Quando os Lobos Cantam escrita por Ladylake


Capítulo 16
Separados


Notas iniciais do capítulo

Olá meus lindos! Mais um capitulo ♥



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Flashback

Era uma linda tarde outono, perto do Lago Moraine. Algumas mulheres da Vila e as jovens meninas, tratavam da roupa nas águas cristalinas.

Nour lavava o vestido dela, mas uma nódoa de lama insistia em manchar o tecido branco.

— Experimenta esfregar com um pouco mais de força – aconselha Liv – assim... vê...

A mãe dela pega no vestido e esfrega-o contra uma pedra, á beira da água. A nódoa sai completamente.

Na outra margem, um grande lobo cinzento acabara de sair dos arbustos. Nour olha para ele e acena. É Soren.

— Mãe... - chama.

— Sim...? – pergunta Liv, já sabendo o que a filha irá dizer.

— Posso ir ter com ele? Nós combinamos em ir ver a migração dos caribus este ano...

Liv faz silêncio por uns segundos. Nour volta a encará—lo. Ele esta com pressa e ela responde com abanar de ombros.

— Vai lá – diz Liv. Nour salta de alegria e corre em direção a ele – Não se aproximem muito!

— Está bem!

Com as bainhas puxadas para cima, ela atravessa a água rasa até ao lobo.

— "Pronta?" – pergunta ele num rosnar manso.

— Eu nasci pronta.

Nour sobe-lhe para cima do dorso e agarra-se com firmeza. Ele é do tamanho de um pónei. Soren transformara-se há um ano, pela primeira vez. Nour ainda espera pela vez dela. Juntos, eles percorrem a floresta até as antigas planícies do Sul.

É um lugar lindo, mas ao mesmo tempo não tem nada. Dá um arrepio na espinha e um certo desconforto a quem fica a encarar o horizonte durante muito tempo. São quilómetros de planícies verdes, sem fim, e quando o nevoeiro assenta, nas frias manhãs de inverno, é como se estivéssemos á espera de que algo fosse sair de lá a qualquer momento.

Soren trava com alguma força, da galopada, e ambos olham cá de cima da colina. As planícies estão vazias.

— Chegamos tarde de mais? – pergunta Nour.

Soren fareja o ar e depois olha fixamente para o horizonte.

— Não. Eles chegaram.

De repente, uma enorme manada de Caribus surge, num andamento curto. Os líderes da manada abrandam o passo, enquanto os mais lentos cá de trás ainda se apressam para apanhar os outros.

Nour salta para o chão. Soren morde-lhe a bainha do vestido para impedi-la de continuar.

— "Onde raio pensas que vais?" – rosna.

— Vou aproximar-me um pouco mais. Daqui não se vê quase nada.

Ela desce a colina com cuidado. Soren balança a cabeça e torna-se humano para a acompanhar.

Os jovens de quinze e dezasseis anos deitam-se no pasto e observam a manada a seguir o seu caminho. Nour põe os olhos numa cria, que decide sair da fila e vir ao encontro dos lobos.

Ela levanta-se. Soren puxa-lhe o braço imediatamente.

— É uma cria Nour! Se a mãe dela nos vê, mata-nos aos dois!

— Mas é ela que esta a vir na nossa direção – rebate – e imagina o momento único na vida.

Nour acaricia a cria de veado com cuidado, completamente derretida, mas de repente, um dos adultos sai da fila em auxílio do pequeno.

— Nour cuidado!

Soren empurra-a para longe da enorme rena, que ia em direção a ela, e é atropelado. Ele geme de dor. O braço foi deslocado. Soren olha em frente. O caribu está com as hastes apontadas a ele.

Nour olha para eles. Se ela não fizer nada, Soren vai morrer.

Um formigueiro começa-lhe a percorrer o corpo. Poderia haver pior e melhor momento?

Ela grita, com dores. Ela está-se a transformar e em breve conhecerá as suas cores. Ela é preta, parece uma noite escura e cerrada. Apenas os olhos vermelhos fazem contraste com o pelo negro como carvão.

Já erguida do chão e com uma nevoa preta á volta do corpo lupino, Nour prepara-se para atacar a rena. Ela corre e o Caribu corre também, mas em direção ao jovem de dezasseis anos, imóvel no chão.

A única coisa que Soren vê, é a rena a ser desfeita em segundos.



O sol tinha nascido á pouco tempo, dando início assim a um novo dia. Um raio de luz atravessa a janela de vidro e ilumina o casal adormecido na cama. O sol pinta o peitoral de Nanuk de ouro.

Ele acorda e imediatamente repara na pequena bola de fogo que dorme nos seus braços. Nanuk passa as mãos pelos cabelos avermelhados e Ignis responde aconchegando-se mais a ele. Como se ele fosse embora. De certa forma, ele vai.

A porta do quarto abre-se com estrondo. Nanuk assusta-se e Ignis acorda com o ressalto. Gabriel e Raphael, juntamente com um pequeno grupo de soldados, estão diante deles com uma expressão de traição.

— Eu não queria acreditar, quando me disseram... - diz Raphael, num tom desiludido.

Ignis apressa-se para cobrir os seios. Nanuk engole em seco.

— Nós podemos explicar – ele começa – não é o que parece...

— Estás a chamarmos-nos de burros? Idiotas? – pergunta o velho – Ignis, levanta-te.

Ela não se mexe. A respiração dela está tão forte e pesada que até dá pena olhar para ela. Pequenas lágrimas estão formadas nos cantos dos olhos.

—Nanuk, levanta-te! – ordena com um grito. Ele assim faz, com um peso enorme sobre ele mesmo.

— O quê? Nanuk não! – ela agarra-o - Raphael por favor! – ela chora desesperada – eu amo-o! Não mo tires!

Nanuk está em pé. Ignis permanece á frente, com o rosto inundado em lágrimas e coberta pelo lençol. Raphael olha para o casal completamente surpreso.

—Vocês realmente amam-se... -diz. Ela assente – ele sabe sequer aquilo que tu és?

Ignis cerra os dentes. O maxilar fica firme e o olhar dela fuzila o velho de farda.

— Do que ele está a falar, Ignis? – sussurra Nanuk. Ela volta-se para ele.

— Eu tenho mantido um segredo de ti... - ela começa.

Ignis afasta-se e encara Gabriel e Raphael com um sentimento de raiva.

— Eu odeio-vos.

Ela deixa cair o lençol e inspira fundo. O que são veias, tornam-se pequenos e finos rios de lava que sobem até aos olhos. Eles tornam-se duas bolas de fogo. A fumaça preta dos lobos, nela parece uma nuvem de brasas incandescente a arder que a envolvem. Nanuk está pasmado.

— O que raio...? - sussurra Nanuk.

Ignis abaixa o olhar, envergonhada.

— Esta é a besta com quem tens dormido, espero que estejas contente – insinua ríspido.

Nanuk não diz uma palavra. Ele começa a caminhar em direção a Ignis, que arde diante dos seus olhos. Os soldados olham para ele surpresos.

— Por acaso... - ele acaricia-a – estou.

Ela olha para ele e dá um sorriso. A nuvem de brasas incandescentes apaga-se e Ignis volta ao seu estado normal.

Gabriel e Raphael ficam fulos.

— Tu és minha a partir de agora!

Gabriel pega-a pelo braço, afastando-a de Nanuk. O Husky estende o braço e por centímetros que os dedos dos dois amantes não se tocam. Tudo acontece em câmara lenta.

Ele transforma-se, mas os soldados agarram-no, colocam-no em correntes e mandam-no ao chão. Os choques de um taser fazem-no parar de debater-se.

Ignis é arrastada por Gabriel. As lágrimas delas voam ao sabor dos cabelos cor de chama. Talvez ela nunca mais o veja. Pertence a Gabriel a partir de agora. Nanuk está deitado no chão, sem forças para lutar de volta.

A porta fecha-se. O rosto de rendido dele é a última coisa que ela vê. 



*****

 

 

Luckyan fecha o último zíper da mala e suspira. Ele está a tremer. Com um olhar rápido, mas com um enorme amor carregado nele, o Alfa olha para os seus betas a dormirem pacificamente. Aslam está guardado por Saaya, que dorme em forma lupina no chão.

Luckyan fecha a porta e desce as escadas com alguma pressa. Miroslav está sentado á sua direita, a ler o jornal.

Não é preciso palavras para perceber o que ambos disseram um ao outro. Miro desvia o olhar novamente para as notícias tingidas no papel e Luckyan sai.

A carrinha vermelha estremece assim que ele fecha a porta de latão. Depois de um suspiro pesado, Luckyan diz:

— Bear, vai para casa...

Não se ouve nada. Luckyan vira-se para o monte de tralha na parte de trás e repara na cauda grande e felpuda que sai debaixo da lona impermeável.

— Eu consigo ver a tua cauda.

Um pequeno rosno ecoa e a carrinha abana-se toda, assim que Bear tenta-se mexer. O focinho branco e castanho aparece e Luckyan olha para ele de modo sério.

— Tu não vens comigo.

Bear ergue-se debaixo da lona. O imenso corpo dele é duas ou três vezes maior do que um lobo normal. Ele devolve com um rosno e vários sons seguidos de uma expressão séria. Ele não está a pedir permissão. 

De volta á Vila, Nour tentava dormir. O chão frio de pedra parece-lhe mais confortável do que a cama quente com lençóis. Depois de algum tempo, o corpo habitua-se e estranha tudo o resto.

Para além disso, há 2 dias que Nour não prega olho como deve de ser. Ela tem medo de adormecer. A última vez que os olhos dela se fecharam e a mente se apagou, foi quando Nanuk a sedou.

Mas os sonhos têm-na acordado. Ela sonha com ela própria, com a mortes dos outros e ás vezes com a dela. Nour depara-se todas as vezes com um clone a apontar-lhe uma arma ou com a sua versão lupina a mostrar-lhe os dentes. Ela sente-se a perder o controlo. Como se algo mais a estivesse a controlar.

Vozes aos berros e confusão fazem as orelhas negras dela rodopiarem de um lado para o outro. Algo se passa lá fora.

Ela levanta-se e caminha até ao vitral. O bafo quente que lhe sai das narinas molhadas embacia o vidro colorido, mas ela ainda consegue ver o que está á acontecer.

Nanuk está a ser arrastado até á fogueira central. Nota-se que foi espancado, novamente. Ela corre para a porta, mas as correntes esganam-na por um segundo.

Com um olhar de raiva, a morena de olhos verdes olha para as argolas de ferro saídas do chão e nota que estão levantadas. Ela tem uma ideia.

Nour respira fundo e reúne toda a sua força. Oh ela vai sair dali, a bem ou mal.

Com um puxão, as argolas saem do chão. Ela está livre, mas quem disse que ela iria sair pela porta? Uns passos para atrás e o balanço é o suficiente. Isto vai ser quase suicídio.

Ela corre em direção á enorme janela e atravessa-a de olhos fechados. Pedaços de vidro estilhaçado ficam espalhados por todo o lado e alguns acompanham-na na queda. É uma altura de 50 metros.

As quatro patas negras assentam no chão. Ela abre os olhos. Um arranhão por cima da pálpebra do olho é o único dano que ela sofre.

Os soldados que prendem Nanuk, olham para trás, mas apenas vêm dentes a virem na sua direção. Eles tentam disparar, mas os poucos tiros que se ouvem passam-lhe ao lado ou vão para o céu. Num minuto, cinco soldados são mortos em plena praça.

Ela aproxima-se do irmão. Nanuk está sentado no chão, de cabeça para baixo e sujo com alguma terra nas mãos.

— "Mas será possível que toda a gente te dê uma tareia?" — resmunga ela, com um rosno. Nanuk levanta a cabeça e cospe um pouco de sangue.

—Habitua-te, este é o meu novo look – devolve com sarcasmo.

Ela arfa depois de ouvir a resposta dele.

Um estrondo ecoa e Nour vira-se para trás, em direção á porta. Gabriel, Raphael e mais 3 homens aproximam-se dos irmãos bastante sérios.

Nour mostra os dentes, lambendo também o focinho ensanguentado e põe-se á frente do irmão. Eles não se impressionam um pouco que seja.

— Eu nunca vou conseguir manter-te presa, pois não? – pergunta Raphael mais adiantado. Ela responde com um arfar pesado pelas narinas.

Ele aproxima-se com cuidado. Nour afasta-se. A corrente á volta do pescoço parece uma trela e é mesmo isso que Raphael lhe quer tirar.

Num movimento rapidíssimo, ela morde-o. Todos apontam as armas para ela, mas, no entanto, Raphael não solta uma onomatopeia sequer, no momento em que os caninos dela entranham na sua carne.

Nour não desfaz a dentada. Sangue escorre pelo antebraço do velho general e ambos não desviam o olhar um do outro. Estão-se a testar. Nour quer ver quanta dor o velho aguenta e Raphael quer ver quanto estrago ela consegue fazer. Ela finca ainda mais a dentada. Os seus dentes remexem na pele, carne e quase nos ossos de Raphael.

—Quanto te fartares, avisa – sussurra o velho. Nour larga-o imediatamente.

Ele tira-lhe as correntes do pescoço. Ela está livre.

— Pai, o que raio estás a fazer? – Gabriel pergunta, confuso.

— Estou a dar-lhe uma chance – responde, olhando diretamente nos olhos dela – e então? Não era isto que querias? O que vais fazer com a tua liberdade? Podes ir ver a tua mãe, a tua irmã...dar um passeio. Escolhe, mas quanto a ti – ele olha para Nanuk no chão – se eu te volto a pôr a vista em cima eu juro pela minha falecida mulher, que vais acabar a puxar armas de guerra até ao fim dos teus dias.

Raphael tinha dado as ordens. O velho vira-se para trás, mas Nour ainda tem algo a dizer:

— Isso significa que não há mais correntes e açaimes? – ela pergunta. Raphael ouve em alto e bom som a voz humana.

Ele vira-se lentamente para trás. A jovem de 20 anos encara-o com um olhar de desespero por uma resposta. O cabelo preto dança lentamente á frente dos seus olhos verdes.

— Sim, sem mais correntes – ele dá um pequeno sorriso – o jantar é ás 21h, não te atrases.

Gabriel olha para o pai em choque. Terá perdido o juízo?

Todos voltam para dentro. Antes de seguir, Gabriel dá um olhar de fúria aos lobos.

O meu pai só poderia ter endoidecido de vez. Tréguas. Com o lobo mais perigoso e desejável da lista dele. No que estará a pensar?

Ele enfia-se no escritório, mas eu não irei deixar as coisas assim. Exijo uma explicação!

—O que raio foi aquilo? – pergunto assim que abro a porta.

—Desculpa? – ele me olha surpreso.

— Está mesmo a pensar em deixá-la á solta? Ela? O mais perigoso Loup Garou que o pai encontrou na vida.

O meu pai não responde. Em vez disso, ele abre uma garrafa de Whisky e despeja o líquido alaranjado num copo.

— Acabaste de responder á tua pergunta – acaba por dizer. Eu não entendo – ela é selvagem, faminta e agora está livre. E pelo que os nossos homens viram e ouviram, ela está a perder o controlo.

— Onde está a querer chegar pai? – pergunto já sem paciência.

— Ela é com uma arma. Precisa de estar carregada e de ter um gatilho – ele beberica – com as palavras certas, esse gatilho é acionado.

— E?

O meu pai sorri.

— Nós não precisamos de os matar, ela vai fazer esse trabalho por nós.

— E se ela nos tentar matar? – volto a perguntar.

— Mandamo-la para o Campo de Concentração onde estão os outros...e matamo-la – o meu pai pega num charuto e acende – Agora... não tens alguém no quarto á tua espera?

O sorriso é incontrolável. Eu assento para o meu pai e saio do escritório, em direção aos meus aposentos. Lá, está o meu presente á espera.

Ela está virada para a janela, sentada no chão e sem se mexer. Consigo ver uma lágrima cair-lhe do rosto.

— O que lhe vão fazer? – pergunta num sussurro quase inaudível. Ignis não desvia o olhar da rua.

— Não sei – respondo – o que sei é que eu estou cheio de fome...

O estômago dela ronca. Eu dou um pequeno sorriso e aproximo-me.

A minha bota pisa as largas e longas correntes de ferro maciço que a mantém presa a mim. Agora só a mim. Como sempre deveria de ter sido. Agacho-me para lhe acariciar uma mecha de cabelo, mas Ignis não parece muito recetiva. Ela desvia o rosto, escondendo-o de mim. O fino e pulsante pescoço dela fica á mostra.

Os meus lábios tocam-no. Ignis encolhe-se e afasta-me para fugir de mim. Tento não me zangar e inspiro fundo. Talvez precise de tempo.

— Temos todo o tempo do mundo... -murmuro no seu ouvido.


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Notas finais do capítulo

NÃO SE ESQUEÇAM DE DAR UM POUCO DE AMOR ! ♥



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