A Fênix de Obsidiana escrita por HellFromHeaven


Capítulo 2
Primeiros passos




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Depois de ser bombardeada por milhares de sentimentos conflitantes e sensações completamente novas, o cansaço físico e mental me atingiu como um meteoro e logo minha vista escureceu. Por sorte, foi apenas por uma fração de segundos, mas o suficiente para eu perceber que deveria voltar para a cama e repousar mais. Os Torin perceberam que quase choquei meu rosto contra a mesa e novamente me encararam preocupados. O jovem me cedeu seu ombro e me encaminhou novamente até o quarto, onde deitei e simplesmente desmaiei. 

Pela primeira vez em décadas, sonhei. Estava em um pequeno quarto escuro sem janelas, apenas com uma pequena porta de aço negro e desgastado à minha frente. Correntes de argolas grossas e pesadas prendiam meus membros e meu pescoço ao chão, soldadas em pequenas aberturas nos paralelepípedos de rocha lapidada. Completamente sozinha e sem poder me mexer, permaneci ali em silêncio sem a menor noção de tempo. Senti a solidão crescendo e me esmagando, à medida que as paredes pareciam se fechar e as correntes se apertavam. Incapaz de permanecer assim, lutei contra as forças que me dominavam, mas nada do que fazia parecia ser capaz de libertar minha alma daquela sensação horrível. Gritei com toda a força de meus pulmões, mas era incapaz de ouvir minha própria voz. Lágrimas escorreram por meu rosto em uma torrente interminável, inundando o pequeno quarto e me deixando embaixo d’água, sem forças, sozinha e completamente desesperada. 

Acordei em um solavanco, suando frio e com uma dor aguda em meus ferimentos. Sentada na cama, olhei para baixo e retirei a camisola rapidamente para verificar as bandagens. Nenhum sinal de sangue. Aliviada, decidi deitar novamente, e ali permaneci inerte por algumas horas à espera do sono que nunca veio. Podia ver os raios de Sol entrando por pequenas frestas na janela de madeira e decidi que era hora de levantar. Cuidadosamente, saí da cama e abri fui até o armário em passos lentos. Meus músculos ainda reclamavam a todo momento, mas já parecia ser suportável. Abri o móvel e sorri levemente ao ver pequenos fragmentos de minha armadura e um vestido longo e florido. 

Vesti a roupa com certa dificuldade, tomando cuidado para não abrir nenhum ferimento e manchar o tecido com meu sangue negro. Antes de fechar as portas, peguei o que sobrou de minha ombreira direita e alisei o metal carmesim. Sorri e senti-me aliviada por saber que não precisaria mais usar aquilo. Guardei novamente o fragmento e sai do quarto. Não precisava mais se escorar nas paredes, o que facilitava muito a locomoção pela casa. Não encontrei nenhum dos Torin na cozinha, no que parecia ser uma sala ou em seus quartos. Então saí da casa.

A luz açoitou meus olhos, desacostumados por ficar tanto tempo dormindo, e tive que levar minha mão até a testa para poder enxergar. Estava em uma clareira numa floresta com uma pequena estrada que provavelmente daria em alguma cidade, um poço de pedra com um balde preso a uma corda e uma pequena construção de madeira com uma chaminé de pedra, de onde saia uma fumaça negra. Reconheci o cheiro de aço e fui atraída para lá, involuntariamente.

Havia um grande forno de tijolos, uma bancada de madeira com várias espadas, machados, arcos e afins, uma mesa com inúmeros pergaminhos com desenhos e no centro de tudo estava Orna, martelando um filete de metal incandescente em uma bigorna de aço. A mulher manuseava habilmente as ferramentas e parecia completamente concentrada em seu ofício, moldando o aço, o aquecendo e resfriando quando achava necessário. Ela ergueu a espada com uma das mãos, analisando a arma meticulosamente, colocou uma empunhadura com detalhes de ouro e prata e se levantou, cortando o ar algumas vezes. Em um de seus movimentos, ela girou o corpo e seus olhos encontraram os meus. Com um sorriso no rosto, ela coçou a cabeça e se aproximou de mim.

— Bom dia, flor do dia! - exclamou Orna.

— É…O quê?

Ficamos nos encarando, confusas. Eu sinceramente não sabia o que deveria responder, mas senti que tinha dado a resposta errada. Ela coçou a cabeça e riu. Sua risada era suave e estranhamente aconchegante aos ouvidos. 

— Desculpe-me, é um costume humano dar bom dia às pessoas.

— O que seria “dar bom dia”? Isso é uma espécie de feitiço para que o dia seja produtivo?

— Nada tão sério assim. É só… Um jeito de demonstrar gentileza. Dizemos bom dia durante as manhãs, boa tarde depois do meio dia e boa noite quando vamos nos deitar.

— Entendi… São formalidades então.

— Quase, mas não é importante. Como vocês costumam se cumprimentar lá no palácio?

— Nós não fazemos isso.

— Imaginei. - Orna riu mais um pouco. - Aliás, tem certeza de que deveria estar de pé?

— Sim, já me sinto boa o suficiente para andar um pouco.

— Fico feliz em saber disso. Aliás, estava interessada nas minhas habilidades de ferreira?

— Sim, já acompanhei bastante os processos de forja durante as guerras. Creio que a única diferença seja os materiais.

— Sim! Humanos não conseguem forjar armas de com rocha derretida. Mas eu espero um dia aprender os princípios, pelo menos.

— Desculpe, mas eu apenas observava.

— Entendo, entendo.

Limpando o suor de seu rosto, Orna deixou a espada sobre a bancada de madeira e foi até a sua mesa com desenhos. Curiosa, resolvi pegar a espada. Era muito mais leve do que a minha, o que me permitiu alguns movimentos sutis com a lâmina. Era perfeitamente balanceada e fácil de se manusear. Passei meu dedo pela lâmina e seu fio estava impecável, tirando uma pequena gota de sangue. Um trabalho muito bem feito.

— O que achou? - perguntou, animada. - Dá pro gasto?

— Não é meu estilo, mas é uma ótima arma.

— Que tipo de arma você usava?

— Bem, eu…

— Não, não! Deixe-me tentar adivinhar.

Orna me rodeou, analisando cada centímetro do meu corpo. Estranhei, mas não quis incomodar e apenas fiquei estática. Ela ergueu meu braço e apalpou meus músculos, recuando alguns passos logo em seguida com uma de suas mãos sobre a boca, pensativa.

— Como pensei, a musculatura de demônios é bem diferente da nossa. Não é tão fácil analisar quando seu corpo todo parece ser feito de pedra. Mas pela forma que brandia a espada... Diria que usava uma arma pesada, provavelmente com ambas as mãos.

— Sim! - respondi, realmente impressionada. - Usava Gleipnir, minha espada de duas mãos feita de meteoritos. Sua lâmina brilha sob o luar e...

Vi-me empolgada ao falar sobre meu instrumento de trabalho favorito, mas logo lembrei de minha antiga vida e meu estômago embrulhou por um instante. Era provável que eu jamais veria aquela espada novamente e se, porventura, um dia a tivesse em mãos novamente… O que eu faria? Notei que ainda tinha a menor ideia do que faria depois de estar completamente recuperada e isso me assustou. Não estava acostumada com a incerteza e ser responsável pelo meu próprio destino me pareceu extremamente assustador. Encolhi meu corpo e me abracei, na tentativa de afastar estes sentimentos. Orna percebeu e tirou a espada de minha mão, me abraçando logo em seguida. Éramos da mesma estatura, mas ela abaixou minha cabeça, encostando meu rosto em seus seios fartos enquanto acariciava meu cabelo. 

— Melhor deixarmos esses assuntos para outro dia. Não precisa se preocupar com nada. Apenas finja que é uma demônio comum, sem títulos ou batalhas a enfrentar por um tempinho.

Senti vontade de chorar novamente, mas me contive. O abraço não durou muito, pois logo afastei o corpo da mulher assim que senti a tristeza me deixando. Não estava acostumada com aquele tipo de tratamento e ainda não tinha certeza sobre como me sentia em relação a isso. Então, apenas desviei o olhar para baixo, levemente envergonhada. Orna apenas bagunçou meu cabelo, fazendo com que minha atenção se voltasse para seu rosto, e sorriu.

— Muito bem, vamos procurar o gordo do meu marido.

Sorri sem perceber, mas logo desviei novamente o olhar. Ora fechou sua forja e fomos para a floresta por uma pequena trilha. Foi bom perceber que não sentia mais dificuldades em andar, apenas uma leve dor insistente na ferida deixada pela espada de meu irmão. Poucos minutos depois chegamos a outra clareira, está cheia de árvores cortadas e alguns troncos empilhados. Leena estava sentada em um deles, balançando suas pernas enquanto observava o céu. Mais ao longe, Owen brandia um machado simples de cabo de madeira, derrubando um grande pinheiro com golpes precisos. Ele suava bastante e enxugou o suor de sua testa assim que a árvore tocou o chão, com sua queda ecoando pela floresta. Assim que nos viu, acenou e veio em nossa direção. 

— Olha só quem já está andando por aí! - exclamou o homem, visivelmente feliz.

— Ela elogiou meu trabalho, amor. - disse Orna, orgulhosa.

— Mas é claro que o fez, você é incrível! - Owen a ergueu, girou, depois a colocou no chão e os dois se beijaram.

— Maaaae! - gritou Leena, assim que me percebeu. - Volta já pra cama, menina, você tem que descansar!

— Não se preocupe. - disse. - Deve demorar alguns dias para estar completamente recuperada, mas não vou mais desmaiar ou coisa do tipo. E no caso, é Maeleth.

— Eu sei disso, mas Mae é mais curto e bonitinho. - disse a garota. - Um apelido carinhoso.

— Tipo um nome de guerra? - perguntei, confusa.

— Quase isso, mas sem a parte da guerra. - disse Owen, rindo logo em seguida.

— Vão construir algo aqui? - perguntei. - Um acampamento ou algo assim?

— Não, por que a pergunta? - disse Owen, intrigado.

— Porque estava cortando as árvores. Então isso é um passatempo para os humanos?

— Longe disso. Eu sou um lenhador. Meu trabalho é cortar árvores e vender a madeira.

— Oh… Então existe mesmo essa profissão. - disse, interessada. - Vi uma vez em um livro, mas não fez muito sentido na época.

— Sério? Vocês não fazem casa e móveis de madeira?

— Geralmente moldamos rochas e metal com magia. Mas… Creio que isso seja difícil para vocês. Desculpe.

— Não precisa se desculpar! Essa diferença cultural vai ser educativa para todos nós. 

Assenti com a cabeça e observei enquanto Owen retirava os galhos e folhagens do pinheiro, cortando a madeira em pequenas toras. Queria ajudar, mas esforço físico estava fora de cogitação, então me conformei em apenas carregar algumas toras. Sentia que era capaz de carregar dez, mas só me deixaram levar três. Entramos em casa e fomos até a cozinha, onde Orna usou uma das toras como lenha para o fogão e começou a preparar algo. Nunca tive muito contato com culinária, pois não me deixavam ficar na cozinha do palácio. Segundo meus pais, eu deveria manter distância dos serviçais ou coisa do tipo. Então fiquei completamente interessada pelo processo. 

Habilmente, ela cortou alguns vegetais e legumes, colocando tudo em um grande caldeirão. Depois, cortou uma carne em cubinhos, que estava dentro de um recipiente com uma espécie de caldo cheiroso. Levou tudo ao fogo pouco tempo depois, o aroma penetrou minhas narinas, acariciando meu rosto e abrindo meu apetite. Era sem dúvidas o melhor aroma que já havia sentido em minha vida. Orna serviu tudo com mais algumas rodelas de cenouras em um prato de porcelana. Estava apreensiva e ansiosa, pois sentia os olhares curiosos de todos sobre mim. Ainda assim, eu precisava provar aquilo. Eu sequer tinha palavras para descrever o que senti com a primeira colher da sopa e muito menos para a carne. Não era tão saborosa quanto à que estava acostumada, mas a combinação de tudo que compunha o prato era simplesmente indescritível. Deixei os bons modos de lado e acabei repetindo, algo que jamais tinha feito em minha vida. Obviamente, Orna ficou muito feliz.

Assim que terminamos de comer, olhei para a cadeira vazia ao meu lado e percebi que minha memória havia me traído. O jovem não podia ser visto em lugar algum a casa e eu sequer perguntei por ele. Envergonhada, apenas encarei meu prato vazio, procurando um jeito de vencer a vergonha. Entretanto, fui salva por Leena.

]- Pai, que horas o Ryan vem pra casa? - perguntou a garotinha, brincando com as cenouras no prato.

— Bem… Não sei, devo buscá-lo depois de entregar a madeira para o senhor Lídio.

— Posso ir junto?

— Claro, querida. - respondeu Orna, enquanto lavava os pratos. - Quer ir com eles, Mae?

Todos pararam o que estavam fazendo, encararam Orna e depois olharam para mim. Eu instintivamente olhei para cima e toquei nos meus chifres. Owen e Leena se voltaram novamente para Orna, que parecia se divertir com a cena.

— É… Querida, não acha que ela precisa descansar mais um pouco? - disse Owen, alisando a barba.

— Eu adorei a ideia! - exclamou Leena, com os olhos brilhando.

— Ela é bem forte, querido. Aposto que pode te ajudar a levar a madeira. E aposto que deve estar curiosa para conhecer a vila.

Estava ficando inquieta por aparentemente ser a única que se preocupava em ser um demônio perambulando por uma vila humana. A aquela altura, meus músculos já não estavam mais preguiçosos, mas seria arriscado entrar em uma batalha tão cedo. 

— O que acha, Mae? - perguntou Orna. - Quer conhecer nossa vila?

— Olha… Eu quero, mas não acha que eu chamaria muita atenção? - disse apontando para os chifres.

— Não se preocupe com isso! - exclamou a mulher, confiante. - Já resolvi isso enquanto você dormia. Leena, pode pegar a touca da Mae?

— Pode deixar!

A garotinha deixou a cozinha e pude ouvir o som de um armário de abrindo em um dos quartos. Pouco tempo depois ela trouxe uma touca de lã preta e me entregou. Coloquei sobre a cabeça e meus chifres ajudaram a sustentar o tecido, que os cobriu e desceu até minhas orelhas. Não deveria ser muito comum como vestuário, mas resolvia o problema dos chifres e das orelhas pontudas. Creio que poderia dizer que vinha do grande Deserto das Lamentações, já que lá vivem humanos de pele negra e reluzente. Obviamente, não são tão escuros como eu, mas deveria servir. Fiquei animada e sorri, assentindo com a cabeça.

Algumas horas se passaram até deixarmos a casa. Seguimos pela estrada em frente à casa por cerca de uma hora. Apesar de sua barriga avantajada, Owen mostrou-se muito forte ao carregar toda a madeira sem pausas durante todo o percurso. Leena era muito animada e parecia muito curiosa sobre minha antiga vida. Evitei as histórias de batalhas e apenas contei como era a vida no palácio, o que pareceu satisfazer ela momentaneamente. Não me parecia uma boa ideia falar sobre todas as cidades humanas que levei a ruínas. 

A vila era bem pequena, com cerca de vinte casas e alguns estabelecimentos. Parecia muito com várias outras pequenas cidades por onde meu exército passou, fazendo com que eu me pegasse imaginando o local em chamas hora ou outra. Não gostava desse sentimento e tentei o máximo possível afastá-lo junto com minhas memórias de carnificinas passadas. Todas as pessoas estavam sorridentes e muitos pareciam ocupados em seus afazeres. Notei alguns olhares curiosos, mas mantive minha visão focada nas costas de Owen, pois não queria arranjar problemas. 

Atravessamos a cidade até uma grande construção de madeira de dois andares. Acima de sua porta havia uma placa de madeira pendurada com o nome “marcenaria” gravado. Entramos no local, um grande salão amplo cheio de móveis de madeira muito bem esculpidos e montados. Mais à frente, um homem alto e magro de cabelos castanhos e olhos também castanhos estava atrás de um balcão. Ele parecia perdido em seus pensamentos e exalava um forte odor de serragem. Owen colocou as toras com força sobre o balcão e o barulho assustou o homem.

— Boa tarde, senhor Lídio! - exclamou Owen, sorridente. - Aqui está sua encomenda!

— Pelos Deuses, Owen! - disse o homem, com a voz trêmula. - Vai acabar me matando do coração algum dia!

— Ah, que isso! - zombou Owen. - Seu coração é forte como o de um touro!

— Um touro velho e assustado!

Ambos riram e a atenção de Lídio se voltou para mim. Confuso, ele coçou a cabeça e se voltou novamente para Owen, puxando-o para si e cochichando em seu ouvido. Para seu azar, minha audição é excepcional.

— Quem é essa bela moça com você? Por acaso você está traindo a Orna, seu desgraçado?

Owen riu e se afastou do homem, que continuava desconfiado.

— Claro que não, seu imbecil! - zombou Owen. - Essa aqui é uma amiga da família, Mae.

   - Boa tarde, senhor. - disse, tentando soar o mais natural possível.

O homem me olhou de cima a baixo, ainda desconfiado. Depois deu de ombros e estendeu a mão para mim. O encarei, sem entender sua ação e Owen pareceu notar minha confusão.

— Ele quer que você aperte a mão dele, Mae.Ah, sim. - disse, cumprimentando Lídio. - Desculpe-me, vim de uma tribo um pouco isolada do Deserto das Lamentações. Ainda estou me acostumando com a cultura local.

— Oh, sem problemas, senhorita. - disse o homem, sorrindo. - O que a trouxe para esse fim de mundo?

— Bem… Minha caravana foi atacada e os Torin me resgataram.

Demônios carmesim?

— Infelizmente sim.

 Droga, esses putos estão cada vez mais perto. Pelo menos eu soube que eles perderam uma batalha contra três sujeitinhos importantes na fronteira.

— Heróis. - disse, por impulso. - Três heróis. 

Todos me encararam, espantados. O homem deu de ombros e assentiu com a cabeça, com um sorriso de canto de boca.

— Isso, tem gente que os chama assim. Perdoe este velho homem cabeça dura por não concordar com esse título fantasioso.

— Não é fantasioso, eles são realmente huma… Pessoas incríveis. Pudo observar uma luta deles meses atrás. - disse, convicta.

— Oh… Tudo bem, então. Desculpe-me. Enfim… Fico feliz que esteja bem. Estes demônios não costumam poupar vítimas… Ainda mais mulheres jovens palavras eram carregadas de um misto de ódio, nojo e medo e eu me senti horrível por ser uma das responsáveis por tudo isso. Não entendi a ênfase que ele deu à questão de eu ser uma mulher, mas isso pouco importava. Percebi que seria impossível fugir do meu passado e da culpa que vinha com ele. Novamente, me vi sendo esmagada por minhas memórias. As paredes daquele amplo estabelecimento pareciam se fechar sobre mim e senti dificuldades para respirar. Precisava sair dali.

— Eu… Preciso sair um pouco. - disse, me virando para a porta.

Sem pensar, apenas saí do local. Assim que parei do lado de fora, suspirei profundamente, mas meus instintos dispararam e eu me voltei para as ruas. Sentia como se todos me observassem, como se todos soubessem quem eu era e o que eu tinha feito. Mesmo sem paredes ao meu redor, estava sufocada. Então, eu corri. Corri desesperadamente. Fugi de tudo e de todos, queria apenas estar sozinha, ficar longe de mim mesma, mas isso era impossível. Uma forte dor percorreu meu corpo e minhas pernas vacilaram. Apenas aceitei a dor e cai, rolando pelo chão e chocando meu corpo contra uma árvore. 

Levei minha mão ao peito e senti as ataduras molhadas. Provavelmente, tinha aberto a ferida novamente. Olhei para trás e ainda estava na vila, próxima à estrada. As pessoas que passavam por ali pararam e vieram me ajudar. Ainda assustada, tentei recuar, mas o tronco me impedia. Só me acalmei quando avistei ao longe Owen, Leena e Ryan correndo em minha direção. Despertei de minha loucura e consegui me levantar, amparada por um casal de idosos. Os Torin logo me alcançaram e Leena me abraçou. Meu peito estava muito dolorido e quase caí novamente com o impacto da garota, mas mantive-me firme. Depois que a multidão se dispersou, me questionaram sobre o ocorrido e eu disse apenas que estava sendo assombrada pelo passado. Não queria entrar em detalhes, pois sequer conhecia meus motivos a fundo e, por sorte, eles respeitaram minha decisão. Mesmo sabendo que seria impossível fugir de meus problemas para sempre, decidi adiar um pouco mais, para ter certeza de que estava no caminho certo.


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