Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 36
Extra - Contagem regressiva




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Heechul fitou o seu reflexo através da tela apagada do seu celular, enquanto permanecia sentado à bancada do laboratório, onde trabalhava. Ainda estava na fase de estágio, mas o ômega acreditava que logo seria contratado, afinal, ninguém era melhor do que ele naquele trabalho. Havia se formado em química um ano atrás, numa universidade no exterior, depois que fora expulso de uma escola particular francesa para ômegas, ou pelo menos era isso que ele contava para seus conhecidos. Era uma boa estória e de que quebra tornava sua identidade segura.

Era melhor assim, no fim das contas. Havia sido ensinado a mentir, então mentia. Mas de vez em quando, Heechul acreditava que merecia mais do que mentiras e a cor vermelha que estava em sua ficha, na Organização. No entanto, se fosse começar a parar de fazer isso, então deveria contar aos humanos com quem trabalhava, sobre sua verdadeira natureza e isso, infelizmente, estava fora de cogitação. Assim como estava fora de cogitação, dizer não àquilo. Abaixou o celular e olhou para a porta ao mesmo tempo que a via abrir e o seu superior entrar, uma prancheta em mãos, pronto para anotar os resultados que a equipe havia tido naquele dia.

O Kim olhou para as folhas soltas sobre a bancada, à sua frente. Cheio de rabiscos de equações e detalhes de procedimentos experimentais. Ninguém entenderia aquilo, além de si mesmo. Leeteuk costumava dizer sua mente funcionava com energia extra, já que estava constantemente pensando em mil coisas ao mesmo tempo. Não era mentira, Heechul sabia. Tinha uma mente agitada mesmo. Puxou uma folha em branco e começou a escrever, de um jeito organizado, os resultados dos experimentos.

Houve melhora na memória do rato...

O laboratório farmacêutico em que trabalhava, estava recebendo dinheiro de uma pessoa muito importante para continuar uma pesquisa que havia sido abandonada algum tempo atrás, por falta de resultados mais consistentes naquele estimulante. A ideia era que o remédio fosse utilizado para tratar Alzheimer e Heechul esperava que até o fim do ano, ele não fosse mais uma ideia.

— Kim? — a pessoa chamou e o ômega logo estava lhe estendendo a folha.

Observou quando o homem passou os olhos pelo que tinha escrito e depois o escutou dizer que todos estavam liberados. Ficou de pé e foi em direção a saída, parou em frente ao pequeno armário e retirou o jaleco antes de pegar sua mochila. Ao seu lado, seus parceiros de laboratório fizeram a mesma coisa.

— Nós vamos ao Flor-de-cerejeira, não quer vir? — a humana perguntou para si.

Flor-de-cerejeira. Lembrava-se muito bem onde ficava. Era o bar mais próximo do seu trabalho, quase na esquina. Os drinques eram bons e o preço melhor ainda, além de deixar que os clientes brincassem de cantores no caraoquê. Cansara-se de ir ali junto dos humanos com quem trabalhava, mas naquela quinta, Heechul tinha outros planos. Siwon havia chegado — finalmente! — do seu intercambio em Florença e hoje seria o primeiro momento deles três juntos, já que Leeteuk havia concordado depois que Heechul torrara-lhe a paciência.

— Sinto muito, — sorriu enquanto colocava sua jaqueta. — vão ter que se divertir sem mim hoje.

— Aigoo. — o garoto mais velho deles reclamou. — Estávamos contando com você para o show em cima da mesa. — brincou e Heechul riu.

— Hoje não. Preciso que o senhor Fu me aceite de novo no bar. — começou a se afastar, a mochila nas costas, parecia um colegial.

— Procuramos outro bar. — o mesmo garoto tentou e Heechul se limitou a dar tchau antes de virar-lhe as costas.

Algum tempo atrás o mesmo bebera tanto que havia feito um pequeno showzinho sobre uma das mesas do local, com seus amigos humanos mais bêbados que si aplaudindo, por isso, coube, ao senhor Fu — o dono do bar — a tira-lo de lá, na verdade expulsa-lo do bar junto com seus amigos. Desde lá, eles não tinham voltado ao Flor-de-cerejeira, em parte por causa da vergonha e em parte por causa do tanto de trabalho que tinham no laboratório. Mas, já passara duas semanas do ocorrido, então Heechul não achava que o senhor Fu ia o impedir de entrar no bar novamente, afinal, o show sobre a mesa não chegou nem perto daquela vez que ele e os amigos inventaram de jogar sinuca e acabaram quebrando algumas garrafas do lugar.

Saiu do laboratório primeiro que seus amigos e ficou parado, em frente ao mesmo. Procurou o seu celular no bolso da calça e olhou o horário. Siwon estava atrasado, pensou antes de guardar o celular. Ficou na calçada por mais uns dois minutos, a tempo de ser convidado novamente para ir ao bar, quando Siwon apareceu. No seu belo conversível, a capota abaixada e o cabelo escuro jogado para trás por causa do vento. Ele tinha 19 anos agora, tornara-se mais alto que o ômega e ganhara músculos mais definidos pelo corpo. Era um belo alfa, não podia deixar de negar.

Heechul sorriu antes de dar a volta no carro e abrir a porta para se sentar ao lado dele.

— Está atrasado. — não foi capaz de não apontar e o alfa sorriu.

— É bom ver você de novo também, senhor Kim. — e o ômega empurrou-lhe o ombro, rindo, antes que o alfa desse partida no carro e eles fossem embora. — Quais as novidades? — perguntou durante o caminho, pelo canto de olho via o cabelo castanho do Kim ser jogado para trás sem piedade.

— Pretendo contar durante o encontro. — fez mistério. — É surpresa.

— Rá. Não acho que vá ser mais surpresa que a minha. — piscou para si.

O Kim não podia deixar de notar o bom humor do amigo, o que era quase raro de acontecer agora que Guerra havia se encerrado e as consequências começavam a aparecer. E logo Siwon, o único herdeiro da Alcateia Byun, parecia ser um dos que mais estavam sofrendo quando o pai o estava pressionando para assumir o controle da alcateia logo. Sabia disso, não só por causa dos relatórios que recebia na Academia, mas também por causa do próprio alfa, que sempre lhe contava os detalhes amargos da sua vida. No entanto, Heechul tinha que admitir que desde que o Byun iniciara seu intercambio tão longe da Coreia e do seu pai controlador, constantemente parecia mais sorridente. Conhecera alguém ou aquilo era apenas efeito das férias? A segunda opção combinava mais, percebeu.

— Me conte. — quase exigiu, mas Siwon não o levou a sério quando só sorriu.

***

Eles estavam sentados na grama, em frente ao rio Han em pleno fim de tarde. O sol estava se ponto no horizonte, banhando Seul inteira em laranja e tornando a água dourada. Haviam latinhas de cerveja espalhadas entre os dois, duas vazias e duas recém-abertas, cada um segurando uma, enquanto esperavam que o terceiro amigo aparecesse. Kim Jungsoo, que deveria ter aparecido meia-hora atrás, mas que até agora não dera sinal algum de vida. Heechul já estava cansado de esperar e Siwon sabia disso, pela forma como ele foi capaz de beber duas latinhas de cerveja nesse meio tempo e agora tinha a terceira aberta, na mão, diferente do alfa que só agora havia se rendido ao álcool.

— Eu acho que ele não vem. — o Byun falou, virando a cabeça para trás, procurando o amigo Kim.

Heechul mordeu o lábio superior antes de beber o primeiro gole da sua terceira latinha.

Babo. — resmungou, os lábios se juntando em um bico mais que irritado.

— A faculdade tem sugado todo o tempo dele, talvez, tenha ficado preso em alguma atividade lá. — tentou o tranquilizar.

— Que nada. — bebeu um gole demorado da latinha. — Ele está fazendo de proposito, você sabe. Aquele teimoso. — suspirou. — E é isso que não entendo, — olhou para Siwon.  — você passa seis meses fora e quando podemos ter nosso primeiro encontro como um trio, Leeteuk faz pouco caso. O que está acontecendo com ele? — Heechul sabia que se algo tivesse acontecido, Siwon seria o primeiro a saber, porque Leeteuk sempre seria mais aberto a outro alfa do que a um ômega.

Dessa vez era Siwon suspirando, levando a latinha aos lábios e sorvendo um gole realmente longo enquanto os olhos se perdiam na paisagem serena que era o rio Han no pôr-do-sol. Estava escolhendo as palavras com cuidado. A notícia tinha chegado até si algum tempo atrás, quando ainda estava em Florença, mostrando a si que seu pai tinha estado muito ocupado durante seu tempo de tranquilidade fora da Coréia.

Meu pai fez uma proposta de casamento para Joohyun. — a irmã mais nova de Leeteuk. — E o senhor Kim prometeu pensar na possibilidade.

— O que? — abriu a boca em descrença, apoiou a latinha ao seu lado na grama. — Seu pai e Joohyun?

— Não. — colocou a mão na nuca e fitou a grama, envergonhado. — Eu e Joohyun.

O Kim mordeu o lábio. Joohyun ainda era novinha para um casamento. 14 anos, pensou. E até onde sabia, não havia tido um cio ainda. Mas mesmo que fosse uma alfa, ainda poderia se casar com Siwon, afinal o importante nos casamentos arranjados era ter filhotes, afim de misturar a raça e mostrar que a aliança valia a pena. Havia até mesmo uma clausura sobre isso nos contratos de casamento arranjados: O casal precisa ter um filhote depois de 2 anos de casamento, se não acontecer, o clã pode terminar a aliança. O que não culminava em divórcio, o casal ainda permaneceria juntos até o fim da vida, mas ômegas que costumavam casar assim, podiam ser devolvidos ao seu clã, o que era uma vergonha tão grande, que a família tendia a não aceitar o ômega de volta em casa. Eles eram vistos como uma mancha sobre a família e sobre o clã, enquanto o outro parceiro podia casar novamente e ter filhos. No entanto, Heechul não conseguia imaginar Siwon casando com Joohyun... não, aquela garotinha de nariz em pé. E pelo jeito que olhava para o alfa, percebia que nem mesmo ele conseguia se imaginar fazendo isso.

— E-eu não sei o que dizer. — acabou falando.

Fitou a latinha de cerveja, havia perdido o interesse no álcool e a irritação pela falta de Leeteuk, havia sumido. Agora podia entender porque o outro alfa parecia estar os evitando, quer dizer, evitando Siwon. Estava chateado com a ideia da irmã casar tão nova, mesmo que o noivo não tivesse culpa alguma das decisões do pai controlador.

— Acho que pode começar com ‘sinto muito’. — teve coragem brincar, mas Heechul não riu.

Na verdade, só ficou em silêncio enquanto erguia a mão para tocar no ombro do amigo, num afago gentil.

— Se te consola, também estou noivo. — resolveu contar, afim de tirar aquele peso estranho do meio deles.

Siwon ergueu os olhos para fita-lo, de repente estava interessado.

— Não ria de mim. — pediu, mas ele próprio estava rindo quando abaixou os olhos e retirou a mão do ombro do alfa, segurou a latinha mais uma vez e sorveu o líquido, já quente. — O senhor Kim procurou minha mãe e pediu minha mão para Kyuhyun. — não conseguia evitar aquela pontinha de animação no fim da frase, ao dizer o nome do beta.

Siwon sorriu enquanto bebia o resto da sua cerveja.

— Você é um maldito sortudo, Heenim. — falou e Heechul concordava com isso mais do que qualquer um.

Mas naquela noite, quando se deitava para dormir, o ômega não conseguia parar de pensar no que Siwon havia lhe dito. Então, no fim das contas, eles fariam parte da mesma família? Era engraçado pensar nisso quando Kim’s e Byun’s tinham se desentendido por tanto tempo, mas o fim da Guerra parecia estar fazendo maravilhas com todos. E isso ficou confirmado, quando no dia seguinte, Kyuhyun surgiu na porta da sua casa, com todo o seu esplendor de beta, convidando Heechul para ir ao cinema. Era surreal assim o jeito como o estômago do ômega se revirou antes que ele conseguisse dizer sim e depois que fechou a porta, não se impediu de dançar pela casa com sua mãe de testemunha, a risada da mais velha preenchendo a casa inteira.

Ele havia entrado no modo de contagem regressiva, seja para o encontro ou para o casamento, que seria marcado no fim daquela semana. Andava saltitante pela alcateia e nem mesmo Leeteuk com seu humor ácido e carranca tinham lhe roubado o sorriso depois de escutar comentários maldosos. Entendia que o amigo estava passando por uma fase ruim, mas não conseguia saber qual fase era essa, quando Leeteuk fechara-se em si mesmo. Nem ao menos deixava que Siwon, que sabia lidar melhor consigo, entrasse na sua bolha de irritação. Então, eles três se afastavam devagar. Cada um começava a se preocupar com outras coisas, correndo contra o tempo para deixar tudo perfeito.

Siwon parecia cada dia mais nervoso, estava constantemente distraído e com o celular em mãos como se estivesse esperando uma ligação de extrema importância e quando Heechul perguntara, tudo que teve foi “Meu pai está aprontando alguma coisa”, mas o ômega não achava que o amigo devesse se preocupar tanto, afinal tudo parecia estar acontecendo da maneira certa. Tinha plena certeza disso, porque todos os encontros que vinha tendo com Kyuhyun, só serviam para que o ômega mergulhasse mais e mais naquele conto de fadas, que havia criado para si.

No domingo, aconteceria mais um. Não sabia onde o beta o levaria dessa vez, mas não podia negar que adorava o tremelique de nervoso que subia por suas pernas todas as vezes que imaginava os lugares que o Kim poderia o levar. Jantar fora? Talvez, um cinema de novo? Mas quando o dia chegou, Heechul, esperou ansioso em sua casa, andando de um lado pro outro na sala, até que Kyuhyun apareceu.

— Boa noite, senhora Kim. — cumprimentou sua mãe, se curvando, antes de virar-se para Heechul e estender a mão. — Prometo não o trazer muito tarde. — disse à mais velha.

— Não se preocupe com isso. Vocês são jovens, tem que se divertir mesmo. — ela disse e Heechul sorriu.

— Se é assim....

— É assim. — ele mesmo disse e o beta sorriu. — Vamos? — assentiu e o levou dali.

Eles caminharam pela alcateia até que Heechul percebesse para onde estavam indo: a floresta.

— Eu preparei uma coisa, espero que goste. — Kyuhyun falou, as mãos estavam para trás e ele estava bonito com aquele corte de cabelo, o ômega pensou.

— Vou gostar. — sempre gostava de tudo que tinha haver com Kyuhyun desde os 13 anos, quando tinham se falado pela primeira vez.

Eles andaram em silêncio até o lugar que Kyuhyun queria mostrar. Ficava perto do lago, em uma árvore. Era pequena e toda feita de madeira. A casinha da árvore, que Heechul se lembrava de ter construído junto de Siwon e Leeteuk, quando tinham seus 12 anos. Era o esconderijo secreto, a base de operações para todas as traquinagens que costumavam armar. Não ia ali fazia muitos anos, nem lembrava-se mais dali até aquele momento. Fazia tanto tempo que deixará de ser criança, se pegou pensando.

Naquela época tudo era bem mais fácil.

Notou que o lugar estava iluminado e com ajuda de Kyuhyun subiu até ali, apenas para encontrar o que parecia um piquenique dentro da casinha. Ela não tinha telhado, porque os três amigos eram atrapalhados demais para conseguir construir um sem se machucar e até hoje parecia não ter um. Anotou mentalmente, que iria construir um telhado para aquele lugar enquanto sentava-se no chão de madeira. Viu o beta sentar-se à sua frente e sorriu, ele queria tanto que aquilo acontecesse.

O seu primeiro amor estava ali. O seu conto de fadas se realizando, percebeu e quase chorou. Quase, porque logo estava piscando as lágrimas para longe. Kim Heechul não chorava, não, na frente do cara que gostava. Então sorriu. Sorrir era melhor, era a forma de dizer que estava feliz com tudo aquilo e que ele faria de tudo para fazer Kim Kyuhyun feliz.

Eles podiam dar certo juntos, disse a si mesmo.

 

Era só uma pena que ele estivesse imerso demais em seus sonhos para perceber o tic-tac do relógio às suas costas.


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