Rainha de Vidro escrita por William de Assis


Capítulo 4
4




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A IGREJA DE GALAPOS nunca pareceu tão grande quanto agora. Pisos que faziam barulhos pareciam irritar a rainha a todo momento, o cheiro de incenso estava por todos os lados, lagrimas banhavam o carpete avermelhado estendido pelo hall e as risadas do rei ecoavam por todo o lugar. O príncipe herdeiro parecia sério a todo momento. A postura rígida de um soldado ficava bastante evidente, seu olhar severo percorria todo o lugar como se estivesse procurando por alguma coisa, ou alguém... Talvez sua mente estivesse perdida em tantos devaneios que mal conseguia notar o olhar de algumas garotas em cima dele.

Pobres garotas do Éden, esse príncipe vai estar casado antes que vocês consigam se aproximar dele de verdade.

A rainha e eu continuamos andando até finalmente estarmos fora da igreja, O Éden estava numa festa que provavelmente não teria fim nunca. Soldados pulavam de um lado ao outro como verdadeiros brutamontes, o som da música improvisada estava baixo e antes do anoitecer poderia ser ouvida por todo o vilarejo.

Ingrith, a rainha de toda Avalon observou ao redor, mas não parecia nem um pouco feliz com tudo aquilo. Alguns guardas reais observavam de longe com lanças nas mãos, outros se esgueiravam entre as arvores com rifles de precisão e espadas presas na bainha. O príncipe com tatuagens observava sorrindo de cima do carro. Vestia apenas umam bermuda e chinelos apesar do frio. Os cabelos estavam na altura do ombro meio bagunçados, perto dele, uma pistola semiautomática parecia brilhar de tão limpa que estava, damas de honra o cercavam, outros soldados armados ficavam dentro dos grandes carros negros fazendo sua segurança.

Daemon tinha uma garrafa de vinho nas mãos e entre todos da corte real que invadiram o Éden, ele era o único que parecia querer se divertir quando a noite finalmente chegasse.

— Por onde gostaria de começar o passeio majestade? — perguntei.

Com as mãos jogadas no bolso do palito eu dei alguns poucos passos parando somente a cinco passos de distância. O longo vestido amarelo parecia ser caro, mas estava completamente sujo pela areia do Éden. Ingrith apenas observava os carros e forçava um sorriso em minha direção. Um sorriso tão falso que eu precisaria de anos para fazer igual.

Ela é uma mentirosa profissional.

— Majestade? — perguntei calma. — Posso começar o passeio pelos penhascos de chionne, pelas casas na montanha e até mesmo pelo mercado, mas acho que ele está fechado a essa hora.

Ingrith sorriu um pouco de canto. Algumas poucas rugas tomavam conta de seu rosto, mas nada que conseguisse tirar seu ar imperial. Os longos cabelos loiros formavam uma única trança perfeita, enquanto a coroa dourada repousava em sua testa com todos os diamantes brilhando sobre o efeito do sol quase totalmente escondido pelas nuvens do inverno.

— Que tal o cemitério atrás da igreja? — perguntou ela. — É um lugar calmo e provavelmente tem mais respeito das pessoas por aqui.

— Claro! — forcei um sorriso simpático tão falso quanto a felicidade de se casar com o príncipe herdeiro. — Se a senhora me seguir, posso apresentar alguns túmulos dos conhecidos que morreram.

Sinalizei para que ela me seguisse, porém, Ingrith tomou a frente por conta própria, sorrindo e com os dedos entrelaçados, ela passou por mim de cabeça erguida e evitando esbarrar em qualquer um.

Algumas pessoas no vilarejo a observavam de longe, incapacitadas de fazer qualquer coisa que pudesse prejudicar a rainha. A mesma parou e sorriu para mim, daquele mesmo jeito falso de antes e então disse:

— Você não vem?

E então estendeu a mão para mim.

Postura ereta e olhos semicerrados foi tudo o que decidi ignorar quando aceitei aquele aperto quente que os azuis não deveriam ter. Ingrith passou os braços ao redor do meu ombro e sorriu enquanto sussurrava em meu ouvido.

— Acho que nossas verdadeiras intenções já foram descobertas. — Nós andávamos grudadas, como se nos conhecêssemos há tanto tempo que parecia assustar. — O herói de guerra provavelmente contou que graças aos esforços dele na guerra, sua mão foi concedida ao príncipe herdeiro.

Mentiras. Ingrith estava realmente tentando mentir para mim.

Missão fracassada, minha rainha.

— Não fique tão surpresa com isso — dizia ela. — Meu marido, o rei, concordou que seria melhor para todo o povo, se a futura rainha fosse alguém humilde e que possa controlar o lado mais brutal de todos nós azuis, mas nunca pensei que esse alguém também teria sangue azul.

Assustada, eu tentei me afastar, mas não consegui. Os braços de Ingrith pesavam sobre meu ombro enquanto eu sentia com se grilhões imaginários se agarravam as minhas pernas e me obrigassem a diminuir minha força cada vez mais.

Eu a observei de canto de olhos, a força que eu achava ter aos poucos sumia de mim e Ingrith parecia cada vez mais forte. Senti meu corpo pesar sobre os braços dela, e tenho certeza que se não estivéssemos juntas, eu já teria caído.

— Você é uma manipuladora de almas — sussurrei. — Está absorvendo energia de todos ao redor.

— De todos não, de qualquer pessoa que pense que pode se voltar contra minha família e eu.

Os manipuladores de almas eram raros em Avalon, diziam que seus poderes lembravam os filmes de terror do passado; o campo de batalha repleto de mortos parecia um paraíso para eles e quando morriam, diziam que sua alma partia para um novo corpo. Um bebe recém-nascido que deveria ser sacrificado para clã dos manipuladores de almas.

Um clã que hoje em dia está quase extinto. Mesmo assim, ter uma manipuladora de almas, lado a lado parecia assustador, mas tentei me manter constante.

— Não me olhe assim, odiaria que meus homens arrancassem um de seus olhos por um mal-entendido — disse ela,  calma. — Mas vamos falar sobre sua família. Não sabia que nobres azuis estavam escondidos em vilarejos pequenos, no meio da plebe e com padrões de vida tão baixos.

— Nunca conheci a capital, meus pais fugiram antes — menti. Dizer que até ontem meu sangue era vermelho e hoje se tornou azul poderia significar que a qualquer momento a mão de obra vermelha teria fim e os nobres deuses azuis poderiam não gostar nenhum pouco. — Minha mãe tinha o sangue como o meu, meu pai como o meu irmão era vermelho.

Ela sorriu para dois guardas e me obrigou a rir como se estivesse contanto uma piada.

— Mestiços? — perguntou incrédula, logo após entrarmos no cemitério. — De qual cã descende? Qual símbolo de sua casa? E até onde chegam os limites de todos os seus poderes?

Perguntas e mais perguntas que eu nunca teria uma resposta porque estava mentindo. Mentindo em solo sagrado, para uma mulher que poderia trazer todos ali de volta a vida e me obrigar a contar tudo o que sabia.

Estou com medo mais uma vez, Que merda! Reage Catherine, essa não é você.

— Eu não sei! — respondi calma, finalmente me soltando da rainha para encostar numa lapide qualquer. O nome Scott Mason parecia recente, mas nunca o conheci no Éden. A cova estava aberta, com espaço suficiente para sete corpos e três caixões. — Minha mãe morreu antes que conseguisse me explicar tudo, meu pai também não costumava conversar comigo sempre.

— Uma mestiça órfã, que por acaso venceu na vida e agora está prestes a morar na grande fortaleza real. Uma história linda que vai fazer as damas da corte desejarem ser você.

— Desejarem ser eu? — perguntei. — Sempre tentei passar despercebida por aqui e não consegui.

— Anime-se Catherine, logo todos conheceram a nova rainha de Avalon. Todos saberão seu nome e vão sonhar com sua grande história de amor — dizia Ingrith. — Precisamos brindar a nova rainha.

Se eu fosse rainha, seria conhecida como a frágil rainha de vidro. Uma mulher poderosa, com semblante poderoso, mas que qualquer tombo seria fatal.

Só então me dei conta, que toda aquela conversa naquele lugar afastado de qualquer alma viva era puro desespero,  Lee e o príncipe estavam juntos, as pessoas suspeitavam, os mortos de hoje sabiam demais ou simplesmente suspeitavam de alguma coisa e as leis estabelecidas por reis antigos era clara; Invertidos precisam morrer, sejam homens, mulheres e até crianças; não importava status social ou a cor do sangue.

Ingrith estava com medo pelo filho e eu era sua única chance de mantê-lo vivo durante esse inverno.

— Podemos brindar e ter os mortos como testemunha — disse calma. — Um brinde a família Orins e todas as suas mentiras. Uma mentira para manter dois garotos vivos.

E então o sorriso dela se desfez, Era obvio, eu sabia de tudo e não seria um simples peão a ser sacrificado para que os deuses mantivessem suas cabeças no pescoço.

— Toda essa farsa — continuei. — Tudo isso apenas para garantir que um de seus filhos continue respirando?

Ingrith não pareceu surpresa ou até mesmo ameaçada por minha pessoa. Afinal de contas, ela provavelmente já tinha poder suficiente para matar a todos sem precisar tomar uma atitude pacifica.

Ela abaixou a cabeça, mas sem perder o ar de nobreza. A rainha demonstrou o rosto preocupado por alguns segundos e então desviou seu olhar para uma lápide um pouco mais distante de onde estávamos. Terras negras se prendiam em nossos calçados, as roupas manchavam com a terra molhada e o cheiro de cadáveres me incomodava um pouco, mas ela parecia tranquila quanto a isso.

A rainha deu dois passos para longe de mim, ajoelhou em frente a lapide e passou as mãos para que finalmente conseguisse ler um nome que estava quase apagado.

— Quem foi Lang? — perguntou.

Me aproximei tentando lembrar, mas ninguém me veio em mente.

— Não sei — respondi. — Pode ter sido qualquer um. Órfão, soldado ou pai de alguém.

— Acha que ele teve uma mãe que se importava com ele? — tentei responder, mas ela me cortou, — Acha que Lang teve alguém, disposto a mover terra e céu para mantê-lo vivo?

Não respondi, mas minha resposta seria sim, todos tivemos alguém assim, mas talvez o melhor deles não tenha sido o suficiente para mantê-lo vivo.

— Me responda menininha! Você conhece as leis de Avalon, conhece seu irmão e com certeza o ama. O que está disposta a fazer para mantê-lo respirando?

— Eu faria qualquer coisa para proteger meu irmão. Faria chover sangue, inundaria vilarejos inteiros e até mesmo mataria meu melhor amigo sem pensar duas vezes — respondi.

Não hesitei, mas não consegui tirar Jeon de minha cabeça. O funeral dele estava acontecendo sem um corpo, os órfãos estavam se despedindo e eu ainda estou aqui. Parada de frente para a rainha de Avalon., ouvindo suas mentiras e começando uma batalha interna para manter meu irmão vivo.

— Então você é como eu — Ingrith se pôs de pé. — Eu mataria você e seu irmão sem o menor problema, aqui e agora! — respondeu sem sequer tirar os olhos castanhos de mim. — Eu queimaria esse vilarejo e mataria aquele dragão somente para ter mais uma noite de paz, mas isso não acabaria com os meus problemas.

Talvez eu devesse desviar o olhar e recuar, mas não conseguia. Talvez fosse a bipolaridade em me tornar uma azul, ou simplesmente a loucura batendo em mim.

— Onde está querendo chegar? — perguntei.

Ingrith sorriu, não um sorriso orgulhoso, mas sim um sorriso vitorioso, chegamos onde ela tanto queria.

— Diferente do seu irmão, que praticamente quer obrigá-la a se casar, eu ofereço uma proposta diferente. Você vai viver com o fardo de carregar a coroa de Avalon, vai se casar com o príncipe herdeiro e forçar todos acreditarem nessa história de amor. A rainha de vidro vai ser amada e odiada por muitos, vai estar ao lado do futuro rei durante o acordo de paz com Albim e no futuro, vai gerar herdeiros para continuarem a linhagem e manter nosso segredo enterrado.

— Está pedindo muito — comecei interrompendo-a. — Espero que tenha algo a oferecer em troca.

— É claro, em troca desses serviços eu me ofereço para trazer todos os membros de sua preciosa família de volta a vida, incluindo amigos mais queridos.

Senti meu coração saltar no peito. As lembranças de Jeon amplificam qualquer sentimento ruim que eu possa ter.

Veros, jogou meu rosto na areia como se eu fosse um simples saco de batata. Os outros dois sentinelas desceram de seus cavalos e consegui ver quando um deles pisou por cima de Jin Jeon como se não fosse nada.  Foi então que asas brancas apareceram em suas costas e como se nunca estivessem ali, os três sentinelas alçaram voo deixando apenas seus cavalos para trás.

— Anjos, Jeon — sussurrei entre lágrimas. — Eles eram como anjos.

— Não precisa me responder agora — disse a rainha.

Ela se preparou para sair do cemitério e me deixar pensar, mas então lagrimas caíram de meus olhos, Culpa e tristeza provavelmente estavam estampados em meu rosto. Minha última lembrança antes de todo esse pesadelo volta e eu só tenho uma única resposta a dar a Ingrith:

— Eu aceito seu acordo — sussurrei. — Meu irmão e seu filho permanecem vivos, eu me caso, carrego a coroa e serei a rainha que o reino precisa, em troca, você traz eles de volta para mim.

Ingrith não consegue resistir. Ela sorri como uma cobra sorrateira, caminha lentamente até mim e estende a mão esquerda. Eu resisto por alguns segundos, mas então me dou por vencida. Jeon, meu pai e minha mãe estariam de volta comigo, e se para tê-los de volta eu precisaria me colocar na linha de frente, eu aceito ser amada e odiada por todos.

Eu carrego esse fardo em minhas e faço chover fogo e sangue em todos que entrarem em meu caminho.

— Não fique triste rainha de vidro — disse Ingrith sorrindo. — Acabei de entregar todo o reino em suas mãos.

— Em troca você tem meu mundo — sussurrei entre lagrimas. — E não me chame de rainha de vidro nunca mais.

— Claro! Rainha de vidro. — Ela estendeu o braço para mim. — Sairemos juntas daqui! — sorriu. — Não queremos que ninguém desconfie de nada, por isso, vai me levar de volta ao meu carro. Vai sorrir para todas as damas e dizer que não está se sentindo muito bem. Só então vai retornar ao quarto e contar o acordo da sua vida para o herói de guerra.

— Como desejar.

Abaixei meu olhar frustrada, o turbilhão de sentimentos estava voltando com força total e tudo que consegui fazer foi chorar como uma criança durante todo o caminho até o carro de Ingrith.

As luzes nunca pareceram tão fortes quanto naquela noite. Eu observava a todos dançando dos primeiros degraus da igreja com uma garrafa de vindo em uma das mãos e um copo vazio em outra. Lee estava sentado ao meu lado, calado, ainda usando as roupas que a família real emprestou para fingir toda essa farsa e fingia até sorrir quando algumas meninas chegavam perto dele e o convidavam para dançar, mas sempre recusava e desviava atenção para mim.

Eu havia contado sobre a morte de Jeon detalhadamente e também sobre a possibilidade de traze-lo de volta, mas nunca comentei que poderia trazer mamãe e papai de volta. Ele poderia achar que profanar corpos seria um crime contra tudo que eles nos ensinaram.

A festa estava um tédio, ou era eu quem não estava conseguindo me divertir com todas as coisas ruins acontecendo e provavelmente estavam prestes a ficar muito pior. Os príncipes vinham em minha direção, as damas da rainha e a mesma vinham em minha direção, enquanto o rei, estava bebendo com alguns soldados.

— Está na hora do anúncio. — disse a rainha sorrindo. — Temos nosso acordo, certo?

Daemon olhou para sua mãe e então sorriu, provavelmente não sabia de nada e se a rainha não contou, provavelmente quer que continue assim e não serei eu a estragar o plano dela. O segundo príncipe, Daemen, deixou os olhos caírem sobre meu irmão e então estendeu a mão para mim e a beijou com toda delicadeza que tinha. Os olhos castanhos puxados e cabelos negros sobre os ombros me diziam claramente porque meu irmão fez tudo o que fez aquele garoto provavelmente fez muito mais do que roubar o coração do meu irmão.

— Sim, majestade — respondi.

Lee observou enquanto Daemen recuava a mão devagar até que finalmente o príncipe herdeiro a estendeu para mim. Meu olhar se encontrou com o dele e senti um pequeno choque percorrer toda minha espinha e uma leva sensação de déjà vu. É como se nos conhecemos antes, mas simplesmente não conseguia lembrar. Demorei alguns segundos, mas finalmente agarrei sua mão e deixei que ele me colocasse de pé. O copo e a garrafa continuaram no chão, Lee se colocou atrás de mim como o último membro de nossa família e deixei que a rainha tomasse a frente atraindo a atenção de todos.

A música parou! Os olhares se voltaram para todos que estavam nos degraus da igreja. Padre Phillipe e irmã Lily estavam bem à frente da multidão, Caleb riu como se aquilo fizesse parte de uma de suas piadas e então eu senti como se todo o tempo parasse.

Daemen e Daemon, os gêmeos, estavam lado a lado, observando com calma enquanto as damas anunciavam que a rainha faria um pronunciamento; Lee estava logo atrás de mim, uma mão presa a minha enquanto a outra segurava meu ombro. O príncipe herdeiro estava ao meu lado como um robô, seu olhar percorria o de toda a multidão, mas ele não parecia ter emoção alguma. Um prefeito soldado. Todos eles vestidos para uma festa, na qual eu finalmente seria condenada a estar ao lado dele.

A rainha sorriu quando todos finalmente estavam ali e entregou um papel em minhas mãos. Folhas e mais folhas com palavras que eu nem compreendia o significado, então simplesmente li o que estava sublinhado em azul. Eu quis chorar, mas não pude, eu precisavs ler aquilo para todos, para que nenhum soldado humano precisasse morrer.

— Éden — comecei calma, apesar de todo meu corpo gritar para que eu não fizesse aquilo. — Eu não sou quem vocês pensam.

Não, não diga isso. Minha cabeça dizia. Eu imploro, não mate a visão que eles têm de você. Não mate a garotinha do Éden.

— Minha família, um dia esteve entre os deuses, mas sempre temeram que seus descendentes fossem mortos durante as guerras do reino. Sou azul! Tenho o sangue dos primeiros deuses, pertenço a sua casa e por isso pertenço a sua corte.

Não minta para aqueles que a viram crescer. Não minta para essas famílias

— Eu Catherine, diferente do que acreditam, eu tenho um título e tenho um sobrenome que todos precisam lembrar que existe. Eu sou Catherine Dragomir, bisneta de Bulford, a serpente negra, herdeira das terras de Zhell, dona das terras do inverno e junto de Lee, o herói que deu fim à guerra a última herdeira daquele povo.

Acho que eles não estão acreditando. Eu via em seus olhos. Tudo estava bagunçado em minha cabeça, Lee morreria se eu não me esforçasse.

— Hoje, venho até aqui diante de todos vocês para confessar meu amor pelo príncipe herdeiro. — disse calma, ainda lendo o papel da rainha. — Há anos nos conhecemos, fingimos sermos completos desconhecidos, mas não faremos mais isso. Viemos confessar nosso amor diante dos deuses e dos homens.

Velaryon apertou minha mão devagar. Meu corpo gelou por um tempo e então eu percebi o que ele estava fazendo. Me colocando de frente para si e ajoelhando enquanto tirava uma aliança do bolso do terno azul. A espada batia no chão, a pistola ainda estava em seu coldre e ele parecia um herói de guerra tão bonito que obrigou algumas garotas a suspirarem.

Eu estava gelada.

— Catherine Dragomir, por você matarei um leão, um orc ou qualquer criatura da noite, lhe trarei peles e te manterei em segurança; colocarei a coroa em sua cabeça e te chamarei de minha todos os dias e eu serei seu de agora em diante e para toda a eternidade.

Ele fingia melhor do que eu, ele sabia de tudo e estava dando tudo de si para salvar sua família. Mas era falso. Tão falso quanto esse sobrenome roubado, tão falso quanto meu discurso, tão falso quanto a pessoa que eu estava fingindo ser.

— A partir de hoje, você é minha noiva. É dona de tudo que é meu, minha princesa e em breve minha rainha.

Os gritos ecoaram da multidão. Pisadas fortes provavelmente seriam ouvidas por qualquer cidade vizinha e a alegria deles representava uma coisa clara, nós finalmente conseguimos. O Éden foi só o primeiro lugar, agora todos teriam que acreditar nessa história de amor.

A rainha sorriu e agarrou meu corpo num abraço forte. Ela conseguiu, todos acreditaram, mas não sei como o príncipe está se sentindo, porque ele sumiu.

— Arrume suas coisas princesa Catherine, não há mais nada para nós nesse lugar imundo, vamos embora antes do amanhecer.

Eu esperei que o calor dela fosse embora só para correr meu olhar por toda multidão, todos felizes pelo futuro casamento, acreditando no que estava sendo mostrado, esquecendo de tudo o que viam nas trincheiras de batalha. E no meio de tantos olhares felizes eu vi o padre sorrir de canto como se esperasse que aquilo fosse acontecer, mas não acreditando quando aconteceu.

Senti como se um capítulo da minha vida tivesse acabado e outro começado, agora eu, uma ninguém foi colocada num lugar de destaque, uma humana estava entre as pessoas mais poderosas do mundo e eu estava decidida a viver pelo tempo que fosse necessário para manter meu irmão vivo.


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