Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 37
IX - Sob o véu




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Henry encarou os documentos que segurava e os guardou em sua pasta antes de, enfim, fechar sua bolsa. Olhou em volta, para o escritório vazio. Junmyeon havia saído mais cedo, outra vez. O ômega não entendia porque o chefe tinha começado a sair mais cedo, não conseguia se lembrar de nenhuma ocorrência importante para que ele tivesse que fazer tal coisa, sabia apenas como o mesmo estava cheio de problemas e que por isso, deveria passar mais tempo no escritório. Suspirou e resolveu deixar isso de lado, afinal também tinha seus compromissos para aquele dia.

Deveria passar na Alcateia Oh e recolher os dados que Oh Sehun tinha, já que Minseok estava impossibilitado de fazer quando estava gastando seu tempo com o cio de Byun Baekhyun. O Lu achava engraçado imaginar que Kim Minseok foi quem deu o primeiro passo naquilo, ao ir atrás do marido, porque ele bem podia ter deixado que o alfa se desfizesse em dor por alguns dias, mas não. Correra atrás de si, mostrando ao Byun toda a imprevisibilidade que pertencia apenas aos Kim’s.

Entrou no seu carro, que não era tão seu assim. Um presente da Alcateia Byun, que Henry achava um tanto exagerado, mas não havia contestado quando ele sempre tinha que estar se deslocando de um lugar a outro, e pagar passagens de ônibus sempre, não estava contribuindo para a sua poupança, quando Kim Junmyeon havia atrasado seu salário por quase três meses. Procurava não reclamar sobre isso, porque o dinheiro não lhe fazia tanta falta assim, quando recebia uma grana boa da Organização. Mas também não queria ficar sem nada no banco, ainda mais quando era um Lu e por isso, estava constantemente se deslocando pelo mundo, a procura de um lugar seguro.

Escutou o celular tocar dentro da bolsa e se apressou em enfiar uma mão ali, enquanto a outra se ocupava em girar o volante e conduzir o carro pelo trânsito. Atendeu depois que reconheceu o nome de Heechul no visor, clicou no botão do viva-voz e só então pôde segurar o volante com as duas mãos e relaxar os ombros ao parar no sinal fechado.

— Lu Henry. — falou sua identificação, como de costume.

Kim Heechul. — devolveu. — Preciso de um favor. — resolveu ir direto ao ponto. — Preciso da ficha de um alfa chamado Chen, preciso de qualquer coisa que conseguir com esse nome, na verdade. — sua voz parecia um tanto eufórica, como alguém que tinha tomado café demais.

Henry assentiu de onde estava, os olhos vidrados no semáforo fechado, estava tentando lembrar se conhecia esse nome de algum lugar, mas nada lhe vinha a mente. Ainda menos se era o nome de um alfa, não era muito fã dessa classe então conhecia muito poucos. Contudo, o que estava lhe deixando desconfiado era o modo urgente com que Heechul precisava da ficha de um alfa. Resolveu que era melhor não contestar, se fosse algo grave, o Kim lhe contaria.

— Tudo bem. — concordou.

E logo a ligação estava sendo encerrada. Simples assim.

O ômega saiu dali quando o sinal abriu e em menos de meia hora estava parado, em frente à entrada da Alcateia Oh, mostrando sua identidade para os guardas betas e torcendo para que Sehun o recebesse no lugar de Minseok, porque o Lu sabia que sua visita não era esperada e que dado a última vez que tinham se visto, o Oh adquirira uma certa desconfiança de si. Observou quando o guarda desenganchou o fone do telefone da parede e falou com alguém, provavelmente o próprio líder, atrás de aprovação para a sua entrada. Não pôde se impedir de admirar o modo como a segurança daquela Alcateia era mais organizada que a dos Kim’s e mais cheia de apetrechos que os dos Byun’s. Olhou em volta, os muros eram cobertos por arame-farpado e haviam dois guinchos, cada um erguido na extremidade do muro, com mais guardas ali, armados e prontos para eliminar qualquer ameaça.

— Pode entrar. — o guarda, finalmente, disse. O cano da arma saia de trás da sua costa, onde a mesma estava presa e o rosto quase se escondia embaixo da aba do boné escuro que usava, na mão, estendia a identidade do ômega.

Henry a pegou antes de assentir para o beta. Então deu um passo à frente ao mesmo tempo que guardava em sua bolsa, escutou o portão de ferro grosso se abrir e logo, estava erguendo o rosto e entrando naquele lugar. O Lu particularmente gostava do modo como a Alcateia Oh se parecia com uma fortaleza por fora, os muros altos serviam para afastar os humanos e qualquer tipo de desconfiança. O terreno onde os lobos Oh’s haviam se estabelecido muito tempo atrás pertencera a soldados humanos exilados. Era para onde os grandes chefões costumavam mandar aqueles que os desobedeciam.

— Senhor Lau, por aqui, por favor. — uma garota falou, o cabelo escuro preso e a roupa social a deixando com um ar mais sério do que deveria.

O ômega notou o lenço verde envolta do seu pescoço, fazia-a parecer uma aeromoça. Contudo, o nome que havia no seu crachá sobre o peito esquerdo fazia Henry abandonar essa ideia. Secretária. Apenas isso, sem um nome realmente, apenas a profissão e a cor do seu cargo. Já havia lido o suficiente sobre a Alcateia Oh para saber como os lobos eram classificados no Conselho Oh, que era responsável por ajudar o líder no comando da Alcateia. Os Oh’s eram os únicos que adotavam essa medida, quando as outras alcateias tinham um beta e um ômega principal para ajudar o líder alfa. E isso, era uma coisa que Henry mais se impressionava com aquela Alcateia, mesmo que todo o verde e as ruas pavimentadas do lugar já fossem impressionantes o suficiente.

O lugar era como uma pequena aldeia, com casinhas de alvenaria dispostas ordenadamente ao lado uma da outra, com uma rua principal que passava em frente as casas, enquanto cada uma era separada por uma árvore. Henry observou casinhas com jardins em frente, flores muito bonitas que ele não lembrava o nome coloriam a aldeia.

Estava seguindo a Secretária, andando calmamente atrás de si enquanto aproveitava para olhar toda beleza organizada que eram os Oh’s. Já havia ido ali antes, mas não parara para observar todos os detalhes do lugar. E agora, que podia olhar com calma achava tudo incrível. Eles tinham menos lobos que os Kim’s e Byun’s, mas ainda sim, se viravam bem, tirando sustento dos seus aparatos tecnológicos e descobertas cientificas. Henry esperava que Sehun lhe desse permissão para visitar o laboratório da Alcateia, pois tinha curiosidade em saber no que os lobos Oh’s estavam trabalhando no momento e desde que perdera seu laboratório no ataque ao Clã Lu, não tinha como produzir mais remédio para si.

 A Secretária entrou em uma construção de dois andares, que Henry reconheceu como a Sede do lugar. Mas logo eles estavam saindo dali e indo direto para a casa principal, que era tão grande quanto a dos Byun’s.

— O Senhor Oh não está se sentindo bem hoje, então está resolvendo seus afazeres em casa. — a garota explicou sob o silêncio dos passos de Henry atrás de si.

Assentiu inconscientemente, meio notando como a fala da garota parecia natural, deixando-o saber que aquilo sempre acontecia. E Henry não podia culpar Sehun, quando conhecia a sua saúde frágil. Talvez, ele nem mesmo saia muito de casa, se pegou pensando. A última vez que tinham se visto havia sido na enorme biblioteca que ele gostava de se esconder, como a mãe disse, mas mesmo naquele dia, ele parecia tão pálido como sempre. Lembrava-se de Baozi lhe dizendo como Sehun era frágil como uma folha na primavera, suscetível demais ao tempo e tornando-se quebradiça muito rápido. Era por isso que ele quase nunca visitava seus primos na Alcateia Kim, pois a mudança climática fora da sua casa bem equipada, lhe causavam um dano — muitas vezes — grave.

Sentia por ele, porque não podia evitar sentir uma certa simpatia quando ele mesmo se encontrava numa situação delicada. A marca em seu ombro pesava, talvez, o mesmo tanto que a saúde frágil de Oh Sehun. No fim, ambos se encontravam em suas limitações, pensou ao mesmo tempo que entrava na hanok Oh. Uma casa tradicional, erguida sobre cavilhas de madeira, sem uso de pregos com uma pequena nascente no quintal, que fora desviada para fornecer água nos canos da casa. Em forma de U, a casa não era formada apenas por uma. Estava mais para a junção de três hanoks, compartilhando corredores de modo que ficassem conectadas, o telhado escuro e afiado e as paredes sem cores artificiais, destacando o tom da madeira pintado a óleo. Fazia Henry se sentir em um dorama coreano, daqueles antigos, que se passavam em alguma dinastia.

Mas por dentro a hanok parecia mais bonita, era mais espaçosa do que parecia e incrivelmente aconchegante. Decorada de modo simples, parecia elegante demais para existir no século 21.

— O senhor pode aguardar aqui. — a moça falou, as mãos juntas em frente ao corpo em sinal de respeito. Henry assentiu, sem saber o que mais poderia fazer.

Conhecia todas as formalidades que cercavam os Oh’s, tinha lido coisas sobre eles durante sua graduação na Organização. Os inteligentes e quietos Oh’s, donos de uma grande fortuna em pesquisas e armamento. Os lobos malhados de branco e marrom com olhos dourados. Não eram conhecidos por sua força como acontecia com os Kim’s e Byun’s. Eram conhecidos pela astucia e pela prudência. Eles sempre pensariam mil vezes antes de dar o primeiro passo, traçariam planos, reveriam quantas vezes fossem necessários os prós e os contras de cada coisa, apenas para ter a perfeição como resultado.

Ajeitou a alça da bolsa no ombro e olhou em volta. Era uma bela casa, disso não podia duvidar. As paredes em tom madeira acolhedor e os arranjos decorativos espalhados pela sala, deixavam tudo terrivelmente bonito, como uma pintura. Levantou o olhar quando escutou passos e se viu observando Oh Joohyun vindo pelo corredor, a saia reta em tom bege e a camisa branca só a fazia parecer mais séria do que realmente era. O cabelo no tom castanho e os olhos grandes, que se pareciam com os de Minseok, não negando de onde aquela garota beta vierá. Atrás de si, a Secretária andava calmamente, apagada pela imponência da atual rainha dos Oh’s.

— Senhor Lau, certo? — a mulher o cumprimentou, a mão estendida e Henry não hesitou em apertar. — Meu filho não está com disposição para atende-lo no momento então, seja o que for, pode tratar comigo. — falou, os olhos delineados avaliando toda a forma que era Lu Henry, deixando-o desconfortável. — Passarei tudo para ele depois.

— Sinto muito, senhora, mas o que tenho para tratar é apenas para os ouvidos do senhor Oh. — Henry curvou-se em sinal de respeito, conhecia bem a personalidade de Oh Joohyun: egocêntrica. — Se ele não pode me atender, então voltarei em outro momento.

Joohyun comprimiu os lábios diante da mensura do outro, desgostosa com o que escutava. Não queria que seu filho se sobrecarregasse com problemas de outras alcateias, já bastava o trabalho que ele tinha com seus próprios lobos. Já bastava as noites em claro que Sehun passava em nome de Kim Minseok, procurando o irmão desaparecido deste. Isso era para ser um trabalho de Junmeyon, que era o irmão, não de Sehun, que tinha problemas de saúde demais para lidar. E Joohyun sabia muito bem que aquele ômega só poderia estar ali a mando de algum Kim, afinal já o tinha visto zanzando pela alcateia do seu sobrinho.

— Se prefere assim. — optou por dizer, sem esconder o modo irritado que sua expressão se contorcia.

Henry segurou a alça da sua bolsa e assentiu, os olhos piscando no processo. Mas mesmo esse ato fofo não pareceu surtir efeito na mulher, pois logo esta estava cruzando os braços e curvando a cabeça para o lado, indicando a saída:

— Jisoo era guia-lo até a saída. — ao escutar seu nome, a secretária se apressou para o lado do Lu.

— Por aqui, senhor. — ela abriu um dos braços em direção a saída, mostrando ao ômega que ele podia ir na frente dessa vez.

— Obrigado pela atenção, senhora Oh. — Henry se curvou mais uma vez em direção a rainha Oh. — Desejo melhoras para Sehun-ah. — chamou-o pelo nome de um jeito informal que não agradou a senhora.

Senhor Oh Sehun. — ela consertou quando seus olhos encontraram com os de Henry e o chinês engoliu em seco diante do olhar terrivelmente superior que ela lhe lançava.

Desejo melhoras para o senhor Oh Sehun. — se escutou repetir, de maneira certa, agora.

Então, Joohyun pareceu aprovar, pois o canto dos seus lábios quase se enrugou em um sorriso. O chinês decidiu seguir Jisoo até a saída, pois era realmente pesado ficar no mesmo lugar que Oh Joohyun. A mulher era definitivamente muito intimidante. Na primeira vez que havia vindo até aqui, a Kim-Oh não parecia estar nos seus melhores dias, quando o deixara passar e de bônus levar uma bandeja de lanche pro filho de coração partido, agora, ela apenas parecia ter atualizado suas definições de mãe superprotetor, quando nem ao menos lhe deu uma chance de ir até o filho, quando sabia muito bem quem ele era e o que fazia ali. A verdade, no fim, era que Oh Joohyun era uma muralha construída sobre muito autocontrole e beleza, mas disposta a fazer qualquer coisa para proteger seu filhote. E ao que parecia para Henry, ele havia acabado de ser classificado como uma ameaça.

***

O garoto levantou os olhos para o médico à sua frente, enquanto nas suas mãos os pertences daquele alfa pesavam, mesmo que não passassem de uma carteira meio vazia e um celular com a tela quebrada.

— E quanto aos meus pertences? — perguntou depois que molhou os lábios partidos.

O médico ajeitou os óculos no rosto, apenas para enfiar as mãos nos bolsos do jaleco.

— Não havia nada com você. — contou o que os paramédicos haviam lhe relatado. — Isso que tem nas mãos é tudo o que havia no bolso do seu parceiro.

O ômega olhou para baixo, fitou mais um pouco as coisas que haviam nas suas mãos. Nenhuma delas lhe parecia familiar e mesmo a palavra parceiro que o médico sempre usava para se referir ao outro, não lhe parecia aplicada de maneira certa. Alguma coisa em si continuava torta todas as vezes que tentava se referir ao alfa como parceiro. Não era essa a palavra certa, tinha quase certeza. No entanto, se não era isso, o que era? Eles eram amigos? Porque pelo que parecia se conheciam, pois de acordo com o médico, o alfa, havia o protegido com seu corpo, não fazia sentido um desconhecido fazer isso. Só que mais sem sentido que isso era o fato de não haver simplesmente nada consigo. Nenhuma carteira ou celular. Simplesmente nada.

Guardou ambos os objetos no bolso da sua calça e voltou a olhar para o médico Lee. Era o dia de receber a sua alta e isso lhe parecia mais apavorante do que não saber o seu nome, porque dali um tempo seria um sem-teto desmemoriado. Um desmemoriado grávido de cinco meses.

— Já sabe para onde vai? — o beta perguntou puxando um pequeno papel do bolso do seu jaleco.

Era o seu documento de liberação, percebeu.

— Não. — externou, a voz saindo baixa de vergonha.

Durante aquele tempo inteiro tinha tentado lembrar-se quem era ou de pelo menos algum detalhe sobre o lugar onde morava, mas tudo que recebia ao forçar sua mente daquela maneira, era uma enorme dor de cabeça. O médico Lee lhe dizia que era provável que sua memória voltasse aos poucos, afinal seus exames mostravam que seu cérebro ainda estava se recuperando de uma concussão forte. Suspirou, colocando a mão sobre a barriga grande. Não sabia o que ia fazer, como ia criar aquela criança, onde iria morar... não podia ficar vivendo nas ruas de Seul com uma barriga daquele tamanho, os humanos iam desconfiar se vissem um homem grávido. Se ao menos soubesse a qual alcateia pertencia, podia muito bem ir para lá e encontrar sua família.

— Bom, se estiver interessado, — o médico começou. — conheço um lugar que pode abriga-lo por tempo indeterminado ou até que se lembre quem é. — ele puxou mais um papel do bolso do jaleco, era um pequeno cartão.

O ômega o segurou e leu o que tinha ali: Santuário — o lar para aqueles que procuram paz. Então levantou o olhar para o beta, confuso com o lugar que ele lhe oferecia como abrigo. Parecia como um refujo de uma igreja.

— É um bom lugar. — afirmou. — Eu fui criado lá, os Altos Sacerdotes me encontravam vagando por Seul e me ofereceram uma casa. Eu aceitei seus ensinamentos e me tornei um sacerdote quando completei 18 anos. — viu o garoto arregalar os olhos e sorriu. — Mas não precisa fazer isso se não quiser. Nós também apenas oferecemos abrigo para qualquer lobo que precise.

— Sem cobranças? Eu... eu não tenho dinheiro algum. — confessou.

— Sem cobranças. Pode ficar tranquilo, não somos nenhum tipo de seita maluca. — e dessa vez era o ômega que estava sorrindo.

— Se é assim, eu aceito.

— Ótimo, espere até que meu turno termine, então levarei você até lá.

Ele assentiu, antes de acompanhar o médico até a saída do quarto. Eles passaram pelo quarto do alfa, e o ômega observou o modo como o outro respirava com dificuldade por aparelhos. O rosto estava inchado de cortes e o tronco se encontrava enfaixado, além do gesso que cobria sua perna e um dos braços. Ele olhou para a própria perna, que já estava sarada apenas com duas semanas e então olhou para a perna do alfa, não entendendo como tinha se recuperado tão rápido e o outro não, quando ambos eram lobos.

— Ele perdeu muito sangue. — o Lee falou quando percebeu o olhar do ômega no paciente. — Tive que improvisar um doador humano, foi sorte que o seu corpo tenha aceitado, mas isso diminuiu suas habilidades de alfa e pelo que parece, o sangue humano o deixou mais fraco, por isso ele está se recuperando tão lentamente. Mas é apenas uma questão de tempo até que seu lobo fique forte novamente e limpe os rastros humanos do seu sistema.

Uma questão de tempo, pensou amargamente. Tudo parecia uma questão de tempo para si.

— Eu posso...? — se referiu a entrar no quarto e observar o alfa mais de perto.

O médico assentiu e foi até a porta, abrindo-a para o ômega entrar. Ainda lançou um olhar para o beta, não tinha tanta certeza sobre aquilo, mas deslizou para dentro do quarto, pisando vagarosamente, tentando não fazer barulho, como se achasse que podia acordar o outro assim, mas sabia que não podia. Era apenas que o seu estômago estava virando aquela confusão dolorosa, deixando-o enjoado. Mas se forçou a andar até parar ao lado do corpo do alfa.

Ele estava em coma. Traumatismo craniano, muita perda de sangue, duas costelas quebradas e um pulmão comprometido, braço direito e perna direita quebrados. Os estilhaços do vidro da frente haviam cortado o seu rosto em vários pontos. Linhas fininhas, agora, amarronzadas se exibiam ali, todas trazendo algum tipo de mensagem subliminar para o ômega, tentando lhe contar o que de fato havia acontecido naquele carro.

— Você está bem horrível. — se escutou dizer, mas logo estava rindo, tentando espantar o peso daquela constatação.

O alfa havia protegido o seu corpo durante o acidente, então isso explicava o seu estado incrivelmente ruim. Suspirou, fechou os olhos por um momento e procurou o cheiro dele, mas estava tão fraco por causa do sangue humano em seu corpo, que se viu aproximando o nariz da curva do seu pescoço. Aspirou, desejando que alguma lembrança despertasse em si, mas tudo que veio foi o grande nada de sempre. Seu lobo não demonstrou nenhum interesse no alfa, o que o fez acreditar que significava que o bebê que carregava não pertencia àquele homem. E por algum motivo, se viu aliviado com aquilo e um tanto esperançoso, porque quem quer que fosse o seu alfa já devia ter notado seu sumiço e podia muito bem estar atrás de si, isso o fazia ficar tranquilo pois logo saberia quem de fato era.

Afastou o rosto da curva do pescoço do outro e o fitou mais um pouco antes de tomar coragem para segurar sua mão. Talvez, fossem amigos, não é? Acariciou a mão esquerda, querendo que o lobo do outro soubesse que não estava sozinho, pois sabia como era importante que o lobo daquele alfa começasse a acordar dentro de si. Tentou transmitir bons pensamentos para o outro, achando que podia realmente funcionar e pode ser que tenha mesmo, pois no minuto seguinte sua mão estava sendo apertada. Uma pressão pequena feita, quase o fez acreditar que era só impressão do seu cérebro desesperado por fatos sobre si, mas quando aconteceu de novo. Tudo que conseguiu fazer foi soltar a mão do alfa, como se tivesse pegando fogo, os olhos muito arregalados.

— D-d... o... — o alfa estava balbuciando, o peito descendo e subindo muito rápido e o aparelho apitando muito alto naquele quarto.

Deu um passo em direção à ele mais uma vez, enquanto escutava a porta se abrir num rompante. Precisava escutar o que ele estava dizendo.

— D-d... o... — ele balbuciava, as letras espaçadas demais e os olhos se mexendo fervorosamente embaixo das pálpebras fechadas. — D-do. — quase conseguiu formar a palavra.

O médico Lee o afastou enquanto com a ajuda de uma enfermeira começava a trabalhar no corpo do alfa.

— Ele está tendo uma parada cardíaca. — o beta disse à moça e o ômega encarou os dois, sem saber para onde deveria ir enquanto na sua mente tudo girava em volta de uma palavra:

Do.

Seria o seu nome?

***

Heechul estava tão concentrado no que fazia, que não percebeu quando Leeteuk entrou no laboratório caseiro que tinha montado há uns bons anos atrás da sua casa. O alfa trazia nas mãos uma carta aberta, que havia encontrado no quarto que dividia com o ômega. Seu objetivo ao ir ali, era perguntar ao ômega o que aquilo significava, porque até onde tinha lido na carta, aquilo não passava de uma ficha técnica de Kim Jongdae. No entanto, ao perceber Heechul usando seu jaleco, luvas e o rosto coberto por uma máscara branca, o alfa decidiu por apenas se encostar na parede ao lado da porta e esperar.

O Kim segurava uma micropipeta enquanto parecia colocar alguma coisa dentro de miniplacas, todas pareciam estar sendo preenchidas por uma solução incolor. Ele trocava a ponteira para cada vez que precisava colocar uma nova solução em cada miniplaca, por isso, ao seu lado muitas ponteiras esverdeadas se amontavam. Leeteuk achou que ele demoraria mais, contudo, Heechul parecia estar no final do seu trabalho, pois logo estava deixando a micropipeta de lado, segurando as miniplacas e colocando dentro de um aparelho. Fechou a porta e cruzou os braços ali, Leeteuk podia apostar que Heechul estava fazendo aquela expressão de quem é dono do mundo e por isso ordena que a máquina vá mais rápido. Quase riu. Quase, porque bem que os lábios se curvaram para o ato, mas o ômega virando-se na sua direção e arregalando os olhos em surpresa para si, roubou qualquer vontade de rir.

— O que faz aqui? — o Kim perguntou ao recuperar a compostura. — Ainda mais vestido desse jeito? — Leeteuk olhou para a própria roupa, procurando o que havia de errado, afinal não achava que bermuda e camiseta fossem um problema no clima que estava fora daquele laboratório. — Saia. — mandou e o alfa piscou na sua direção, mostrando que era a sua vez de ficar surpreso. — Agora. — a voz do ômega se elevou e o alfa não contestou ao abrir a porta e sair, sendo seguido por Heechul.

O ômega presava muito a higiene no seu laboratório e isso implicava em usar trajes adequados para estar ali dentro, como sapato fechado, calça comprida e camisa de mangas além de jaleco. As luvas e máscara vinham de acordo com o tipo de trabalho que realizava, e para aquele teste de DNA entre os restos mortais de Jihyun e a criança — afim de saber se eram parentes mesmo — era necessário o máximo de cuidado para não contaminar a amostra, quando havia tão pouca.

— O que quer?  — perguntou enquanto tirava as luvas e abaixava a máscara.

O alfa o fitou, por um momento estava confuso pela forma como o marido podia mudar de humor muito rápido, mas logo estava se recuperando e levantando a carta que tinha na mão.

— Desde quando está investigando Kim Jongdae? — perguntou de uma vez.

— Por que está mexendo nas minhas coisas?  — Heechul puxou a carta sem delicadeza alguma da mão do alfa e enfiou no bolso do seu jaleco sem cuidado algum. — Não pode ficar fuçando minhas coisas só porque estamos dormindo juntos. — e sem explicação alguma, deu as costas pro alfa e entrou no seu laboratório, fez questão de trancar-se ali e Leeteuk suspirou do lado de fora.

Devia ter imaginado que não conseguiria nada de Heechul, sem que ele quisesse falar.

Heechul era bem difícil quando queria, pensou, antes de se afastar. Suspirou, apenas para olhar para os lados, tentando decidir para onde iria. Agora que não era mais o líder dos Kim’s, já não tinha mais tanto tempo ocupado. Havia mais tempo livre do que podia lidar, então sempre terminava os dias afundado em tédio. Às vezes, ajudava os lobos em trabalhos caseiros e também conseguia brechas na vida — fora da cama — com Heechul, mas não conseguia se aproximar de Ryeowook e muito menos de Junmyeon sem receber caretas desgostosas. A verdade, era que não era mais tão bem-vindo assim na sua família. Seus filhos não queriam falar consigo, Ryeowook também não, e Heechul só o tolerava por causa da marca.

Era estranho olhar para esse cenário, quando meio ano atrás eles eram nada além de uma família grande e unida. Umas brigas aqui e ali entre Ryeowook e Heechul, mas tudo sempre muito equilibrado. Agora... agora só existia o limbo de rejeição que Leeteuk tanto odiava, contudo não podia negar a sua culpa nisso tudo. Havia tentado se desculpar com Junmeyon, mas o alfa só lhe virara as costas e até mesmo tinha tentado procurar Sehun para tentar reatar o acordo entre suas alcateias, mas nada deu certo. Sehun, apesar de o ter recebido, não tinha concordado em reatar.

Atravessou o quintal da casa que costumava dividir com Heechul e avançou até ficar de frente para a casa amarela de Ryeowook, onde eles tinham feito juras de amor. Tudo parecia ter acontecido em outra vida, com outra pessoa, que tinha o seu mesmo nome e se parecia consigo, mas com toda certeza, era melhor. Leeteuk sentia como se fosse uma versão mais fraca e nada interessante de si mesmo do passado.

Andou até o portãozinho da casa e entrou na mesma. Olhou para o jardim em frente à casa e não encontrou Ryeowook, então supôs que este estava dentro de casa e isso apenas se confirmou quando entrou no local, e foi agraciado pelo cheiro bom do almoço. Tropeçou na entrada, acabando por fazer barulho, alertando ao ômega que não estava mais sozinho e estragando o seu plano em querer se aproximar silenciosamente, observar o ex-marido e quem sabe suprir um pouco da saudade que sentia. Só que mesmo assim andou até a cozinha e parou na entrada, encostou-se ali, no batente e observou, jogando pro alto toda a vergonha que sentia.

Haviam três panelas no fogão, duas eram mexidas ocasionalmente por Ryeowook, enquanto uma parecia ter sido finalizada. O ômega não estava olhando para si, parecia estar o ignorando fervorosamente. Leeteuk cruzou os braços ao mesmo tempo que o ômega suspirava, um tanto incomodado por estar sendo observado com tanto afinco. Levantou o olhar vagarosamente em direção ao alfa, mexia vagarosamente algo em uma das panelas com uma colher de pau.

— O almoço não está pronto. — falou, tornando a desviar os olhos para as panelas.

O Kim continuava o fitando. Meio vagando entre suas lembranças passadas e os arrependimentos da vida presente, em algum momento lembrou-se de Ryeowook mais novo, nada além de um ômega novato na alcateia, quieto e um tanto adorável com as bochechas fofas que estavam sempre prontas para ficarem rosadas. Tinha se apaixonado, não podia negar isso a si mesmo nem em um milhão de anos. Admitia para si mesmo que amara e amava Ryeowook com todo o seu ser, um sentimento bem diferente do que sentia por Heechul e daquele que um dia sentiu por aquela pessoa. Ryeowook parecia ter aquilo que aquelas duas pessoas não tinham: paciência.

— Quer ajuda? — tentou uma medida mais drástica para se aproximar.

— Não. — respondeu simplesmente, focando toda a sua atenção no que fazia e fingindo que Leeteuk não estava ali.

Aquilo doeu de uma forma que nunca poderia pôr em palavras, pois aquele tipo de atitude só o fazia constatar da coisa que já sabia: havia perdido Ryeowook. Talvez, eles não se acertassem mais, não é? Conhecia o outro Kim bem demais para ter plena certeza de que nunca mais seria olhado daquela forma amorosa de antes, ele havia quebrado alguma coisa dentro do ômega, alguma coisa que não tinha mais conserto. Mesmo que se esforçasse em colar as peças, sabia que não seria mais o mesmo. E era justamente isso que doía. Forte e certeiro, a culpa se fazia presente em cada pedaço de si.

Minha culpa, minha máxima culpa.

— Eu posso... — tentou dizer.

— Não. — Ryeowook afirmou novamente. — Só saia daqui. — meio pediu, meio mandou, virou-se de costas para o alfa e fingiu que estava ocupado em cortar alguns legumes sobre a bancada da pia.

— Ryeowook, por favor.

Não respondeu, mesmo que pudesse escutar os passos do alfa se aproximando. Cortou com raiva a cebola, picando tudo em uma velocidade incrível, denunciando toda a raiva que estava começando a sentir. Por que Leeteuk tinha aparecer justo quando estava fazendo a coisa que mais gostava e que o mais distraia? Isso era tão cruel! Já bastava ele o ter feito perder Minseok e Kyungsoo, e depois quando achava que estava tudo bem, perdera Heechul também. Por que esse tipo de coisa tinha sempre que acontecer quando ele achava que estava tudo bem? Foi assim na adolescência, quando perdeu seus pais e tinha sido assim na vida adulta quando seus tios haviam morrido também. E quando achou que podia ter uma família com Leeteuk, tudo tinha ido pro mesmo lugar e ele tinha se tornado o velho Ryeowook solitário. Era cruel!

— Wookie...

Ergueu a mão suja de cebola e sem prestar atenção, limpou as lágrimas dos olhos, que não eram causadas por estar cortando cebola. No entanto, logo seus olhos estavam ardendo mais do que o normal, mostrando que não era só o prenuncio de um choro e sim, a cebola agindo direto no seu globo ocular. Largou a faca sobre a bancada e se apressou em direção a torneira.

Droga!

Abriu a torneira e lavou as mãos de olhos fechados antes de começar a lavar os olhos, Leeteuk se aproximou nesse meio tempo. Apressou-se em segura-lo pelos ombros, e ajudar a molhar os olhos, afim de tirar os resquícios de cebola dali. Ryeowook o empurrou, forte e raivoso. Não queria Leeteuk o tocando e muito menos o ajudando, virou-se novamente para a pia e fez ele mesmo o serviço de limpar os olhos enquanto o lobo ex-líder o fitava com as mãos molhadas e um coração pesado. Pensou em se afastar, mas não tinha coragem de desistir de Ryeowook assim, era como vinte anos atrás, lembrou-se. Gostando do ômega de longe, rodeando seus passos e inseguro demais para se aproximar, pois não sabia se seria correspondido. Só que agora sabia que não seria e isso doía, porque seu lobo dentro de si se entristecia no mesmo tanto que o seu lado humano.

— Eu não preciso da sua ajuda. — afirmou, a voz tremendo no final, alertando sobre suas lágrimas.

Ryeowook sempre seria sensível demais, suscetível demais ao choro quando estava inflamado por emoções. Então, lavava o rosto com pressa, jogando água de uma forma bruta contra o rosto, o alfa observou quando ele mordeu o lábio e os ombros tremeram levemente, quando as mãos se espalmaram na pia, o barulho da torneira aberta servia como sinfonia para o choro baixinho do Kim. Os olhos estavam fechados bem apertados e com o rosto úmido, Leeteuk não sabia dizer se as lágrimas estavam descendo ou se Ryeowook estava tentando impedi-las. Resolveu fechar a torneira e tentar falar com ele, talvez conseguissem resolver essa coisa... talvez, conseguissem tapar esse buraco de decepção que o próprio Jungsoo havia colocado entre eles.

— Wookie, você me odeia?

Você, que um dia me amou tanto, me odeia? 

Parecia a pergunta certa para começar aquela conversa. Mas também parecia o tipo de coisa que ele não queria saber, de repente havia o medo feio dentro de si. Não queria ser odiado. Conseguia lidar com a raiva, sabendo que algum dia ia passar, mas não conseguia lidar com o ódio, que parecia tão imensamente grande para sumir algum dia. Uma vez tinha escutado que o ódio podia ser mais forte que o amor, mas será mesmo que um amor tão bonito podia virar algo tão feio e indigesto?

Ryeowook limpou as mãos no avental que usava antes de tentar enxugar o rosto. Tirou o excesso de água e fitou o alfa com olhos vermelho de choro. Estava machucado e não tinha vergonha alguma de mostrar isso ao ex-marido, parecia certo mostrar a ele toda a dor que sentia, toda a bagunça que sua vida tinha se tornado e agora o vazio que existia no lugar daquela família tão bonita. Era culpa de Leeteuk e sua imprudência que Kyungsoo estivesse perdido no mundo, que Minseok tivesse sido obrigado a se casar com Baekhyun, que Junmyeon tenha que segurar nas costas uma alcateia inteira, que Heechul não possa ser mais só seu e que ele tivesse sido reduzido a só Kim Ryeowook, o ômega solitário.

— Eu não odeio você. — se escutou dizer.

Aquilo pegou Leeteuk de surpresa, pois logo estava dando um passo para trás. Estava esperando uma surra de ódio, não aquela negativa. Então havia esperança para os dois?

— Não é raiva, não é ódio. — suspirou, piscando os olhos grandes tentando afastar as lágrimas, parecia frágil demais aos olhos de Leeteuk. Alguma coisa no alfa queria ter coragem para se aproximar e abraça-lo. — É só uma grande decepção sobre tudo que pensei que sabia de você. — deixou-o saber. — Nós fomos casados por mais de 20 anos, Leeteuk. Eu achei que te conhecia, achei que era o alfa certo e que podíamos ser felizes juntos pelo resto da vida, mas olhe só pra isso... — e as lágrimas estavam ali de novo, dessa vez descendo pelo rosto alfa. — olha pra tudo o que você fez. — abaixou o rosto, não suportava olhar para o rosto tão cheio de dor de Ryeowook. — E-eu perdi Kyungsoo por sua causa. Minseok também foi tirado de mim e eu mal vejo Junmeyon. Você nos afastou, Jungsoo, e por quê? Por causa de uma vingança que não tinha haver contigo.

— Não tinha a ver comigo? — levantou o rosto, um tanto surpreso pelo que escutava. — Era meu irmão, Siwon assassinou meu irmão, como pode dizer que isso não tinha a ver comigo?

— Porque não tinha! — Ryeowook subitamente gritou, fazendo o alfa arregalar os olhos e dar um passo para atrás. — Isso sempre foi entre Siwon e Kyuhyun, e não entre você e ele.

Ele era meu melhor amigo. — confessou.

— E você era meu marido.

Leeteuk voltou a olhar para baixo, subitamente com vergonha, subitamente com um peso sobre os ombros, subitamente encurvado demais para ter forças de encarar a verdade no rosto do ômega. O termo no passado era o que mais o machucava, se entranhava sob sua pele, rasgava sua alma. Agora tudo aquilo havia se resumido em passado?

— Por favor, Wookie, não diga isso assim. — sentiu os joelhos fraquejarem, mas se recusou a ceder diante do ômega. — Nós já fomos tão felizes. Nós temos filhos maravilhosos, nós...

— Nós não existimos mais, Leeteuk. — a frase saiu calmamente dos seus lábios. Tinha se voltado de frente para a pia, fitava um ponto qualquer ali e não parecia disposto a encarar a boca aberta em incredulidade do alfa.

Não, não, não... — balbuciou e não se conteve em se aproximar e segura-lo pelos ombros, vira-lo de frente para si sem delicadeza alguma. Seus olhos estavam escuros, brilhando em pavor por estar perdendo um dos seus ômegas assim. — Não faça isso comigo, por favor. Não faça isso conosco. E-eu sei que não fui um bom pai nem um bom marido, mas se me der mais uma chance. — balançou-o quando Ryeowook se recusou a fita-lo nos olhos. — Se me deixar tentar mais uma vez, podemos ser uma família de novo. Por favor, Wookie... Por favor. — enfiou o rosto na curva do pescoço dele e permaneceu ali, achando que sua aproximação pudesse fazer alguma coisa acender no ômega.

Estava acostumado com o modo como o corpo de Ryeowook sempre reagia ao seu, os pelos arrepiados e as borboletas no estômago. Mas naquela fração de segundos, enquanto ele se agarrava ao sentimento que sentia pelo Kim e implorava para que não fosse embora, o outro só conseguia torna-se suave em seus braços, desfazia-se em suavidade ao ponto de Leeteuk não conseguir segura-lo. Ryeowook já estava longe, tão longe de Leeteuk que o alfa não se conteve em fechar os olhos bem apertados e chorar contra a curva do pescoço do menor.

Por favor, pediu silenciosamente, mas os braços do ômega não se mexeram. Ele não se mexeu, o corpo rígido só entregava seu desconforto em estar tão perto daquele que o machucou.

Jungsoo passou os braços em volta corpo de Ryeowook, apertou seu corpo contra si, se agarrou a ele com tanta força que o mesmo sentiu falta de ar. O Kim não queria ter que deixa-lo ir, não queria perder tudo aquilo assim, em si ainda havia a esperança de que podiam recomeçar, que se eles insistissem mais um pouco podiam ser um casal novamente. Mas quando o ômega não se mexeu em sua direção, o alfa afrouxou o aperto, o rosto se desencostou da curva do seu pescoço e os braços deslizaram pelas laterais do corpo do seu corpo.

Ergue o rosto para fita-lo e sentiu o coração apertar ao perceber que Ryeowook tinha o rosto molhado. Ele também parecia não querer se despedir daquele jeito, mas não havia mais forças para insistir no nada que havia no seu peito.

O Kim ergueu a mão e limpou os olhos, virou-se e saiu da cozinha. As mãos estavam fechadas em punho ao lado do corpo, pronto para uma briga, ele só não sabia por que deveria brigar. Ryeowook correu até o fogão e apagou o fogo, depois que lembrou-se que estava fazendo o almoço. Encarou toda aquela comida queimada e ergueu a mão para abafar o soluço doloroso que escapou dos lábios finos.

Dizer adeus doía mais do que pensava.

***

Siwon observou Donghae por sobre as lentes dos óculos de leitura, a sobrancelha erguida em confusão pelo Lee estar tão agitado diante de si. Andava de um lado para o outro, os dedos sobre os lábios e os olhos vagando por qualquer canto do quarto. A barriga de oito meses parecia não incomodar naquele momento, mas o alfa já podia prever o marido reclamando de dores nas pernas e costas mais tarde. E mesmo que soubesse que devia pedir para que descansasse, estava ocupado surpreso demais com aquela disposição do marido, já que os oito meses deixavam Donghae terrivelmente exausto enquanto o bebê em sua barriga tornava-se mais agitado. Era contraditório, mas também era bonito porquê Siwon adorava o modo como sua filha mexia-se sobre seu toque, sempre tão agitada quando ele começava a falar com ela.

Ji Eun era realmente uma benção.

Mais de uma vez por dia, costumava se pegar pensando em como seria sua filha. Teria seus olhos ou herdaria azul profundo de Donghae? Teria o rosto delicado da sua mãe ou puxaria todos os traços dos Lee, do jeito que acontecera com Chanyeol? Nos seus sonhos de pai, costumava sempre ver uma garotinha de cabelos escuros e olhos âmbar, parecida consigo — dessa vez.

Olhou mais uma vez para o marido ômega e decidiu que era melhor chama-lo não iria fazer bem algum que ele ficasse agitado daquela maneira.

— Hae. — chamou suavemente, fazendo o ômega olhá-lo de canto de olho, primeiro desconfiado e depois, sorridente, quando viu Siwon deixar o jornal de lado e meio abrir os braços, convidando-o para sentar-se sobre suas pernas. — O que há com você? — perguntou quando Donghae sentou-se sobre si, de frente para si, a barriga os mantinha bem afastados, mas Siwon ainda podia erguer as mãos e segurar o rosto do Lee.

Desceu os polegares pelas bochechas, fazendo um carinho singelo. Calmo o suficiente para fazer o ômega fechar os olhos.

— Chanyeol está chegando hoje, estou ansioso para vê-lo. — confessou de olhos fechados, o lábio inferior sendo preso entre os dentes no fim da frase. — Estou com saudade e nervoso. — então suas mãos estavam sobre as do alfa no seu rosto, ele queria se aproximar mais um pouco, mas a barriga avantajada o impedia. Por isso, levantou-se do colo do marido e sentou-se novamente, dessa vez de lado.

Deitou a cabeça sobre o ombro dele e deixou que os dedos de Siwon deslizassem pela lateral da sua cabeça. Fechou os olhos e suspirou.

— Vai ficar tudo bem. — Siwon entendia muito bem porquê o marido se mostrava nervoso.

Chanyeol não estaria voltando para o que deixou há alguns meses, ele estaria voltando para um cenário totalmente novo, a qual Kyungsoo não fazia parte. Claro, que ele podia ter se preparado pra isso se não tivesse se isolado e não sido tão teimoso em não ler as cartas e atender os telefonemas dos seus pais e irmão, agora Chanyeol teria que lidar com o choque inicial de encontrar Minseok ali e não o outro Kim.

— Espero. — sussurrou contra a pele do alfa.

Siwon tentou pensar em algo mais para dizer, contudo, nada lhe veio à mente. O que eles podiam fazer naquele momento enquanto Byun Chanyeol voltava para casa, era esperar. Tudo se resumir a esperar. Assim como esperava que Kim Kyungsoo aparecesse algum dia ou que alguma pista surgisse, pois dado toda a bagunça em que estavam imersos Siwon não se importava em deixar que Chanyeol se unisse em casamento com Kyungsoo, o problema residia em Kim Jungsoo. Mas o alfa não achava que ele fosse ser um problema, já que pelo que havia escutado, o ex-líder havia sido excluído do círculo familiar então já não tinha mais tanta voz em seu meio.

O celular tocando o despertou dos seus devaneios. Olhou para os lados enquanto Donghae levantava-se e pegava o celular sobre o criado mudo. O viu atender, ao passo que sentava-se novamente, dessa vez, na cama. Siwon observou quando o marido mexeu os lábios, formando uma única palavra: Heechul. Abriu a boca para pedir o celular, já que pretendia dar um oi para o amigo que quase nunca ligava, mas Donghae já estava encerrando a ligação.

— Ele está vindo para um chá. — meio sorriu.

Tinha conhecimento do modo como Heechul e Donghae se davam bem. Terrivelmente bem, como melhores amigos. Ficava feliz por isso, pois ao menos um dos seus amigos de infância sempre o apoiaria, já que quando conheceu Donghae, o único que não o julgou por dar abrigo para um ômega de rua, foi Heechul.

— Vou pedir que os empregados preparem algo. — fez menção de se levantar, mas a mão do ômega no seu braço, o impediu.

— Não precisa se preocupar com isso. — sorriu, suavizando o aperto, acariciando o local e fazendo o lobo sorrir de volta, o coração se aquecia tão fácil quando Donghae estava junto de si. — Eu faço isso, estou querendo me distrair mesmo e além do mais, vou preparar algo para que a empregada leve até Baekhyun e Minseok.

— Não se esforce desse jeito, huh? — Siwon se viu pedindo, agora colocando sua mão sobre a do marido. — Precisa descansar, Hae. Ji Eun tem tomado suas forças.

— Estou bem. — se aproximou do marido alfa, retirou a sua mão debaixo da dele e depositou em seu rosto. — O médico disse que estou bem, está tudo sob controle. — Ji Eun é apenas muito agitada. — ele riu para tranquilizar o marido e Siwon não resistiu dessa vez, aproximou-se o suficiente para beijá-lo.

Donghae suspirou contra os lábios do marido ao passo que esse se afastava, os olhos fechados, o corpo inteiro reagindo a aquele pequeno gesto do alfa. Siwon deslizou os lábios pela bochecha do ômega e chegou até seu pescoço, deixou beijos molhados ali, fazendo questão de demorar, apenas porque queria sentir o gosto da pele de Donghae na língua, foi por isso que a deslizou por ali, fazendo o ômega gemer baixinho. Era sempre tão fácil ter Donghae para si, tão terrivelmente fácil constatar o quanto o afetava e o quanto se deixava afetar apenas por estar beijando-o daquela maneira.

Separou os lábios dali e foi em busca da boca dele, tão necessitado por sentir o gosto do Lee no centro da sua língua. Sempre acabava desse jeito, percebeu. Começava querendo Donghae e terminava o querendo mais ainda.

— Eu te amo. — sussurrou quando quebrou o beijo, a testa encostada na dele.

Donghae sorriu, tranquilo demais, fazendo o Byun tremer por dentro. Era sempre um rebuliço de emoções quando Donghae apenas respirava perto de si, como se cada célula do seu corpo fosse programada para adorar aquela pessoa de sorriso fácil e ideias mirabolantes. Todos tendiam a dizer como o Lee era bobo, nenhum pouco merecedor do seu cargo como Ômega Principal e um tanto desleixado entre outros ômegas com sangue puro. Na verdade, muitos lobos importantes lhe perguntavam qual era a descendência do Lee, se era um ômega puro, digno de ser o Ômega Principal. Siwon respondia-lhe do mesmo jeito que um dia respondeu a Jungsoo — seu ex-melhor amigo —: Não importa, o importante é que ele é meu.

— Também te amo. — esticou os braços e tentou abraça-lo, mas a barriga de oito meses não deixou e tudo que eles fizeram foi rir do modo como Ji Eun estava crescendo tão rápido.

Siwon tocou a barriga, acariciou por cima da camisa enorme que o marido usava. Donghae colocou a mão sobre a dele e observou. Tinha medo de perder tudo aquilo se Siwon descobrisse sobre Jihyun estar viva. Tinha tanto medo de que o marido não o olhasse mais daquela maneira, como se fosse a coisa mais maravilhosa do mundo, um ponto de luz, e tinha mais medo ainda por seus filhos, pela pequena Ji Eun que não nascera ainda e já teria que aguentar os pais separados, porque sabia muito bem que o amor que Siwon dizia sentir por si não era páreo para a coisa que sempre parecia acompanhar Siwon e Jihyun, como um tipo de sentimento inacabado. Isso sempre lhe mostrava como o alfa acabaria voltando pra ela na primeira oportunidade, já que como Leeteuk lhe disse uma vez “Você é só diversão”.

Donghae não passava de diversão.

— O que foi? — Siwon perguntou, a mão livre encaixou-se na bochecha gordinha do rosto do Lee, chamando sua atenção.

— O que? — devolveu, confuso.

— Está todo pensativo, parece triste. Aconteceu alguma coisa? — Donghae curvou o rosto sobre a palma do alfa e suspirou.

— Você ainda gosta da Jihyun? — decidiu perguntar de olhos fechados, porque não queria ver seu pesadelo tornando-se realidade.

O Byun retirou a mão da bochecha do marido, um tanto surpreso pela pergunta Não era o tipo de coisa que estava esperando depois de tanto tempo que a Park havia morrido e além do mais sempre tinha acreditado que Donghae sabia sobre cada parte dos sentimentos que carregava por si em seu peito, porque era um tanto difícil explicar cada um. Principalmente, quando envolvia Jihyun. A bela Jihyun que tinha um gênio tão forte que fazia Siwon se comportar como um filhote perto de si, tão desconsertado diante de tanta beleza e inteligência que por vezes se perguntava se a merecia mesmo. Mas Jihyun nunca mereceu ninguém, nem mesmo Kyuhyun, que foi quem mais a amou, a mereceu realmente. Ela era uma princesa construída sobre gelo e sangue, perspicaz demais e com ideias um tanto maldosas. Ele tinha demorado a perceber tudo isso, mas quando a verdade veio flutuando até si em forma de olhos azuis, não podia deixar de pensar em como nem mesmo o ódio que ela parecia nutrir por tudo que era vivo era páreo para aquele sentimento devastador de posse e amor, que sentia por ela.

E quando Baekhyun nasceu. O fruto eterno de alguma coisa que Siwon não sabia classificar, não podia se impedir de continuar fantasiando um futuro cor-de-rosa com a ômega, mesmo sabendo que tudo já estava manchado de vermelho escuro. Ela havia se matado algum tempo depois que filhote de ambos nascera. Afogara-se. Isso era tudo que conseguia digerir até hoje. Jihyun morta, para sempre morta, para sempre longe dos seus sentimentos. Mas, afinal, o que seriam esses sentimentos? Poderia posse ser um sentimento por si só que se transformava em amor? E esse amor que surgia era bonito? Ou era tão monstruoso quanto achava? Porque fora dominado por essa posse que matara aquele que ela amava. Kim Kyuhyun não era forte o suficiente para tê-la e para falar a verdade, se Siwon não podia tê-la, então ninguém mais teria, nem ela mesma.

Piscou os olhos, tentando clarear os pensamentos. Procurou dentro de si todos os momentos com Jihyun e comparou com os que tinha com Donghae, comparou os rebuliços no estômago, o tremor nas mãos e o jeito como só o sorriso de Donghae lhe fazia suspirar. O Lee sempre seria mais doce, mais amoroso e mais paciente. Enquanto que Jihyun era distante, fria e calculista. Doía bastante se dar conta do quanto não passava de um nada para aquela garota, doía bastante saber que nem mesmo Baekhyun significava alguma coisa. E foi por doer daquele jeito que ele soube que realmente a amou, de um jeito um tanto feio e fraco, mas tinha sido amor. Era amor quando ele a chamou para dançar na festa de casamento, quando se ajoelhou diante dela pedindo que aceitasse seus sentimentos, quando a observou sorrir sozinha no jardim, escondido atrás de uma pilastra. Foi amor quando comprou todas as coisas possíveis apenas para agrada-la, quando deixou que ela o enganasse com sorrisos e pedidos educados.

Foi amor.

— Ela era linda e eu amei mais que qualquer coisa. — começou, olhando para baixo, fitando a colcha da cama. Era azul claro, como os olhos de Donghae. — Mas, Donghae, eu te amo mais. — levantou o rosto e fitou o modo como os olhos do ômega se abriram. — Aprendi a amar você em todos os seus detalhes.

Com Donghae era diferente. Era mais profundo. Era incandescente. Era cheio de alguma coisa pegajosa que o fazia se afundar mais e mais, e gostar disso. Era como acordar num dia de verão, com tudo a sua volta explodindo em vida. Assim era ser correspondido: fazia-o pertencer. Siwon que pertencia a cada detalhe de Lee Donghae.

O ômega piscou as lágrimas para longe e sorriu quando o alfa tornou a se aproximar. Se beijaram, meio sorrindo enquanto Siwon lhe sussurrava como o amava, amava mais que tanta coisa, amava sendo ômega puro ou não, sendo Lee ou não. Amava os olhos azuis do seu lobo, as maluquices que lhe dizia as vezes, as danças estranhas e o jeito que parecia constantemente distraído. Amava-o desde a ponta dos dedos até o fim da alma. E Donghae acreditou, acreditou tanto que quando Heechul apareceu, os dois ainda estavam na cama do quarto. Deitados juntos, rindo de aleatoriedades enquanto Ji Eun parecia tranquila demais no seu ventre.

O Kim entrou no quarto sem cerimônia alguma, parecia apressado para acabar com o clima em que Donghae e Siwon tinham se enfiado, tão apressado, que simplesmente jogou-se na cama ao lado dos dois, assustando-os.

— Não acredito que me deixaram plantado na sala para ficarem namorando. — estava com a barriga para baixo e os pés balançando no ar enquanto Donghae corava e Siwon revirava os olhos.

— Nos distraímos. — o alfa disse, trazendo Donghae para perto novamente. — Será que pode sair para que continuemos distraídos?

Heechul revirou os olhos.

— Pervertidos. — acusou e Siwon não resistiu ao sorriso que queria se formar em seu rosto, mostrando a Heechul que ele estava confortável em estar na presença do ômega, do jeito que sempre esteve. — Mas se querem ficar sozinhos, eu vou descer e cozinhar algo. — começou a se levantar, mas parou sentado na beira, parecia ter se lembrado de algo. — Onde está meu filhote?

Siwon mordeu a parte interna da bochecha, apreensivo, e Donghae se calou, olhando para um canto qualquer do quarto. Heechul cruzou os braços enquanto estreitava os olhos para cima dos dois.

— Baekhyun não o maltratou de novo, não é? — o tom era ameaçador demais para ser só uma pergunta.

— Bom, — Siwon tossiu e Donghae mordeu o lábio inferior. — não. Claro que não. Eu te dei minha palavra que ia colocar Baekhyun na linha.

— É bom mesmo. — suspirou. — Minseok é um tanto sensível demais. Mas, me diga, onde ele está?

Ajudando Baekhyun no cio. — Donghae acabou dizendo, meio sorrindo, nervoso.

Heechul abriu a boca em incredulidade enquanto os braços descruzavam.

— Pela Grande Mãe!

E subitamente Siwon riu.

— Não ria, seu idiota. — Heechul pegou um dos travesseiros e jogou no alfa. — Não estou pronto para ter netos ainda. — levou as mãos até o rosto, apalpou o canto dos olhos como se estivesse procurando rugas.

— Fique tranquilo. — Siwon jogou o travesseiro de volta, acertando o rosto do Kim. — Não acho que Baekhyun e Minseok queiram filhotes. — desviou para o lado quando Heechul jogou o travesseiro em si, novamente.

— Parem com isso. — Donghae segurou o travesseiro e bateu em cada um dos dois. — Minseok e Baekhyun teriam filhotes lindos e ninguém acha que está velho. — dirigiu-se a Heechul, que jogou-se na cama dramaticamente enquanto Donghae levantava-se. — Vem, vou preparar alguma coisa. — segurou na mão do Kim e começou a puxa-lo, fazendo-o levantar.

— Você não vem? — Heechul perguntou à Siwon quando já estava perto da porta, Donghae à sua frente.

— Vou tomar um banho antes.

Os ômegas assentiram antes de saírem e Siwon limitou-se a suspirar enquanto se punha sentado sobre cama, levantou-se e foi até o banheiro. Tomaria um banho, comeria algo e então iria buscar Chanyeol no aeroporto, afinal o filho estaria chegando daqui a pouco.

Heechul e Donghae caminharam até a cozinha, o ômega Kim o ajudou a descer a escada devagar e depois que já estavam na cozinha, ajudou-o a cozinhar. Estava batendo a massa de um bolo enquanto Donghae apoiava os cotovelos na bancada, à sua frente.

— Veio apenas visitar Minseok? — perguntou o Lee.

— Também. — respondeu. — Faz algum tempo que não tenho notícias dele, mas isso pode esperar um pouco. Eu vim para falar com você e Siwon. — de repente o tom estava sério, alertando Donghae de algo.

— Aconteceu algo grave?

Heechul suspirou antes de olhar em volta, não havia ninguém ali além dos dois. Era melhor que ninguém escutasse aquilo, pelo menos até que ele soubesse o que de fato estava acontecendo.

— Lembra-se que Siwon devolveu a Leeteuk os restos mortais de Kyuhyun, Jihyun e a criança?

Donghae engoliu em seco enquanto assentia, desencostou-se da bancada, as mãos tinham começado a suar em nervosismo.  

— Eu fiz alguns testes e ou os ossos de Jihyun e da criança não são deles ou o filho que Jihyun esperava não era de Kyuhyun e na verdade, nem mesmo dela é. — contou e Donghae olhou para baixo enquanto mordia o lábio.

Aquilo não deveria está acontecendo agora, pensou. Jihyun deveria continuar morta para os outros e bem longe de si, mas parecia que tudo a sua volta parecia o puxar em direção a Park. E ali estava Heechul a um passo de saber toda a verdade.

— É? — soltou inutilmente e não viu quando os ombros do Kim abaixaram-se, mas percebeu que ele já não batia mais a massa.

O Kim não esperava por aquilo, mas conseguia reconhecer uma mentira a um quilometro de distância e o jeito que Donghae se comportou, todo engolido atrás da bancada, só entregava sua postura de maior culpado de todos. Seja lá o que fosse, parecia ser algo grave. O que de fato só confirmava suas suspeitas de que os ossos da mulher e da criança não pertenciam àquelas pessoas. Será que Siwon havia enganado Leeteuk achando que ninguém chegaria perto daquela ossada? Parecia típico do amigo não querer se desfazer dos restos mortais da preciosa princesa Park.

— Onde está? — resolveu ser mais incisivo, colocou a tigela com a massa sobre a bancada e se inclinou sobre para encarar Donghae. — Onde estão os ossos? — Donghae não conseguia encara-lo nos olhos e por isso Heechul deu a volta na bancada e o segurou pelos ombros. — Olhe pra mim. — pediu, estava começando a ficar nervoso com aquele silêncio.

— Eu sinto muito. — o Lee pediu desculpas, os olhos piscando freneticamente e o outro não hesitou em sacudi-lo, um tanto frustrado pelo que recebia.

— O que está falando?

. — Donghae reclamou, mas Heechul não o soltou, precisava saber porque o outro estava se comportando como se tivesse assassinado alguém.

— Diga onde estão. — mandou.

— Não existem. — confessou e o ômega o encarou confuso. — Não existem ossos.

Heechul soltou-o e se afastou um passo. Um tanto surpreso pelo que escutava, não sabia como deveria interpretar. Não havia ossos por que foram destruídos? Sabia que a Alcateia Park era mais adepta a cremação do que ao enterro tradicional que os Kim’s e Byun’s tendiam a fazer. Se era isso mesmo então não havia modo dele conseguir fazer um teste DNA. Abriu a boca e logo tapou-a com a mão, não conseguia acreditar que nunca saberia se a criança de Kyuhyun estava viva ou não. Sentiu vontade de chorar, de frustração. Mas notou o modo como Donghae estava se encostando na bancada da pia, hiperventilando como se estivesse prestes a ter um colapso. Correu em sua direção, de repente se sentindo culpado por ter sido tão rude com o ômega. Devia ter sido mais suave já que ele está num grau tão avançado de sua gravidez.

— Hae. — segurou-o pelos braços. — Desculpe-me. — pediu e começou a leva-lo em direção a sala, que era mais próxima. Sentou-o em um dos sofás. — Eu não deveria ter sido tão rude. — segurou-lhe o rosto e observou suas pupilas dilatadas. — O que está sentindo? — tocou sua testa, estava suando frio.

— Acho que minha pressão baixou. — falou fechando os olhos e encostando a cabeça no encosto do sofá.

O Kim segurou em suas mãos, massageou-as ao mesmo tempo que escutava passos na escada e um Siwon descendo esbaforido os degraus.

— Hae. — o alfa chamou ao mesmo tempo que o ômega soltava sua mão e observava o marido correr até o outro. — O que aconteceu? — segurou o seu rosto.

— A pressão dele baixou. — Heechul contou ao passo que via o momento em que Siwon beijava Donghae, segurando seu rosto com urgência como se sua vida dependesse disso.

O Kim piscou com a forma como Donghae suspirou ao passo que suas bochechas tornavam-se rosadas, afastando a palidez de vez e mostrando ao ômega o poder da Marca. Pois assim que Siwon se afastou, um tanto pálido, Heechul foi capaz de entender ele havia acabado de doar um pouco da sua energia ao marido. Fitou os dois sentados no sofá, ao lado um do outro. Donghae que parecia mais saudável e Siwon que parecia alguém que havia saído de um furacão, porque a camisa estava abotoada do jeito errado e o cabelo molhado. Quis rir, mas se limitou a morder o lábio inferior, sentia-se estranho por estar vendo aquela cena. Parecia pessoal demais observar todo o sentimento que Siwon nutria por Donghae, por isso quando Hae esticou a mão para tocar na do marido, Heechul desviou os olhos.

De repente sentia vergonha por ter provocado aquela situação.

Aproximou-se o suficiente para sentar ao lado de Siwon no sofá.

— O que aconteceu? — o alfa quase sussurrou na sua direção e Heechul fechou os olhos, sabendo muito bem o que significava aquela pergunta.

O que realmente aconteceu? 

— Você cremou os restos mortais de Jihyun e da criança? — preferia não responder aquilo. Isso era mais importante.

— O que?

— Os restos mortais, você...? — abriu os olhos para fitar o castanho confuso do amigo alfa.

— Não. — o cortou ao mesmo tempo que Heechul notava Donghae agitando-se novamente.

Voltou a olhar para frente. Não fazia sentido o que pensara antes. Se Siwon não havia cremado Jihyun e a criança, então os restos deviam estar em algum lugar, não é?

— Então, onde estão?

— Como assim? Eu os entreguei a Jungsoo. — Heechul não pôde deixar de notar o modo como Siwon parecia sincero e o jeito que Donghae abaixara a cabeça. —Heenim, aconteceu alguma coisa com os restos mortais?

O ômega fitou Donghae e acabou por se levantar, parou em frente à ele. Ajoelhou-se ali e segurou suas mãos, afastando-as de Siwon. Havia um começo de uma ideia rondando sua mente, mas parecia absurda demais para que pudesse começar a cogitar. Por isso precisava escutar o que o Lee tinha a dizer, afinal era óbvio que ele sabia mais do que aparentava.

— Heenim? — Siwon chamou, mas o Kim não podia responder.

Só Donghae parecia poder fazê-lo naquele momento.

— Donghae, olhe pra mim. — pediu suavemente. — Me conte o que aconteceu. — pediu mais um pouco. — Donghae, eu preciso que me conte o que aconteceu no dia que Jihyun foi dada como morta.

— Que tipo de pergunta é essa? — Siwon soltou, parecia nervoso por alguma coisa que Heechul não entendia.  — Heenim....

— Por favor, não minta pra mim. — continuou se dirigindo ao Lee, mas este apenas soltou sua mão.

— O que está fazendo? — Siwon subitamente o empurrou, fazendo-o cair contra o chão. — Não lembra que foi Donghae que a encontrou morta, não pode estar querendo que ele relembre isso. — era o lobo furioso querendo proteger seu parceiro, sim, Heechul reconhecia.

— Você não está entendendo. — enfrentou-o enquanto Siwon ficava de pé, tão enorme diante de si. — Eu fiz testes de DNA nos restos que mandou para Leeteuk, mas os parentescos não bateram. Os restos da mulher não condiziam com os da mãe da criança e nem mesmo Kyuhyun tinha algum parentesco com a criança. Então, só há duas explicações: ou você enviou os restos errados ou Jihyun está andando por aí, vivíssima. — o peito subia e descia, estava irritado.

Siwon piscou. O lobo nervoso havia dado lugar ao confuso.

— Eu enviei os certos. — disse inutilmente, a voz baixa, meio compreendendo o que Heechul tinha em mente.

Eles se fitaram, daquele jeito longo que costumavam fazer quando era mais novos e não podiam dizer as estratégias em voz alta. O Byun leu nos olhos ansiosos de Heenim a coisa mais absurda de todas. Tudo bem, que era um fato que a única pessoa que encontrou Jihyun no lago fora Donghae, assim como fora Donghae que pediu para cuidar do corpo morto da Park, afim de prepara-la para o funeral. O funeral que aconteceu num caixão fechado. Mas Siwon lembrava-se muito bem do dia que ela morrera, do jeito como seu rosto estava pálido e suas roupas molhadas. Não parecia certo associar aquela palavra àquela mulher quando havia visto seu corpo morto.

— Donghae...  — chamou quando escutou o soluço do ômega. — Di-diga a Heenim que Jihyun está... — precisava ouvir que ela estava morta.

Heechul levantou-se, iria se aproximar de Donghae novamente quando o viu levantar o rosto molhado de lágrimas. Os olhos escuros se mesclavam em azul, deixando-o ver que seu lobo estava tão triste quanto seu lado humano. Ninguém choraria daquele jeito se não tivesse feito nada de errado, pensou. Ninguém choraria daquele jeito por alguém como Jihyun, mesmo se estivesse morta.

Viva. — soltou baixinho, pegando os dois amigos de surpresa. — Jihyun está viva.

Donghae sentiu que estava flutuando. No segundo que Siwon virou-se para fita-lo, afim de ver a verdade com seus próprios olhos, e Heechul abriu a boca em descrença por estar certo, Donghae sentiu que estava flutuando. Pairando sobre aqueles dois amigos, pairando sobre todo o peso que ambos carregavam, pairando ao lado da imagem desbotada de Jihyun, vendo o modo como aquela garota desbotada ria da expressão de ambos. Siwon foi o primeiro a vir até si, segurou-o pelos ombros e o sacudiu como se fosse feito de papel, balbuciava alguma coisa sobre parar de mentir. Mas Donghae não entendia o que ele queria dizer, afinal já tinha parado. Depois de tantos anos havia conseguido parar de mentir.

Jihyun está viva, pensou e quis gritar. Uma parte sua queria rir, mas a outra queria chorar e foi por isso que chorou. Enquanto Siwon o segurava atrás de alguma explicação, Donghae chorou. Escondeu o rosto com as mãos e chorou toda a frustração que era ser tão ele. Não sabia como diria aos dois como Jihyun fingiu ser sua amiga apenas para conseguir fugir, tinha vergonha de deixá-los saber que era tão idiota que tornou-se manipulável, que era chantageado com facilidade, que tornou-se o maior mentiroso de todos.

— Hae. — Heechul se aproximou quando Siwon afastou-se, sentando no sofá e escondendo o rosto entre as mãos, Heechul podia jurar que ele estava chorando também. — Olhe para mim. — pediu e tentou afastar as mãos do seu rosto, mas Donghae balançou-se em negação. — Por favor. — não sabia o que deveria fazer, Ryeowook sempre tinha sido melhor em lidar com pessoas passando por estresse. — Eu não vou brigar com você, prometo. Mas tem que parar de chorar, sim? Ji Eun não vai ficar bem se continuar assim.

Mas Donghae não conseguia escutar. Ele só conseguia sentir o rebuliço amargo que vinha de Siwon, tão ruim que lhe doía o peito. A Marca, as vezes, não tinha suas vantagens.

Heechul ficou parado entre os dois. Não sabia o que deveria fazer, como deveria fazer. E tudo pareceu piorar mil vezes mais quando a porta se abriu e uma pessoa de cabelos vermelhos entrou arrastando uma mala de rodinhas.

Byun Chanyeol.

— Eu não acredito que vocês me esqueceram no aeroporto. — reclamou retirando os óculos escuros e ainda não notando a bagunça que seus pais estavam na sala. — Bela recepção, hein. — seus olhos primeiro encontraram Heechul e depois caíram sobre Siwon e Donghae, principalmente em Donghae que parecia ao ponto de se dissolver em suas lágrimas.

— Omma! — largou a mala e correu até o ômega Lee. — Omma, o que aconteceu?! — o tom estava desesperado.

Siwon levantou-se, os olhos machados de vermelho e um tanto grogue, parecia bêbado de cansaço. Heechul segurou-lhe o braço, mas ele se soltou. Não disse palavra alguma, nem mesmo diante do chamado de Chanyeol. Apenas se afastou... Subiu a escada como um morto, deixando Donghae para trás. Heechul sabia muito bem o que Siwon pensava, porque estava pensando o mesmo: Não deveria ter mexido com os mortos.

***

Sehun sentou-se na cadeira do escritório que ficava em sua casa. Ainda não sentia-se bem o suficiente para ficar na Sede e sua mãe fazia questão de deixar isso mais claro para si, então, havia terminado ali: no escritório da sua casa, resolvendo os pormenores do seu clã. Aparentemente, havia um problema no fornecimento de água, teria que olhar a planta dos canos e ver o que podia fazer, pois metade dos seus lobos estavam sem água.

Olhou para o lado, estava um dia ensolarado lá fora. Sorriu, meio triste, porque queria poder sair e aproveitar aquilo. Mas querer e poder eram coisas muito distantes quando se considerava a condição do Oh, e pra falar a verdade, se sua mãe sequer sonhasse que estava pensando em ir lá fora, apenas para sentir o sol, já podia esperar um escândalo da mulher. Kim Joohyun conseguia ser bem intimidante quando queria. Balançou a cabeça para afastar esses pensamentos ao mesmo tempo que escutava a porta se abrir, era sua secretária: Jisoo.

— Trouxe os papeis que pediu, senhor. — ela se aproximou e depositou sobre a mesa os rolos de plantas da Alcateia Oh.

Sehun puxou um para si e retirou o elástico que o prendia antes de abri-lo.

— Os pontos que estão dando problema, foram marcados de vermelho. — ela contou. — Os engenheiros já começaram a trabalhar numa solução, mas precisam do seu aval. — então ela empurrou na direção dele uma pasta.

Sehun lançou um olhar de soslaio para aquilo, mas não largou o rolo que segurava. Já havia visto a ideia dos engenheiros e do jeito que a mãe deixara claro, era caro demais para o orçamento Oh.

— Eu já olhei. — falou a Jisoo. — A solução é cara e demorada, não compensa o dinheiro. Precisamos de algo mais barato ou ao menos mais rápido.

A garota assentiu.

— Devo manda-los revisar a proposta?

— Chame o chefe do departamento de tecnologia e o chefe do laboratório. — pediu. Havia tido uma ideia.

Jisoo anotou em seu bloquinho.

— Mais alguma coisa? — ela perguntou e ele negou, mas logo estava parando-a. — Ligue para Lau Henry e marque uma reunião, mas, por favor, seja discreta.

Jisoo piscou, entendendo realmente o que o líder pedia: não deixe minha mãe saber. Então, não pôde se impedir de sorrir antes de começar a se afastar. Sehun voltou a olhar a planta do Clã. Escutou a porta se fechar e suspirou, os olhos se fechando no processo. Contudo, o telefone sobre sua mesa tocou, assustando-o. Largou o rolo de papel antes de atender.

— Oh Sehun. — se identificou.

Olá, senhor Oh. Aqui quem fala é Wu Yifan, o líder dos Choi’s.


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