito vagaria eternamente, sem um lugar de descanso, pagando pelo que fez ao seu líder e todos aqueles Kim’s. Traíra seu sangue, afinal.

Mas Jongdae não acreditava naquilo. Era baboseira. Não havia nada depois da morte além de escuridão. Seu espírito não vagaria por aí atrás de redenção. Esse tipo de coisa acontecia em filmes, não na vida real. Na vida real, Jongdae apenas sentia a dor de ser a pior pessoa do mundo inteiro e não poder chegar perto da única pessoa que uma vez importara na sua vida. Estava perto, quis rir com esse pensamento. Estava na plateia vendo o fracasso que ele se tornara, estava observando todos os seus erros.

Junmyeon afastou-se, soltou o seu rosto, limpou as mãos em uma toalha que o guarda lhe estendeu e Jongdae soltou o lábio que havia prendido entre os dentes. Sentia o gosto de sangue na boca também, no entanto, não se importava mais. Sua bochecha estava ardendo como o inferno e ele ficaria com uma cicatriz eterna na pele, mas estava tudo bem porque nem sequer viveria muito para tê-la cicatrizada.

Voltou a olhar para frente e procurou aquela pessoa, mas não a viu mais. O que o fez pensar que tudo não passava de um delírio pré-morte. Estava tendo alucinações ainda tão cedo, se repreendeu, ou poderia ter sido um sinal. Quem sabe, do outro lado — se realmente existisse — aquela pessoa o estava esperando. Aguardando-o para seguirem juntos para a escuridão eterna, afinal não havia chance alguma dele estar vivo e no meio daqueles Kim’s. Não fazia sentido. Kibum tinha lhe contado a história, a Avó confirmara: Lu Han estava morto.

Seu melhor amigo de infância, seu amigo magricela que ainda assombrava suas lembranças estava morto desde que não passava de um adolescente sendo despejado do Orfanato junto das outras crianças. Ele estava morto. Estava tão morto quanto sua mãe, tão morto quanto Sunhae, tão morto quanto todos os outros que conhecera. Lu Han estava morto, era a única verdade que ainda acreditava, porque não fazia sentido algum vê-lo ali se não estivesse morto.

Mexeu a cabeça em direção ao corpo de Junmyeon e dessa vez, o viu realmente perto da alavanca que roubaria sua vida. A mão dele pairou ali em cima, Jongdae notou seus dedos tremendo e sentiu vontade de xingá-lo, de provoca-lo a tal ponto que o mesmo puxasse aquilo com firmeza, mas não o fez. A plateia continuava gritando, incentivando-o a dar o golpe final, todos estavam esperando isso e Jongdae não conseguia culpa-los. Merecia aquilo mais do que qualquer um e acima disso, merecia ver Lu Han mais uma vez, então, não foi uma surpresa quando firmou o rosto mais uma vez em direção a multidão procurando por alguém que não existia naquela realidade.

— JUNMEYON! — todos escutaram, tão alto e carregado numa voz ativa de alfa que nenhum lobo jamais ouviu.

Aquele que era chamado virou o rosto em direção ao seu nome, Jongdae arregalou os olhos quando encontrou aquele que bradara o nome do Kim. Vinha avançando pela multidão, empurrando lobos, o rosto sério e o cabelo escuro caindo sobre a testa como se tivesse corrido até ali, mas Jongdae não entendia. O sangue secando na sua pele começou a deixa-lo com frio e só pareceu ficar pior quando Byun Siwon parou em frente ao palco, o queixo erguido e os olhos tão incrivelmente castanhos, que o prisioneiro se sentiu intimidado.

— Eu reivindico o prisioneiro Kim Jongdae.

A voz soou clara ao ouvido de todos, o silêncio veio como um cobertor. Cobriu todos com uma excelência que até mesmo Jongdae ficou com medo de respirar alto demais. E o sol não estava ali, tudo se tornava escuro, a luz das tochas, tudo parecia sombrio demais. Junmyeon recolheu a mão da alavanca, fitou o alfa mais velho, estava tão surpreso com tudo aquilo quanto qualquer lobo Kim.

— O tempo para reivindicações encerrou. — rebateu numa neutralidade que não combinava nenhum pouco com seus olhos confusos. — Kim Jongdae foi condenado por traição de sangue.

— Byun Jongdae. — Siwon corrigiu e Jongdae abriu a boca, surpreso com o rumo daquilo. — Meu filho.

Acreditara fielmente que o exame dera negativo. Só isso explicava a forma como aquele alfa não comparecera ao começo do seu julgamento, contudo, mesmo se tivesse dado positivo não parecia certo que ele aparecesse. Confirmar a sua paternidade só servia para inflamar os nervos dos lobos Kim’s.

— Não fale besteiras. — Junmyeon voltou a colocar a mão sobre a alavanca. — Minha ordem já foi dada.

Jongdae desviou os olhos para o ex-amigo. Ele era o líder, tinha um dever para cumprir e as palavras já haviam saído da sua boca, voltar atrás seria o mesmo que mostrar-se indeciso e isso não faria bem para si. O prisioneiro realmente entendia em que tipo de armadilha do outro tinha se metido e mais uma vez naquele dia, ficou do seu lado.

— Puxe de uma vez. — mandou ao Kim.

Junmyeon engoliu em seco diante da sua fala, comprimiu os lábios e segurou a alavanca com força. Siwon observou o ato sem entender porque Jongdae se entregava daquele jeito, abriu a boca para tentar impedir o alfa líder. Iria gritar dali toda a sua autoridade quando tudo se tornou uma bagunça. Siwon virou o rosto para trás e ainda viu o corpo de Baekhyun avançando pela multidão, estava gritando alguma coisa. Mas os lobos só o empurravam de um lado para o outro, não o deixavam se aproximar e no palco, Junmyeon fez a coisa que achou certo.

Puxou a alavanca com os olhos escuros focados no rosto do prisioneiro e enquanto o chão se abria aos seus pés, Kim Jongdae sorriu. Um sorriso manchado de vermelho.


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