Universo em conflito escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 17
E não se assuste com algumas revelações




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/786802/chapter/17

Era uma garota muito bonita, pele clara e cabelos lisos bem negros. Ela usava uma roupa vermelha no estilo francês e uma boina.

— Você por aqui? E quem é seu amigo? – Ela falou com aquele maldito sotaque falso que ele sempre odiou. Ao lado dela estava outra garota loira, bem grande, cabelos amarrados em Maria-chiquinhas e vestida de marinheiro. Ele também a conhecia. Apesar do mau humor, Mônica respondeu o cumprimento tentando se controlar a todo custo.

— Oi, Penha! Como vai Sofia? Querem sentar com a gente? Ah, esse aqui é o Cebola, meu amigo.

Mesmo sabendo que cada pessoa do mundo original tinha um duplo ali, ele não esperava ver aquelas duas. Aliás, naquele mundo a Sofia nem estudava no colégio do Limoeiro. Penha o olhou como se fosse um indigente e respondeu.

— Nós só estamos de passagem. Eu precisava comprar algumas coisinhas.

— Não querem nem tomar um suco?

— Ah, não vai dar porque tenho muitas coisas para fazer. Até mais, querrida!

Quando elas foram embora, Mônica foi até o banheiro para lavar o rosto e voltou mais calma. As outras pessoas ao redor também se acalmaram.

— Você tá melhor?

— Tô sim, já passou. Você também tá se sentindo estranho?

— Não, tô de boa. Faz tempo que eu não vejo a Penha.

— Engraçado, ela não te reconheceu...

— Eu só conhecia ela de vista mesmo, nada de mais. – eles continuaram a comer e o assunto foi esquecido.

Depois do almoço, eles andaram mais um pouco pelo shopping e Cebola foi para casa feliz com os presentes que tinha ganhado e por ter passado um tempo tão agradável com a Mônica. Aquele babaca do seu duplo não sabia o que estava perdendo.

—_________________________________________________________

DC ainda estava furioso por causa do fora que tinha levado e só conseguia pensar em vingança. Não contra a Mônica, pois sabia que ia ter muitos problemas com os pais dela. Seu objetivo era acabar com a raça do Cebola.

Ele virou uma esquina e entrou num beco onde alguns rapazes o esperavam.

— E aí, galera? – ele cumprimentou.

— Fala, DC. O que tá mandando? Quer nossa ajuda pra bater em outro mané?

Os outros riram e o rapaz cortou.

— Na verdade, quero a ajuda de vocês pra quebrar a cara daquele mané e de uma magrela que vivia tocando o terror no colégio ano passado. – falou também pensando na Magali que ia voltar dia primeiro de agosto.

A surpresa foi geral.

— Tá falando da Magali? Então é verdade que ela vai voltar? Danou tudo!

— Calma, pessoal. Agora ela tá sozinha. O que me dizem?

— Que pode dar encrenca. – outro rapaz falou.

— Que nada, meu tio é delegado e vai proteger a gente. Qualé, vocês não querem se divertir um pouco? É isso ou deixar a Magali dominar aquela escola de novo.

Por fim os outros concordaram. Ia ser um bom começo de semestre para todos.

—_________________________________________________________

Cascão olhava a banheira de soslaio como se fosse um predador pronto para lhe atacar. Ele devia ou não fazer aquilo?

“Vai logo, cara! Não é tão difícil! É só água!” ele incentivou a si mesmo e acabou desistindo. Limpar seu quarto era uma coisa. Tomar banho era outra muito diferente e ele ainda não estava preparado para aquilo. Por fim, ele só se limpou com uma toalha úmida e passou perfume para disfarçar o cheiro. O banho ia ficar para outro dia quando reunisse coragem suficiente.

— Mãe, vou sair. – ele avisou passando perto da cozinha. Lurdinha ainda não estava acostumada a ouvir essas palavras.

— Hein? Sair? Ah, claro, claro! Pode ir filho! Só não volte tarde!

Ele correu até o ponto de ônibus onde Magali já o esperava.

— E aí, beleza? – ela o cumprimentou.

— Beleza. Seus pais te deixaram sair?

— Deixaram. É só eu não voltar tarde que tá tranqüilo.

O ônibus chegou rápido e a viagem foi tranqüila. Minutos depois eles estavam chegando ao ferro velho, antigo lugar onde a gangue se reunia. O trailer estava no mesmo lugar, com as pichações do Cascão na lataria e algumas caixas espalhadas ao redor.

— Olha só, tá do mesmo jeito que a gente deixou! – Cascão falou olhando para o interior do trailer. Era de bom tamanho, os vidros estavam intatos e até tinha algumas parafernálias eletrônicas que Franja esqueceu ali há bastante tempo. Também havia garrafas de bebida, alguns cigarros e até alguns produtos roubados que eles não tiveram tempo de vender.

— A gente gostava tanto de ficar aqui... – Magali falou olhando ao redor sentindo uma pontinha de saudade. Mas aquele tempo já passou e ela pretendia iniciar uma nova página em sua vida.

E para mostrar que aquela fase tinha mesmo passado, eles esvaziaram as garrafas de bebida e picotaram os cigarros. Os itens roubados não tinham muito valor. Alguns CD’s, dois relógios, chaveiros, carteiras vazias e o rádio de um carro.

— O que a gente faz com isso? – Cascão quis saber.

— O ideal seria devolver tudo, só que eu nem lembro mais onde a gente roubou isso. Vamos deixar aqui mesmo, eu não vou querer levar isso pra casa.

— Nem eu. Vamos ver o que mais tem aqui... olha só! Isso a gente não pode deixar não!

Os dois exploraram uma caixa onde eles guardavam guloseimas. Tinha salgadinhos, barras de chocolate e biscoitos. A caixa era bem vedada e tudo parecia em bom estado.

— Bora mandar tudo pra dentro! – Cascão abriu um pacote de biscoito e comeu sem cerimônia. – Pega um aê, ainda tá bom!

Magali aceitou e comeu enquanto ria junto com o amigo. Ela foi olhar o que mais tinha na caixa e Cascão continuou a comer os biscoitos. Um gosto desagradável se espalhou por sua boca, não por causa dos biscoitos e sim pela lembrança que eles despertaram. Seu semblante entristeceu ao se lembrar do que ele e Cebola fizeram com ela. Foi por causa daquele evento que ela se tornou a valentona que aterrorizou o colégio por vários anos. Ela se desculpou pelo que tinha lhe feito, mas ele sabia que também tinha sua parcela de culpa.

— Desculpa, Magali.

— Hein? – ela virou-se com duas barras de chocolate na mão e estranhou a tristeza do amigo.

— Você me pediu desculpa pelo que tinha feito comigo, mas eu também tenho que te pedir desculpa. Sei que não fui nenhum santo com você.

Ela abaixou os olhos.

— Você era criança...

— Você também. Se puder me desculpar por tudo que aprontei...

— Eu errei e você também me desculpou, então tá tudo tranqüilo. Só quero seguir em frente.

Os dois voltaram a comer dos biscoitos e Cascão deixou que ela comesse a maior parte, pois lhe devia isso. Ainda assim ele percebeu um pouco de tristeza no olhar dela.

— Você tá pensando nele, não tá? No Titi?

— Acho que pra ele não vai dar pra pedir desculpas.

— Você pode tentar falar com os pais dele.

— Tentei durante o velório e eles quase foram pra cima de mim.

— É que tava todo mundo com a cabeça quente. Hoje pode ser diferente.

— Pode ser, mas foi culpa minha tudo aquilo ter acontecido. Se eu não tivesse levado o Titi pro mau caminho, ele...

Cascão fez com que ela parasse.

— Nem começa, tá legal? O Titi foi mexer com bandido porque quis, você não mandou ele fazer isso.

— Mas ele aprendeu coisa errada porque andava comigo...

— Ele já aprontava bem antes. E entrou pra gangue porque quis, você nem queria ele andando com a gente.

Aquilo era verdade. Titi foi o último a entrar para a gangue e Magali só o aceitou porque Denise gostava dele, caso contrário o teria colocado para correr.

— Cascão...

— Não fica se culpando porque pra fazer isso já tem um monte de gente sem noção que não conhece a história toda.

Ela sorriu e lhe deu uma barra de chocolate. Eles ficaram ali mais um tempo conversando, comendo as guloseimas e relembrando algumas coisas divertidas que o grupo tinha feito quando todos estavam juntos. Nem tudo era só terror e gritaria. Cascão fez questão de lembrar das festinhas que davam, do quanto eles riam, contavam piadas e das vezes em que Magali os defendeu dos outros alunos. Ela podia ser o que fosse, mas quem mexesse com um amigo seu estava condenado.

—_________________________________________________________

De noite, Cebola estava no porão fazendo pesquisas com o tablet novo que Mônica tinha lhe dado. Era muito melhor que a tela do celular, mas ele continuava perdido como sempre.

“O que faço agora?” sem mais nenhuma idéia, ele continuou olhando a internet e se deparou de novo com o logotipo da Vinha. Aquilo estava por toda parte como se fosse uma praga, até o prefeito usava aquele brasão em seu terno. Não só o prefeito como vários deputados, secretários, delegados, diretores dos outros colégios e demais autoridades. Ele deveria estar preocupado?

Seu instinto dizia que sim. Se eles só queriam melhorar a qualidade da educação, por que estavam tomando conta da cidade inteira ocupando cargos importantes? Será que eles tinham planos mais sinistros do que simplesmente melhorar a educação? Ele resolveu estudar melhor o brasão e começou a reparar em coisas que não tinha visto antes.

“Hum... isso tá parecendo um pi... esse outro parece um lambda” ele foi olhando com cuidado os desenhos intrincados no brasão e viu que tinha muitas letras do alfabeto grego, que ele decorou no passado por causa de um jogo e foi anotando todas as letras que encontrou. Quando viu que tinha encontrado todas, colocou no Google tradutor e só não caiu no chão porque já estava sentado no seu colchonete.

— Peraí, esse troço tá errado! Deixa eu conferir de novo!

Ele conferiu com cuidado, letra por letra. Mas não tinha erro nenhum ali. O que estava acontecendo? O logo da Vinha chamou novamente sua atenção e ele observou com outros olhos. O rapaz copiou a imagem para um editor simples de desenho e usando a caneta pen touch, fez um contorno ao redor da vinha e daquele galho no meio. Quando terminou, excluiu o desenho deixando apenas o contorno que tinha feito.

— Não... não pode ser! Cara, isso é doideira! 

Era uma serpente dando voltas ao redor de um cajado. E a tradução do Google para a frase em grego que ele tinha encontrado no brasão lhe deu arrepios.

Casa de Asclépio.

—_________________________________________________________

O tempo passou depressa e finalmente chegou o dia trinta de julho, o dia da festa para comemorar a promoção da Srta. Duister. Rosália limpou a casa como se sua vida dependesse disso, pois a velha patroa não lhe deu um minuto de folga. Tudo tinha que estar brilhando, impecável e perfeito. Rosália fazia tudo controlando a vontade de mandar aquela velha chata para o inferno. Ah, se não fosse aquela dívida...

Em seu quarto, ela se preparava separando a roupa que ia usar na festa.

— Está tudo pronto? – Sua mãe entrou andando com aquela bengala.

— Sim senhora, mãe. Tudo pronto.

— Acho bom mesmo. Hoje é um dia muito importante e não quero que nada dê errado. E espero que você corresponda nossas expectativas.

Ela sorriu gentilmente para a senhora e a tranqüilizou.

— Eu prometo que não irei decepcioná-los.

A velha balançou a cabeça em aprovação e disse.

— Deixe-me ver se suas roupas estão de acordo. Quero que minha filha se vista como uma mulher decente, não como essas desavergonhadas que vejo por aí!

Sem discutir, ela mostrou para sua mãe um vestido preto no estilo vitoriano com a saia bem longa que ia até os pés. As mangas eram compridas e por baixo ela ia usar uma blusa branca com um discreto babado na região da gola. Sua mãe analisou a peça por alguns instantes e falou num tom de reprovação.

— Esse broche está muito colorido. Use este. – ela tirou do porta-jóias um broche mais simples com uma pedra negra cercado de uma moldura prateada. – Mulher direita não usa coisas chamativas, quer que as pessoas pensem mal de você?

— Não senhora, por favor me desculpe.

— A roupa não está ruim, mas acho que falta alguma coisa. Aqui, use isso também. – ela tirou o próprio xale e entregou a filha. - Uma verdadeira dama deve se vestir com recato. Esse é um dos meus xales preferidos e vai ficar bom em você.

— Obrigada, mãe. A senhora é muito generosa.

Sem mostrar nenhum sinal de emoção, sua mãe simplesmente disse.

— Agora eu vou descansar. Nos chame quando chegar a hora.

Quando a velha senhora saiu do quarto, ela fechou a cara e jogou o xale em cima da cama com pouco caso. Como ela odiava aquelas roupas!

— Um dia eu farei tudo o que quiser e ninguém irá me impedir! – ela falou com a voz baixa e um sorriso perverso no rosto.

—_________________________________________________________

A festa ia começar lá pelas quatro da tarde, mas ele teve que ir mais cedo para ajudar Rosália e receber instruções para o serviço de garçom.

— Bairro das Pitangueiras... cruzes, nunca gostei desse lugar! – murmurou enquanto procurava pelo endereço e achou com alguma dificuldade porque a casa ficava em um local afastado e cercado por uma pequena área verde.

Área verde era só jeito de falar porque aquilo ali estava mais para cenário de filme de terror. Árvores mortas, vegetação rasteira lutando para sobreviver, cascalho, plantas espinhentas e uma terra seca e esquisita. Tudo parecia estar morto até onde sua vista alcançava.

A casa até que não era feia. Tinha um aspecto antigo, mas estava limpa e bem conservada. Antes de prosseguir, ele olhou por um tempo e viu que tinha qualquer coisa de familiar por ali. Não... era só coisa da sua cabeça. Talvez ele só estivesse impressionado com as descobertas que tinha feito. Era uma festa daquela organização sinistra e Cebola tinha decidido ficar mais atento do que nunca para captar quaisquer pistas que pudesse. Alguma coisa importante acabaria saindo dali.

Ele tocou a campainha e Rosália atendeu.

— Entra logo que a gente tem muito o que fazer. – a mulher disse sem nem ao menos lhe cumprimentar. – A Srta. Duister quer te conhecer. Hum... espera!

Ela analisou o rosto dele e viu que as marcas tinham sumido. Depois ajeitou as roupas dele, passou a mão nos cabelos e o levou até o escritório onde a mulher os esperava.

— Srta. Duister, esse é o meu sobrinho Cebolácio Júnior. Eu estou cuidando dele desde que sua mãe faleceu.

Ele a encarou sem nenhum receio, não entendendo por que os alunos tinham tanto medo dela. Era só uma mulher sem graça usando roupas caretas. O local onde estava a marca de Ior começou a coçar e arder um pouco e era bem provável que estivesse vermelho e irritado, mas como estava usando camisa de manga comprida, ninguém ia ver nada.

— Prazer em revê-lo. – ela estendeu a mão e o cumprimentou com aquela voz fria e suave.

— Bom dia, Srta. Duister. – ele apertou a mão que ela ofereceu e sua marca de IOR coçou ainda mais.

— Sim, parece um bom rapaz para o serviço. Rosália, trate de ensinar a ele tudo o que for necessário. Também tem alguns uniformes, procure um que seja do tamanho dele. Isso é tudo.

Os dois saíram do escritório e ele reparou que Rosália estava bem pálida e com visível mal estar.

— Você tá bem?

— Estou, isso não é nada. De onde ela te conhece?

— De vez em quando ela vai ao colégio. – Ele mentiu para não falar sobre a suspensão e Rosália se deu por satisfeita com a resposta.

De fato, de vez em quando aquela mulher visitava o colégio e os alunos ficavam como se estivessem no velório dos pais. Muitos passavam mal e teve até uma vez que o nariz do Luca sangrou muito e foi preciso levá-lo ao hospital.

“Engraçado... como é que eu tô sabendo disso?” ele se perguntou não entendendo de onde tinham saído aquelas lembranças.

— Aqui, prove isso. – Rosália cortou seus pensamentos lhe dando um conjunto elegante formado por uma blusa branca de mangas compridas, um colete preto, calça também preta e gravata borboleta.

Rosália o olhou aprovando o resultado. Com os cabelos arrumados e bem vestido, até que aquele rapaz não era feio.

— É, assim tá bom. Agora tira isso e veste sua roupa porque temos que arrumar algumas coisas até a hora da festa.

Enquanto trabalhavam, Cebola reparou que o estado de Rosália estava piorando.

— Você não parece bem. Tá até suando frio!

— Vai passar...

Seu primeiro impulso foi dar de ombros e deixar que aquela mulher se virasse sozinha, mas seu lado humanitário acabou falando mais alto.

— Falta pouca coisa e acho que dou conta. Não quer ir descansar até a hora da festa?

Ela até levou um susto com essa proposta. Por acaso teria ouvido direito? Um gesto de boa vontade da parte do Cebola?

— Se eu for descansar, vão achar ruim.

— Eu dou um jeito pra ninguém notar.

Mesmo estranhando muito, Rosália acabou concordando. Meia hora de descanso ia lhe fazer bem. Antes de ir, porém, ela quis saber de uma coisa que a estava intrigando.

— Você não está sentindo nada?

— Eu? Não, tô bem.

De fato, ele parecia bem disposto, tranqüilo e estava até corado. Nem parecia que estava sob o mesmo teto que aquela mulher. Sem falar mais nada, ela foi descansar deixando-o sozinho para dar conta da tarefa. A campainha tocou e ele mesmo foi atender para que a patroa não percebesse a ausência de Rosália. E teve uma surpresa.

— Penha? Sofia?

Cenourra? O que faz aqui? – Penha perguntou com sua típica grosseria.

— É Cebola... eu tô aqui pra trabalhar na festa. E você?

— Eu sou assistente pessoal da Srta. Duister! – respondeu com orgulho e ele estranhou suas roupas, tão diferentes do dia anterior. Ela usava um vestido longo no mesmo estilo da Srta. Duister e seus cabelos estavam presos num coque. Sofia também se vestia de preto, tinha um lenço amarrado na cabeça e estava com cara de quem ia a um velório.

— Hã... tá. Eu devo anunciar sua presença ou o quê?

— Não precisa, sei o caminho.

Ela passou por ele com o nariz empinado, sendo a Penha que ele sempre conheceu. Era impressionante como algumas pessoas mantinham fielmente suas personalidades em qualquer mundo. Sofia foi atrás dela segurando alguns embrulhos e Cebola voltou ao trabalho.

—_________________________________________________________

— Acredita que a gente até jogou dance revolution? Foi tão divertido! – Mônica falou empolgada enquanto hidratava os cabelos da Magali com um dos seus produtos caros.

— Eu também saí com o Cascão outro dia e fomos ao ferro velho onde ficava nosso trailer. A gente encheu a pança de besteira e ficou conversando um tempão. Foi muito legal.

— Bom que vocês estão ficando amigos! Acho que as coisas vão entrar nos eixos daqui pra frente.

— É, vamos ver quando a gente voltar a escola, né...

— Não precisa ter medo que vai ficar tudo bem.

Elas ficaram caladas por um tempo e Magali perguntou.

— Você ainda gosta do Cebola? – o rosto da Mônica ficou vermelho.

— Er... sim... eu gosto!

— Engraçado, nunca entendi o que você viu nele.

Nem Mônica entendia por que foi gostar justamente daquele rapaz tão rejeitado por todos. No início ela só queria ajudá-lo, mas foi se afeiçoando por ele de um jeito inexplicável.

— É que ele sempre me incentivou a ser eu mesma, sabe... quando entrei na escola queria ser meiguinha e delicada, mas ele falou que eu não precisava ser assim se não quisesse.

— Ah, então era por isso que você nunca me encarava nas brigas?

— É. Senão você ia ver só uma coisa!

Magali deu uma risada, não levando a mal o comentário. Ela sabia que Mônica era mais forte e lutava bem.

— Só que depois ele me deixou de lado e nunca entendi o porquê. Acho que ele tava com tanto problema com a mãe dele que nem tinha cabeça pra namoro.

— É, pode ser isso. E agora são aqueles parentes folgados. Tá barra pra ele, viu?

Quando terminaram de aplicar a máscara nos cabelos, Mônica foi preparar o creme facial. Magali ainda não se sentia muito confortável fazendo aqueles tratamentos de beleza, mas Mônica a convenceu de que não havia nada de errado em cuidar do corpo. Ainda assim ia levar tempo até ela se acostumar.

— Sabe... eu tava pensando... de repente eu podia provar um pouco dessas roupas de patricinha, só que não pode ser com muita frescura não!

— Ah, é? Que bom! Eu conheço uma loja muito boa com cada coisa linda que só vendo! Você vai acabar achando uma roupa legal pra usar. Pronto, acabei de misturar os cremes. Agora vamos colocar uma máscara pra ficar com a pele bem bonita.

— Credo, esse negócio parece nojento!

— Mas faz muito bem pra pele. Só não pode falar nada e nem fazer careta, viu? Senão dá ruga. 

—_________________________________________________________

Normalmente ele não se importava com problemas ambientais, mas daquela vez lamentou as plantas estarem morrendo, pois não tinha encontrado nem um mísero arbusto para se esconder e aquela árvore torta e seca não era o melhor esconderijo.

— Xaveco, por que tá escondendo aí? – Denise reclamou assim que encontrou o namorado tentando se esconder atrás de uma árvore.

— Escondendo? Nãaao, eu só estava indo pra padoca do seu Quinzão e...

— Ah, tá. E a padoca fica atrás dessa árvore, é?

Ele engasgou várias vezes, tentando explicar o inexplicável. Denise perdeu a paciência.

— Por que tava escondendo de mim? A gente quase não se viu porque você viajou, agora que chegou tá me evitando? O que tá acontecendo?

Ele gaguejou um pouco e deu um jeito de sair pela tangente.

— Olha... é... foi mal, eu preciso ir pra casa ajudar meu pai a tirar os cabelos do ralo do banheiro. A gente se vê!

O rapaz saiu dali apressado deixando Denise sozinha. O que estava acontecendo com aquele namoro?

— Eu aposto que tem alguma piriguete na jogada! Se for isso, eu esgano esse moleque!

—_________________________________________________________

— É... acho que tá tudo quase pronto. Melhor chamar a Rosália pra terminar de arrumar as bandejas.

— A Srta. Duister mandou perguntar se tudo está pronto. – Penha quis saber. Sofia entrou na cozinha enquanto ela ficou na porta, pois não colocava seus pés de rainha num lugar onde só a criadagem circulava.

— Tá tudo encaminhado. Vem cá, a quanto tempo você trabalha pra Srta. Duister?

O rosto da moça se iluminou.

— Ela me conhece desde que eu tinha cinco anos, acho, e sempre foi responsável pela minha educação. Quando fiz quinze anos, ela me convidou para ser sua assistente PRINCIPAL. – ela enfatizou última palavra - É uma grande honra trabalhar com ela, eu sou muito privilegiada!

A moça não parava de tecer elogios e Cebola achava aquilo estranho. Seria tão maravilhoso assim trabalhar com aquela mulher? Ele duvidava muito, pois para Mônica tinha sido um pesadelo. Mas Penha parecia estar sendo sincera, talvez até gostasse mesmo Srta. Caretona. Que mundo estranho...

Sem falar mais nada, ela saiu dali deixando Sofia observando seu serviço. Algo no vestido dela chamou sua atenção. O formato era muito familiar.

— Broche legal esse. – o rapaz falou e a moça deu um pequeno sorriso.

— Foi um presente da Srta. Duister pra mim. Ela faz a maior questão de que eu sempre use e até dá bronca quando esqueço de colocar.

Era um broche que parecia ser de prata e tinha o formato da marca de Ior, o que Cebola achou muito suspeito.

— Esses salgadinhos parecem muito bons! – ela falou com cara de fome.

— Vai um aí?

— Não posso. São para a festa.

— Ué, quando começar a festa você come.

— Penha e eu não vamos ficar. A gente só veio para trazer algumas coisas pra Srta. Duister.

Cebola ia perguntar por que as duas não podiam ficar para a festa quando Penha chamou da sala.

— Sofia! Onde você está, aberraçón? Aí está você de papo com a CRIADAGEM! – Ela parou na porta da cozinha com as mãos na cintura.

— Eu estava checando o serviço. – a moça falou com os olhos baixos e o rosto vermelho de vergonha.

—Checando? Oui, sei! Péssima idéia, cherry. Ele nem é tão bonito!

“Grrrrr! Mesmo nesse mundo ela é um pé no saco!” Cebola pensou e segurou a língua para não mandar aquela criatura irritante tomar onde o sol não bate.

— Vamos emborra. A festa vai começar daqui a pouco e minha glorriosa presença é emoção demais parra esses velhos chatos.

Ela saiu dali com o nariz empinado, rebolando e fazendo pose de rainha da cocada preta. Sofia foi atrás de cabeça baixa e rosto triste, deixando Cebola com pena.

Quando viu que estava mesmo na hora, ele chamou Rosália que acordou sentindo-se melhor depois de um bom cochilo. Depois trocou de roupa, os preparativos foram finalizados e quando a anfitriã da festa desceu junto com seus pais, tudo estava preparado conforme ordenado.

Ao lado dela estavam sua mãe e seu pai, dois idosos que andavam encurvados e apoiados numa bengala. A mulher tinha os cabelos bem brancos amarrados atrás num coque e usava xale. O homem tinha bigodinho e se vestia de maneira muito formal. A campainha tocou e Rosália foi atender os convidados.

— Espero que você tenha entendido o que é para fazer. – Srta. Duister falou olhando para ele com seu olhar gélido. Cebola não se intimidou e nem desviou o olhar.

— Sim senhorita, tudo está do jeito que mandou.

— Certo. Prepare-se, os convidados já chegaram. Ah, lá está nosso querido líder!

Ela foi saudar um homem de cabelos brancos, compridos e que andava apoiado numa bengala assim como os pais dela. Outros convidados foram chegando e ele suspirou de tédio ao ver que era uma festa de gente velha e chata. Se bem que nem todos eram velhos. Logo atrás do homem de bengala tinha um rapaz...

Seus olhos dobraram de tamanho ao ver em pessoa o temido Tonhão da Rua de Baixo, pois não esperava vê-lo tão cedo. E o brutamontes também o viu, para seu desespero.

— Seja bem vindo, Sr. Malacai! – ele ouviu Srta. Duister falar e por pouco não derrubou uma bandeja de canapés. Teria ele ouvido direito? Os tabefes de Rômulo podem ter bagunçado um pouco sua cabeça.

— Obrigado. Espero que tudo esteja bem organizado, hoje é um dia muito especial.

Cebola foi servindo todo mundo com salgadinhos finos, canapés e outros quitutes. Tudo muito sem graça, sem sal e nem tempero. Mas os convidados comiam como se fosse um manjar. Eram poucas pessoas e eles conversavam com voz baixa. Todos se vestiam de preto, roupas muito sérias, tinham expressões fechadas e posturas rígidas.

— Como está indo, Sr. Malacai? – Ele ouviu novamente e não teve dúvidas. Aquilo estava ficando cada vez mais estranho e a festa mal tinha começado.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Caso vocês tenham algum palpite sobre quem é a Srta. Duister, por favor não falem nada. Pode estragar a surpresa dos outros leitores. Vamos deixar as revelações acontecerem no tempo certo, ok?



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Universo em conflito" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.