Trio Maravilha escrita por Karina A de Souza


Capítulo 4
O Presente de Morte


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo um pouco mais tenso agora.



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—Então... Nós temos algo pra você. -Missy contou, em pé ao lado do Mestre. Calea, sentada em frente a eles, moveu o olhar de um para o outro, tentando entender o que estava acontecendo.

—Tipo o que?

—Um presente. Nós pensamos muito bem, e achamos que está na hora. -Tirou uma caixinha retangular de trás das costas e a entregou. -Abra, abra.

—Okay.

Desfez o laço roxo e abriu a caixinha. Havia uma chave de fenda sônica dentro, algo dourado e metálico.

—Achamos que devia ter a sua. -Missy continuou. -Tem várias funções e ainda pode ser usada como arma. O que achou?

—É... Legal. Obrigada.

—Mal posso esperar pra te ensinar a explodir coisas com ela. -Bateu palmas, animada. -Você gostou mesmo?

—Claro.

Mas ela tinha medo do que aquilo podia significar. Estava há um tempo andando com Missy e o Mestre. Quanto ia demorar até eles pedissem que ela matasse alguém?

—É muito bonita. -Continuou, girando-a na mão para ver os detalhes. -Eu gostei. Obrigada.

***

—Temos uns assuntos para conversar. -Missy avisou, sentando na outra poltrona. Calea tirou os olhos do livro que estava lendo e tentou não suspirar. -Se estava se escondendo, a biblioteca não é um bom lugar.

—Não estava tentando me esconder.

—Ótimo. Tópico número um: nada de bebês híbridos.

—O que?

—Eu juro, Calea, não vou cuidar de nenhum bebê, então espero que não haja nenhum.

—Eu não estou... De onde tirou isso?

—De onde acha que tirei? Você está por aí fazendo coisas...

—Foi uma noite e faz semanas!

—E você tem sido meio estranha desde então.

—Não, não tenho. Podemos ir para o próximo tópico ou ele também é absurdo?

—Por que decidiu se tornar vilã? É realmente algo que quer ou é um jeito maluco de se aproximar do Mestre?

—Okay, essa conversa acabou. -Fechou o livro com força e ficou de pé.

—Calea...

—Eu cansei de jogar com as regras dos bonzinhos. Cansei de ver tudo ir pro espaço por que há limites que não se pode cruzar, por que você tem que ser bom. Escolhi ter liberdade de escolher e cruzar limites. É um dos motivos de eu estar aqui. Está bom o suficiente pra você?

Saiu da biblioteca.

***

—Calea está estressada, o que você fez?

—Por que eu teria feito alguma coisa?-O Mestre retrucou.

—Somos em três nessa nave, e eu não fiz nada.

—Tem certeza?

—Está me acusando?

—Você me acusou primeiro.

—Por que você faz bobagens. Está sempre deixando Calea irritada com seus comentários estúpidos. Uma hora ela vai acabar atirando em você, eu juro. Em algum momento todas as mulheres da sua vida atentam contra sua vida.

—Você é uma delas?-Missy moveu a cabeça.

—Talvez. Fique esperto... Para variar.

***

A bomba fez outro som irritante. Se fosse verdadeira, teria explodido bem na cara de Calea. A garota suspirou, irritada e tentou recomeçar, seguindo os passos que tinha aprendido alguns dias atrás. Armar bombas não era um de seus interesses, mas seus tutores insistiram que ela aprendesse.

Vilões, aparentemente, precisavam saber armar bombas. Talvez heróis precisassem saber desarmá-las. Ela tinha visto o Doutor desarmar uma ou outra, quando ainda era a companheira dele.

De novo, o som irritante, mostrando que Calea tinha feito algo errado na armação da bomba. Mal tinha recomeçado quando o som soou de novo, uma campainha insistente que mostrava seu fracasso na tarefa.

Enfurecida, a garota agarrou a bomba falsa e a jogou na parede oposta. O som soou por alguns segundos, mas começou a diminuir até parar.

—Isso faria a bomba explodir. -O Mestre disse, entrando na sala, que mais parecia uma sala de interrogatório vazia. -Bum. Você morreu.

—Bem, não vou reclamar. -Cruzou os braços, se inclinando para trás na cadeira. -Pelo menos não preciso mais armar essa coisa. Estou morta.

—Talvez conseguiria armá-la se não a jogasse na parede.

—É. Talvez.

—Missy comentou que você anda irritada. Algum motivo específico?

—Não. Mulheres ficam irritadas, não importa a espécie. Devia saber disso, você mora com duas e uma delas é você.

—Não precisa me lembrar disso. -Calea estreitou os olhos, esperando um comentário estúpido sobre mulheres, mas nada aconteceu. -Uma lição valiosa: seja paciente. Vilões precisam de paciência, só assim criam e executam planos perfeitos. Se quiser ser apressada e impaciente, prepare-se para ter seus planos arruinados por algum herói idiota.

—Como o Doutor?

—Exatamente como o Doutor. -Olhou para a bomba no chão da sala. -Continue tentando... E não a jogue na parede. É a única bomba falsa que temos. Não acho que vai querer mexer nas verdadeiras sem estar pronta. -Sumiu pelo corredor.

Calea suspirou, jogou os cabelos para trás dos ombros e foi juntar a bomba falsa.

***

Missy tinha contado aquela história centenas de vezes, e parecia não se importar... Ou sequer lembrar. Repetia como se fosse a primeira vez, sem notar que não estava sendo ouvida.

Do outro lado da mesa, o Mestre mexia em sua chave de fenda sônica, se perguntando por que ainda arrastava Missy por aí. Ao lado dele, Calea assentia de vez em quando, fingindo ouvir Missy, enquanto tomava seu milk shake.

—A gente precisava mesmo prender todo mundo?-Interrompeu. -Quer dizer, nem tinha tanta gente assim na lanchonete... E os caras verdes de Nópolis nem entenderam o que estava acontecendo.

—Se a gente podia prender todo mundo no freezer, por que não fazer?-Missy retrucou. -Agora, onde eu estava mesmo? Ah, sim, então eu comecei a rir da cara dela e...

—O que é aquilo?

—Calea...

—Não, olha!-Apontou pela janela. Os dois Senhores do Tempo se viraram naquela direção.

Havia uma torre alta e escura se erguendo no horizonte. Eles não tinham prestado atenção nela quando pararam na lanchonete intergaláctica (Missy tinha se encrencado com a cozinha de novo), mas agora era impossível não notar, com o céu escurecendo naquela região, e raios sendo atraídos diretamente para a torre.

—O que é aquilo?-Calea repetiu.

—Parece estar usando os raios para se alimentar. -O Mestre murmurou.

—Tipo energia?

—Exato.

—Mas por que usar raios? Você disse que esse planeta usa energia solar.

—Sim, por que não há nada aqui que precise de tanta energia.

—Então o que aquilo está fazendo e por que precisa dos raios?

—Você faz perguntas demais. -Missy ficando de pé. -Não quer umas respostas?

—Quer ir até lá?-Olhou pra ela, chocada.

—É claro que sim. Se alguém está aprontando alguma coisa, eu quero saber como, por que e de que forma posso me intrometer.

A torre alta pertencia à uma construção confusa. Parecia que haviam mudado de ideia enquanto estavam construindo o projeto... Algumas vezes. Aquilo que podia ser uma igreja misturada com um hospital, um castelo e uma fábrica era a arquitetura mais feia que Calea tinha visto.

—É horroroso. -Comentou. -E escuro. Não parece com o resto da arquitetura local.

—Como se tivesse caído aqui de paraquedas. -Missy completou. -Acho que não se importam com a beleza exterior. Bem, que seja. Essa porta deve abrir, então eu vou entrar...

—Não, espera. -Segurou o braço dela. -Se vamos invadir essa coisa, devíamos ser discretos e não sair entrando pela porta da frente. Nem sabemos o que é ainda.

—Ela tem razão. -O Mestre concordou. -Parece que tem aprendido alguma coisa, afinal de contas.

Entraram pela porta dos fundos, que abriu com um rangido horrível. Calea sentia que os três estavam entrando no castelo assombrado de um vampiro assassino. Balançou a cabeça para espantar o pensamento. Estava assistindo filmes terráqueos demais.

—É tão... Silencioso. -Sussurrou. Parecia estar falando de um lugar imenso e vazio. -Não gosto daqui.

—Deve haver algum computador em algum lugar com informações. -Missy sussurrou de volta. -Vamos descobrir o que é.

—Talvez tenha uma ideia. -O Mestre disse, de outro corredor. As duas se apressaram em se aproximar. -Parece uma sala de cirurgia.

—É por que é uma. Calea e eu assistimos seriados médicos de todos os cantos do universo. Sou quase médica.

—Isso é um hospital?-Calea perguntou, espiando pelo vidro da porta.

—Tão silencioso? Só se os pacientes forem cadáveres.

—O que?

—Ou talvez sejam mudos. E não se mexam. E...

—Que tal achar aquele computador agora?-O Mestre interrompeu.

Os três andaram pelos corredores. Os passos soando incomodamente altos no chão branco e sujo. Subiram alguns lances de escada até Missy apontar para uma placa numa porta e entrar.

—Esse computador é mais velho que Gallifrey. -Resmungou, batendo nas teclas rapidamente. -Talvez demore um pouco.

—Você, vigie a porta. -O Mestre ordenou, mal olhando para Calea. A garota suspirou e cruzou os braços, pegando seu posto.

—Se é um hospital...Cadê todo mundo?-Perguntou. -E por que precisam da energia dos raios se não tem ninguém aqui?

—Mais perguntas.

—Eu não sei. -Missy continuou digitando. -Talvez tenham ido tomar chá.

—E o hospital ficou vazio?-Calea perguntou, confusa. -Cadê os pacientes, as enfermeiras, os médicos...?

—Não é um hospital.

—Mas...

—Não é um hospital. É um centro de testes.

—Testes? Que tipo de testes?

—Testes em espécies. Experimentos em espécies de vários planetas e galáxias diferentes. -O Mestre se aproximou para ver a tela do computador. -Ah. Interessante.

—O que?

—Não vimos ninguém por que todos os “pacientes" estão presos. Não são voluntários... São prisioneiros. Isso é...

—Horrível.

—... Uma excelente ideia. Por que não pensamos nisso antes, Júnior?

—Você tá falando sério? Isso é uma coisa terrível. Pegar pessoas e fazer testes nelas sem seu consentimento? Você não pode fazer isso com alguém. Não pode tirar suas escolhas. Isso é algo...

—Que vilões fariam. -Calea fechou a boca, não tinha uma resposta.

—Exato, minha cara.

Calea se afastou da porta, girando na direção da voz. Havia dois homens perto da porta e a diferença entre eles era gritante. Enquanto um parecia um armário, alto, de cabelos curtos e bagunçados, e cuja cabeça parecia enfiada entre os ombros, o outro era baixinho e careca, e o nariz era enorme. Parecia alguém que criaria um monstro no porão de seu castelo, em um filme em preto e branco.

—Eu não os convidei para o meu hospital. -O baixinho disse. Calea recuou mais um pouco. -Odeio invasores, mas adoro fazer deles meus pacientes. Você, garota do cabelo escuro, qual sua espécie?-A híbrida não respondeu. -Dorff precisa ajudá-la a lembrar?-O grandalhão apertou um punho.

—Kepleriana... E humana.

—Uma híbrida. Gosto de híbridos. Os bebês deles, se feitos com outras espécies, acabam sendo uma surpresa. E o que temos aí?-Olhou para Missy e o Mestre.

—Senhores do Tempo. -A mulher respondeu.

—Já tive alguns por aqui... Só deram trabalho. Normalmente morrem tentando escapar.

—É mesmo, é?

—Odeio quanto tentam escapar.

—Eu acho até interessante.

—Não tenho tempo para discutir isso. Tenho duas cirurgias marcadas pra hoje. Dorff, é com você. Pode levar a híbrida lá para baixo.

—E a gente?-Missy perguntou, colocando as mãos na cintura com a cara de quem ficaria ofendida caso fosse esquecida.

—Vocês? Ah. Vocês vão morrer.

***

Ninguém disse nada depois que o velho baixinho saiu, todos imóveis e com seus próprios pensamentos. O silêncio foi cortado quando Dorff entrou e fechou a porta atrás dele, fazendo Calea recuar até a mesa atrás de si.

—Tudo bem então, -Missy começou. -como vamos resolver isso?

Dorff atacou. Calea só teve tempo de gritar e cair para fora do caminho daquele armário desgovernado.

De repente, alguém jogou uma cadeira no grandalhão, que parecia nem ter sentido. Depois disso foi tudo confuso e violento. Calea se manteve abaixada, tentando não ficar no meio da confusão, então chaves de fenda sônicas voavam e rolavam para o chão, alguns xingamentos ecoavam pela sala, e os punhos de Dorff acertavam o que podiam, mais parecendo bolas de demolição.

O armário ambulante jogou o Mestre contra uma parede, derrubando uma estante. O Senhor do Tempo caiu e não se mexeu mais.

—Okay, isso foi extremamente desnecessário!-Missy reclamou. O penteado dela estava desfeito e Calea podia ver que ela não estava conseguindo ficar de pé muito bem. -Tudo bem sair socando o Júnior, mas eu sou uma dama e exijo ser respeitada.

O mini discurso não adiantou. Dorff apenas cerrou os punhos mais uma vez e avançou. Calea tentou agarrá-lo pelas costas do terno velho, mas ele apenas virou e a estapeou como faria com uma mosca irritante, fazendo-a cair no chão.

—Como ousa?-Missy gritou. Ela teria dito mais, todos sabiam disso, mas em seguida estava contra a parede, com Dorff apertando seu pescoço.

Calea gritou de novo, e percebeu que isso era inútil. Olhou para o Mestre, pedindo ajuda, mas ele ainda não tinha acordado. Olhou de novo para Missy, que não conseguia se soltar.

O que eu faço?, pensou desesperadamente. Seu lábio sangrava e ela sabia que se levantasse para lutar, ia cair de novo e dessa vez podia ser pior.

Mas, se Dorff matasse Missy e o Mestre, seria muito, muito pior. Eles estariam mortos e ela seria usada nos experimentos do baixinho esquisito.

Isso não podia acontecer.

Olhando em volta, tentando dissipar o desespero em sua cabeça, acabou agarrando algo próximo de sua mão, e apontou o objeto na direção de Dorff. Era sua chave de fenda sônica.

Um raio atingiu o grandalhão em cheio, fazendo seu corpo brilhar de modo sinistro e então cair como um boneco desengonçado.

Silêncio. Missy apenas olhou pra ela, surpresa.

Calea abaixou a mão lentamente, começando a entender o que tinha feito.

Dorff não ia levantar e continuar seu ataque. Ele estava morto. E Calea havia o matado.


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Notas finais do capítulo

Bem... É isso, por hoje.
No próximo capítulo, Calea terá que lidar com o que fez, e alguém trazendo um spoiler do futuro pode causar problemas para o Trio Maravilha.



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