A estrela mais brilhante escrita por LC_Pena, Indignado Secreto de Natal


Capítulo 3
Capítulo 2. Uma longa semana


Notas iniciais do capítulo

Segundo capítulo, dessa vez contemplando um espaço bem curto de tempo, porque eu sou assim de inconstante, mas tem uma das coisas que conversamos no chat (e que acabou tomando uma proporção grande), espero que você goste.



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Rita havia ido dormir há poucos minutos, então Sirius aplicou um feitiço antirruído na porta do quarto dela, antes de ir atender ao choro de seu filho recém-nascido. Havia se levantado da cama improvisada na sala abarrotada da mulher, tentando não tropeçar em nenhum dos móveis na escuridão da noite, feito notável dada a bagunça do lugar.

Era mesmo incrível como o ser humano podia se adaptar rapidamente às novidades, por exemplo, Cometinha não tinha nem um dia fora do hospital e o maroto já sabia exatamente como o tirar do berço sem quebrar o pescoço e nem deixá-lo cair no chão, duas coisas que pareciam bem prováveis na primeira vez que o segurara nos braços.

Ajeitou o filho no vão entre o braço e o antebraço, antes de consertar a manta que havia escorregado com o movimento brusco. O bebê continuava chorando como se o Sol não fosse nascer novamente na manhã seguinte, então o rapaz o sacodiu com leveza.

―  Você sabe que amanhã é um grande dia, certo, garoto? Os seus tios vão vir te visitar e todos nós temos que estar na nossa melhor forma, não é mesmo? ―  O grifinório foi falando com o tom mais calmo que conseguia gerir, mesmo que estivesse começando a entrar em pânico.

Ok, Sirius, sem pânico, lembra das orientações de Andrômeda que tudo vai ficar bem!

Certo, o bebê tinha acabado de mamar, sabia que ele tinha que se alimentar várias vezes ao longo do dia e da noite, porque seu estômago era muito pequeno, só que meia hora era pouco tempo para uma nova refeição, então fome estava teoricamente descartada das hipóteses para aquele choro.

Apoiou a criança com cuidado no móvel que Rita havia insistindo que era essencial, um trocador de madeira com um revestimento de tecido antirresíduo, então checou a fralda do bebê, respirando aliviado porque não estava bem certo se havia aprendido direito o ritual mágico para a troca de fraldas sujas.

―  Certo, amigão, eu sei que não vou poder evitar isso para sempre, mas não estou muito animado para começar a limpar a sua bunda. ―  Falou divertido, mas o bebê continuou esperneando de uma maneira desesperada, o que fez o animago perder todo o ar de brincadeira que havia adquirido com o próprio comentário.

Trouxe o menininho novamente para perto de si, dessa vez na vertical, em um abraço desajeitado. Colocou a cabeça do bebê em seu peito e o sacodiu com mais veemência, porque tinha ouvido que bebês gostavam dessas coisas, então talvez se ele balançasse mais forte, ele gostasse mais!

―  Shhhhhhh, eu sei, você está chateado, mas eu não faço ideia do que você quer, Cometinha! ―  O maroto resmungou exasperado para o filho, olhando ao redor do quarto, a procura de qualquer coisa que pudesse funcionar para acalmar o choro daquela criança. ―  Meu Merlin, a gente vai ter que encontrar uma forma de se comunicar, Halley, porque assim vai ser muito difícil...

Sirius havia usado o que provavelmente seria o segundo nome do bebê, assim que decidisse qual seria o primeiro. Halley havia soado errado novamente, da mesma forma que soara quando tinha testado o nome na maternidade, mas com os pais de Rita o olhando julgadores, ansiosos para comunicar aos familiares sobre a chegada do neto, teve que aceitar o nome, por hora.

Mas era só olhar para a carinha cada vez menos enrugada de seu filho para saber que não era um Halley Black de jeito nenhum! Tinha certeza de que um Halley seria dócil e paciente e seu pequeno já estava demonstrando que não seria nenhuma das duas coisas.

Não era tanto por conta daquele choro em específico, mas de tudo que havia sido dito sobre ele na maternidade:

Primeiro, o bebê mantinha um eterno cenho franzido para tudo e para todos, mal abrindo seus olhinhos ainda cinzas – Rita tinha certeza de que os olhos seriam verdes como os seus – para nada, nem ninguém.

Segundo que quando ele estava satisfeito em alguma posição, geralmente no colo de alguém, ficava muito chateado quando tinha que trocá-la, pior ainda se o novo lugar fosse o berço. As curandeiras auxiliares o haviam descrito como “adoravelmente genioso” por isso.

Com certeza a história seria completamente diferente na adolescência...

E terceiro... Bem, o bebê não se esforçava nem um pouco para se acalmar e, a cada minuto que passava, seu choro parecia mais estridente e desesperado. Com certeza não era um Halley, cujo nome tinha toda a pinta de pertencer a um lufa-lufa tranquilo e bem-comportado.

―  Cometinha Black, o que eu vou fazer com você? ―  Sirius sussurrou para o filho, beijando de leve a cabeça pequena, que não era desprovida de cabelos, como havia pensado a princípio, mas sim coberta de uns fiozinhos ralos, tão clarinhos, que pareciam nem estar lá.

O maroto rodou devagar pelo quarto, tão incomodado com o choro do filho, quanto com a combinação que havia usado para chamá-lo: Cometinha Black. Por mais irônico que fosse, a única certeza que tinha sobre o bebê não era a respeito do temperamento, ou da cor dos olhos e do cabelo, que podiam mudar a qualquer momento, ou da casa em Hogwarts e nem sequer era o primeiro nome dele e sim o fato de que o menino era um Black.

A única coisa que tinha tentado evitar por toda a vida, agora era a única certeza que podia dar ao seu filho, ou seja, uma verdadeira tragédia grega. Riu amargamente, de olhos fechados, sentindo o calor do corpinho encostado no seu, com o choro estridente ainda machucando seus ouvidos sensíveis de animago.

Ok, nenhum dos dois era um Black pleno, já que Sirius havia sido queimado da tapeçaria. O grifinório se viu então obrigado a listar o que ser um Black significaria para Cometinha, já que não parecia que o filho iria voltar a dormir e nem que ele conseguiria mudar esse curso de raciocínio absurdo, que volta e meia inundava seu cérebro de perguntas.

Certo, sendo um Black, Cometinha seria seu filho, obviamente e teria como familiares próximos Andrômeda e sua família e todos os seus amigos, o que era o que de melhor poderia oferecer, Sirius estava bem certo.

Talvez o menino tivesse que responder à perguntas indelicadas sobre uma prima presa em Azkaban ou sobre primos de primeiro grau participando da alta sociedade britânica, primos com os quais nem sequer teria o mínimo contato... Bem, por sorte essa era uma lista bem curta, porque todo o resto do que significava ser um Black o maroto nunca apresentaria ao filho.

Sirius se sentou com cuidado na cadeira de balanço que Rita havia comprado para amamentar com conforto, fechando novamente os olhos, apoiando Cometinha com cuidado em seu peito. Era possível que sua audição estivesse finalmente falhando, porque parecia que o bebê estava diminuindo o volume do choro.

O maroto suspirou exausto, ele mesmo muito tentado a chorar junto com a criança, que bem poderia estar sentindo uma dor excruciante ou uma fome terrível, sem que ele pudesse fazer nada para ajudar a melhorar.

Aparentemente haviam esquecido de lhe informar como a paternidade fazia você ter um eterno sentimento de impotência e que também fazia aflorar sentimentos que você tinha bem certo de que já estavam resolvidos ou suficientemente bem enterrados.

Por exemplo, nesse exato segundo estava voltando a se perguntar que arremedo de pai seria, se nem ao menos tivera um bom modelo em casa. Órion era, na opinião de Sirius, o homem mais sem vida de que se teve notícias e lhe dava um arrepio terrível só de imaginar ser remotamente igual a ele nesse ou em qualquer sentido.

Seu pai parecia apenas aceitar tudo que lhe era imposto, casara com a própria prima pelo bem da linhagem e se já não fosse uma pretendente estranha o suficiente, era bem provável que Walburga não tivesse escondido, nem quando fora jovem e supostamente bela, a grande víbora que era, então Órion Black tinha sido duplamente tolo e apático.

Para ser honesto, odiava infinitamente mais a mãe do que o pai, já que suas piores memórias na Mansão Black haviam vindo de Walburga e todas as suas regras, reclamações, gritos, castigos e torturas, mas talvez a omissão de seu pai, agora que parava para pensar no assunto, fosse o que mais lhe tivesse marcado a alma.

Walburga havia lhe ensinado em primeira mão o que era o mal e a vileza de verdade, então talvez ela até tivesse lhe feito alguma espécie de favor torto, o preparando para toda a crueldade que o mundo podia jogar sobre si, mas Órion Black... Órion parecia o haver ensinado que, para sempre, estaria sozinho no mundo.

Abraçou ainda mais o filho contra o peito, porque se esse não fosse o seu maior medo, não sabia mais o que seria: se algum dia o seu Cometinha precisasse de ajuda e ele a negasse, saberia que realmente havia falhado como pai.

―  Não se preocupe, filho, não importa o que aconteça, eu sempre estarei aqui para você, está certo? ―  Sussurrou com a voz embargada, feliz de que seu bebê era muito pequeno para lembrar desse momento constrangedor, embora quisesse que ele sempre soubesse o que havia sido dito nessa primeira noite. ―  Eu nunca vou abandonar você.

O bebê não respondeu e Sirius não esperava que o fizesse, mas poucos minutos depois, ambos estavam adormecidos em uma frágil, mas bem merecida, primeira noite neste novo mundo incrivelmente assustador.

***

―  Você parece terrível! ―  Peter comentou sem nenhum tato, ganhando uma cotovelada de Lene, que estava bem ao seu lado. ―  O que significa dizer que você ainda está acima do padrão de beleza de todos nós, meros mortais.

O maroto baixinho completou dando de ombros, reavivando a eterna brincadeira que ele, Prongs e Moony sempre faziam com a vaidade de Sirius. Não que James ficasse muito atrás, mas Pads era o que respondia das maneiras mais engraçadas aos insultos disfarçados de elogios.

Nesse exato momento o mais novo papai terminava de abrir a porta para os amigos, segurando o filho com uma habilidade invejável em um dos braços.

― Wormtail, que saudades de sua sempre bem-vinda honestidade! O que seria de mim sem você para me lembrar do desastre ambulante em que me tornei? ―  Sirius perguntou sarcástico, deixando os amigos entrarem na sala apertada do apartamento de solteira de Rita. ―  Entrem e tentem se ajeitar em algum lugar, a casa de Rita consegue ser ainda menor do que a nossa, Moony.

―  Ela com certeza tem mais tralhas do que a gente, mas não foi isso que viemos ver, então... ―  O lobisomem deu de ombros animado, feliz que Cometinha tinha resolvido nascer bem longe da lua cheia, o que lhe daria tempo para curtir aquele momento em paz.

O maroto mais tranquilo foi o primeiro a se aproximar para dar uma olhada no primeiro bebê da sua turma de amigos, colocando uma mão no ombro de Sirius e a outra, de leve, na cabeça da criança, que o animago ajeitava nos braços para ficar mais visível.

―  Nossa, Pads, ele é a sua cara! ―  Remus constatou fascinado, depois deu risada, porque o bebê havia franzido o cenho ao ter sua bochecha tocada de leve. ―  E é mal-humorado que nem você quando é acordado muito cedo!

―  Ainda não acredito que não é uma menina! Cometinha nos enganou direitinho... ―  Lily falou sentada ao lado de James, se contendo para não pegar o bebê no colo, porque sabia que não conseguiria devolvê-lo por um bom tempo se o fizesse. ―  E então? Conseguiu decidir o nome, agora que viu o rostinho dele?

Sirius fez uma careta, enquanto passava o bebê para um Remus desavisado. O outro maroto não esperava ter que segurar o recém-nascido, do mesmo jeito que o pai da criança não esperava ter que responder a essa pergunta tão cedo.

―  Eu ainda não me decidi e que Rita não me ouça, mas Halley está completamente descartado como primeiro nome, embora eu ainda goste do apelido. ―  Sirius falou enquanto ajeitava o bebê mais confortavelmente no colo de um Moony atordoado. Cometinha se aconchegou nos braços do lobisomem, deixando até mesmo seu cenho suavizar de leve. ―  Hey, acho que ele gosta de você, Moony!

―  Deve ser a temperatura mais alta, você sabe... ―  O rapaz tímido respondeu ainda temendo que fosse fazer alguma besteira com algo tão precioso como o filho de Pads. ―  Eu nem acredito que ele finalmente está aqui, cara, olha só! Ele tem seu nariz e a curva dos lábios, embora deva admitir que os olhos são de Rita.

―  Ai, eu não vou aguentar esperar a minha vez! Remus, deixa eu carregá-lo, por favor! ―  Lily falou aflita, se impulsionando para fora do sofá apertado como se tivesse sido pressionada por uma mola invisível. Todos os presentes deram risada, então Moony passou, com muito alívio, o bebê de Sirius para as mãos ansiosas da ruiva. ―  Oh meu Merlin, que precioso!

Lily parecia a ponto de chorar, o que fez Sirius dar risada e se sentar no lugar que antes havia sido ocupado por ela, ao lado de James. Colocou uma das mãos no ombro do amigo, com um sorrisinho ladino no rosto.

―  Sabe que em breve será você, não é? Não consigo imaginar Lils esperando muito tempo para ser mãe. ―  Sirius comentou travessamente, recebendo um dar de ombros conformado do amigo.

―  Bem, o que se há de fazer? Pelo menos é bastante divertido ir tentando... ―  O rapaz de óculos respondeu marotamente, depois deu tapinhas de leve na perna do outro animago, da mesma forma que seu pai costumava fazer quando queria oferecer um ombro amigo. ―  Mas e você, Pads, como está? Fiquei surpreso quando soube que Cometinha havia nascido, achei que você iria nos querer lá, para dar apoio, você sabe...

―  Pois é... Na última hora achei melhor não chamar vocês, porque era mais sobre Rita e o que ela queria, do que o que eu precisava, sabe? O parto... A gente só fica lá parado sem fazer nada, Prongs, rezando para que todo o sofrimento acabe, então, para que arrastar mais gente para isso? ―  Sirius falou desconfortável, porém percebendo que, de certa forma, toda a angústia que havia sentido na hora do parto do filho já estava desvanecendo de sua memória frente a alegria de o ter finalmente ali. Talvez por isso as pessoas tivessem segundos filhos, quem sabe?

―  Tão ruim assim?

―  Te desejo toda sorte do mundo, Prongs, porque Rita e eu não somos tão próximos e eu sofri bastante com o sofrimento dela, então não imagino o que será de você quando for a vez de Lily. ―  O maroto falou com sinceridade, depois sorriu com diversão para o amigo ao seu lado. ―  Respira, Prongs.

―  Meu Merlin, eu não tinha pensado por esse lado! Talvez Lily fique satisfeita apenas sendo tia de Cometinha, quem sabe? ―  James perguntou com uma esperança tão frágil, que a pergunta havia soado tola até mesmo para seus próprios ouvidos. Sirius o encarou com um olhar conhecedor.

―  Ok, o parto é mesmo horrível, mas deixa pelo menos eu te apresentar a um belo motivo para passar por tudo isso. ―  O rapaz se levantou, puxando o amigo ainda atônito com a perspectiva de seu próprio futuro, em direção a uma Lily cercada por Lene de um lado e Peter do outro. Remus acompanhava a interação de todos por cima do ombro da ruiva, se valendo de sua altura. ―  Ei, pessoal! Que tal dar um espacinho para Prongs conhecer seu mais novo sobrinho?

Lene e Peter se afastaram um pouco, o quanto conseguiram naquela sala pequena e Lily apenas levantou o olhar com o sorriso mais radiante que James já havia visto na vida. Certo, aquela era uma causa perdida, Lily teria um bebê para chamar de seu, ele querendo ou não.

―  James, não é a criatura mais linda que você já viu? ―  A grifinória perguntou encantada, esticando um pouco o braço para que o marido pudesse ver a criança direito.

Na cabeça do maroto, ele daria qualquer resposta genérica para satisfazer sua Lily, mesmo que, na verdade, sempre fosse achar que ela era a criatura mais perfeita que já havia pisado na face da Terra, mas ao se aproximar do filho de seu melhor amigo, soube que devia haver mais de uma forma de perfeição, porque o bebê era todinho Pads e só por isso já tinha todo o seu amor incondicional.

James fez que sim com a cabeça, emocionado, então se virou para o amigo atrás de si, que assistia a tudo com um sorriso orgulhoso.

―  Cara, ele é perfeito! ―  James felicitou, dando um abraço desajeitado no melhor amigo. ―  Pads, não acredito que você já é pai! Eu estou tão feliz por você!

E Sirius sabia que era verdade e pela primeira vez desde aqueles pensamentos depressivos que haviam lhe acometido na noite anterior, soube que estava certo em pensar que, Black ou não, estava dando o que tinha de melhor no mundo para seu filho: uma família de verdade.

***

Sirius estava morrendo de sono na fila do refeitório do quartel, aguardando sua vez para ser servido. Assim que recebeu a refeição das mãos de outro pobre estagiário, este mais novo no curso, então por isso mesmo mais miserável, não pôde deixar de rir ao ver que o prato do dia era uma carne misteriosa, que podia ser de qualquer coisa.

Se lembrou de Rita falando que achava que serviam elfos no refeitório do Ministério, o que bem poderia ser verdade, ainda que fosse de se esperar mais ossos do que carne em uma sopa de Kreacher. Riu de novo, fazendo os outros aurores da fila o encararem com estranheza.

Quando se sentou na mesa de seus amigos, todos o receberam com diferentes graus de curiosidade e preocupação. James foi o primeiro a interrogar o amigo, que na última semana parecia que estava em um estado de torpor eterno.

―  Pads, você está bem? Do que está rindo? ―  O rapaz de óculos questionou, enquanto dava mais espaço para o amigo se sentar confortavelmente no banco de madeira, que lembrava muito os de Hogwarts.

―  Eu acho que estou ficando louco, mas pelo menos estou acordado, então... ―  O rapaz deu de ombros, conformado, então deu uma primeira garfada na carne, a olhando com suspeita. Riu de novo. ―  Alguém sabe que diabo de carne é essa?

―  Sirius, querido, você precisa de descanso. Que dia mesmo você disse que começa sua licença paternidade? ―  Alice Corpman, colega de turma e do treinamento para aurores, perguntou preocupada, enquanto terminava de afastar o prato recém-terminado.

―  Na sexta, que é...

―  Depois de amanhã. ―  Frank Longbotton completou solicito, recebendo um aceno de agradecimento do maroto como resposta. ―  Que estranho, sempre achei que essas coisas de licença começassem antes do bebê nascer, não quase uma semana depois.

―  Bem, normalmente começam, mas era começar depois ou adiar a minha formatura para a turma do próximo semestre, então... ―  O maroto murmurou, emendando a fala com um bocejo. Prongs o cutucou nas costelas, para que ele voltasse a comer.

―  Falando em licença paternidade, como vai o bebê, Sirius? Cometinha tem se comportado? ―  James perguntou animado, porque estava ansioso para o fim de semana, quando ele e Lily iriam poder visitar o sobrinho juntos novamente.

―  Ele vai bem, mas não, não tem se comportado. Na verdade, ele está treinando para ser cantor de ópera, adora gritar, especialmente no meu turno. ―  O maroto falou exausto, mas depois sorriu com sinceridade. ―  Rita acha que ele gosta de me irritar, que é o passatempo dele, então tenho passado às madrugadas todas dando conselhos e sermões sobre tudo e nada. Acho que já cobri os primeiros 15 anos de bronca.

Os quatro amigos riram da conclusão da história, James ainda um pouco preocupado com o estado de exaustão do amigo e Alice e Frank pensando que, em breve, bem que poderia ser os dois passando por isso. O casamento estava marcado para a véspera de Natal e o casal mal via a hora de começar sua própria família.

A mesa caiu em um silêncio confortável, até porque Sirius agora estava comendo, mantendo a boca ocupada, então não tinham muito o que perguntar a ele sobre o bebê e todo e qualquer assunto que os quatro tinham em comum parecia poder esperar por um momento menos tranquilo e talvez mais oportuno.

O descanso do grupo foi interrompido por um senhor grandalhão, ostentando uma barba bifurcada. Sirius não tinha visto o auror desde a última sexta, quando o homem havia lhe dado a notícia que seu filho estava nascendo e a verdade é que não tinha nenhum interesse de vê-lo agora.

―  E então, Black, como vai a vida de pai? ―  O senhor deu tapinhas que deveriam ser de consolo em seu ombro, mas Sirius sentiu como se fosse perder um dos braços a qualquer instante.

―  Senhor... Tem sido incrível, meu filho é uma criança maravilhosa, um anjo das pinturas trouxas, eu diria. ―  O maroto respondeu com um sorriso que deveria ser de deleite e encantamento, mas pareceu mais uma careta de sofrimento, o que fez os outros aurores em treinamento rirem disfarçadamente.

―  E o nome da criança, Black? Ouvi dizer que é um menino, como se chama? ―  Auror Baldwyn continuou o interrogatório, dessa vez com uma pergunta que deixou todos na mesa desconfortáveis. Sirius sorriu com mais intenção, dessa vez quase como se estivesse realmente no controle completo de suas faculdades mentais.

―  Ainda não decidi o primeiro nome, senhor. Muitas opções, o senhor sabe... ―  O maroto gesticulou disfarçando seu constrangimento, porque odiava o fato de que logo, logo seu filho completaria uma semana de vida ainda sem nome.

―  Sei bem como é, garoto. Minha filha caçula ficou quase um mês sendo chamada de princesa, porque minha sogra insistiu que aquela, a última menina, tinha que ter o nome em sua homenagem. ―  O velho auror começou a história com um sorriso saudoso, depois trocou para um brincalhão, o que segurou a atenção de todos os jovens da mesa. ―  E eu insisti que só faço homenagens aos mortos, então, como podem ver, tínhamos um impasse.

―  Espero que o senhor tenha ganhado a disputa, afinal, a filha era sua. ―  Sirius disse simpaticamente, até porque a história familiar do seu chefe lhe trouxe uma breve sensação de alívio. Não era o único que demorava para decidir nomes de bebês, quem diria?

―  Infelizmente ganhei, mas teria gostado de homenagear a velha. ―  Auror Baldwyn concluiu divertido, fazendo todos na mesa rirem de leve com a conclusão da história, porém logo depois o homem voltou a falar sério. ―  Agora terminem de comer e voltem ao trabalho, cadetes! Temos missões importantes para cumprir essa semana.

O homem falou apontando para ninguém em particular, depois foi para outra mesa cheia de outros aurores em treinamento. De onde estava, Alice pôde ver o encolher de ombros assustados de seus pobres colegas molestados pelo chefe mais taciturno do quartel.

―  Sempre soube que por baixo de toda aquela casca grossa, auror Baldwyn era molinho por dentro. ―  A única mulher da mesa falou contente, recebendo três olhares incrédulos, um acrescido de carinho misturado. Seu noivo a beijou na testa, rapidamente, afinal estavam em um ambiente de trabalho.

―  Tenho certeza de que você entendeu tudo errado, Alice. Debaixo da casca grossa de Baldwyn tem mais casca grossa, tem casca grossa até o cerne. ―  James falou dramaticamente, fazendo Sirius rir ao seu lado. O maroto sonolento estava tentando voltar a se concentrar em terminar seu almoço, agora quase completamente frio. ―  Bem, ele é casca grossa com todos, menos com Pads aqui. Talvez o truque seja virar pai, o que acha, Frank? Topa a experiência?

―  Com você? ―  Frank perguntou confuso, arrancando um revirar de olhos de James, um riso de Alice e um engasgo de Sirius com a carne de elfo.

―  Eu não vou me dignar a responder isso. ―  O rapaz de cabelos bagunçados consertou os óculos no rosto, indignado, depois deu tapas entre as omoplatas do melhor amigo para que ele desengasgasse.

―  Mudando de assunto, ou melhor, voltando para o assunto que nosso querido chefe estava falando... Sirius, estive pensando sobre a questão do nome de seu bebê e sabe do que eu lembrei? ―  Alice disse com um sorriso gentil no rosto, mesmo que Frank e James a olhassem com apreensão. O que ela estava fazendo? Não tinham decidido que não iriam tocar nesse assunto? Que o nome de Cometinha era tabu naquele grupo? ―  Enquanto eu e Lene estávamos ajudando com o reforço dos feitiços de proteção de Hogwarts, a gente se deparou com uma história muito legal.

―  Por que tenho a impressão de que meu filho vai acabar se chamando Nick-quase-sem-cabeça? ―  Sirius falou brincando, desistindo de vez de seu prato. Talvez devesse tentar descolar alguns cookies na cafeteria na rua transversal do quartel, em qualquer intervalinho que tivesse. ―  Falando nisso, onde está a madame Marlene?

―  Ela está terminando uns relatórios para a auror Jones. ―  Alice respondeu de pronto, olhando feio para James assim que detectou um “puxa-saco” em sua tosse falsa. Sirius e Frank apenas riram dos dois. ―  Mas como estava dizendo, eu e Lene fomos obrigadas a estudar o máximo de feitiços de Hogwarts que pudemos, para não estraga-los quando aplicássemos os novos, então nos deparamos com o do livro de estudantes e olha que interessante: ele escreve automaticamente o nome de todos os bebês da Grã-Bretanha que irão frequentar o castelo, para 11 anos depois, as cartas serem enviadas para eles!

―  Poxa, Sirius, significa dizer que você está atrasando a escrita do nome de seu filho em Hogwarts, o coitadinho vai... Oucht! ―  Frank se interrompeu ao ter o tornozelo chutado por um James furioso à sua frente. Alice resolveu remendar a situação.

―  Ou... O livro já anotou o futuro nome do seu filho! É de um feitiço bem poderoso que estamos falando, ele consegue identificar até filhos de nascidos-trouxas que acabaram de nascer e não fizeram nenhum teste de magia, então imagina se não conseguiria adivinhar um simples nome de bebê! ―  Alice disse animada e Sirius a encarou esperançoso.

―  Você acha que eu poderia dar uma olhada nesse livro e descobrir, de uma vez por todas, o nome do meu filho? ―  O maroto a encarou encantado, então a jovem auror em treinamento lhe respondeu com uma careta confusa.

―  É claro que não! Quem te deixaria olhar um livro desses? Não, Sirius, só te contei a história porque a achei bem interessante. ―  Alice finalizou com um sorriso, que foi morrendo aos poucos ao perceber que ninguém mais compartilhava de seu bom humor. ―  O que?

―  Amor, por favor, diga que você está sendo irônica. ―  Frank tentou, mas a noiva o continuou encarando com um olhar adoravelmente confuso. ―  Você acha mesmo que Sirius não vai tentar pôr as mãos nesse bendito livro?

―  Eu sinceramente espero que ele não tente nada, porque agora ele é quase um auror, pai de família e não mais um adolescente correndo por Hogwarts, aprontando todas! ―  Alice informou em um tom exasperado, misto de bronca e alerta. Sirius riu animado e James o olhou em dúvida.

―  Boa tentativa, Corpman. ―  O animago canino declarou, se levantando com a bandeja na mão e se dando ao trabalho de dar uma volta na mesa só para estalar um beijo fraterno no rosto da amiga. ―  Obrigado pela excelente ideia!

―  Não, Sirius, não foi uma... ―  Alice ainda tentou argumentar, mas o maroto já saíra do seu alcance, a fazendo suspirar insatisfeita. ―  Não foi a minha intenção dar ideia alguma, eu só queria acalmar ele, fazê-lo ver que, eventualmente, as coisas irão se resolver.

―  O único problema do seu plano é que Pads não gosta muito da palavra “eventualmente”, Alice, ele gosta de pegar o destino em suas próprias mãos. ―  James falou satisfeito, porque ao menos agora Sirius estava voltando a parecer consigo mesmo, ainda que fosse se meter em alguma confusão em breve.

***

No fim das contas, não exigiu nenhum grande plano mirabolante da parte do maroto para conseguir uma cópia da última página do livro de registro de Hogwarts. Demandou apenas um pouco de criatividade para inventar uma missão onde os nomes eram necessários e pronto, recebeu uma carta simpática de sua antiga diretora de Casa no final da tarde.

Bem, ser auror tinha mesmo suas vantagens e uma delas era que sua palavra valia muito no mercado, então Sirius prometeu a si mesmo que tentaria manter essa verdade o mais verdadeira possível, não abusando de sua posição sem um bom motivo. Mas, por hora, tinha o nome de seu filho para descobrir!

Passou o dedo rapidamente pelas linhas copiadas na letra elegante de McGonagall, confirmando que Rita estava certa, havia acontecido uma série de nascimentos no pós-guerra. As turmas do primeiro ano de 1989 estariam lotadas de criancinhas geradas nas comemorações pela paz, mas o nome que realmente importava estava bem no final da lista:

Rigel Halley Skeeter Black

Sirius se deixou cair na cadeira de sua saleta individual no quartel general dos aurores, tentando entender como seu filho tinha acabado com um nome daqueles. Rigel? Rigel Black? De onde ele tinha... Como ele poderia ter...

O maroto inflou as bochechas com ar e o expulsou devagar, tentando retomar o foco. Ok, ok, o que diabos ele sabia sobre o nome Rigel afinal? Era uma estrela, certo, mas não qualquer estrela, era simplesmente a mais visivelmente brilhante da Via Láctea e era...

“ Esse é um nome perfeito, nunca foi usado antes e você vê? É a estrela mais brilhante de todas, até mesmo mais brilhante que Betelgeuse e ainda por cima é a maior estrela da constelação de Órion, Six!”

―  Não, isso aqui só pode estar errado! ―  O rapaz jogou a folha de pergaminho de volta na mesa, com uma mistura de indignação e medo, porque não fazia ideia do que aquilo significava. Não fazia ideia de como seu filho tinha acabado com aquele nome.

Nos minutos restantes até o fim do seu turno, Sirius não conseguiu parar de pensar naquilo. Se era ruim o bastante não ter nem ideia de como chamaria seu único filho, saber que colocou nele um nome que representava simplesmente tudo que odiava era ainda mais aterrorizante.

Em sua saída do trabalho, o grifinório passou pelos corredores do Ministério distraído, não cumprimentando, nem se despedindo de ninguém, arrancando mais de um olhar confuso. Lene até tentou chamar atenção para que ele segurasse o elevador para ela, mas o maroto estava tão compenetrado em seus próprios pensamentos, que deixou as portas se fecharem bem diante do nariz da amiga.

Aparatou para a casa de Rita sem nem pensar muito no que estava fazendo, mas por sorte chegou até o apartamento em uma só peça, inteiro o suficiente para aceitar receber seu filho no colo, sem nenhuma preparação inicial.

―  Sei que está imundo do treinamento, mas eu vou dar um banho nele agora, depois você pode se banhar e aí o turno é seu, ok? ―  A mulher falou com pressa, se dirigindo ao banheiro do lugar apertado, de onde saía um barulho de algo enchendo.

Sirius piscou para aquela bagunça em que sua vida havia se transformado, depois encarou o bebê no seu colo, que milagrosamente não estava dormindo, chorando, nem sequer de cenho franzido. Os olhinhos cinzas o contemplavam com o que poderia ser curiosidade, algo improvável há apenas um par de dias.

―  Você está crescendo bem rápido, não está? ―  Sirius sussurrou para o filho, que permaneceu olhando como se estivesse realmente entendo tudo que estava sendo dito.

O cabelo continuava ralinho e muito claro, o bebê quase não tinha sobrancelhas e o nariz era só uma bolinha que todos insistiam em dizer que era igualzinho ao seu, mesmo assim, Sirius não pôde deixar de pensar que aquela era a criaturinha mais incrível do mundo.

―  O que eu vou fazer com você, Rigel? ―  Testou o nome e para seu eterno desespero, aquele funcionou perfeitamente. Era forte, exótico e tinha personalidade, seu filho se parecia muito com uma estrela super gigante azul, de raios irregulares. O bebê deu um daqueles seus sorrisos reflexos, que sumiam tão rápido. ―  Você gosta do seu nome?

Passou as costas da mão devagar pela bochecha do filho, que ao invés de sorrir novamente, franziu o cenho, fazendo seu pai rir com o peito mais leve. Andrômeda já havia explicado que as expressões não equivaliam aos sentimentos verdadeiros do bebê ainda, então Sirius soube que Rigel não havia se irritado de verdade com o nome.

―  Você agora é uma super gigante azul e um cometa, tudo numa pessoa só, o que acha que vai resultar disso, Rigel? ―  Perguntou baixinho para o bebê, mas foi escutado por uma terceira pessoa na casa.

―  Do que o chamou? ―  Rita questionou ansiosa, porque não havia ouvido direito o nome e embora soasse um pouco como Halley, sabia que Sirius não gostava muito desse nome.

―  Rigel, Rigel Black, este é o nome do nosso filho, vou registrar amanhã. ―  O maroto informou confiante, depois se preocuparia com os porquês do livro de Hogwarts ter escolhido justo esse nome para seu bebê, o importante é que agora pelo menos já tinha resolvido uma das milhares de questões que rondavam a sua mente nos últimos tempos.

Uma vitória de cada vez!

―  Ah bom, ainda bem que fui avisada! Imagina, sou só a mãe da criança, aquela que pariu essa pequena coisinha mal-humorada... ―  Rita comentou resmungando, enquanto se ajeitava para pegar o filho no colo.

―  Quer que eu dê banho nele?

―  Você faria isso? ―  Ela recolheu as mãos tão rápido e o perguntou tão esperançosa, que Sirius quase riu do desespero dela. Quase, porque ainda temia a morte e a mulher era muito boa com a varinha.

―  Claro, eu e Rigel vamos te dar um pouco de descanso antecipado, não é mesmo, amigão? ―  Perguntou ao filho, que o encarava com uma expressão levemente franzida, com um dos punhos na boca. ―  Vou entender isso como um sim.

―  Bem, obrigada. E, a propósito... Belo nome, o que significa? ―  Rita já estava virada em direção ao seu quarto, mas parecia genuinamente curiosa.

―  É uma estrela bem brilhante, uma super gigante azul, na realidade. Há bem poucas estrelas como Rigel na Via Láctea. ―  Ele respondeu olhando para o filho, que se preparava para fazer um biquinho que antecedia uma das crises de choro por pura birra. ―  Mas também deve significar “chorão” em alguma língua antiga.

Pronto, o comentário do pai tinha sido mais do que suficiente para fazer o bebê respirar fundo e começar a chorar de um jeito que poderia ensurdecer qualquer um dentro de um raio de 1 km, inclusive, Sirius estava bem certo de que sua audição canina já não servia mais para nada.

―  Meu turno já acabou, Black, agora ele é todo seu! ―  Rita falou espertamente, se dirigindo ao seu quarto antes mesmo que o rapaz pudesse dizer mais alguma coisa.

Bem, ele não tinha mais nada a dizer para ela nem a ninguém, porque, na verdade, naquela noite, ele tinha muito o que pensar.

***

Sirius acordou pelo que deveria ser a terceira vez desde que havia se deitado, então checou a fralda do bebê, deu a mamadeira preparada por Rita na temperatura certa e assim que Rigel arrotou e voltou a pegar no sono, se sentou na cadeira de balanço, depois de colocar o menino de volta no berço.

Dessa última vez não soube dizer ao certo se tinha sonhado ou se havia se lembrado sem querer de alguma memória a muito esquecida, ou talvez uma mistura das duas coisas, mas a questão é que agora podia sentir uma ideia clara em sua cabeça:

Aquele nome havia sido escolhido por seu irmão Regulus e não o pertencia de jeito algum!

Deuses, fora tão cego, o garoto era obcecado por nomes de estrelas na infância e claro que ele mesmo, assim como todas as suas primas e qualquer Black bem criado, sabia recitar os nomes das principais estrelas e constelações mapeadas pelo homem, mas era seu irmão mais novo quem se debruçava realmente sobre informações que ninguém mais se importava.

Regulus lendo uma redação própria sobre a diferença entre supernovas e buraco negros no Natal de 69, desenhando as linhas que dividiam Canis Major, Monoceros, Órion e Lepus no chão do corredor – essa infração Sirius tinha assumido, porque Walburga havia ficado muito furiosa, embora os riscos tivessem saído com um simples feitiço de Kreacher – e mais um sem fim de histórias envolvendo corpos celestiais, eram testemunhas do quanto o garoto mais novo adorava a tradição Black para a escolha dos nomes.

E agora ele havia roubado para si o nome favorito do irmão, escolhido com tanto esmero desde uma idade tão nova!

Por que aquele nome apareceu no livro de Hogwarts? Ele teria escolhido Rigel, se não o tivesse visto nos registros da escola? Sirius estava bem certo de que nem sequer se lembrava dessa estrela em particular e com certeza não dava a mínima para qualquer uma das tradições da família Black, mas lá estava ele, apegado àquele nome como se fosse muito especial.

Ainda podia mudar e escolher outro, não? Olhou para o berço onde apenas um vulto do filho era visível e percebeu que não, não poderia mudar o nome, Rigel era um Rigel dos pés a cabeça, odiaria qualquer outro nome que pudesse pensar depois e odiou inclusive qualquer outro nome que pensou antes.

Que se dane! E daí que tinha usado um nome escolhido por Regulus? Até onde sabia, nomes de estrelas eram de domínio público, se Regulus quiser, ele que escolha outro nome ou aceite que seu filho terá alguém com um nome igual!

Se uma árvore qualquer no centro de Londres for sacudida, vai chover milhares de Peter, James, Lily, Alice, Frank e tantos outros britânicos com nomes repetidos, ou seja, qualquer criança pode sobreviver com um homônimo!

Sim, não tinha que se importar com o que seu irmão caçula pensava, Regulus era o filho perfeito, escolheria algum outro nome Black perfeito e seguiria sua vida sem dirigir um segundo olhar para qualquer coisa fora de sua bolha elitista. Não era como se ele desse a mínima para o que um traidor de sangue e sua prole estavam fazendo de suas existências, não é?

Bem, questão encerrada. Sirius deixou o quarto do filho, voltando para a sua cama transfigurada na sala, resoluto. Olhou para a o teto de Rita, suspirando satisfeito, porque agora poderia voltar a dormir em paz, até Rigel decidir que era a hora dele acordar de novo.

Olhou para cima por mais alguns minutos e então fechou os olhos, porque a escuridão das pálpebras era muito mais tranquila. Da janela leste da sala dava para ver alguns vultos de carros refletindo em alguma coisa, formando padrões no teto, então não conseguiria dormir nunca de olhos abertos! Sim, tinha que mantê-los fechados.

Se virou de lado e então de bruços, mas por mais que estivesse cansado, seu cérebro não parecia muito afim de descansar. A verdade é que o que tinha pensando sobre a escolha do nome de Rigel estava lhe causando uma dúvida cruel: era tão errado assim roubar um nome para si?

Veja bem, não se importava com o que Regulus iria achar ou sentir ao saber que seu precioso nome de estrela havia sido usado primeiro, mas de certa forma era uma questão ética, não era? Se havia uma coisa que uma pessoa queria muito e você não dava a mínima, e então resolvesse usá-la apenas porque podia, isso devia ser errado de alguma forma, certo?

Puristinha de merda ou não, ainda era errado usar algo que era importante para alguém, sem se importar com o tanto de trabalho que a pessoa empregou nisso. No entanto, a verdade é que Regulus não tinha descoberto a estrela, nem sequer batizado ela, então...

Foda-se! Sirius sabia que não iria conseguir dormir tão cedo, não importava que estivesse exausto por conta de todas as noites mal dormidas e que de manhã fosse ficar ainda mais imprestável do que esteve ontem. Seu cérebro simplesmente não queria colaborar!

Voltou ao quarto de Rigel e verificou se o pequeno ainda estava dormindo bem. Por um segundo seu coração gelou, porque não conseguiu identificar uma respiração sequer, mas sua audição aguçada captou os batimentos constantes do coração do menino e então seus olhos, mais acostumados com a penumbra do quarto, identificaram o subir e descer regular da respiração do bebê.

Desfez o feitiço antirruído do quarto de Rita, para caso Rigel acordasse, convocou sua jaqueta de couro dos ganchos ao lado da porta, a vestiu por cima da camiseta larga e da calça de moletom que usava para dormir na casa da mulher, então calçou os coturnos e foi dar uma volta ao redor do quarteirão, para espairecer.

Sentiu saudades do seu velho hábito de fumar cigarros trouxas assim que saiu pela porta do pequeno prédio residencial em uma zona igualmente trouxa. Havia parado de fumar no verão anterior, porque sempre acabava esquecendo de comprar maços de cigarros novos e suas vontades às vezes pareciam tão volúveis, que nem devia ser capaz de se viciar em alguma coisa realmente.

Mas hoje teria sido bom ter um cigarrinho qualquer no fundo do bolso, o teria acendido e soprado a fumaça contra a neblina que cobria Londres no início da madrugada, se aquecendo de dentro para fora. Já estava quase em dezembro e em breve chegaria um Natal branco, então o clima noturno não estava exatamente receptivo.

 ― Ótima ideia, Sirius, todo mundo fica mais inclinado a dormir quando encara um frio estando mal agasalhado.  ― Resmungou para si mesmo, se sentindo cada vez mais desperto.

Aproveitou a rua deserta para puxar a varinha do bolso e executar um feitiço de aquecimento extra na jaqueta, feitiço esse que não fez nada por suas mãos e rosto, mas ao menos era a garantia de que não morreria de frio, embora estupidez sim devesse matar, em sua humilde opinião.

Estava nas ruas desertas de Londres às 2 horas da manhã, simplesmente porque estava se sentindo culpado por dar ao seu filho o nome que seu irmão purista supostamente usaria em seu herdeiro, que poderia ou não nascer algum dia! Se aquilo não era a definição de estupidez, Sirius não sabia mais o que significava a palavra.

Continuou andando pelas ruas silenciosas, vez ou outra chutando uma pedrinha do meio-fio ou catando, ao estilo trouxa, um lixo na calçada, só para jogar na primeira lata de lixo que encontrasse na esquina seguinte. Fez isso até se deparar com uma avenida irritantemente familiar.

Sirius sabia que se subisse aquela rua até o final, então virasse à esquerda, chegaria a uma vizinhança trouxa conhecida. E se executasse o feitiço correto, uma certa Mansão fora de lugar surgiria, apenas porque seus donos eram teimosos demais para ir para paragens que considerassem mais adequadas para sua nobre estirpe.

Não era tão romântico a ponto de achar que seus pés cansados haviam lhe trazido justo para sua antiga “casa", afinal, sempre soube que o endereço do apartamento de Rita ficava a apenas alguns quarteirões de Grimmauld Place, então tudo que tinha que fazer agora era dar meia volta e pronto, estaria longe do lugar para sempre.

Revirou os olhos com sua idiotice sentimentalista, porque simplesmente estava andando por vias públicas e não por calçadas particulares e proibidas. E daí que a Mansão Black estava escondida em algum buraco no centro trouxa de Londres? Pensar nela lhe dava mais poder do que aquela casa velha realmente tinha! Nenhum trouxa desviou seu caminho por causa da existência dela, então Sirius tinha mais era que passar por ali como se não fosse nada.

Continuou seu caminho irritado consigo mesmo, porque o não querer dar atenção à Mansão Black parecia mais um esforço hercúleo de sua parte, o que alguém de fora poderia entender justamente como se a casa de sua infância fosse algo tão importante, que agora precisava ser negada, o que era uma loucura sem tamanho.

E estúpido, porque ele realmente não se importava com aquela casa velha.

Entrou com determinação na rua que supostamente deveria conhecer apenas das janelas, afinal, um Black que se prezasse só sairia de Grimmauld Place via flú, chave de portal ou ainda pelos fundos, na carruagem da família, de vassoura ou aparatando.

Mas a verdade era que o maroto conhecia bem aquelas ruas das cercanias da casa, pois às vezes conseguia escapulir das garras de Kreacher para ir brincar ou tentar jogar futebol com meninos trouxas em um parque não muito longe dali.

Ainda quando criança, Sirius gostava de fazer um caminho diferente sempre que podia, nem que fosse apenas virando em uma viela antes da que havia usado na semana anterior, só para o elfo doméstico da sua casa ter algum trabalho para achá-lo.

Eventualmente Kreacher o encontrava, claro, bastava apenas uma de suas primas insuportáveis notar sua ausência ou Walburga querer alguém para colocar a culpa pelos seus problemas, que a criatura aparatava e desaparatava discretamente, frustrando os planos do garoto.

Sirius sorriu distraído, se lembrando de que suas fugas diminuíram drasticamente depois de Hogwarts, já que conseguiu fazer amizade com tipos que nunca seriam aprovados por seus pais, porém não havia muito que qualquer um deles pudesse fazer para impedi-lo.

Finalmente saiu de suas lembranças, pois se assustou ao ouvir uma voz familiar a suas costas.

 ― O traidor do sangue não deveria estar aqui!  ― O elfo doméstico da família Black de mais de 600 anos, pelas contas de Sirius, murmurou amargurado de um ponto na rua onde a luz circular do poste trouxa não alcançava.

 ― Bom, Kreacher, até onde eu sei, essa rua é pública e frequentada por trouxas, quem não deveria estar aqui é você.  ― O maroto constatou com um dar de ombros sarcástico, que fez a expressão carrancuda da criatura mágica se acentuar ainda mais.

 ― O traidor não é bem-vindo, Mestre Regulus exige que se retire!  ― O elfo sibilou furioso, mas ainda assim em sua maneira apática que era tão familiar para o maroto.

 ― Mestre Regulus nem deveria estar na cidade nessa época do ano e certamente, a essa altura, deve estar dormindo, como a criança obediente que ele é!  ― Sirius retrucou com deboche, mas uma outra voz o respondeu antes que Kreacher tivesse a chance.

 ― Mestre Regulus adoraria que os dois parassem de discutir em plena madrugada em sua porta, às vistas de, possivelmente, dezenas de trouxas.  ― Sirius se virou para onde sabia que agora deveria estar uma enorme Mansão de formas intimidantes, apenas para ver a figura esguia de seu irmão caçula o olhando com superioridade da porta. O garoto sonserino continuou.  ― O que está fazendo aqui, Sirius? Não acha que está um pouco tarde para vir importunar Kreacher, não?

Regulus perguntou tentando soar o mais aborrecido que podia, mas a verdade é que estava realmente curioso para saber o que o irmão mais velho estava fazendo na porta de sua casa a essa hora. Pelo que se lembrava, essa devia ser a primeira vez que Sirius vinha a Grimmauld Place em anos, então algo importante devia ter acontecido.

O maroto encarou o irmão mais novo incomodado, porque agora que o via de frente, percebeu o quanto ele havia mudado. Regulus ainda parecia um pouco magricela para a idade, mesmo tendo jogado Quadribol escolar no ano passado, mas estava mais alto e parecia ter uma sombra de barba juvenil no rosto.

Merlin, aquilo era absurdo, Regulus tinha barba agora!

 ― Como eu disse, a rua é pública e eu só estou passando.  ― O grifinório respondeu mal-humorado, tendo cada movimento seguido pelo olhar atento do outro rapaz.  ― Então, com sua licença...

Fez uma vênia sarcástica e dedicou um sorriso falso tanto para o elfo doméstico à sua esquerda, quanto ao garoto no topo da escada à sua frente. Fez menção de ir embora, antes de ser chamado novamente.

 ― Não quer entrar?  ― A voz de Regulus soava firme, mas aos ouvidos experientes do animago, que o conhecia desde sempre, não importando o quanto havia mudado, uma subnota de necessidade foi detectada. O irmão sempre havia sido uma criança carente de atenção.  ― Sua presença na casa já não é mais proibida, agora que eu sou oficialmente o mestre. E eu nunca te expulsei, se não se lembra.

Ele falou tudo com seriedade e em outros tempos Sirius teria visto o adolescente trocando o peso de um pé para outro, esperando por aprovação, mas hoje ele apenas permaneceu no lugar, aguardando com uma aura que realmente combinava com um tal Lorde Regulus Black.

 ― Walburga com certeza terá algo a dizer sobre isso.  ― O grifinório preferiu ir para território neutro, porque, embora ainda fosse contra todas as decisões que seu irmão caçula havia tomado nos últimos anos, sabia reconhecer uma oferta de paz quando ouvia uma.

 ― Nossa mãe não saberá de nada. É uma ordem.  ― Essa última frase Regulus direcionou para o elfo doméstico indignado na calçada, que murmurou algumas palavras por baixo do fôlego. Sirius conseguiu entreouvir um “traidor" e um “sua senhora".  ― Minhas ordens agora valem mais do que as de qualquer um nessa casa, se digo que é bem-vindo, assim o é, então entre, terminemos essa conversa ao menos aquecidos.

Por um segundo Sirius quase replicou que as ordens de Lorde Black não valiam para ele, mas novamente teve que admitir que o garoto estava apenas sendo educado. E que Circe lhe transformasse em um porco se fosse negar essa característica do irmão, porque, além de educado, Regulus também estava sendo gentil.

Nunca havia entendido como ele permanecera com essa qualidade, mas assim era, o garoto sonserino conseguia ser sempre gentil. Quando estava sozinho, é claro. Se perguntou o que teria sido do irmão se tivesse sido criado com alguma dose de amor e carinho... Que tipo de pessoa ele seria em uma família que não fosse das trevas?

Deuses, ser pai o estava deixando mole, essa era a única explicação possível para tanta reflexão!

 ― Que seja, mas vou logo avisando que não vou consumir nada servido por essa criatura.  ― Sirius apontou para Kreacher com deboche, tentando disfarçar o desconforto ao entrar em um lugar que prometera nunca mais pisar os pés pelo resto de sua existência.

O elfo fez menção de responder, provavelmente se recusando a servir o traidor de sangue, indo de encontro a característica servil de sua espécie, mas seu mestre foi mais rápido na resposta.

 ― Feito. Agora entremos.  ― Regulus ordenou com um quase sorriso no rosto, então Sirius respirou fundo, antes de segui-lo. Kreacher aparatou para dentro com sua habilidade formidável de sempre, logo em seguida.

Merlin, iria mesmo fazer isso? O maroto pensou incomodado com as implicações dessa decisão, mas não deixou transparecer, enquanto pisava no foyeur da casa centenária, lar de várias gerações de Blacks tão empoados quanto o rapaz que abria o caminho à frente.

 Sirius continuou seguindo a liderança do irmão, e chegou a pensar que se sentiria claustrofóbico naquela prisão de luxo, mesmo aquele sendo um espaço tão grande, ricamente decorado com um papel de parede e tapete escuros. Porém, na verdade, agora que tinha liberdade para ir e vir, se pegou apenas observando tudo com curiosidade.

Pelo que podia notar, Regulus não tinha feito nenhuma mudança drástica na casa. Seguiu pelo corredor comprido, iluminado pelos velhos archotes a gás, notando o porta guarda-chuva com pé de troll e quadros ornando as paredes dos dois lados. Se surpreendeu com a escolha do quadro da parede destaque, antes da escadaria.

Era uma paisagem simples, de uma das propriedades ancestrais Black antes da família ter tomado esta casa de um pobre trouxa desavisado. Pelo que se lembrava, no lugar onde a pintura bucólica estava, costumava ficar um quadro da matriarca Black da geração, nesse caso, Walburga, mas por algum motivo misterioso Regulus resolvera que ali não era um bom lugar para a mãe ser homenageada.

Deixou sua curiosidade de lado, então subiu para o primeiro patamar através da escadaria no final do grande Hall. Se surpreendeu mais uma vez ao ver que as cabeças de elfos domésticos emolduradas haviam saído da decoração, o que não imaginava tendo sido feito com pouca resistência de Walburga, mas, novamente, o grifinório preferiu manter-se calado.

Regulus o levou para onde o maroto sabia que era o escritório do lorde Black, próximo da sala de desenho onde a odiosa tapeçaria da família ocupava toda uma parede do espaço. Em contrapartida, o escritório, agora pertencente ao sonserino, era um espaço muito menor e masculino, onde Sirius havia entrado poucas vezes para receber um ou outro sermão apático do pai.

A sala passava despercebida por quem não conhecia o layout da casa, pois, assim como a porta da frente, o escritório só abria com magia, não tendo trancas ou maçanetas visíveis, podendo ser aberto apenas pelo próprio lorde ou alguém de sua confiança.

Regulus abriu a porta com um simples toque da varinha, então entrou na frente, se colocando em uma poltrona de couro de espaldar alto, fazendo um gesto para o irmão se sentar no lugar à sua frente. Sirius aceitou o convite, feliz que atrás de si a lareira estava acesa, emitindo um calor agradável e a única iluminação de todo o cômodo. Obviamente o garoto não estava fazendo nenhuma leitura no momento.

 ― E então, irmão, o que te trouxe aqui a essa hora da noite?  ― O mais jovem perguntou, convocando uma licoreira de cristal e dois copos. Serviu um para si e outro para o irmão, que aceitou com um levantar de sobrancelha irônico.

 ― Você já pode beber?  ― Sirius perguntou em um tom de gozação, porque, se bem lembrava, Regulus não tinha idade e muito menos apreço por bebidas alcoólicas. Sempre fizera careta quando o maior roubava alguma bebida da coleção do pai, só pelo prazer da contravenção.

 ― Posso. Mas e então, sobre o que devemos falar?  ― O sonserino insistiu, mas como Sirius permaneceu calado, tentando entender o que havia por trás daquela resposta hermética – Walburga não se importava com isso? Desde quando Regulus gostava de beber? – o mais novo retomou a palavra.  ― Acho que posso começar dizendo que você continua como um dos beneficiários da herança da família, embora o seu nome tenha sido realmente queimado da tapeçaria, não há nada que possa ser feito quanto a isso.

 ― A mim não entristece o mínimo. Mas por que permaneço como um dos herdeiros? Achei que Walburga e Órion haviam sido bastante definitivos na decisão de me expulsar da família.  ― Sirius questionou após dar um gole curto no licor servido. Era doce e amargo, uma combinação que combinava bastante com o anfitrião.

 ― Nossa mãe te queimou da tapeçaria, mas cabia ao nosso pai acertar os trâmites legais para sua expulsão da herança.  ― Regulus explicou tranquilamente, então deu um gole longo, fazendo uma careta de leve no final, o que fez Sirius sorrir em reflexo. Continuou a falar, dando de ombros, um gesto atípico para o garoto tão bem-educado.  ― Ele não o fez e tão pouco eu fiz quando assumi, logo você e seu filho permanecem como herdeiros dessa casa e de tudo que pertence aos Black.

 ― Por que você é tão velho que não pode ter os próprios herdeiros, não é assim?  ― Sirius perguntou sarcástico, recebendo um leve franzir de cenho do irmão.  ― Regulus, não faço ideia do porquê está me dizendo tudo isso, já que eu não tenho o mínimo interesse em qualquer coisa que pertença aos Black.

 ― Pode não ter interesse, mas é seu por direito e não serei eu quem negarei isso a você ou a sua criança.  ― Regulus mencionou Rigel de novo na conversa, mas dessa vez o rapaz lhe deu um pequeno sorriso, que o maroto não pôde ignorar.  ― A propósito, como ele está? Nasceu bem? Não pude conseguir muitos detalhes sobre o nascimento.

Pronto, aí estava, o tópico pelo qual havia saído do calor do pequeno apartamento de Rita. Andara a esmo pelas ruas vazias de Londres, até acabar sentado na sua odiosa casa ancestral, na frente de seu irmão, que havia jurado que renegara por envolvimento com as artes das trevas.

Já que estava aqui, exausto e confuso com o acumulado dos últimos dias, resolveu que era melhor não perder mais tempo e ir direto ao assunto.

 ― Rigel nasceu perfeitamente bem, completa uma semana no sábado.  ― Sirius mencionou o nome como se fosse apenas uma informação corriqueira, mas sentiu, mais do que viu, a reação do irmão ao que foi dito. Manteve o olhar na bebida do copo que girava de leve nas mãos.

 ― Rigel?  ― Regulus perguntou surpreso, mas não parecia ter nada mais no tom de voz. O grifinório resolveu levantar o olhar para ler a expressão do jovem à sua frente.  ― De onde tirou esse nome?

Sirius deu de ombros da maneira mais relaxada que conseguiu manejar. Não sabia o porquê de não conseguir admitir o que havia feito, afinal não era assim tão importante, havia usado um nome que tinham lhe falado na infância. Se terceiros atribuíram um significado a mais a ele, o problema não era seu!

 ― Estava no livro de registros dos futuros alunos de Hogwarts e como eu tive dificuldade de escolher um nome, aceitei a sugestão de bom grado.  ― Era uma verdade parcial e Sirius estava satisfeito que havia soado como se não fosse grande coisa. Regulus sorriu para a resposta, um sorriso sincero, se bem lembrava das expressões de alegria do irmão.

 ― Eu gosto muito desse nome! Não sei se lembra, porque foi há muito tempo, mas eu estive obcecado por essa estrela Rigel. Tinha certeza que seria o nome do meu filho, acho até que cheguei a comentar com o nosso pai na época.  ― Regulus se recostou na cadeira, como se tentasse lembrar exatamente da conversa com o pai. Desistiu com um sorriso conformado no rosto.  ― De qualquer forma, foi uma ótima escolha, Sirius, estou feliz por você.

Estou feliz por você.

Aí estava essa frase de novo, as palavras tinha sido quase exatamente iguais às de James e o sentimento também soara sincero, então, o que isso queria dizer? Sirius esteve remoendo sua culpa pelas últimas horas, pensando no quão errado tinha sido roubar o nome que Regulus havia escolhido para o próprio filho e lá estava ele, sorridente, “feliz por você”!

Só podia estar além da exaustão, porque agora sentiu novamente vontade de chorar, do mesmo jeito que quis naquela primeira noite quando Rigel não conseguia se acalmar de jeito nenhum. Aquilo parecia que tinha acontecido há um século... Ele estava tão cansado.

Regulus não disse mais nada, apenas observou como os ombros de seu irmão pareciam baixos e o jeito meio desastrado com o qual passava uma das mãos pelo cabelo, agora curto. Fazia anos que não via Sirius com o cabelo curto e na verdade isso só acentuava o pouco que conhecia o homem à sua frente agora.

 O rapaz pigarreou de leve, se recusando a dar outro gole naquele licor estranho de seu pai. Teria que pedir para Kreacher dar um fim nas bebidas do armário, substituir por algo melhor, do seu gosto. Fazia tempo desde a última vez que um lorde Black havia sido tão novo, então era normal que as bebidas guardadas não fossem do seu paladar. O devaneio do sonserino foi interrompido apenas quando Sirius finalmente resolveu falar.

 ― Quer conhecê-lo?  ― O grifinório sugeriu em um tom de voz baixo, mas havia se forçado a olhar diretamente nos olhos do irmão, que não conseguiu disfarçar sua surpresa com a pergunta. O próprio maroto estava surpreso com o rumo que seus pensamentos estavam tomando.

Regulus coçou inconscientemente o lugar onde a marca negra repousava no braço. Ele fazia isso agora, quando estava confuso, quase como um lembrete de onde poderia ter parado por não ter seguido seus instintos. Sirius olhou automaticamente para o braço que o irmão tocava distraído, se lembrando tardiamente do que estava propondo.

O garoto, gentil ou não, era um ex-comensal da morte iniciado e acabara de convidá-lo para conhecer seu filho recém-nascido, tudo por causa de uma culpa totalmente fora de lugar. Era um excelente pai e auror mesmo, pensou com sarcasmo.

 ― Eu adoraria.  ― O rapaz respondeu tímido percebendo para onde o irmão olhava. Parou de mexer no braço por baixo do casaco, que colocara para ver o que estava acontecendo do lado de fora há alguns minutos. Talvez devesse tentar esclarecer essa situação, antes de conhecer o sobrinho.  ― Hum, Sirius... Sobre a marca, eu... Eu nunca... Eu não fiz nada, na verdade. Mamãe precisava de mim em casa depois da morte do nosso pai e Bella me tratava como criança na frente do mestre, então...

 ― Ele não é seu mestre!  ― O grifinório falou sério, quase com agressividade. Não sabia de onde havia saído isso, porque Regulus não era sua responsabilidade, mas havia odiado o tom natural com que o mais novo falara sobre o bruxo das trevas.

 ― Claro que não, ele está morto!  ― Regulus apontou o óbvio e ante a cara ainda raivosa do irmão, achou por bem acrescentar algo mais a explicação.  ― E mesmo que não estivesse, eu... Bem, a verdade é que eu não tinha muito como escapar do juramento a ele, então talvez eu não tivesse muita opção no assunto.

 ― Não era nem para você ter aceitado segui-lo, para início de conversa.  ― Sirius soou como um pai cansado, mas talvez aquilo fosse apenas uma resposta a expressão vulnerável do irmão. Para um lorde Black, Regulus se parecia muito com a definição de uma criança perdida.

 ― Nossa mãe não queria realmente que eu fizesse a marca, porque ela acreditava na causa, mas não confiava inteiramente no Lorde, contudo Bella disse que não haveria lugar no novo mundo para os indecisos e bem, a guerra era eminente, eu tinha que escolher um lado, não é?  ― O garoto se justificou da melhor maneira que pôde e embora Sirius tivesse um milhão de argumentos para qualquer pessoa com discernimento não escolher o lado do Lorde Voldemort, ele só conseguia pensar em uma coisa:

Regulus foi abandonado sozinho, que opção havia restado para um garoto que sempre havia se esforçado para atender às expectativas dos pais e que nunca lidou bem com a possibilidade de decepcionar alguém?

Quando Sirius partiu, o irmão tinha 14 anos e havia implorado para que ele repensasse sua decisão, mesmo que ambos não se falassem direito há anos. O grifinório não o ouviu, estava com raiva, raiva de todos, inclusive de Regulus, que era a exata versão de um filho perfeito que os seus pais tanto queriam.

Agora olhava para o rapaz à sua frente, uma mistura do desejo dos pais, tão bem-educado e polido em suas vestes tradicionais, mas ainda assim continuava sendo aquele garoto gentil até mesmo com as criaturas mais insignificantes, não à toa era o queridinho de todos os elfos da família.

No fim das contas, se fosse olhar bem, Regulus era tão rebelde quanto ele mesmo, já que conseguiu conservar, em todos aqueles anos, algo que era extremamente difícil manter em um ambiente inóspito como a mui nobre morada dos Black.

Sirius havia fugido de casa, porque havia bondade nele e Regulus havia se mantido bom, apesar de ter ficado, então eram ambos sobreviventes do negrume Black, à sua maneira. O grifinório engoliu em seco, sem conseguir olhar para o irmão diretamente, não agora, pelo menos.

Esqueça o roubo de nome, Sirius agora se sentia culpado por uma coisa ainda pior.

 ― Vamos de uma vez, daqui a pouco tenho que ir para o trabalho.  ― Falou com a voz mais rouca do que gostaria, se levantando da cadeira sem olhar para ver se o garoto o acompanhava.

 ― Ir para onde?

 ― Conhecer seu sobrinho, lógico.  ― Sirius respondeu como se fosse óbvio, não esperando que Regulus respondesse a isso. Atravessou todo o caminho para a saída sem falar mais nada, apenas consciente dos passos rápidos atrás de si.

Estava aliviado, porque seu irmão finalmente o havia seguido.

***

Mesmo não tocando em Regulus há anos, preferiu segurar o braço do rapaz por cima das vestes nobres, do que caminhar com ele de volta para casa. Aparatou assim que a Mansão Black desapareceu atrás dos dois, entre o número 11 e 13 de Grimmauld Place.

Desaparataram em uma pequena viela ao lado do prédio onde ficava o pequeno apartamento de Rita, em uma vizinhança tranquila, com poucos prédios comercias e edifícios baixos. Regulus observou o lugar com atenção, talvez tentando se localizar naquela vizinhança simples, onde provavelmente nunca havia pisado os pés.

Sirius conduziu o irmão pelos seis lances de escada que levavam até o terceiro andar, onde Rita dividia o patamar com um casal de trouxas idosos, alheio a família bruxa à sua frente. O grifinório sentiu que deveria dar algum tipo de aviso ao irmão, mas antes que pudesse, a porta se abriu de supetão, fazendo com que um choro estridente tomasse o pequeno corredor entre os apartamentos.

 ― Onde inferno você se meteu?  ― Rita rosnou furiosa, entregando um Rigel chorando desesperado, querendo a solução para uma demanda que ninguém poderia adivinhar qual era.

A mulher havia dado as costas tão rapidamente, entrando na casa e então em seu quarto com tamanha irritação, que não teve nem tempo de notar que o pai do seu filho não estava sozinho no corredor.

Sirius fingiu que aquele comportamento não era nem um pouco absurdo, então fez um gesto para que Regulus entrasse na sua frente, trancando habilidosamente a porta com apenas uma das mãos desocupadas. Rigel continuou berrando, como se não houvesse amanhã.

 ― Bem, uma mudança e tanto de cenário, não?  ― O grifinório falou bem humorado, porque embora devesse ficar constrangido com a óbvia bagunça que era a sua vida nesse exato momento, não a trocaria pela solidão de Grimmauld Place de jeito nenhum.  ― Aqui, tome, segure seu sobrinho de uma vez por todas. Nada melhor para selar uma nova amizade do que fazer isso no momento mais tenso possível!

 ― Sirius, eu nunca segurei um bebê antes, eu não...  ― Regulus ainda tentou argumentar contra aquela péssima ideia, mas teve uma criaturinha molenga passada para seus braços contra sua vontade.  ― Meu Merlin, o que eu faço?

Sirius deu dois passos para longe, como se quisesse analisar a cena um pouco mais distanciado, então Regulus manteve a criança suspensa pelas axilas, de um jeito que parecia apenas ter intensificado ainda mais o choro dela. O grifinório voltou para dar apoio a cabeça do filho, que ainda não se sustentava sozinha.

 ― Você precisa manter uma mão segurando a cabeça e o pescoço, isso é o mais importante no momento.  ― O maroto ajudou o irmão a trocar a posição do sobrinho de vertical, para uma deitada no antebraço do rapaz, mas Regulus ainda encarava tudo como se estivesse sendo forçado a executar um ritual das trevas.  ― Isso, perfeito! Viu? Você leva muito jeito para a coisa!

 ― Mas ele não para de chorar!  ― O bruxo mais novo apontou desesperado, porque aquela criança devia estar sendo amaldiçoada por algum inimigo invisível, aquele choro não podia ser normal.

 ― Sacode ele para cima e para baixo, isso... Exatamente! É provável que isso seja tudo que possamos fazer por hora, Andie acredita que ele deve estar tendo cólica e não há muito a se fazer sobre o assunto.  ― Sirius odiava essa hipótese, porque isso significava que o bebê estava sentindo dor, mas era normal e passageiro, então tinha que se conformar.

Regulus deixou de olhar o irmão para encarar o bebê que esperneava em seus braços, continuou sacudindo o pequeno pacote quentinho como se sua vida dependesse disso. Depois de alguns minutos, o garotinho começou a se acalmar, o que foi um alívio sem tamanho para todos os presentes.

 ― Acho que ele dormiu...  ― O sonserino cogitou esperançoso, em um sussurro, fazendo Sirius se inclinar para perto, observando a expressão ainda frágil do filho. Não, ele poderia voltar a acordar a qualquer momento.

 ― Só mais um pouco.  ― O maroto decidiu, então sorriu para um Regulus completamente imerso naquela experiência assustadora de lidar com um pequeno caldeirão prestes a explodir. Assim que o bebê adormeceu completamente, até mesmo esboçando um de seus sorrisos inconscientes, Sirius retirou o menino das mãos do irmão.  ― Pronto, bom trabalho.

Regulus não poderia descrever o tamanho do alívio ao ser retirado daquela tarefa difícil. Suspirou aliviado, então encarou o sorriso orgulhoso do irmão, que segurava o filho em único braço, como se tivesse nascido fazendo essas coisas!

 ― Eu acho que envelheci uns dez anos com a experiência!  ― O sonserino desabafou, fazendo Sirius revirar os olhos para o drama.  ― E eu não acredito nisso, seu filho é loiro!

Dessa vez o maroto não pôde evitar, riu baixinho, sendo acompanhando por Regulus, que havia soado como alguém traído. Os dois voltaram a observar o menino loirinho nos braços do pai, dormindo tranquilamente, como se não fosse a criaturinha mais exasperante que ambos haviam posto os olhos.

 ― Ele é incrível, irmão, parabéns.  ― Regulus falou com carinho, o que fez Sirius ter certeza que havia tomado a decisão certa: aquela era uma versão nova da família Black, que valia a pena manter.


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Notas finais do capítulo

Mais um fim de capítulo, que poderia ser um fim de fic, mas você me pediu interação com os marotos e mais uma coisinha, então vamos para o capítulo 3!

Bjuxxx



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