Nadando con los Poetas muertos escrita por Miss Addams


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Vamos dar um pulo no tempo?



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2018

Êxtase. As luzes se apagaram e eu só me senti extasiada.

As palmas eram constantes e então veio o agradecimento. Segui o protocolo quase de forma automática. Palmas. Muitas Palmas. Olhei para o lado para ver Paco comentando com um amigo ao seu lado sobre a peça e eu lembrei de respirar direito.

Ele se sentou e eu soube que não teria volta.

E estava tão inebriada pela magia da obra que confesso não ter prestado muita atenção no percurso até os bastidores e camarins. Estávamos ali para apoiar o primo de meu namorado. Era nisso que eu deveria me concentrar.

Mas, de quebra eu o vi. Após meses ou anos. Estou perdida no tempo. Estava tudo muito movimentado é uma peça onde diversas pessoas colaboram fora o elenco, cumprimentei alguns rostos conhecidos e felizmente soltei a mão de meu namorado quando vi Fernanda Castillo.

Ela me abriu um sorriso simpático assim como começamos os ensaios para Mujeres Asesinas. Foi certeiro para falar a verdade.

Minha mão começou a tremer e a suar devido ao meu nervosismo e por um segundo minha memória celular me teletransportou para anos atrás devido a tantas pessoas conversando animadas e cansadas simultaneamente dentro de uma sala.

Olhei para o lado e ele entrou no camarim. Já trocado.

Sorriu para um dos meninos e logo engatou uma conversa. Instantaneamente eu me voltei aonde estava Paco e ele estava mais interessado na conversa com os produtores e seu primo do que em mim.

Neste momento eu não consegui prestar atenção em Fernanda ou em mais ninguém a não ser nele. Mas, não o encarava. Dessa vez era diferente. Dessa vez era diferente. Repeti o mantra assim como uma das falas da peça atemporal.

Minha mente me trai novamente e me faz lembrar de um dos momentos onde Poncho em cima do palco parou para observar a plateia e nossos olhos se cruzaram. Tenho experiência em dizer que ele demorou segundos a mais do que seria necessário.

Engoli a seco. O que eu estou fazendo? Eu não deveria me deixar levar por minhas emoções, não na frente de tantas pessoas. O passado está morto e enterrado.

O passado está me olhando com curiosidade e carinho.

Já tive minha resposta ao sentir meu coração tomar o seu ritmo particular, ele deu alguns passos na minha direção e me deu um sorriso fechado de lado que fez a pele na lateral de seus olhos enrugarem. Deus!

— Oi – Ele me disse me dando outro sorriso.

— Oi – Respondi e voltamos a nos olhar. Poderia até tentar contabilizar, mas acredito que foram frações de segundos. Me pegando de surpresa, Poncho encurtou nossa distância e me deu um abraço.

Eu o recebi em meus braços e corpo aproveitando para apertá-lo. Sentia falta. Só eu sabia que momentos como esses eram raros e queria memorizar. É muito estranho o que a saudade faz conosco, não é? Ela existe conforme o tempo passa, mas você perde alguns detalhes.

Tinha me esquecido do nosso encaixe. Do seu calor. Me trai desejando que fossem outros tempos.

Poncho se soltou tão devagar como eu e assim que voltamos a nos olhar senti que ele queria falar algo, mas foi interrompido. Outra conversa paralela. Dessa vez, Paco percebeu sua presença e agora tinha o olhar voltado aonde eu estava.

Fiquei em silêncio, confesso que constrangida. Sem necessidade, talvez. Porém, esse tipo de sentimento geralmente não busca nossa permissão para surgir.

— É bom rever você. Como está? - Poncho voltou a sua atenção para mim.

— Bem. - Resumi tudo.

Ele abriu a boca mais uma vez para falar algo que eu nunca vou saber o que era porque um dos atores lhe chamou. O camarim virou uma confusão.

Eu só posso dizer que no meio dela Paco voltou a ficar do meu lado. Eu o apresentei a Poncho e eles deram um aperto de mão cordial. Se formou um mini círculo numa conversa sobre a peça e detalhes sobre as próximas apresentações.

Ainda vivendo um turbilhão alguém propôs fazermos uma foto e como em velhos tempos ficamos próximos.

 

— Podemos celebrar juntos mais uma função da peça, o que acham? - Paco sugeriu em voz alta sorridente, mas encarando seu primo.

Não posso negar que sentir meu coração disparar mais rápido de novo e imediatamente não sabia dizer se isso era algo bom ou ruim. O convite se estendia a todos no final das contas.

Neste instante o celular de Poncho começou a tocar e ele pediu licença para atender, saiu em questão de segundos do camarim e minha cabeça estava girando. Lembrei que Paco disse antes de chegarmos que ele estava cansado, porém agora estava tão empolgado que queria comemorar.

No fim de tudo dá para entender... Sociedade dos Poetas mortos é uma obra e tanto e te deixa extasiado no mínimo. Se passaram alguns minutos e alguns decidiram comemorar e outros não poderiam. Mas, eu só queria uma resposta. Não conseguia me concentrar nas conversas.

Chegou um momento que decidimos sair do camarim porque estávamos mais atrapalhando do que outra coisa e foi no estacionamento do teatro que nos encontramos novamente.

Assim que vi Poncho entendi tudo.

Ele não iria.

Alguns dos meninos da peça o chamou e perguntou o óbvio. E só então pareceu que ele prestou atenção.

— Desculpe. - Ele deu os ombros e um meio sorriso sem graça. - Não vou poder ir hoje. Podemos deixar para outro momento sim? - Deixou no ar e eu só pude reparar no seu olhar distante. Poncho estava com a cabeça em outro lugar.

Fez um sinal para o bolso. Se despediu com um aceno. E logo saiu com o seu carro.

Uma parte de mim gostaria de tê-lo chamado. Oh capitão, meu capitão. Eu gostaria de ter tido mais tempo. Uma conversa. Talvez um convite. Talvez tenha sido um sinal. Minhas expectativas...

... 

Haviam conversas paralelas a minha volta. E tive algumas banais. Especialmente com Fernanda. Paco havia deixado o lugar ao meu lado vazio para ir conversar com seu primo e seu amigo. Eles estavam animados.

Voltei para a mesa assim que ouvi Fernanda comentar algo. Sebastián Aguirre, ator que interpretou Neil Perry na peça, respondeu que era sempre assim quando se tratava de família. Prestei mais atenção e percebi que falavam de Poncho.

— Quando se trata de família ele é assim. Diana chama e ele corre. Na maioria das vezes ele não se demora a ir para casa, essa é sua rotina, é sempre um dos primeiros a sair. - Respondeu Sebastián.

— Uma pena. - Lamentou Fernanda. - Eu queria ter conversado com ele sobre sua atuação. Eu estou sem palavras até agora. - Ela se virou e percebeu que eu estava escutando e me chamou para sentar ao seu lado. Assim o fiz. Tinha interesse.

— De todos você é a única que não falou o que achou da peça... - Mauro Sánchez tomou a frente da conversa e me encarou diretamente. Era uma pergunta indireta.

Eu me lembrei dele como Charlie Dalton e abri um sorriso. O menino tinha talento.

— Eu não tenho muita experiência no teatro. - Respondi dando um sorriso sem graça ao pensar nas obras que eu fiz. Especialmente no musical Rock Of Ages.

— Por favor, não seja modesta. - Castilho me incentivou a falar mais e percebi no seu olhar que era para encarar os meninos. Mauro e Sebastián tinha um olhar de admiração. Eu era uma pessoa mais velha e tenho anos de estrada.

— Mas... - Voltei a falar e todos nós sorrimos. - Eu sinto que o teatro é a verdadeira escola dos atores. É clichê, mas é de uma conexão maior. Desde a obra, o diretor, os ensaios, o figurino, os cenários, a estreia, a sirene, a plateia envolvida com choros e risos, o teatro é como se fosse um coração. Pulsante e vivo. Vocês são talentosos e se me permitem um conselho no lugar de vocês eu me jogaria de cabeça em tudo. Nos projetos do teatro, das series, do cinema e da Televisão.

Voltamos a rir.

Há uma classe que odeia trabalhar nas novelas.

— Digo por experiência que a televisão não é tão ruim quanto parece, reconheço sua má fama. Mas, ali é uma aprendizagem insana, uma fábrica de sonhos e é nossa cultura, faz parte de nós. Vocês são de uma nova geração que pode mudar o está errado e transformar nossa arte.

— Você é tudo o que falam mesmo. – Mauro comentou e eu fiquei curiosa. Alguém falou de mim para ele? Para eles?

Papo vai e papo vem e o assunto proibido voltou a ser mencionado. Sempre assim quando me esqueço dele, ele volta à tona.

— Deve ter sido uma loucura os ensaios então com a agenda do Poncho assim... O plano é de ficar mais tempo em cartaz? - Questionou Fernanda curiosa.

— Sim, pelo menos completar um ano, graças a Deus. Deu tudo certo até agora mesmo com Poncho correndo feito um louco dos Estados Unidos pra cá e ainda com sua festa maluca. Seu aniversário... Nada mais dará errado.

O silêncio que se formou deve ter sido curioso porque Sebastián voltou a falar para explicar.

— Poncho não é muito de sair para comemorar como estamos agora. Algumas vezes ele marca jantares em sua casa, Diana prepara tudo é sempre muito bom. Aí teve uma vez que ele nos convidou para uma festa que até hoje eu sei dizer pelo o que nós comemorávamos.

— Acho que era o seu casamento. - Mauro brincou e todos riram. Menos eu. Tinha que absorver essa informação. Percebi que Fernanda me ofereceu um cigarro e eu não recusei.

Deixou de ser minha prática, mas essa noite eu precisava. Por um momento me senti observada e olhei para o outro lado da mesa para ver que Paco me reprovava. Sei que ele não falaria nada, mas ele detesta me ver fumando.

— Diga a ele então... - Eu voltei a focar em minha amiga quando escutei que ela falava de Poncho. Estava fascinada por seu trabalho. Eu conhecia bem esse efeito. - Puxa, dá para acreditar fazer um papel como de Robbie Williams?

— Eles se encontram uma vez sabia? - Comentei casualmente e Fernanda ficou surpresa. - Sim, nos Estados Unidos, por acaso, em uma viagem. Poncho sempre o admirou muito. - Eu confirmei tentando não dar a entender que sabia muito sobre ele.

Fiquei pensando em Poncho. Era inevitável.

— Eu o acompanhei na maioria de seus trabalhos. Lembro que fui há alguns anos assistir Nadando con Tiburones, obra também baseada no filme, com Demian Bichir, um estupendo ator, vocês sabem. E Poncho sempre foi assim. Implacável. Ele é do tipo que tem um objetivo e trabalha por ele até ultrapassá-lo. Sempre foi muito talentoso, consegue dar brilho aos seus papeis mesmo pequenos, é versátil. Sempre o admirei porque ele é sensível e deixa o seu rastro... Sua mensagem em cada fala, cada gesto... - Desatei a falar e fiquei pensativa de novo.

— Curioso é que as duas peças se interligam sabem? Ambas criticam a sociedade e a pressão de quem devemos ser. No final das contas sempre estamos batendo de frente com essas normas, com essas regras. Leis. Que foram criadas para fazemos viver, mas parece que nos faz morrer lentamente. - Dei os ombros me lembrando de Poncho. - É isso, a grande lição é aproveitar o dia. Carpe Diem! — Finalizei e ganhei aplausos e comemorações.

Traguei meu cigarro e por entre a fumaça vi Paco me olhando. Será que ele escutou como eu falei?

A comemoração acabou em pouco tempo, no dia seguinte, todos tinham uma agenda cheia. Paco e eu fomos de mãos dadas até um táxi depois de nos despedir de todos.

Eu não estava muito a fim de conversar então só respondia suas perguntas e lhe escutava.

Chegamos no meu apartamento e eu fui direto para a sala para me sentar no chão.

— Estou tão cansado. - Ele comentou começando a tirar sua camisa e me encarando. – Eu vou tomar um banho e dormir. - Disse e eu entendi como se fosse um convite, mas resolvi ignorar.

— Tudo bem, eu estou com a cabeça explodindo e acho que vou dormir depois. - Expliquei e indiretamente recusei.

— Vai virar a noite mais uma vez, não é? - Ele disse bem-humorado segurando a camisa e se sentando no sofá mais perto de onde eu estava.

— Sim, você já me conhece. Sabe como minha cabeça funciona quando vejo esse tipo de obra. - Confessei. Não seria a primeira vez.

— Uma vez artista. Sempre artista. - Ele riu do próprio comentário e passou a encarar o tapete. Paco entendia minha alma de artista. Ele tinha o seu lado também. Por vezes eu cheguei a acordar de madrugada com a luz acesa porque ele estava escrevendo ou lendo.

Se passaram alguns segundos e foi como se ele se lembrasse de algo.

— Gostou da peça?

— Gostei. – Eu resumi sua pergunta e completei com um sorriso. Fui sincera.

— É incrível mesmo. Não sei como não fomos antes. - Ele definiu, eu sabia só que decidi me manter quieta. Paco então voltou a me olhar. Senti que havia algo ali e ele queria soltar, mas estava pensando em como. - Nunca te vi falar assim. - Retomou a conversa.

“Dele?”, eu pensei com minha boca fechada.

— Lá no restaurante... Sobre a peça. - Ele concluiu voltando a me olhar e esperando respostas. Respostas que talvez eu não poderia lhe dar naquele instante. Mas, lhe ofereceria parte do meu coração.

— Tenho um poema que se chama Arriésgate eu acho que fiz uma viagem ao passado ao sentir o Carpe Diem hoje. Me lembrei dos meus textos. Meus poemas. Minhas palavras. “Meus sentimentos, minha juventude e meu passado”, quis completar, entretanto, não o fiz.

— Eu sabia. Aí dentro deve ter um turbilhão acontecendo. – Paco soltou um riso e se levantou. - Bem, dessa vez, não vou ter pique para te acompanhar, estou muito cansado. Vou dormir. Amanhã eu quero ver o que você fez. - Ele se despediu e desapareceu pelo corredor me dando boa noite. O respondi me levantando.

Soltei um suspiro alto.

Fui até uma estante e peguei o controle e um dos meus cadernos. Liguei a tevê e comecei a fazer minha pesquisa. Sentei mais uma vez no tapete e voltei a pensar nele...

O resto da noite seria longa e cheia.


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