Pokémon - Unbroken Bonds escrita por Benihime


Capítulo 8
Corações de Vidro




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Calista riu alto ao ver um dos Victreebel pendurados nas árvores atingir Gary com um ataque Queda de Corpo que derrubou o jovem pesquisador pokemon.

— Bem feito, garoto. — A jovem morena disse jocosamente. — Você mereceu essa.

— Ah, qual é! — Gary protestou, afastando o pokemon tipo Planta e se pondo de pé. — Tente fazer melhor, então.

— Desafio aceito, garoto.

A irmã de Ash se agachou, estendendo uma das mãos para o Pokemon Catador de Mosca. Victreebel a princípio se encolheu para longe, mas logo permitiu que Calista o tocasse. Em segundos as partes secas de suas enormes folhas haviam sido removidas. É um fato pouco conhecido, mas pokemon folhosos como Leafeon, Victreebel ou Lilligant precisam de cuidados constantes para que suas folhas não apodreçam ou se tornem quebradiças demais.

— Pronto. — A morena declarou com um sorriso orgulhoso, erguendo o pokemon tipo Grama para ajudá-lo a voltar a se pendurar na árvore da qual caíra anteriormente. — Missão cumprida. Pode ir agora, rapaz. E chega de atacar as pessoas com Queda de Corpo.

— Não é justo. — Gary protestou. — Aposto que Meloetta te deu uma mãozinha.

— Que nada. Não preciso disso. — Calista bufou ironicamente, seguindo para o próximo Victreebel à vista e repetindo o processo de limpar suas folhas. — É só uma questão de prática. Por exemplo: o truque com um Victreebel é não encará-los. Eles são territorialistas, então ...

— Eu sei disso, ok? — O neto do professor Carvalho interrompeu bruscamente. — Não precisa bancar a professora e agir como se fosse melhor do que eu.

— Gary ... — A Rainha de Kalos declarou, virando-se para encarar seu namorado com um olhar gélido. — Eu só estava tentando ajudar. Não tente descontar em mim se está frustrado.

— Não estou frustrado. Não estou descontando em ninguém. — Gary rebateu. — Você é quem está agindo toda superior. Igual à sua "amiga".

— Já chega. — Calista rosnou. — Anda, temos mais Victreebel para cuidar. Vamos nos dividir, assim terminamos mais rápido. 

Calista seguiu pelo arvoredo sozinha, propositalmente escolhendo a direção oposta a de Gary e se perdendo na tarefa repetitiva de escovar as folhas dos Victreebel usando um borrifador de água e uma escova de cerdas extra macias.

— Sabe ... —  A voz de seu namorado atrás de si fez Calista dar um pulo de susto. — Tratamento de silêncio não vai te levar a lugar nenhum.

A morena respirou fundo para se controlar antes de se virar e encarar o rapaz.

— É mesmo? — Ela inquiriu. — Qual é a sua sugestão? Porque claramente conversar está fora de cogitação. Você só ouve o que quer.

— Ah, qual é, Caly-Nite, pare com isso. Seja boazinha, está bem? Eu estou tentando.

Calista suspirou mais uma vez. Por mais bobo que fosse, aquele apelido infantil sempre a fazia sentir-se bem por dentro, mesmo que estivesse furiosa.

— Eu sempre sou. — Ela rebateu. — Você é quem anda complicando as coisas.

— Não seja dramática, Caly.

— Viu? Não há diálogo. Você interpreta tudo o que eu digo da forma que lhe convém. Um egoísta egocêntrico, é isso que você é!

— E você é uma princesinha mimada metida a sabe tudo. — Gary rebateu. — Por isso mesmo nós combinamos.

— Quer saber? — Calista rosnou. — Para mim já chega. Espero que tenha terminado a sua parte dos Victreebel. Se não, vai ter que se virar sozinho. Até mais, Gary.

Ao terminar de falar a morena atirou para ele a escova extra macia que estivera usando para limpar as folhas dos Victreebel. Gary aparou o objeto em pleno ar por reflexo.

— Caly, espere. Sinto muito. Eu ...

— Tarde demais, rapaz.

Gary simplesmente ficou parado ali, observando aparvalhado enquanto Calista se afastava a passos rápidos e nervosos.

— Lina! — O Professor Carvalho exclamou, erguendo os olhos do computador ao ouvi-la entrar e soltando um arquejo de surpresa ao notar a morena fumegando de raiva. — O que aconteceu, menina?

— Gary. — Calista respondeu simplesmente. — Ele anda impossível ultimamente. Parece que só o quer fazer é comprar briga, especialmente comigo.

— É, eu também notei. Algo deve estar incomodando o meu neto.

— Ele não comentou nada com o senhor?

— Não, Lina. — O velho professor pokemon respondeu, balançando a cabeça. — E não acredito que vá. Gary não é do tipo que fala sobre um problema. Ele sempre preferiu resolver tudo por conta própria.

— Tem razão. — A morena suspirou. — Eu só queria saber quanto tempo ele vai levar dessa vez.

— Isso, minha menina ... — Samuel Carvalho respondeu, se pondo de pé para apertar carinhosamente o ombro de Calista num gesto paternal. — Acho que vocês terão que descobrir por si mesmos.

— É, acho que sim. — A irmã de Ash assentiu. — Bem, é melhor eu ir para casa antes que mamãe comece a se preocupar.

— É claro. — O professor Carvalho assentiu. — Diga a Dehlia que mandei um oi. E ... Não se preocupe com o Gary. As coisas vão se acertar no final.

Calista sorriu em agradecimento e se aproximou, dando um beijo estalado na bochecha do velho pesquisador, rindo consigo mesma ao ver a mancha de batom na pele já enrugada do homem que considerava um segundo pai.

A jovem foi direto para seu quarto assim que chegou em casa, satisfeita em ter conseguido evitar sua mãe e irmão naquele momento em que não estava com disposição nenhuma para conversar. Myiabi, Inari e Mirabelle a receberam com olhares preocupados, observando atentamente enquanto a jovem se jogava na cama. Myiabi, a Mimikyu, imediatamente se aninhou em seus braços, esfregando o rosto contra o seu.

— Ei, pequenina. — Calista disse carinhosamente, esboçando um pequeno sorriso. — Não se preocupe, eu estou bem.

Mas nenhuma de suas três parceiras caiu naquela mentira. Myiabi se aninhou contra seu peito, enquanto Inari pulou para deitar ao lado de sua treinadora, descansando a cabeça em sua barriga. Mirabelle se limitou a procurar a bolsa de sua treinadora, remexendo-a impacientemente com suas fitas até encontrar o que procurava.

— O que foi, Mira? — Calista inquiriu ao ser cutucada por sua Sylveon. Vendo o que a pokemon segurava, a morena fez uma careta. — Ah, não. Nem pensar. Pode esquecer. Não vou ser eu a pedir desculpas dessa vez.

Mirabelle rosnou impacientemente, segurando a mão livre de Calista com uma de suas fitas e depositando ali o celular que segurava.

— Esqueça, Mira. Não vou ligar para ele. Deixe que o Gary me procure, se ele quiser. Só para variar.

As fitas da Sylveon agarraram Calista pelos ombros, dando-lhe uma sacudidela gentil. Por um momento, a jovem apenas encarou sua parceira com surpresa.

— Está bem, está bem. Que droga, Mirabelle! — A irmã de Ash cedeu enfim, abrindo um breve sorriso. — Você tem razão, nós dois estamos agindo como crianças mimadas. Um de nós tem que ser maduro e dar o primeiro passo. Mas é sério, Mira, eu já estou cansada de precisar sempre bancar a adulta.

Com Myiabi empoleirada em seu ombro e ladeada por suas duas outras parceiras, Calista decidiu voltar ao laboratório e ter uma conversa franca com Gary. Ao chegar lá, porém, o professor Carvalho a informou de que o rapaz havia ido à floricultura pegar algumas mudas de plantas medicinais encomendadas por Daisy.

— Não tem problema. — A Rainha de Kalos respondeu. — Podemos encontrá-lo no caminho. Certo, meninas?

As pokemon que as acompanhavam assentiram, e as quatro se puseram a caminho. Ao chegar ao Viveiro Xanadu, Calista seguiu direto para a estufa número 2, onde sabia que encontraria sua velha amiga Florinda.

Alcançando o prédio, a Rainha de Kalos paralisou de súbito, surpresa. As paredes de vidro lhe permitiam ver claramente: Gary e Florinda estavam juntos. O rapaz prendia a florista contra o tronco de um arbusto de hibiscos, enquanto Florinda tinha os braços ao redor de seu pescoço. Os corpos de ambos se entrelaçam, num efeito tão belo quanto grotesco.

Enquanto Calista  assistia, ele se beijavam profundamente. Ela sentiu como se alguém apunhalasse seu coração com uma adaga. Levou alguns segundos para que seu estado de choque cedesse.

— Vamos, meninas. — A morena disse, numa voz completamente sem emoção. — Foi uma completa perda de tempo ter vindo.

Calista não aguentou muito. Empoleirada em uma árvore à beira do caminho, a morena enfim cedeu às lágrimas. Inari, sentada aos seus pés, a olhava com compaixão. Mirabelle envolveu sua treinadora em suas fitas, num abraço apertado contra o qual a jovem não se dignou a protestar. Até mesmo Myiabi pulou para o colo da morena e estendeu sua garra feita de sombras, gentilmente limpando as lágrimas que lhe corriam pelo rosto.

— Obrigada, meninas. Vocês são as melhores. — Calista esboçou um sorriso, usando as costas da mão para limpar o restante das lágrimas. — Agora andem. Vamos para casa antes que alguém comece a se preocupar.

A morena chegou em casa torcendo para que sua família ainda estivesse distraída demais para perceber sua presença. Para seu azar, Ash a encontrou assim que ela pisou no jardim da frente.

— Ei, mana! — O rapaz exclamou alegremente. — Chegou bem na hora, estávamos indo treinar. Quer se juntar? Ei, espera. Que cara é essa? O que aconteceu?

— Nada, Ash. — Calista respondeu, se esforçando para soar jovial. — Só estou cansada. Anda, vamos treinar. Aposto que você não vai nem conseguir encostar nas minhas garotas.

— Pode esquecer. — O moreno declarou. — Aconteceu alguma coisa, sim. Posso ver nos seus olhos. Foi o Gary, não foi? Anda, mana, você sabe que pode conversar comigo.

A preocupação de seu irmão mais novo chegava a ser tocante. Calista, porém, não estava com disposição para aquilo. A jovem somente a custo continha uma nova onda de lágrimas.

— Esqueça, Ash! — A Rainha de Kalos quase gritou. — Eu já disse que não é nada! Largue do meu pé!

— Ei, calma. — Ash ergueu ambas as mãos no ar em rendição, encarando sua irmã com um olhar ainda mais preocupado. — Eu só estava tentando ajudar, sabia? Não precisa tudo isso.

A morena respirou profundamente para recuperar um pouco de auto controle, e então soltou o ar em um longo suspiro.

— Eu sei, Ashie. — Ela disse carinhosamente, estendendo uma das mãos para bagunçar o cabelo de seu irmão. — Me desculpe, está bem? Eu não queria gritar.

— O que aquele babaca fez dessa vez? Anda, mana. Você sabe que vou descobrir de qualquer jeito. Prefiro ouvir de você.

— Ele ... Ele me traiu, ok? — Calista enfim soltou, sua voz trêmula. A jovem, porém, mais uma vez conteve as lágrimas. — Eu acabei de vê-lo na floricultura, aos beijos com Florinda na estufa.

— Ele fez o quê?! Tem certeza? — Ash rugiu, seu rosto tornando-se vermelho de raiva quando Calista assentiu em resposta. — Aquele babaca desgraçado! Pode deixar comigo, Caly. Eu cuido disso.

— Ash! — A morena exclamou, segurando seu irmão mais novo pelo pulso. — Ash, não. Por favor. Nada de brigas.

Um soco. — Ash insistiu. — Só um soco. Qual é, Caly, você sabe que ele merece isso e muito mais. Mamãe concordaria comigo.

— Mas eu não concordo. — Calista declarou. — Ash, deixe que eu me resolvo com o Gary. Preciso fazer isso por conta própria, está bem?

O rapaz kantoniano ainda estava vermelho de fúria, e definitivamente indisposto a ceder. Porém, ao ver Calista perder a batalha e explodir em lágrimas, toda a sua raiva arrefeceu.

— Ei ... Não. — Ash disse timidamente. — Caly, não chore. Gary não merece tudo isso, mana.

Ela fungou e passou as costas da mão pelo rosto, numa óbvia porém falha tentativa de se conter. Ash deu um passo à frente e abraçou sua irmã mais velha, que enterrou o rosto em seu ombro e começou a soluçar como uma garotinha.

O rapaz kantoniano a abraçou mais forte, dando-lhe alguns tapinhas desajeitados nas costas, sem saber realmente o que fazer. Calista sempre parecia ser tão forte que era difícil conceber que algo pudesse derrubá-la.

(...)

— Steve, eu não acredito. — Cynthia protestou. — Isso é mesmo necessário? Já não conhecemos tudo sobre esse lugar?

— Duvido muito. — Steven rebateu. — De qualquer jeito, pode parar de fingir. Eu sei que você está gostando, Cynthia.

— Você me conhece bem demais para que eu consiga enganá-lo, não é?

— Pode apostar nisso,Cynth.

Os dois campeões estavam na cidade de Snowpoint, na frente de uma construção antiquíssima parcialmente escondida pela neve e pelo gelo. Era o Templo de Snowpoint, uma construção lendária que, segundo o mito, tinha conexão direta com Pokemon Colossal, Regigigas.

— Está bem, então. — Cynthia cedeu, passando uma das mãos por seus cabelos, que estavam presos em uma grossa trança. Neve se acumulava entre as mechas loiras, tornando-as quase prateadas na luz difusa daquele dia nublado. — Mas ainda não entendi o que você espera encontrar. Exploramos cada andar desse templo quando ainda éramos crianças.

— Vamos, Cynth, se anime. — Steven rebateu enquanto ambos entravam no antigo templo. — Onde está aquele seu bom humor que eu conheço tão bem?

— Tem razão, Steve. Sinto muito. Estou mesmo um pouco estranha hoje. Um mau pressentimento.

Steven não riu daquele comentário, como muitos teriam feito. Conhecia Cynthia desde a infância, sabia o quanto a intuição da loira era forte.

— Sobre o que?

— Não faço a mínima ideia. — Cynthia respondeu. — Sinto como ... Se alguma coisa estivesse para acontecer. Algo grande.

— Sempre a fatalista. — O campeão de Hoenn disse com carinho. — Relaxe, Cynth, você sabe que podemos lidar com o que quer que aconteça.

A loira meramente agradeceu aquela afirmação com um sorriso e depois disso os dois exploraram o templo em silêncio pelo que pareceram horas. Ao finalmente atingirem o quinto nível subterrâneo do prédio, uma gigantesca caverna tomada por gelo, tiveram uma surpresa.

Foi Cynthia a primeira a vê-lo: um homem alto, usando um pesado casaco negro de inverno e analisando com interesse as antigas gravuras nas paredes de pedra à luz de um lampião. Segundos depois, notou os cabelos do estranho, espetados e em um tom incomum de azul. No instante em que a campeã tomou consciência desse fato, o homem misterioso ouviu seus passos e se virou. Cynthia se viu encarando um par de olhos azul-escuros tão familiares quanto o reflexo dos seus próprios no espelho.

— Cyrus?!

Por um momento os olhos do homem à sua frente se arregalaram de surpresa, e então ele reagiu da última forma que ela esperaria: com um sorriso. Não o esgar frio e amargo do chefe da Equipe Galáctica, mas o sorriso franco e caloroso do qual Cynthia se lembrava de sua juventude. Seus lábios se moveram, mas ela não conseguiu ouvir nada além do próprio sangue trovejando em seus ouvidos.

— Cynthia. — Cyrus falou baixinho, seu tom maravilhado. Como se a mulher diante de si fosse seu próprio milagre pessoal. — Eu sabia que você viria, se eu esperasse o suficiente.

Cynthia encarou o homem à sua frente pelo que pareceu uma eternidade, sua mente completamente em branco. Só a muito custo conseguiu desviar os olhos, trocando um olhar atônito com Steven, que estava parado ao seu lado. O campeão de Hoenn, aproveitando-se do fato de sua presença não ter sido percebida, recuou para as sombras, ao mesmo tempo dando o máximo possível de privacidade e oferecendo proteção à sua amiga.

— Eu ... — A campeã de Sinnoh mal conseguiu falar, tamanha sua surpresa e confusão. — Não estou entendendo. Pensei que você estivesse morto. Pensei que Giratina ...

— Giratina? — Cyrus deixou a cabeça pender para o lado, da mesma forma que Cynthia lembrava-se de vê-lo fazer no passado quando algo o intrigava. — Cynthia, do que você está falando?

— Você ... Não se lembra?

Quase de forma inconsciente, a loira aproximou-se. Apenas um pequeno passo, nada mais. O homem a observava, seus lábios levemente abertos em espanto e curiosidade.

— Eu me lembro de nós dois discutindo. Você estava furiosa. Disse que queria romper o noivado ...

— Espere. — Cynthia interrompeu, finalmente recuperando um pouco de sua presença de espírito. — Cyrus, isso ... Isso aconteceu quase doze anos atrás.

— Não. — O homem de cabelos azuis balançou a cabeça em negativa. — Não pode ser.

A loira suspirou em resignação, aproximando-se até estar a poucos passos de seu antigo amor. Cyrus estendeu uma das mãos, que simplesmente pairou a milímetros de seu rosto sem no entanto tocá-la. Ela sentiu o calor que irradiava da pele dele, aquecendo suas bochechas enregeladas pela neve.

O ex líder da Equipe Galáctica abriu um pequeno sorriso, parecendo mais o garoto que Cynthia conhecera quando criança do que o homem que anos depois roubara completamente seu coração. 

— De fato você parece diferente. — Cyrus declarou com suavidade, quase com carinho. — Seus olhos, no entanto ... Continuam exatamente os mesmos.

Cynthia lutou contra uma onda de lágrimas, balançando a cabeça para tentar clarear a mente. Mesmo depois de tantos anos, ele ainda detinha o poder. E tudo porque ela jamais deixara de amá-lo.

— Cy, você não faz ideia do quanto está enganado. — A campeã declarou baixinho. — Não só eu mudei. Tudo mudou.

O homem de cabelos claros balançou a cabeça, olhando-a com confusão. Cynthia suspirou. Semanas passaram depois desse dia. Cyrus mostrava-se caloroso e apaixonado, quase como nos primeiros dias de seu namoro, tantos anos atrás. A única coisa que lhe faltava era memória: ele nada lembrava sobre a Equipe Galáctica ou toda a crise envolvendo Dialga e Palkia. Era quase como se nada tivesse acontecido.

Quase dois meses depois, já na cidade de Cinnabar, Ash riu e trocou um rápido olhar com sua mãe, que lhe abriu um sorriso conspiratório. Em seguida o rapaz se esgueirou por trás de sua irmã, que estava entretida conversando com Serena. Se sua namorada o viu, não deu nenhuma indicação de tal, e o jovem moreno gargalhou em alto e bom som ao ver sua irmã pular de susto.

— Ash! — Calista repreendeu. — Cresça, seu pirralho. E você, Serena, sua traidorazinha. Aposto que viu esse idiota chegando. Devia ter me avisado! 

— Eu vi. — Serena admitiu maliciosamente. — Só não quis estragar a surpresa.

— Vocês dois são absolutamente impossíveis. Uma dupla de pestes.

— Caly, pare de implicar com o seu irmão.

— Desculpe, mamãe, mas a senhora sabe que não posso evitar.

— E você ainda diz que o Ash é quem precisa crescer.

Calista riu com gosto daquele comentário, ajustando a posição da coroa de flores que seu irmão mais novo acabara de colocar entre seus cachos negros.

Faltava pouco para seu retorno a Kalos e, como uma forma de despedida em família, Dehlia sugerira que fossem ao festival da cidade de Cinnabar, um evento histórico anual da região de Kanto que comemorava a fundação da pequena cidade ao pé da enorme montanha vulcânica. A jovem Rainha de Kalos teve que admitir que, apesar de sua relutância inicial, acabara se divertindo muito mais do que imaginara.

Já estava anoitecendo, e fogueiras haviam sido acesas ao longo da praia. Pessoas dançavam em grupos junto ao bruxulear das chamas. Calista observava com satisfação, sentada lado a lado com Mirabelle em um dos troncos secos dispostos como bancos na areia.

— Você me concederia a honra dessa dança, Majestade?

A voz familiar sussurrando em seu ouvido a sobressaltou, e fez Calista virar-se de um pulo para ver Gary abrindo-lhe um largo sorriso, do tipo que não se lembrava de ver desde antes que assumissem o noivado, naquele longínquo dia na região de Alola.

— Desculpe, Gary. — Ela disse simplesmente. — Eu não sei dançar.

— Vamos, Caly, nós dois sabemos o quão ridícula essa mentira é. — O neto do professor Carvalho riu, estendendo-lhe uma das mãos. — Por favor. Só uma dança. Não é um pedido tão absurdo.

— Gary, eu ...

— Por favor, Caly-Nite. — Calista suspirou pesadamente ao ouvir seu apelido de infância. Mesmo depois de tantos anos, ainda se amolecia ao ouvir Gary chamá-la daquele jeito, por mais bobo que fosse. — Uma dança, como amigos. Ainda somos amigos, não somos?

— É claro que sim, seu bobo. — A morena cedeu, colocando sua mão sobre a do rapaz e permitindo que ele a puxasse de pé. — Tudo bem, mas só uma dança. E nada de gracinhas.

— Legal! — O sorriso de Gary se alargou, quase abobalhado em sua alegria. — Anda, Umbreon, você não pode perder essa!

Umbreon, que até então estivera convenientemente fora de vista atrás das pernas de seu treinador, abriu um sorriso para Calista ao sair de seu esconderijo e se aproximar de Mirabelle, que o tempo todo estivera empoleirada no tronco ao lado de sua treinadora, observando com olhos reprovadores. Apesar da carranca que a Sylveon tentava manter, os cantos de seus lábios se ergueram em um sorriso enquanto se juntava ao Pokemon Luar.

Gary e seu parceiro conduziram as duas garotas até a fogueira mais próxima, onde se juntaram ao círculo de pessoas e pokemon que dançavam. Calista pôde ver sua mãe, Mimey, Ash, Pikachu, Braixen, Serena ... Até mesmo o professor Carvalho e seu parceiro Tauros haviam resolvido participar das festividades.

— Sua mãe e o vovô parecem estar se divertindo bastante.

O comentário risonho de Gary fez Calista sorrir. Era quase como nos velhos tempos, quando ele parecia capaz de ler sua mente sem o mínimo esforço, apenas com um simples olhar.

— Com certeza. — A morena assentiu. — Faz muito tempo que não vejo mamãe parecer tão feliz.

— Pois é ... Anos atrás, quando você me disse que eles fazem bem um ao outro, eu não acreditei. — O rapaz declarou. — Mas estou começando a ver que você tinha razão, e não só sobre isso.

Calista parou de dançar e girou nos calcanhares para encarar seu ex noivo, seus olhos verdes cintilando com desconfiança sob a luz das chamas.

— De onde veio tudo isso de repente? O que você está armando, Gary?

— Nada. É só que ... Será que podemos conversar? Só nós dois, a sós?

— Não tenho certeza se isso é uma boa ideia.

Gary balançou a cabeça, seus olhos castanhos assumindo uma expressão de mágoa. Calista não se lembrava de ver aquele garoto olhá-la com tanta suavidade já há um bom tempo.

— Calista ... — Ele disse seu nome pausadamente, com reprovação. — Sou eu. Sou a última pessoa no mundo que sequer sonharia em fazer qualquer coisa para ferir você. Sabe disso, não sabe?

Cínico. Calista pensou consigo mesma. Como consegue me olhar nos olhos e mentir assim tão descaradamente?

— Tudo bem. — A jovem disse ao invés de externar seus pensamentos. — Acho que devo pelo menos ouvir o que você tem a dizer. Onde e quando?

— Agora. — Gary respondeu, puxando-a delicadamente para longe do círculo de pessoas e pokemon que dançavam. — Venha comigo.

A irmã de Ash lançou um último olhar ao redor, para ter certeza de que nem sua família nem Mirabelle notavam sua retirada, antes de finalmente permitir que seu ex noivo a guiasse. Os dois subiram a trilha que levava ao topo do vulcão, onde pararam por um momento para admirar a cidade de Cinnabar e as fogueiras que brilhavam ao longo da praia.

— Uau. — Calista comentou sonhadoramente. — Isso é lindo.

— Pois é, com certeza vale a subida. — Gary concordou. — Agora olhe para lá, para o Leste.

A morena fez o que lhe foi sugerido, vendo uma enorme e amarelada lua cheia surgindo sobre o mar, colorindo as ondas com sua luz como um gigantesco holofote.

— É exatamente como aquela noite em Alola. — A Rainha de Kalos declarou. — Lembra? A noite em que Inari nasceu.

— É claro que eu me lembro, Caly. — O neto do professor Carvalho respondeu, correndo o polegar pelas costas de sua mão em uma carícia. — Eu me lembro de cada segundo. Cada detalhe. Duvido que pudesse esquecer. E é exatamente sobre isso que eu queria falar.

Calista simplesmente balançou a cabeça, permitindo que Gary a puxasse consigo. Os dois se empoleiraram nas rochas vulcânicas de topo mais plano, usando-as como bancos. A irmã de Ash notou que o rapaz ao seu lado em momento algum soltou sua mão, mas decidiu não fazer nada a respeito. Momentaneamente, pelo menos.

— Admito que agora você conseguiu me confundir. — A morena disse. — Do que, exatamente, você está falando Gary?

— Daquele dia em que discutimos no laboratório do vovô. — Gary respondeu. — Você tem razão: eu estava frustrado. Com ciúmes. Devia ter conversado com você a respeito ao invés de discutir. Fui um enorme, tremendo idiota. Não só daquela vez, mas já há um tempo antes daquilo. Você teria toda razão em me odiar.

— Que bom, pelo menos você admite. — Calista declarou amargamente. — Isso prova que tem alguma decência.

— Por favor, Caly, seja boazinha. — O jovem pesquisador repreendeu, embora sorrindo com aquela demonstração da teimosia que já conhecia tão bem. — Eu estou tentando dizer uma coisa importante. Você podia facilitar as coisas para o meu lado.

— Tudo bem, tudo bem. — A Rainha de Kalos cedeu com um profundo suspiro. — Diga. Estou ouvindo.

— Eu sinto sua falta, Caly. — Gary disse suavemente, estendendo a mão livre e se inclinando para acariciar a bochecha da mulher à sua frente. — Você não imagina o quanto. Eu te amo como nunca, jamais, amei qualquer outra pessoa.

— Mentiroso.

A resposta àquela acusação foi que Gary se levantou e a puxou consigo. O gesto abrupto e inesperado fez com que Calista se chocasse contra o peito do rapaz, que imediatamente passou os braços ao redor de sua cintura, cingindo-a num abraço apertado.

— Caly ... — O neto do professor Carvalho disse baixinho, esfregando o rosto nos fartos cachos negros da Rainha de Kalos como um gato, apreciando o já familar aroma de gardênia que ela sempre exalava. — Seja honesta, comigo e consigo mesma. Você não sentiu minha falta? Nem mesmo um pouco?

Quase contra sua vontade, Calista sentiu os joelhos bambos e a mente travada. Simplesmente ficou imóvel, sentindo a calidez da mão que aninhava sua bochecha. Quase sem saber o que fazia, passou os braços pelo pescoço de Gary em busca de apoio, descansando a cabeça contra o ombro dele. O jovem tomou o gesto como aquiescência, gentilmente erguendo-lhe o rosto para beijá-la.

Rendida por aquela mistura de desejo e raiva, Calista se permitiu retribuir o beijo. Sabia que devia se afastar, mas havia esquecido o motivo. Afinal, era só Gary ... O seu Gary ... O melhor amigo do seu irmãozinho, mesmo que nenhum dos dois admitisse  o fato ... O rapaz egoísta e insuportável que a havia amado desde sempre ...

— Bom ou ruim? — Ela o ouviu sussurrar, fazendo-a arrepiar-se quando seu hálito quente moveu alguns fios de seu cabelo. — Caly?

Calista soltou um pequeno arquejo de prazer quando Gary mordiscou a pele sensível de seu pescoço, depositando beijos que desceram devagar até a base de sua garganta. A jovem sentiu-se derreter. Apenas os braços dele, firmemente envolvidos ao redor de sua cintura, a sustentavam.

— Boa ou ruim? — Gary insistiu.

A irmã de Ash não respondeu, simplesmente pendeu a cabeça para trás de modo a facilitar o acesso daqueles lábios que exploravam seu pescoço, descendo e se aproximando cada vez mais de seu colo, até o ponto onde o decote de sua blusa começava ...

— Calista?!

— Mana?!

As duas vozes, uma completamente esperada e a outra uma total surpresa, foram como um balde de água fria. Calista abruptamente empurrou Gary, impondo distância entre os dois.

— Não acredito que você está aqui com ele! — Malva exclamou. — Francamente, Calista, de todos os erros idiotas ...

— O Gary é o idiota aqui. — Ash interrompeu. — Minha irmã só é boa demais para o próprio bem.

— Não posso discordar disso. — A repórter kalosiana aquiesceu rispidamente. — Já você, Gary Carvalho, claramente não vale nada.

— E quem é você para se meter nisso?

— Uma amiga, que claramente se importa mais comigo do que você. — Foi Calista quem respondeu, seu tom pingando pura fúria e seus olhos demonstrando somente acusação. — E ela tem razão. Não pense que não sei sobre Florinda. Eu vi vocês dois aos beijos na estufa.

Somente por um momento Gary pareceu surpreso, então sua expressão mudou para uma de desdém quase absoluto.

— Se você sabia e ainda assim veio até aqui comigo, então é tão hipócrita quanto está me acusando de ser. Você não é melhor do que eu, Caly! Vamos, admita!

— Retire o que disse! — Ash berrou, seu rosto corando de fúria. — Minha irmã é milhões de vezes melhor do que você, e todo mundo sabe disso!

— Ah, cale essa boca, Ash-boy. Caly queria isso tanto quanto eu. Ela também me beijou. Ela me ama.

— É verdade. — Calista admitiu. — Amei, anos atrás. Antes de você me virar as costas quando eu mais precisava. Agora, nem sei mais quem você é.

— Droga, Caly, eu não mudei. Ainda sou eu!

— Não. O Gary de quem me lembro jamais teria feito isso comigo.

— Ah, pelo amor de Arceus, Caly ...

— Ei, já chega. — Ash interferiu, interpondo-se entre os dois ex namorados. — Parem já com isso, vocês dois.

— Não se meta, Ash! Isso é entre nós dois!

— Já chega. — Malva interferiu. — Ash, é melhor você ir. Eu cuido disso.

— Mas ...

— Vá. — A repórter ordenou. — Não piore as coisas para a sua irmã.

O rapaz assentiu e obedeceu. Malva imediatamente voltou-se para Gary, seus olhos luzindo de fúria.

— Suma daqui, moleque. — Ela disse. — Deixe Calista em paz.

— Eu não vou a lugar nenhum. — Gary rebateu arrogantemente. — Não tenho medo de você.

— É mesmo? — Malva praticamente ronronou, naquela frieza perigosa que precedia seus momentos mais cruéis. — Então suponho que não saiba com quem está lidando. Acredite, rapaz, eu não sou uma inimiga que você vai querer ter.

— Sei exatamente quem você é. — O jovem pesquisador pokemon respondeu. — Uma mentirosa fútil, falsa e covarde que precisa de um exército de capangas da Equipe Flare para enfrentar alguém.

Malva não respondeu, simplesmente deu um passo à frente e atingiu Gary com um soco. O rapaz gemeu de dor e levou aos mãos aos rosto, seu nariz agora pingando sangue.

— Mal! — Calista gritou, horrorizada. — Malva, não! Pare com isso!

— Malva! — Ash, que assistira ao confronto escondido nas sombras, interferiu. — Chega! Tire a minha irmã daqui, eu cuido do Gary.

— Tudo bem. — A mulher de cabelos cor de rosa assentiu, seu rosto ainda contorcido em uma máscara de fúria. — Você tem sorte, Carvalho. Não vou acabar com você hoje. Melhor agradecer ao Ash por isso.

Dizendo isso, a repórter segurou Calista pelo pulso com bem mais gentileza do que a morena esperava, levando-a consigo de volta para a trilha que conduzia montanha abaixo. A jovem kantoniana tentou se soltar, mas um olhar para a mulher de cabelos cor de rosa foi o bastante para fazê-la desistir da ideia e parar de resistir. Enquanto se afastava, Calista ouviu novamente o som enjoativo de um punho atingindo carne macia.

— Me desculpe. — Malva disse gentilmente após alguns segundos. — Caly, eu realmente sinto muito. Perdi o controle. Eu não devia ter ...

— Como ... Como você sabia? — A Rainha de Kalos interrompeu em voz baixa. — Como foi que me encontrou? E por que deixou que o meu irmão se envolvesse nisso?

— Eu disse que ficaria de olho em você. — Malva respondeu. — Quanto ao seu irmão ... Eu não o deixei fazer nada. Ash é estupendamente teimoso. No momento em que teve a menor pista de que eu estava procurando por você ... Bom, acho que você pode imaginar.

— É, eu posso sim. — Calista assentiu amargamente. — Mesmo assim, ainda preferiria que ele não tivesse visto Gary e eu juntos hoje.

— Ele não está errado, sabia? — A repórter declarou. — Eu mesma poderia voltar lá e transformar aquele seu ex noivo canalha em uma pilha de cinzas.

— Não, Mal. Por favor, não.

A repórter kalosiana a olhou apenas por um breve momento, e então abriu um pequeno sorriso. Um gesto sincero, quase caloroso.

— Aquele rapaz tem sorte de você ser uma pessoa muito melhor do que eu, Caly.

— Isso não é nada difícil, bruxa.

Apesar da piada e do sorriso forçado, Malva notou o quanto Calista estava se contendo. O rosto da jovem estava pálido como giz, seus olhos avermelhados e ela tremia dos pés à cabeça.

— Caly ... — A repórter kalosiana balançou a cabeça em reprovação. — Eu juro, você é a pessoa mais teimosa que eu já conheci. Bancando a durona mesmo agora ...

— Não vou chorar por ele. Gary não merece.

— Bela atitude. Veremos por quanto tempo consegue mantê-la.

— Me chamando de fraca? — Calista inquiriu num rosnado. — Você é desprezível.

— E mesmo assim ainda estou aqui. Assim como você. — Malva rebateu. — O que isso diz sobre nós, huh?

— Ok, talvez nós duas sejamos horríveis.

— Só humanas, Calys. — Foi a resposta indiferente. — Agora venha, vamos dar o fora daqui.

— Não. Eu não posso voltar ao festival e deixar que me vejam desse jeito.

— Bom, você não tem escolha. Sua parceira ainda está lá, certo? E ela vai ficar preocupada se você sumir. Furiosa também, eu diria.

Calista deixou sua cabeça pender e seus cachos esconderem-lhe o rosto, envergonhada de seu egoísmo. Só mesmo Malva, com sua honestidade brutal, para colocar seus pensamentos de volta no lugar em uma hora como aquela.

— Tem razão. — A morena cedeu. — Mira com certeza iria querer me matar.

— Eu cuido da Mira. — A voz de Ash soou. — Você, mana, vá pra casa.

As duas mulheres se viraram a tempo de ver o jovem moreno descendo a trilha, com um olho roxo e o lábio inferior cortado. 

— Droga, Ash! Não era para ter se metido numa briga, ainda mais por minha causa.

— Relaxe, mana. — Ash disse tranquilamente. — Valeu a pena.

— Isso quer dizer que aquele verme repugnante levou a pior? — Malva inquiriu acidamente.

— Pode apostar. — O treinador kantoniano assentiu com um sorriso satisfeito.

— Perfeito. — A repórter sorriu com aprovação. — Nada mal, garoto.

— Ninguém mexe com a minha irmã se eu puder evitar. — Foi a resposta. — Agora é sério, Caly, vá para casa. Descanse. Vou manter todo mundo longe do seu pé até amanhã. Pensando bem ... Talvez seja melhor eu ir com você.

— Pode deixar que eu cuido disso. — Malva interferiu, passando um braço pelos ombros de Calista de forma protetora. — Essa teimosa vai chegar em casa sã e salva. Eu prometo.

— Caramba, Malva, obrigada. Eu nem sei como te agradecer.

— E nem precisa.

Calista se pegou quase sorrindo novamente com aquela resposta. Afinal, aquele era o motivo pelo qual valorizava tanto a amizade de Malva: mesmo com o temperamento de um Gyarados raivoso, aquela mulher era a pessoa mais leal que já conhecera.

Assim que Ash se afastou, a especialista em pokemon tipo Fogo ergueu uma pokebola e libertou seu Talonflame.

— Malva, é sério. Eu estou bem. Posso ir para casa com IceFire.

— E depois eu sou a mentirosa. — Malva rebateu ironicamente. — Suba e não discuta, menina fada. Não vou deixar você acabar se matando no caminho de volta.

— Engraçadinha. — Calista rebateu — Até parece que aquela garota deixaria qualquer coisa acontecer comigo.

— Pode ser, mas vou me sentir melhor se tiver certeza.

Calista desistiu de discutir. Já aprendera há muito que argumentar contra Malva era uma causa perdida e um gigantesco desperdício de tempo. A jovem simplesmente se aproximou de Talonflame, que se abaixou para que pudesse ser montada com mais facilidade. Mesmo assim, a morena ainda sentiu as mãos de Malva em sua cintura ajudando-a a montar no majestoso pássaro, o que a fez sorrir consigo mesma. Momentos depois, as duas mulheres e a ave ganharam os céus.

— Calista — Malva chamou um pouco depois ao ouvir sua companheira soluçar baixinho. — Pensei que tivesse dito que não iria chorar por ele, menina fada.

— Não estou chorando por ele. — Calista rebateu, lançando um olhar zangado para a mulher kalosiana enquanto limpava as lágrimas teimosas com a mão livre. — Estou chorando porque estou furiosa.

— Certo. — Os braços da mulher kalosiana, que já estavam ao redor de sua cintura, se estreitaram ainda mais, num abraço um tanto desajeitado. — Vou fingir que acredito em você.

— Pela última vez, Malva, eu não ...

Mas Calista não conseguiu completar a frase, perdendo de vez a batalha contra as lágrimas, que agora fluíam livres.

— Eu sabia. — Malva suspirou, estreitando ainda mais os braços ao redor de Calista. A morena se permitiu ser abraçada apenas por um breve instante antes de afastar-se. — Sua teimosa.

— Que droga! — A jovem kantoniana exclamou baixinho assim que conseguiu se controlar. — Me desculpe, Mal. Eu não queria chorar.

— Peça desculpas mais uma vez e vou ficar muito zangada com você. — A repórter rebateu. — Chorar não é nenhum crime, sua garota teimosa.

— Ah, claro. Isso vindo da Bruxa Malvada em pessoa.

A mulher de cabelos cor de rosa soltou um bufo baixinho, o que Calista logo percebeu ser uma risada mal disfarçada.

A morena sorriu de ternura. Malva podia ser puro aço, até mesmo cruel segundo algumas pessoas, mas era uma das amigas mais incríveis que qualquer um poderia querer.

O resto do voo seguiu em silêncio absoluto. Quando finalmente pousaram, Malva ajudou Calista a apear.

— Tem certeza de que está bem? — A repórter inquiriu.

— Estou sim. — A morena respondeu afetuosamente. — E obrigada por tudo. Não sei o que eu faria sem você.

— Pare de me bajular. — Malva rebateu. — E tente descansar um pouco. Você está precisando.

 

As palavras a pegaram de surpresa, fazendo Calista deixar escapar uma risada fraca. Ali estava o motivo pelo qual adorava Malva: ácida e cruel, porém brutalmente honesta. Egoísta até o osso, porém a pessoa mais leal que já conhecera. Perigosa, porém corajosa. Aquela mulher complicada e misteriosa subia cada vez mais em seu conceito.

Sem sequer parar para pensar no que fazia, Calista se inclinou e lhe deu um beijo na bochecha.

— Obrigada de novo. — A jovem kantoniana disse. — De verdade.

Foi uma sorte que Malva fosse tão boa em esconder seus sentimentos porque, pela primeira vez em um bom tempo, a repórter sentiu-se corar depois daquele agradecimento.

 


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