Acordara já tinha alguns minutos, mas deixou que a preguiça falasse mais alto e permitiu-se ficar deitada um pouco mais. Já se costumara ao macio colchão de seu quarto no Largo Grimmauld e decididamente, ao silêncio do ambiente. Espreguiçava-se, rolando de um lado para o outro entre os cobertores embolados nas pernas sem se importar com os estalos das articulações.

Precisava daquelas férias para colocar a cabeça em ordem.

—... Gina está... Seu problema?! — Os gritos chegaram no seu quarto, frases cortadas e sem sentido.

Sentou-se assustada, e não demorou a levantar-se da cama num salto ao reconhecer a voz entrecortada. Enrolou-se no robe e saiu de seu quarto, a cada degrau que descia, os gritos tornavam-se cada vez mais altos e agressivos.

Ao chegar à porta que dava para a sala, paralisou.

Harry segurava o encosto do sofá com força, a cabeça caída, enquanto Ronald amassava um jornal entre os dedos e falava alto o suficiente para deixa-la preocupada com o rumo da situação. Avaliando-os, resolveu interromper.

— Harry? — Chamou ao notar que o amigo parecia completamente estressado, o óculos pendurado numa das mãos era sinal de que perderia o controle muito em breve.

Surpreendeu-se por ainda conseguir compreendê-lo depois de tanto, não teve tempo, no entanto, de prolongar-se nos próprios devaneios. Ambos os homens a olharam, Rony, no entanto voltou-se para o outro em poucos segundos.

— Ela dormiu aqui! — Exclamou com tamanha severidade que Hermione constrangeu-se momentaneamente. — Como pôde? Vocês sequer assinaram os papéis do divórcio e já está dormindo com outra!

Harry tirou os olhos de Hermione e olhou para o ruivo irado na sua frente, sacudiu a cabeça e não conteve a risada. Aquilo tudo era demais para sua cabeça.

Não conseguira dormir a noite inteira, como vinha acontecendo nas últimas semanas, e depois de caminhar pelos cômodos vazios do Largo, atendeu a porta que, cedo demais, estava sendo esmurrada.

— Do que está rindo? — Perguntou irritado, as orelhas tornando-se vermelhas.

— Da conclusão ridícula que tirou, sabe se lá de onde! — Pontuou Hermione, entrando na sala e parando a poucos passos de Rony. — Você ainda não faz ideia de quem sou eu...

Harry cruzou os braços e arqueou uma sobrancelha quando Rony o olhou em busca de uma confirmação silenciosa, não conseguia acreditar que aquela mulher na sua frente era Hermione. Tão diferente da última imagem que tinha da amiga.

— Mérlin, Hermione! — Diminui a distância entre seus corpos e abraçou-a com força, esmagando-a contra seu corpo. — Pensei que você fosse... E Harry... Por Mérlin!

— Você não está fazendo sentido algum. — Riu ao afastar-se do ruivo. — Por que estava gritando com Harry daquele jeito, o que houve?

Olhou de um para o outro, e cruzou os braços depois que a resposta demorou demais para ser dada. Harry imitou-a, negando-se a dar uma resposta, já Rony acabou por tomar a frente:

— Você já deve saber sobre Harry e Gina. — Depois de Hermione confirmar, continuou: — A capa do Profeta Diário de hoje é a foto de Harry e uma mulher misteriosa, não dá pra ver o rosto dela, mas acredito que seja você.

Hermione pegou o exemplar amassado das mãos do ruivo, e não conteve a expressão de surpresa que estampou seu rosto. A imagem mostrava-os no dia anterior durante o café da manhã em Hogsmeade, na imagem limpava o rosto de Harry com o guardanapo de renda, seu cabelo cobria-lhe o rosto, mas não o do amigo.

— Acho que conseguem imaginar o teor do artigo! — Produziu uma careta constrangida. — Gina desaparatou na Toca e estava muito nervosa com a situação, desculpem-me por tirar conclusões, mas é minha irmã e isso tem deixado todos estressados em casa.

Harry assentiu e deixou os ombros caírem.

— Tudo bem, Rony, vocês não tinham como saber. — Jogou o exemplar no sofá e cruzou os braços para afastar o frio que passou por seu corpo. — Vou trocar de roupa e podemos sair para tomar café, o que acham?

— Claro, seria ótimo!

Quando virou-se para Harry, o sorriso de seus lábios murchou rapidamente.

— Vão vocês, preciso adiantar algumas coisas no Ministério! — Saiu da sala, deixando-os sozinhos.

***

— Harry está furioso comigo! —Rony gemeu depois de beber um longo gole de seu cappuccino.

— Vocês não estavam na melhor situação quando cheguei. — Comentou. — Converse com ele, sei que Harry está estressado, mas vai desculpá-lo.

— Foi por isso que veio? — Perguntou Rony, bastante interessado na resposta. — Por Harry?

— Voltei por inúmeros motivos, um deles, o divórcio do meu melhor amigo. — Explicou, mas seu tom era cortante, o que deu aquele tópico por finalizado. — Como estão todos em relação ao divórcio?

Rony gemeu baixinho, bastante frustrado. Na manhã anterior, assim que a coruja entregara o jornal que tinha como capa a notícia sobre o divórcio, a Toca entrara em completo estado de caos. Molly rira como se aquilo fosse um imenso engano, até que terminou de ler a notícia, e seu riso tornou-se completo nervosismo. Arthur não comentou nada a respeito, mas percebia-se que o afetara de alguma forma.

— Gina chegou no meio da manhã e explicou para todos sobre a decisão de se divorciar, ninguém está irritado com Harry, mas você sabe como essas coisas funcionam. — Disse, as mãos agarradas à xícara com mais força que o necessário. — Não consegui falar com ele ontem, e hoje aconteceu aquele mal entendido. Mérlin!

Passou as mãos pelo rosto.

— Tomávamos café quando Gina chegou chorando, disse que apesar de estarem se divorciando ele não tinha o direito de fazer aquilo com ela. — Continuou a contar. — Só conseguimos entender quando papai mostrou a matéria no jornal, e claro, foi o estopim para algumas injúrias. E então fiz aquilo, resolvi confrontá-lo e meu dia desandou...

— O que acha de eu ir até a Toca e resolver o mal entendido que causei? — Perguntou com real sinceridade.

Chegara a menos de quarenta e oito horas e já causara mais transtornos do que desejava. Gina e a família Weasley mereciam um esclarecimento e desculpas dela, além do mais, seria ótimo revê-los. Sentia falta do barulho de quando estavam todos juntos, dos almoços nos domingos, das festividades e dos jogos de Quadribol no quintal da propriedade.

— Seria ótimo! — Exclamou animado. — O que acha de irmos agora? Posso deixa-la lá antes de ir trabalhar.

***

— Mãe? Tenho uma surpresa para você. — Gritou da porta da casa, abrindo passagem para Hermione. — Mãe?

O lugar mudara pouco, alguns móveis haviam sido trocados e a pintura era completamente diferente da que se lembrava, mas a Toca continuava tão acolhedora quanto há seis anos. Molly chegou na sala poucos segundos depois, limpava as mãos no avental colorido enquanto caminhava em passos curtos.

— O que pode ser tão urgente, meu filho? — E então levantou o rosto redondo e sorriu ao vê-la ao lado do filho. — Você voltou! — Abraçou Hermione com vontade e saudade. Depois, afastou-a para analisa-la meticulosamente. — Como está bonita, minha querida. A Holanda te fez tão bem, parece até mesmo aquelas modelos magérrimas das revistas!

Hermione sorriu envergonhada.

— Obrigada! — Olhou ao redor, ainda encantada com o lugar que passara tantos anos de sua vida. — Estou tão feliz por ter voltado, senti tanta falta de todos.

— Oh, e nós a sua. — Juntou as mãos, sinal de que tramava algo de baixo dos cabelos ruivos misturados aos grisalhos fios. — Temos de comemorar a sua volta, mandarei um Patrono e pedirei que todos almocem conosco hoje!

— Devem estar ocupados, não há necessidade de tirá-los dos...

— Ora, besteira! — Sacudiu a mão e tratou de procurar pela varinha presa no bolso do avental.

O feitiço foi realizado com bastante maestria, assim como o convite que deixava explícito que uma visita bastante importante os aguardava para o almoço.

— Já que está tudo certo, vou para o trabalho! — Beijou a bochecha da mãe e abraçou Hermione mais uma vez. — Fico feliz por ter voltado, Mione, de verdade!

Concordava com Rony, e agradeceu mais uma vez antes do amigo aparatar. Sentiu seu peito inflar-se de felicidade e carinho, não tinha aquilo na Holanda, e, apesar de ser feliz lá, seu coração já batia mais forte e rápido em solo Inglês.