Reconstrução escrita por Gabs Germano, Indignado Secreto de Natal


Capítulo 10
Esperança




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Ponto por ponto eu me rasgo

Se estar quebrado é uma forma de arte

Eu devo ser uma criança prodígio

Fio por fio eu me desfaço

Se estar arrasado é um trabalho artístico

Com certeza essa é minha obra prima

Neptune - Sleeping At Last

 

Manteve os olhos fechados, mesmo após já sentir os pés firmes no chão e o enjoo característico de desaparatar ter passado. Sentia a mão de Remus junto a sua e não quis soltá-la, pois mesmo após tudo que acontecera com os dois, as desconfianças e brigas, Moony ainda era alguém que lhe transmitia força.

Era começo de dezembro e naquele local o frio parecia ainda mais intenso que em Londres. O vento gelado batia forte contra seu corpo e ele tinha o desejo de se aquecer imediatamente. Abriu os olhos e o branco intenso da neve fez os seus olhos arderem pela claridade excessiva em união com o dia claro.

Estavam diante do pequeno cemitério de Godric's Hollow. Seu peito doeu por saber que estivera ausente no enterro de Lily e James e por instinto apertou ainda mais a mão de Lupin entre a sua. Andaram em silencio pelo caminho até a entrada do cemitério, com a neve umedecendo a barra de sua calça.

O frio não era nada comparado a dor quase desumana que sentia naquele momento. Estivera preso em um quarto, alimentando a própria dor, olvidando-se do mundo externo. E naquele instante, a dor era diferente de todas. Era densa, quase palpável. Era uma dor que corroía tudo e que o trazia para a realidade do modo mais brutal que existia.

Sentiu o peito arder em uma falta de ar, à medida que se aproximava do túmulo. As letras grifadas na pedra, fazia a morte de Lily e James tornar-se ainda mais real. Soltou a mão de Remus e os joelhos cederam em um baque silencioso na neve.

― Doí como o inferno, eu sei. ― Murmurou Lupin. ― Mas acho que Prongs merece que você se despeça dele do modo correto.

Seus dedos tocaram a pedra fria, deslizando lentamente pelo nome de James. As lágrimas deslizaram com facilidade.

“Pad, quando eu me casar com Lily, pois eu vou me casar um dia com ela, quero que você seja meu padrinho. – Comentou em uma tarde silenciosa de inverno, próximo do Natal. – E quando eu tiver um filho, você será o padrinho dele”.

 

Injustiça. Sirius ao se recordar de que Prongs prometera que ele seria padrinho de casamento e de Harry – mesmo que James e Lily nem namorassem ainda – sentiu um gosto amargo em seus lábios, um gosto cruel de injustiça. O destino fora incrivelmente bárbaro com todos eles. Eles eram jovens demais quando o ar de guerra começara a pesar; jovens demais quando tiveram que decidir por quem lutar; jovens demais para lutar.

Jovens demais para morrerem.

“Sirius, caso eu e James morra, quero que você cuide de Harry. – Pediu Lily em uma manhã quente, ainda com o pequeno Harry em sua barriga. O temor que Sirius jamais viu em Lily, que era pura coragem, o preencheu naquele momento e ele jamais conseguiu não temer por tudo que ocorria”.

Ele prometera que cuidaria de Harry. Seu pequeno Harry. Mas ele não conseguia imaginar como cuidaria de uma criança. Ele não conseguira nem cuidar de Regulus, que era seu irmão caçula. Ele não conseguira manter James e Lily vivos. Não conseguira descobrir que Peter era um maldito traidor.

Como ele cuidaria do pequeno Harry?

Sirius chorou, ajoelhado diante do tumulo do casal. Chorou pela vida ser injusta e eles serem tão jovens. Chorou pelo que foi arrancado dele de modo brutal. Chorou por não saber como conseguiria a guarda de Harry para si e como cuidaria do pequeno.

Ele era fraco e egoísta. Não merecia ser da Grifinória, tamanha a fraqueza que carregava naquele momento. O temor que carregara desde que Lily mostrou o medo pelo filho, jamais passara e parecia pior naquele instante. Não tinha ido no enterro de ninguém e quando os últimos a caírem foram James e Lily, ele se fechou em um quarto. Era covarde até mesmo para fazer o que tinha desejado de fato naqueles dias, que era se jogar da janela.

Já ouvira falar que desejo de morte era depressão, no mundo trouxa, mas ele jamais acreditara naquelas doenças que surgiam – ou eram de fato faladas – pelos nascidos trouxas em Hogwarts. Quando morava ainda com os pais, era constante o aperto no peito, assim como o desejo de sumir, quando apanhava e era trancado no quarto. Começara quando era criança e só passara quando fugiu. Entretanto ao ver Regulus se tornando um Comensal, o término do seu relacionamento – se é que podia chamar assim – com Remus e a guerra tirando as pessoas de si, aquele desejo de desaparecer era crescente e a falta de ar era insuportável quando alguma nova morte era anunciada.

Talvez ele tivesse aquela doença. Ou talvez só fosse covardia e sensação de não ser capaz de fazer nada.

“Nasceu Pad, Harry nasceu! – Gritou James, saindo da sala de parto que Lily havia sido levada no St. Mungo’s. Em meio a guerra, a felicidade de James trouxe luz para ele e todos presentes. Era uma emoção estranha, mas que causou paz em Sirius, abraçado James de forma eufórica, desejando ver imediatamente o afilhado”.

 

A mão de Remus apertando seu ombro, o trouxe novamente para realidade. O frio cortante, as letras na pedra, a neve umedecendo sua calça.

― Prongs, eu prometi para você e para Lily que cuidaria de Harry e vou cumprir isso. ― Sussurrou para o nada. ― Eu sinto muito por não ter protegido vocês. ― A voz era rouca devido ao choro, agora um pouco mais calmo. ― Eu queria ter descoberto sobre o Peter... Eu queria tanto, mas tanto, ter protegido vocês.

A neve abafou quando Remus ajoelhou ao lado de Sirius e o envolveu por seus braços, abraçando-o por trás. Nada foi dito, apenas ficaram ali, ambos mirando o tumulo em seus próprios pensamentos e dores.

 

Escuridão absoluta, azul pálido

Estes oceanos selvagens

Sacodem o que sobrou de mim

Só para me ouvir clamar por misericórdia

Neptune - Sleeping At Last

 

Os dois permaneceram assim durante minutos que pareceram infinitos, absortos no silencio do cemitério. Ao se levantarem, Remus não permitiu que Sirius se afastasse e o mesmo nem desejava se afastar. Havia um acordo silencioso que ambos precisavam daquele momento juntos, sem julgamento, sem passado. Era apenas Remus tentando fazer Sirius voltar a vida e reagir de alguma forma.

Não houve quem começasse o abraço, eles apenas se abraçaram e permaneceram novamente um no braço do outro. Estar nos braços de Remus era reconfortante. Era como finalmente ter um fio de esperança e sanidade, após um mês inteiro enterrado em luto. Ele já havia chorado, esbravejado e desejado estar morto diversas vezes. Entretanto as lágrimas que estavam deslizando por seu rosto naquele momento, molhando a blusa de Remus, era um choro quase desesperado de uma sensação estranha de alívio.

Ele tinha Remus. Não havia sobrado apenas ele, como pensara diversas vezes. Um arrependimento cruel o tomou por desejar que Remus tivesse no lugar do James. Ele jamais pensaria aquilo novamente.

― É bom ter você aqui, Rem. ― Sussurrou, com a voz rouca pelo choro. Sentiu os braços de Lupin o apertarem ainda mais seu corpo.

Podia morar ali, naquele abraço. Sentiu que mesmo quebrado internamente, era possível ter um pouco de esperança, amor e afeto. Mesmo com toda escuridão o tomando, era possível ver alguma luz no final do túnel.

― Vamos buscar, Harry, Rem. ― Pediu, mas não fez menção de se mover. Não havia cura para sua dor de ter perdido James, mas havia um sentimento gostoso de fé nascendo dentro de si. Beijou o rosto do lobisomem, de maneira demorada e intensa, agradecendo aos céus, por ter ele ali, em uma tentativa de o salvar de si mesmo. ― Obrigado por estar aqui.

Remus nada disse, apenas permaneceu ali. Sem saber, estava salvando Sirius e se salvando também.


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