Forever escrita por Saturn san


Capítulo 3
Capítulo 3 - Saídas não dão certo em dias chuvosos




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 Era quinta feira e já passava do meio dia, estranhamente naquela dia o céu estava coberto por nuvens cinzentas, indicando que uma tempestade estava a caminho. As chuvas de verão eram agradáveis, mas podiam ser assustadoras com os trovões ensurdecedores e os relâmpagos que iluminavam todo o horizonte. Quando pequena, Wendy costumava ter medo dos trovões e segurava na barra do vestido da mãe, chorando e pedindo por proteção. Hoje em dia, os trovões não eram mais seus maiores medos.

 Para o azar de Wendy, ela havia saído de casa no dia errado e na hora errada. O pai tinha pedido para que ela buscasse certos livros sobre classificação de ervas medicinais e botânica em uma livraria em específico na cidade, ele também avisou que o dono já havia deixado o pedido reservado. Wendy demorou quase vinte minutos somente para achar a loja, já que não conhecia o lugar. A cidade não era pequena e com certeza havia mais de uma livraria ali que todos poderiam querer ir, mas quando queremos algo em específico, não é tão fácil. Ela subiu a rua cambaleando os joelhos na curva quando parou por um segundo para checar o céu, as nuvens acima de sua cabeça a intimidavam e expulsavam dali. Apressou o passo, já avistando a casa à metros de distância. Ela amaldiçoou Anhtony mentalmente quando notou a caminhonete parada ali, em frente à garagem, quando ela precisou sair Anthony havia saído com os amigos do time e agora que a tarefa estava feita ele havia retornado. Wendy tinha pensando em esperar por ele, mas o pai estava com pressa e argumentou que a livraria não era tão longe, era desnecessário um carro. Não era longe, mas difícil de achar.

 Abriu e bateu a porta, a batida foi mais forte do que ela queria. Arrastou os tênis pelo chão, um dos poucos barulhos na casa era a voz de Christine no telefone da cozinha. Wendy observou de relance a mãe. A mulher robusta estava caminhando animada, mas limitada à centímetros pelo cabo do fone que a impedia de ir muito longe. Os dedos se enrolavam no fio enquanto escutava atenta o que a outra pessoa dizia do outro lado da linha, Christine respondia com uma risada ou uma resposta animada. 

  Wendy deu um breve aceno com a cabeça e seguiu para o escritório debaixo das escadas, dando três leves batidas na porta branca. Em cinco segundos ela adentrou na pequena salinha que só era suficiente para duas pessoas caberem, mas com certeza era maior que o pequeno quartinho que Harry Potter vivia. Wendy colocou a sacola com livros na escrivaninha, ao lado do braço esquerdo do pai

— Obrigado, querida. - Ele deu um gole na caneca de café.

 Fechou a portinha sem fazer muito barulho, enquanto ainda escutava os dedos rápidos do pai digitando no teclado. Deu a volta e subiu as escadas, deslizando a mão sobre o corrimão. Os relâmpagos podiam ser ouvidos ao longe, mesmo que ainda estivessem nascendo no horizonte, a luz branca era exibida pelas janelas junto aos trovões. Wendy fechou as janelas do segundo andar e soprou uma mecha que caia sobre os olhos. Ela pegou o celular e visualizou algumas mensagens mandadas por Cynthia e Rachel, suas melhores amigas desde havia entrado na atual escola. As três haviam encerrado uma conversa meia hora atrás sobre pizza, como qualquer coisa aleatória que surgia entre elas e Cynthia formava uma conversa complexa sobre aquilo. Wendy sentia-se decepcionada às vezes por não saber mais como se comunicar direito com os amigos atuais, os únicos laços de amizade que ela tinha. Deu um breve sorriso que desapareceu em segundos, relendo as mensagens que teve pela manhã. Guardou o celular novamente no bolso na calça quando passou pela quarto de Anthony.

 Anthony estava sentado em uma cadeira, girando uma bola de basquete na ponta do dedo indicador direito. Os olhos castanhos concentrados como se aquilo fosse o mundo, se equilibrando em seu toque. Mesmo com o ventilador que refrescava suas costas, ele parecia arfar. Wendy deu uma única batida no vão da porta antes de entrar no quarto, sentando-se na cama do irmão.

 – Foi mal não ter pego minha carona. - Anthony suspirou. - O pai me contou que precisou ir na cidade pegar algo para ele.

— Eram só livros. 

 Mesmo que ela amaldiçoasse aquela caminhonete, Wendy nunca conseguia realmente ficar com raiva de Anhtony ou Emmy por muito tempo. Ela retirou o tênis e se sentou na cama de pernas cruzadas. 

— Você vai na festa do Matt?

— Hum? - Wendy levantou o cabeça. - Não sei do que está falando.

— Os pais deles fizeram uma viagem de segunda lua de mel para Bahamas. O Matt vai aproveitar a ausência deles e dar uma festa amanhã à noite.

 Wendy tentou recordar mentalmente de Matt na lista de amigos de Anthony. Ah sim.

 Matt era da mesma idade que Anthony, mas entrou para o time de futebol americano antes dele. Os dois eram amigos, mas não melhores amigos. Matt era do tipo que gostava de flertar com qualquer garota que trocasse o olhar com ele por mais de cinco segundos, também de gostava de festas e estar ao redor de pessoas. 

— Ele não me conhece direito. - Wendy respondeu rápido. - Sou apenas sua irmã mais nova, que é amigo dele. Não há motivo para me convidar para isso.

— Ah, Wendy! Vamos, pare com isso.

  Anthony jogou a bola de basquete sem força, rolando para algum canto do quarto.

— Você passou quase as férias inteiras dentro de casa. Deveria pelo menos aproveitar os últimos dias e sair para se divertir, para variar.

— Eu tenho certeza de que não vão haver amigos meus lá, não vou me enturmar.

— Você sequer tenta?

  Wendy fechou a boca antes de dizer quando outra coisa, acariciando as pontas dos dedos dos pés e admirando suas meias cor de rosa. Ela odiava quando Anthony tentava forçar ela a algum entrosamento de grupo, sem ele enxergar como as pessoas claramente olhavam para ela.

— Você não pode deixar de ir a uma festa só porque suas amigas não vão. - Anthony sentou-se ao lado dela na cama. - Não acha que é egoísmo consigo mesma?

  Ela torceu os lábios em resposta. Não havia porquê ela ir em uma festa se não foi convidada, não havia ir porquê ir em uma festa se nenhum de seus amigos estaria ali, não havia porquê ir naquela festa. Era apenas isso que Wendy concluía em seus pensamentos.

 Os trovões continuavam do lado de fora, forçando Anthony a fechar sua janela. Mas ele não demorou para voltar até a cama.

— Eu vou estar lá com você. Também não sou seu amigo?

 Ela assentiu com a cabeça, dando um sorrisinho que também fez Anthony sorrir, exibindo as covinhas.

— Se Matt não te deixar entrar… - Ele pensou. - Eu quebro a cara dele e tomo a festa para mim. Ele perde os convidados mas ganha um olho roxo.

— Você não faria isso!

— Tem razão. Eu não faria. - Anthony riu pelo nariz, inclinando a cabeça - Talvez.

 A conversa se encerrou com Anthony arrancando uma única e verdadeira gargalhada de Wendy, uma das raras que ele escutou nessas férias. Ela deixou o meio sorriso marcando suas bochechas, virando-se para ele com as sobrancelhas franzidas.

— A Lana vai?

 Anthony negou com a cabeça.

— Ela disse que tinha que ficar em casa para ajudar a mãe com os preparativos da próxima reunião da boa vizinhança. É claro que ela não ficou nada feliz em perder uma festa.

 Mas Wendy alegrou-se, mesmo que algo dentro dela a lembrasse que aquilo era errado, ela não podia ficar mais feliz em saber que Lana não jogaria seu veneno nela por uma noite. A dose de humor que ela não teve em metade daquelas férias parecia abastecer pelo menos 30% dela, até lembrar que seria só mais um noite em que ela e sua mãe travaria um conflito por roupas. Ela não podia esquecer de trancar a porta do quarto, não podia!

  Depois de horas que a chuva havia passado, a noite chegava para acalmar a todos após aquela tempestade devastadora. Wendy estava rabiscando algo em um caderno em sua escrivaninha, segurando a caneta contra o dedo indicador e o polegar, batucando a ponta contra a folha de papel. Seus olhos levantaram-se para o jardim do vizinho, do lado esquerdo. Uma movimentação estranha debaixo das sombras das árvores, ao lado da cerca. Wendy levantou um pouco as costas e segurou sua respiração sem entender aquilo. Até que notou a filha do vizinho abrir a janela de seu quarto e estender uma coberta para fora. Ela olhava para trás e para os lados a todo momento. A movimentação correu das árvores até a janela, revelando um garoto que parecia ter não mais que 20 anos. Ele saltou e agarrou a coberta e foi puxado para dentro, as luzes do quarto se apagaram logo em seguida.

— Oh, Deus. - Wendy levantou-se e fechou a cortina.

  Safadezas de adolescentes não estavam programadas para ela assistir nesta noite, nem em qualquer outra. Wendy não lembrava de ter uma vez sequer deixado um garoto entrar escondido em seu quarto pela janela. O único e primeiro namoro que Wendy teve não trazia a ela memórias boas, eram péssimas memórias, tão péssimas que ela nem sabia o porquê de ter recordado disso. Balançou a cabeça e se afastou com força na cadeira para longe da escrivaninha, puxando com tanta força a cordinha do abajur que se perguntou como não a arrebentou. Jogou-se no colchão e descansou a cabeça sobre o travesseiro macio.

  Pensar na festa amanhã à noite provocava uma agitação na boca do estômago. Fazia tanto tempo que não ia em uma festa que nem sabia mais como deveria se enturmar com as pessoas, sobre quais assuntos deveria falar. Era fácil falar com Cynthia e Rachel, mas tinha dificuldade em lidar com outras pessoas. Às vezes o motivo era ela mesma.

  Bocejou quando olhou para o relógio uma última vez, marcando nove horas. Faltavam cinco minutos para virar para as dez horas. Fechou os olhos já cansados e tentou pensar o mínimo possível na festa, evitando aquela ansiedade que sempre afeta alguém na época de algo que esperamos muito (ou nem tanto). Bastava ela pensar em um plano, na pior das hipóteses ela faria companhia à mesa de comida a noite inteira. Era um ótimo plano B.


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