Forever escrita por Saturn san


Capítulo 4
Capítulo 4 - Bebidas e Beijos


Notas iniciais do capítulo

Após muito tempo, eu retorno para postar outro capítulo desta história. Espero que gostem!



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Wendy terminou de encaixar o par de tênis branco, ajeitando em seu calcanhar e puxando seu dedo indicador com pressão entre o objeto e sua pele. Levantou e bateu a sola três vezes no chão firmemente, apenas para certificar que estava confortável o suficiente para ficar horas em uma festa. Ela não conseguia pensar em nenhuma roupa boa o suficiente para usar, então simplesmente havia escolhido uma blusa de lã peluda, que nem esquentava tanto naquela noite mais fresca.
Encarou-se no espelho pela primeira vez naquela noite, os olhos verdes vibravam em um estranho brilho animado. Mesmo que sempre nos esforçamos para fingir algo ou esconder um segredo, nossos olhos podem sempre denunciar a verdade, refletem todo nosso ser. Mesmo que Wendy sempre parece-se desanimada ou uma garota introvertida, os olhos dela mostravam quando aquela pequena ponta de felicidade a afetava.

Guardou o celular no bolso do shorts, deslizando os pés pelo chão do quarto. A noite estava fresca e agradável, uma daquelas noites de verão que nos fazia ficar confortável o suficiente para tirar um cochilo em qualquer lugar. Em um pequeno rádio da cômoda tocava uma música pop que Wendy não reconheceu. Mergulhou sobre o edredom estendido na cama, balançando os pés no ar sem muito ânimo. Ela nunca sabia o que fazer quando terminava de se arrumar para sair, mas Anthony não. A verdade era que ela mal se lembrava da última vez em que os dois ficaram juntos durante uma noite de sexta-feira entre irmãos. Quando era bem mais novos, faziam suas festas do pijama só entre eles, costumavam jogar banco imobiliário e comer pizza, então passavam o resto da noite assistindo filmes do anos 90 que eram exibidos na televisão. Mesmo antes de Anthony entrar para o ensino médio, o número dessas noites foram diminuindo, até Anthony fazer novos amigos no colegial e aquilo ser totalmente extinto. Wendy tentou imitar as noites com Emmy, mas a pequena sempre dormia antes das nove da noite. Wendy não se sentia mais tão feliz em sextas-feiras.
Três batidas ecoaram, da madeira da porta. Wendy virou seu rosto.

—Está pronta?

Apenas acenou com a cabeça, levantando-se da cama e desligando o rádio. O quarto foi clareado apenas com a cor pálida da Lua quando a lâmpada foi desligada e o cômodo abandonado. Uma das poucas vezes que sua dona saíra de seu covil nas férias de verão, as maioria para ir a outros cômodos da casa ou fazer compras para o pai na cidade. Mas uma das poucas vezes no verão em que ela saiu para se divertir.
O casal de irmãos desceu as escadas rapidamente, com Anthony perguntando se seu cabelo estava arrumado, Wendy como resposta dizendo que estava bom, mas a gola da jaqueta estava torta. Com o relógio marcando oito horas e meia, eles despediram-se do pai na porta da sala, o mesmo quase cochilando segurando uma latinha de cerveja, enquanto passava uma partida de beisebol na televisão. O homem apenas deu um breve aceno, antes de se ajeitar na poltrona e mudar de canal. A senhora J. Sumner estava na cozinha, como sempre, falando no telefone enquanto mexia uma colher de pau dentro de um tigela com uma mistura. Do pouco que Wendy escutou, ela parecia entretida demais com a próxima reunião da boa vizinhança. Anthony deu um aceno para a mãe, mas quando virou-se a voz estridente dela soou como um alarme.
— Espere um pouco, Susan querida. - Ela disse para a pessoa do outro lado do telefone, guardando o objeto e mirando na direção dos filhos. - Onde pensam que vão assim?


— Mãe, eu disse antes. Vamos à uma festa de um amigo.
— Com essas roupas? - Ela rosnou, olhando os dois com desgosto. - Anthony, essa jaqueta já está pequena demais em você, não combina nada com suas calças.
Então foi a vez de Wendy.
— E você tire esse suéter. Eu comprei saias lindas para você na última vez que fui no departamento de roupas, você disse que eram bonitas.


 Verdade. Embora quase nunca usasse saias, na verdade Wendy nunca usava, achava-as lindas e um charme extra para qualquer garota. Mas nunca achou que combinava com suas pernas magrelas e sem bronzeado.
— Mãe, vamos estar em uma festa. No escuro. - Anthony bufou. - Ninguém vai reparar.
— Mas eu estou reparando!
— Bom, você não vai estar na festa. Já estamos indo.
 Quando Christine abriu sua boca redonda para falar qualquer coisa, Anthony saiu porta à fora e puxou Wendy. Ele tinha uma maneira única de cortar a fala da mãe e escapar daquilo. Wendy o invejava, ela nunca conseguia pensar rapidamente em uma oportunidade até que notasse que já era tarde para qualquer abordagem. Ela ainda conseguia escutar Christine esbravejando do lado de dentro, enquanto voltava para a cozinha com seus saltos perfurando o piso de madeira e voltando a conversar amigavelmente no telefone. Anthony e ela saíram do jardim, enquanto o mais velho tirava a chave da caminhonete do bolso e destrancava as portas.
— Foi mal. - Ele disse, apertando o cinto de segurança. - Achei que se continuássemos ali, ela faria perdermos a noite.
— Talvez até a manhã do dia seguinte.


 Wendy murmurou, logo ouvindo um riso breve de Anthony ao seu lado. Ele puxou a chave de ignição e saíram rua abaixo, passando pelas diversas casas coloridas do bairro, algumas com luzes das janelas acessas e outras apagadas. Uma ou duas casas estavam com placas escritas em vermelho "Vende-se" colocadas sobre a grama verde. A casa do amigo de Anthony ficava em outro bairro, bem mais próxima à cidade. Wendy começou a ficar mais e mais nervosa quando as casas coloridas e com um estilo clássico logo mudam para casas mais modernas, de cores neutras e jardins pouco decorados. Ela se perguntou que tipo de pessoas haveriam na festa, odiava multidões e sentia-se sempre sem ar. Quando era mais jovem até gostava de ir em uma festa ou outra por mês, nada radical ou que interferisse nos dias de aulas. Mas agora, sentia que era um lugar que a tratavam como uma forasteira. Uma intrusa. E de fato, ela era.
 Se amaldiçoou mentalmente por ter cedido ao pedido de Anthony, se arrependeu de ter tentando se dar uma segunda chance. Tudo que queria era voltar para sua casa e afundar-se entre os cobertores, enquanto assistia uma maratona de filmes de terror com uma caneca de chocolate quente. O carro então parou e ela sentiu que era tarde demais.
 Anthony foi o primeiro a descer do carro, acenando para algumas pessoas que estavam entrando na festa e o notavam, céus, ele realmente se dava bem com todo mundo. O seu olhar mudou quando notou o olhar de Wendy totalmente perdido sobre o porta-luvas, ele deu duas batidas leves no vidro do carro, chamando a atenção dela.
— Como é que é, vai ficar aí até a festa acabar?
 Ele perguntou rindo, mas ainda impaciente. Wendy suspirou, finalmente percebendo que não havia como voltar atrás. Ela desceu do carro e bateu a porta, logo sendo trancada pela chave de Anthony com um apito. A casa era gigante, quase o dobro do tamanho da de Anthony e Wendy. Com um enorme jardim de grama que recepcionava os convidados,haviam diversos adolescentes com bebidas alcoólicas nas mãos. Um mal sinal para Wendy.   Mesmo do lado de fora podia-se escutar música eletrônica alta, enquanto muitas pessoas dançavam e penduravam-se no parapeito da janela rindo ou soltando uma fumaça de cigarro. Mesmo na varanda -agora um pouco destruída- o time de beisebol fazia uma competição para ver quem conseguia tomar 10 copos de ponche mais rápido, pelo visto um dos garotos já queria vomitar logo no quarto copo.
 Anthony cumprimentou a todos com breves acenos e piscadelas, enquanto ignoravam Wendy, os que milagrosamente a notavam a recebiam com um "Oh, ela também veio" ou "Veja, o Anthony trouxe a irmã". Isso pelo menos era melhor do que a olharem torto ou confundirem seu nome com Candy ou Mandie. Pelo menos haviam mais maneiras de cumprimentar ela do que Anthony. Mas não sentiu-se nem um pouco feliz com isso.
 Logo quando passaram pela porta de entrada, Wendy sentiu que seus tímpanos choravam. A música era absurdamente alta e as vozes das pessoas ali dentro mais altas ainda. Ela segurou-se, tonta, na jaqueta de Anthony, com medo de se perder tanto fisicamente quanto mentalmente. Ele a guiou por alguns sofás, enquanto era cumprimentado com apertos de mãos pelos meninos do time ou beijos na bochecha pelas líderes de torcida. Matt, amigo de Anthony e o anfitrião da festa estava entre o grupo, com diversas pulseiras neon dos pulsos e até o antebraço, distribuindo aleatoriamente para seus convidados. Foi questão de segundos para a mão de Wendy soltar-se da jaqueta de Anthony e ele se afastar, sendo engolido cada vez mais pela multidão de amigos que o cumprimentavam, o número parecia aumentar cada vez mais. Até que ela só conseguia ver sua nuca castanha em meio a tanta gente.

 Ela suspirou derrotada, arrastando-se para um canto vazio do lado da lareira, notando que não havia mais quase ninguém ali. Para ela já estava bom, mesmo que tivesse que ficar de pé ou os copos de plásticos apoiados na lareira constantemente eram empurrados por braços distraídos em direção aos tornozelos dela. Suspirou outra vez naquela noite, dessa vez um pouco mais indignada. Cruzou os braços e se acomodou um pouco na cortina do lado, observando os rostos desconhecidos que passavam de um lado para o outro, as vezes sozinhos, as vezes grupos de amigos ou as vezes casais que achavam estar em um motel.
 Céus, para ela parecia que estava há horas ali. Mas na verdade estava só há dez ou quinze minutos. O seu celular com a bateria pela metade também não a ajudava a se distrair.
 Mas seu olhar se concentrou em algo mais interessante. Ali, com a porta de entrada ao lado da sala de estar em que estava. Um grupo entrou. Ela reconhecerá, meio que ainda com incerteza, dois daqueles garotos. Eram os mesmos da lanchonete naquele dia. O garoto moreno calmo e o de cabelo laranja energético. Eles estavam vestidos com roupas mais ajeitadas que antes, com camisas normais e jaquetas ou blazer's por cima, mais ainda assim tinham uma aura de rebeldia ao seu redor. Ela tentou olhar para as outras duas pessoas do quarteto, quando fora interrompida por uma voz ao seu lado.
— Um saco né?
 Wendy virou-se, dando de cara com uma garota alta e de características nativas-americanas. O cabelo preto preso em um rabo de cavalo alto e uma maquiagem forte que ocultava a pele mais bronzeada. Ela estava encostada na cortina, a alguns centímetros de Wendy.


— Digo, ficar aqui sem conhecer ninguém. - A garota disse, sorrindo. - Também está sendo um tédio para você?
— Ah sim, na verdade eu vim com o meu irmão.
 Wendy tentou o procurar na multidão para indicar, até perceber que ela estava realmente perdida e mais separada ainda dele. Seu olhar voltou para a garota de traços indígenas, ainda com um sorriso no rosto.
— Desculpe, acho que não sei quem é. Eu entrei na escola pouquíssimo tempo, e quando pensei que teria coragem para me enturmar, vieram as férias de verão.
— Quando as aulas voltarem você vai o conhecer. - Wendy murmurou. - Todo mundo o conhece.
— Certo, mas ninguém parece conhecer você.
 A garota misteriosa então arregalou os olhos, fazendo uma expressão desconfortável.
— Desculpa, me expressei mal. - Suspirou. - Sou ruim com palavras.
— Eu te entendo. E quando tenho coragem para falar algo, parece que me atrapalho e embaralho tudo.
 A garota respondeu com uma risada forte que virou um sorriso honesto. Ela deu um gole no ponche que segurava na mão, olhando para a multidão e então olhando novamente para Wendy.
— Sou Melanie. - Ela disse. - Mas meus pais me chamam de Mel.
— Wendy.
— Como o Peter Pan?
— É...acho que sim. Nunca sei como funciona a imaginação dos meus pais.
 Wendy soltou um risinho fraco enquanto Melanie gargalhava novamente. Wendy se perguntou que, mesmo aquela garota sendo uma novata, nunca a tinha notado pelos corredores da escola antes. Era bonita e chamava atenção, isso ficava evidente quando alguns garotos passavam por ela e assobiavam. Wendy achava que ela se parecia bastante com a princesa Pocahontas, talvez pelos traços ou o cabelo. Elas conversaram mais um pouco até o telefone de Melanie tocar no bolso, ela educadamente pediu licença e pausou a conversa com Wendy. Após alguns minutos, fez um expressão séria.


— Meu irmão me dedurou para minha mãe. - Ela disse, bufando. - Tenho que voltar ou as coisas vão ficar feias.
—Você fugiu de casa?
Melanie riu novamente.
— Não exatamente. Mas meio que meu pai sabia que eu estaria aqui, mas a minha general não. Bem, te vejo no primeiro dia de aula.
— Certo... - Wendy sorriu fracamente, o melhor que pode. - Te vejo lá.


 Melanie acenou, apressando-se e saindo da casa. Wendy novamente estava sozinha, era uma pena já que pensou ter feito amizade com uma pessoa que realmente se interessava - ou tentava- conversar com ela. Aquilo melhorou seu humor a ponto dela se locomover para a cozinha e pegar algo, seu estômago de quem ainda não havia jantado estava irritado. Mesmo na cozinha, nenhum sinal de Anthony.
 Ela se juntou a uma bandeja de sanduíches que parecia solitária, saboreando primeiro um sanduíche de atum e depois um de queijo. Haviam poucas pessoas na cozinha junto a ela, algumas bebendo, outras refazendo o estoque de ponche em uma tigela de cristal e outras apenas conversando. Ninguém parecia prestar muito atenção em Wendy. Isso era um alívio.
 Quando havia sido transferida para a mesma escola que seu irmão, Wendy achava que era uma boa oportunidade para recomeçar, fazer novos amigos e esquecer o passado. Mas era tarde, quando chegara na escola nova as fofocas corriam de bocas em bocas, por tempos ela escutava risadinhas e comentários maldosos, até chegavam a colocar mostarda em seus sapatos e escreverem "Vadia" em sua mesa. Mas isso não durou muito quando Anthony interferiu, toda aquela intimidação com Wendy se paralisou. Mas de vez em quando, vez ou outra, ela recebia olhares tortos, risadinhas e cochichos. Certas coisas nunca mudam.
— Você parece só.
 Outra pessoa, pela segunda vez naquela noite, havia chegado perto de Wendy para puxar papo. Mas aquela pessoa tinha um ar totalmente diferente de Melanie. Wendy sentia que não deveria falar com aquela pessoa, não era boa gente.
— Tá sozinha, menina?
 Era um rapaz com mais ou menos a altura dela, os braços tatuados com ossos e caveiras, além do cabelo longo bagunçado e um jaqueta aos trapos. Exalava um cheiro forte de narguilé, cerveja e gasolina. Wendy enjoou-se com aquela mistura forte, quase um soco em seu estômago. Tentado se afastar de pouco em pouco. Aqueles olhos escuros não eram do bem.
— Te conheço? - Ela perguntou, tremendo o olhar.
— Eu não mordo, não. - Ele riu. - Quer cerveja?
O garoto colocou uma latinha na mão dela antes que pudesse responder.
— É que eu vim com meu irmão e...
— É verdade o que os boatos dizem? Tipo...você sabe.
 Ah, então era isso, ela deveria ter notado mais cedo aquela malícia no olhar dele. Wendy sentiu um nó em sua garganta, ela sentia vontade de vomitar e chorar. Estava mais apavorada do que nunca. As pessoas na cozinha não pareciam notar eles ou simplesmente não queriam ajudar. A latinha em sua mão tremia com seu medo.
— Desculpe, eu realmente preciso ir. - Ela engoliu em seco.
— Qual é, vem comigo um pouco. Garanto que não vai se arrepender.
— Não ouviu ela dizer que não quer?
 Wendy assustou-se quando um braço se estendeu entre ela e o cara assustador, a pessoa repousou uma garrafa de vinho sobre o balcão. Wendy olhou ao seu lado. Era um garoto loiro, um pouco mais alto que o cara que estava a abordando rudemente antes. Ele olhou para a cara dos dois e bocejou.
— Sério, em pleno século XXI os caras ainda acham que abordar uma garota assim é legal. Vai procurar sua turma, mané.
 O garoto loiro não esperou pela resposta do tatuado, ele apenas pegou a latinha de cerveja da mão de Wendy e jogou fora, logo ficando entre aqueles dois e enchendo um copo com a garrafa de vinho de mais cedo. O tatuado apenas revirou os olhos e bufou, saindo da cozinha com pressa. Wendy parou para observar ligeiramente o loiro que a ajudou. Ele usava uma blusa vermelha e uma calça jeans, junto a algumas correntes de prata e um chapéu coco. Era um estilo diferente, mas legal, Wendy admitia.
— Não aceite o que qualquer um te oferecer. - Ele disse, olhando para a lata de lixo onde jogou a cerveja. - Podem ter colocado alguma coisa para te dopar.
— Eu estava tentando sair.
— Eu notei. - Ele então elevou o tom de voz. - Parece que nem todo mundo aqui se dispõe a ajudar alguém em situações reais, mas quando vem notícias depois cobram da população, hipócritas!


 As pessoas na cozinha ficaram cabisbaixas, algumas até escondendo seu rosto da visão do loiro. Ele apenas bebeu o copo de vinho e encheu outro, tomando tão rápido quanto o primeiro copo. Wendy observou incrédula, ele tomava aquilo como uma criança toma um copo de limonada em uma barraca de vendas na vizinhança. Parecia tão natural para ele. Wendy o olhou tanto que ele notou, o garoto apenas deu de ombros e abandonou a garrafa pela metade, perdendo o interesse.
— Leo! - O rapaz ruivo da lanchonete apareceu na porta da cozinha. - Vem logo, umas garotas da escola militar estão pedindo seu número.
— Eu deixei meu celular em casa. - O loiro deu de ombros, fazendo uma careta e andando até o ruivo. - Joga elas para o Reve.
— Ele já tá cheio delas, sério, tá totalmente cercado. - Respondeu.
 Wendy reparou que o ruivo agora não parecia mau-humorado como naquela noite na lanchonete, mas apenas energético e sorridente, apenas um adolescente. Os olhos dela cruzaram com os dele. O ruivo apenas olhou para o loiro e para ela de novo, inclinando a cabeça para o lado, como um cachorro confuso.
— Essa não é a...
— Vem logo, antes que a sua boca grande cuspa algo desnecessário. - O loiro puxou o ruivo pela regata. Wendy reconheceu os gritos histéricos do mais jovem, como fizera na lanchonete.
 Parece que aquela noite para Wendy estava se resumindo a ficar sozinha e ter encontros misteriosos com desconhecidos, ficar sozinha e mais desconhecidos. Sério, se a próxima pessoa que esbarasse com ela fosse alguém que pudesse passar a noite discutindo sobre os últimos livros de romance lançados ou os atuais terrores do cinema comparado com os antigos, ela não se importaria.   Precisava distrair a cabeça com algo, seus olhos esbarraram em algo, a garrafa de vinho pela metade e o copo logo ao lado, abandonados pelo rapaz de mais cedo. Wendy sentia-se frustrada com tudo aquilo, sentia-se tão deslocada que não aguentava mais. Ela precisava beber para que a tratassem como alguém comum? Precisava de bebidas alcoólicas para que não a enchessem e perturbassem, para que não precisa de alguém para a defender? Ela só queria que todos fossem legais como eram com Anthony, que a tratassem como Melanie a tratou. Sem pensar muito ela encheu o copo com vinho e cheirou. Era amargo e forte. Ela quis desistir. Mas as imagens de antes, de risinhos e cochichos vieram a sua cabeça. Ela engoliu aquilo como se fosse suco de laranja. Mas seu estômago berrou e a xingou. Ela o xingou mentalmente de volta. Virou o vinho novamente no copo e bebeu, então de novo. A garrafa estava vazia. Mas o estômago de Wendy não se agradou com aquela visão, nem seu cérebro. Ela ficou zonza, então percebeu que havia passado dos limites. Ela precisava de Anthony. Tinha que encontrar Anthony antes que outro encontro épico acontecesse ou o cara tatuado voltasse, ela estava encrencada sem o loiro ao seu lado. Esbarrando e empurrando acidentalmente em algumas pessoas, com muito sufoco Wendy retornou à sala de estar principal totalmente perdida, a música já havia sido trocada para uma mais baixa e menos agitada, mas mesmo assim fazia a cabeça da garota rodar. Com muitas pessoas agora jogadas sobre os sofás e apoiando os pés em mesas de centro, Wendy teve certeza que se isso um dia acontecesse com Christine, ela surtaria e caçaria até o fim do mundo quem tivesse sujado seus tapetes e mesa de centro favoritos. Apertando os olhos e ficando mais afastada da multidão, Wendy tentava procurar Anthony entre tantas pessoas. Ela então o viu, a jaqueta que usava e o cabelo castanho-ruivo penteado em topete o denunciavam. Se inclinou na ponta dos pés, quase caindo, observando melhor; junto a Anthony estavam pessoas que ela conhecia, pelo menos alguns deles. Por coincidência ou não, o loiro, o ruivo e o moreno de olhos azuis estavam ali, conversando amigavelmente com Anthony e colocando a mão em seu ombro, rindo. Haviam algumas garotas ao redor deles, abraçando seus braços e rindo, com intimidade até demais.
 Espere...então Anthony conhecia eles? Naquele dia na lanchonete sua reação na lanchonete tinha no mínimo sido de surpresa e no máximo de assustado. Até aquele momento, ela julgava aquela reação como os amigos dele que estavam na lanchonete naquele momento, medo de caras com outro estilo, com um pouco de intimidação no olhar. Wendy pensava que ela não sentia isso, os garotos, pelo menos o loiro e o ruivo, pareciam normais para ela. Mas Anthony os conhecer era novidade, ela conhecia seus amigos...mas então por que.
 O olhar dela então focou no centro daquele grupo. Um garoto. Alto e magro, com os cabelos negros, curto e bagunçados, despenteados. A camisa preta abarrotada e com uma única corrente de prata, com um pingente de uma falsa identificação do exército. As calças jeans apertadas e rasgadas, com uma jaqueta amarrada na cintura e botas de combate até os joelhos. Aquele garoto tomou a atenção de Wendy por alguns rápidos minutos. Ela o encarava de baixo a cima, sentindo medo que alguém -ou pior, ele mesmo- percebesse. Ele parecia diferente de todos que ela conhecerá, parecia algo...incomum. Ela já não estava mais bêbada somente pelo vinho. Mas o efeito durou pouco, ela piscou diversas vezes quando notou Anthony falar algo perto da orelha daquele garoto. O mesmo piscou os olhos castanhos, incrédulo. Enquanto um sorrisinho aparecia em seus lábios, encarando Anthony que ainda estava de costas para Wendy. Os dois apenas subiram as escadas sozinhos, abandonado o grupo que nem pareceu notar a ausência deles. Apenas algumas garotas que gritaram um "Voltem logo" ou "Aonde vão?" e então voltarem sua atenção para os meninos ali e rindo. O grupo afastou-se das escadas, indo para uma sala de estar mais próxima. Wendy viu sua chance. Um pouco zonza e sem entender nada pela situação, seus pés desajeitadamente se arrastaram para as escadas. Pisou no pé de alguém e recebeu um xingamento em troca, mas não sabia de quem era. Seu único objetivo eram as escadas. Ela foi com um pé de cada vez, em cada degrau, apoiando-se sem jeito no corrimão. O andar de cima estava vazio comparado a como estava lá embaixo. No andar de cima só tinha duas ou três pessoas, uma deles jogando no celular no primeiro degrau da escada e outros dois esperando no que parecia ser a fila do banheiro. Ninguém reparou nela ali, que sorte. Olhou os lados, percebendo que não havia sinal de Anthony por ali. Mas ao fundo, naquele imenso corredor escuro, havia uma porta encostada com um filete de luz passando. Talvez Anthony estivesse lá, conversando sabe-se lá o que com o rapaz de antes. Ela não queria saber muito, só encontrar seu irmão.
 Indo devagar nos passos, tomando cuidado para não tropeçar nos próprios pés, Wendy finalmente chegou ao vão da porta. Ela engoliu quando sentiu o gosto do vômito subir pela garganta, não estava na hora de sujar o carpete do corredor da casa do amigo de seu irmão. Juntando algumas forças, ela empurrou a porta e preparou-se para encontrar o rosto confuso e atormentado de Anthony pelo estado dela, a xingando por ter bebido. Algo que ela nunca fez antes e com certeza o deixaria arrasado.

— Anthony, eu... - As palavras dela nem chegaram a ser uma fala, mas sim sussurros.

Foi Wendy quem se surpreendeu. Ela arregalou os olhos. Anthony estava no quarto com o garoto de antes, é verdade. Mas não estavam conversando. Anthony empurrava o garoto contra uma estante, enquanto Anthony amassava seus lábios contra os lábios do moreno, que parecia confuso, mas não o empurrava. Anthony mantinha os olhos fechado e apertava com força o ombro do garoto, enquanto o outro estava de olhos abertos, com uma expressão de confusão e indiferença. Wendy não se conteve, a surpresa era muito para ela. Agarrada ainda a maçaneta da porta, ela jogou para fora um vômito que se transformou em poça, com a mesma cor da bebida que havia tomado mais cedo. Sua garganta arranhava com aquela sensação horrível, enquanto grunhidos e gritinhos saíam de sua boca junto aquela substância amarga.
 Depois de, literalmente, jogar tudo para fora, Wendy olhou na direção do irmão. Tanto ele quanto o garoto a olhavam surpresos...não, assustados e chocados. As íris brilhantes de Anthony agora pareciam se espatifar como vidro quebrado. Todo segredo que ele escondeu todo esse tempo havia sido descoberto por sua irmã da pior forma possível. Anthony se afastou da estante. O moreno que era pressionado por ele limpou os lábios com o punho, suspirando. Wendy sentiu-se cortada por aqueles olhos castanhos do garoto, que agora estavam afiados e pareciam a julgar.
— Opa, ela nos viu. - O garoto disse. Wendy reconhecerá a voz.
 Era a mesma voz rouca e cansada do dia que Anthony recebeu a carona e tentou disfarçar. O mesmo dia que ele não permitiu que ela olhasse quem era no carro. O mesmo dia que ele mentiu dizendo que era Thomas que o havia levado para casa. Mentiras. Anthony mentiu para esconder aquele garoto?
— Eu vou nessa. - O moreno disse, passando por Wendy, olhando ela e virando-se para Anthony. - Ela não me parece bem.


 Nem Anthony nem Wendy disseram nada, ela estava muito tonta, confusa e enjoada para falar algo, e ele muito apavorado. O garoto moreno pareceu pensativo, olhou para Wendy mais uma vez e deu de costas para eles, indo ao corredor e descendo as escadas. Wendy ainda conseguia escutar o tilintar da corrente dele contra seu peito, enquanto ele pisoteava escada abaixo. Ela, ainda enjoada e tonta, abriu a boca diversas vezes para falar algo. Cada vez que ela abria, Anthony tremia, com medo do que ela falaria. Mas nunca saía nada de sua boca.
 Isso durou até ela dar sinais de que vomitaria de novo, ele finalmente percebeu a situação e correu para a ajudar. Encarando o rosto pálido do irmão, ela tentou finalmente abrir a boca para dizer algo, mas foi interrompida.


— Não conte para ninguém.


 Foi apenas isso que ele falou. Antes de Wendy entender e ficar tonta de novo, não se lembrando de quase nada do que aconteceu depois do irmão a carregar para o andar de baixo com ela apoiada em seu ombro. Ela desmaiou em seus braços, bêbada, enquanto iam para o carro.


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Notas finais do capítulo

Gente, só um aviso: Antes que alguém militante venha falar algo, deixe-me explicar. A Wendy não vomitou por causa da cena do irmão beijando outro cara. Mas sim porque ela bebeu uma quantidade grande bebida alcoólica, algo que ela não estava acostumada e estava enjoada. Ela apenas vomitou porque se surpreendeu, foi um choque, e não segurou o vômito com a surpresa. É isso. Acho que a maioria das pessoas entendeu isso, mas né....vai saber se tem alguém que interpretou errado.



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