Cassis (Série Alestia I) escrita por Jane Viesseli


Capítulo 24
Presente para Mim?




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O comboio do rei chega ao castelo no fim da tarde. Assim que os cascos dos cavalos adentram o pátio principal, Cassis salta de seu animal e caminha apressado em direção ao hall de entrada, para onde Jonas corria desengonçado a fim de recepcioná-lo.

― Tragam-me os mensageiros, todos eles – ordena o vampiro aos soldados que estavam em guarda, voltando-se para o velho e ofegante chanceler em seguida. – Venha comigo, imediatamente!

― Sim, majestade – responde prontamente, fazendo-lhe uma reverência e o seguindo em direção à sala de conferências, onde o vampiro redigiu, pessoalmente, uma carta à Sir Thorkus e outras três aos generais das fortalezas.

Cassis ainda sentia a fúria dentro de si enquanto escrevia cada uma daquelas cartas, contando sobre o infeliz encontro com o rebelde, solicitando o alerta máximo do exército e a fortificação das regiões habitadas, pois Tibérius poderia estar e atacar em qualquer lugar. Os envelopes foram lacrados com o selo real e entregues aos mensageiros com caráter de urgência, fazendo-os correr em direção aos seus cavalos e partirem apressados rumo aos seus destinos, escoltados por dois soldados cada um.

Para Sir Thorkus, a mensagem pedia uma investigação do conselho sobre o esconderijo do rebelde, que ameaçava a vida de Sara e, consequentemente, da permanência do tratado com Alestia. Sua vontade era simplesmente valorizar a vida da humana através de suas palavras, mas ele sabia que aquela não seria a melhor forma de convencê-los, sabia que precisaria colocar a aliança em cheque para que o conselho vampiro se movesse a seu favor. E para que não houvesse oposição de nenhuma parte, necessitava das habilidades de seu criador, pois não havia ninguém mais influente que ele dentre os anciãos, e se Thorkus estivesse preocupado com o assunto, os demais também estariam no instante em que abrisse sua boca.

O rei senta-se a mesa novamente, após a saída dos quatro mensageiros, redigindo sua última carta, desta vez a Narbor, o reino das grandes armas com quem Alestia tinha uma sólida aliança, solicitando dez de seus mestres ferreiros a fim de reforçar os armamentos de seu exército. Em troca, o rei se encarregava de aniquilar a ameaça que pairava sobre o reino e que poderia facilmente migrar para os domínios narbornianos se não fosse contido.

Cassis sabia que não haveria recusa ao seu pedido. Narbor era um reino bastante pacífico, apesar de ser o mais bem armado e com os melhores ferreiros de todos os reinos do sul, e, por isso, encararia a proposta com muito interesse, afinal, era mais fácil ajudar um vampiro a caçar outro vampiro, do que submeter humanos a uma força tão superior à deles.

― Leve essa mensagem ao rei de Narbor, com igual caráter de urgência – explica o vampiro, enquanto a carta era lacrada com o selo real –, e só retorne quando ele lhe der um veredito a respeito de seu conteúdo.

― Sim, majestade! – confirma o último mensageiro, guardando a correspondência em sua bolsa de couro e despedindo-se com uma reverência, antes de correr porta afora como todos os outros.

― Convoque o general da Cidadela para uma reunião, ainda esta noite – pede Cassis ao chanceler, levantando-se de sua cadeira para averiguar a localização de Sara, que não via desde aquela manhã.

― Há algo com que devamos nos preocupar, senhor? – questiona Jonas, ainda alheio aos conteúdos de todas as cartas escritas pelo rei.

― Sim, mas você saberá em breve, assim que o general chegar.

― Entendo. Providenciarei que ele chegue o mais rápido possível.

O vampiro acena positivamente com a cabeça, deixando a sala de conferência em direção ao próprio quarto, onde, pelo horário, esperava que Sara estivesse.

No aposento, a rainha já o aguardava. Cassis permanecera recluso com o chanceler e os mensageiros por quase uma hora, mas Sara parecia não se interessar pelo motivo, visto que as mulheres sempre eram deixadas alheias à política e aos assuntos militares. E quando o vampiro finalmente adentrou o cômodo, abrindo a porta ruidosamente para que sua presença fosse notada, encontrou a humana sentada na poltrona que outrora fora dele.

Sara se levanta, caminhando até ele de forma apreensiva e mordiscando os lábios, buscando as melhores palavras para lhe contar de sua feliz descoberta. Entretanto, com a mente ainda gritando o nome de Tibérius, Cassis não pôde deixar de entender seu nervosismo de forma errada.

― O que houve? Ele esteve aqui?

― Ele? Quem? – questiona confusa, fazendo o vampiro cair em si. O rebelde não tentaria nada contra sua rainha a não ser que ele desse o primeiro passo rumo a uma caçada, o que era exatamente o que estava propondo ao clã e ao seu exército, contudo, a situação ainda era nova demais para ser contra-atacada.

― Ninguém – desconversa. – Você está tensa e milhares de coisas passaram pela minha mente neste momento.

― Não se preocupe, estou no local mais seguro do reino – assegura, fazendo o vampiro, por um instante, duvidar dessa certeza. – Meu nervosismo se deve ao fato de ter um presente para lhe dar, mas não saber como reagirá quando recebê-lo.

― Um presente para mim? – questiona, com um resquício de curiosidade passando por seu olhar. – Que eu saiba, não faço aniversário hoje. – Franze a testa com a piada não proposital. – Na verdade, não comemoro aniversários há muito tempo.

― Não é de aniversário e também não estamos comemorando nada, pelo menos, não ainda.

― Ainda? O que quer dizer? Por favor, Sara, seja mais clara. – pede casualmente, tentando não estragar qualquer que fosse o presente que ela tinha a lhe dar, devido a sua mente descontrolada.

― Venha, sente-se aqui – pede ela, sorrindo, não se incomodando com a necessidade de Cassis em controlar suas emoções o tempo todo, o que, na maioria das vezes, o fazia parecer apático e desinteressado.

Ela o conduz para a poltrona, tocando levemente em seu encosto para incentivá-lo a se sentar, e quando o vampiro finalmente obedece, Sara lhe fecha os olhos com uma tira de veludo.

― Por que tenho que vendar os olhos?

― Pare de fazer perguntas, apenas aproveite o momento.

O rei solta um rosnado baixo, demonstrando não gostar da sensação de ser deixado no escuro, fazendo a rainha sorrir por finalmente retirá-lo da apatia forçada por seu autocontrole, achando graça na forma como ele esboçava certos sentimentos, ficando bravo por não saber lidar com eles.

Vencido pela própria curiosidade, o não-vivo relaxa os músculos e aguarda, tamborilando insistentemente os dedos no braço da poltrona, enquanto Sara respirava profundamente e enxugava as mãos suadas. Ela segura as mãos de Cassis com firmeza, lentamente colocando-as sobre o seu ventre e fazendo a testa do vampiro se enrugar.

Aquele era o corpo dela, ele tinha certeza, mas não entendia o que aquilo queria dizer. Sara não podia ser o presente, pois, se fosse, todo o suspense criado seria ilógico. Então o quê, realmente, ela queria lhe dar?

O rei retira a venda com uma das mãos, abrindo os olhos e observando o corpo de sua rainha, assim como o local estratégico onde sua mão estava posicionada. Seus olhos correm para o rosto de Sara, para o ventre e novamente para o rosto da humana que parecia muito feliz, o que o fez descartar a hipótese de se tratar de uma prenda. No entanto, se não era uma brincadeira, o que aquilo queria dizer? Será que…

― Sara, o que quer dizer com isso? – questiona, a surpresa e a suspeita abertamente estampadas em seu rosto pálido.

― Isso mesmo que está se passando pela sua cabeça, você vai ser pai!

― O quê? Ah, eu, e… – gagueja chocado, tornando impossível descrever os sentimentos que o inundavam. – Impossível! – proclama em pensamento, com a voz travada em sua garganta.

O corpo do vampiro congela e diversos pensamentos invadem sua mente. Ele não poderia gerar filhos, não era um vivo, portanto, se o feto não havia sido gerado por ele, quem o fez? A ideia de que Sara pudesse o trair e se deitar com outro homem era inaceitável e o próprio vampiro se recusava a pensar nela daquela forma tão baixa, repudiando a hipótese no momento em que surgiu em sua mente. Contudo, se Sara lhe fora leal durante todo o tempo e se tinha certeza de seu estado de gravidez, como aparentava, então não havia outra explicação a não ser a que ela estava lhe dando: ele a havia engravidado.

Ainda em silêncio, o rei segura a cintura da humana e a aproxima de si, até que sua cabeça fosse capaz de tocar sua barriga através do tecido, imaginando se havia mesmo uma criaturinha ali dentro, se aquilo era possível, se ele realmente poderia dar um filho a ela e um herdeiro a Alestia, se ele poderia ter uma família como os humanos comuns.

― Criaturinha – pensa ele, frisando o termo que usara mentalmente, achando aquela a pior forma de se referir à sua cria, mas logo pensando numa questão preocupante.

― Então, o que achou? – pergunta Sara, ainda aguardando uma resposta.

― O que você achou? – rebate, se levantando, aderindo mais uma vez a sua máscara de imparcialidade para não transparecer a nova preocupação que o consumia. – Está feliz com isso?

― Com toda a certeza. – Sorri. – É o seu filho e isso me faz feliz. Acreditávamos que não seria possível, mas, agora acho que estávamos enganados, quem quer que tenha lhe dito tal coisa, de certo não estava falando a verdade – conclui extasiada, acertando-o profundamente com suas palavras, afinal, ninguém nunca havia lhe dito aquilo, o vampiro havia chegado à constatação de sua esterilidade sozinho, tendo como base apenas o fato de ser “diferente” dos humanos, e, portanto, incapaz de viver como eles ou de ter o que eles tinham.

O vampiro se levanta e a abraça, de repente sentindo-se tolo por todas as suas conclusões precipitadas e por, desde o início, privá-la do desejo e da esperança de gerar uma criança.

― Se você está feliz, então eu também estou feliz – sussurra no ouvido de Sara, fazendo-a se arrepiar.

Ainda segurando a rainha contra seu corpo e já crente de que a criança que crescia em seu ventre lhe pertencia, Cassis deixou sua nova preocupação lhe assombrar o semblante, enquanto imaginava que tipo de criatura surgiria daquele estranho cruzamento. O que poderia vir de bom de alguém como ele, quando, obviamente, Sara era a melhor parte dos dois?

Nenhuma palavra sobre o encontro com o rebelde foi mencionada no aposento real naquela noite, pois, apesar de pretender alertá-la sobre a nova ameaça, o rei não ousava desfazer a alegria que se apossava do rosto de sua amada. Em consequência a isso, o vampiro percebeu que reinar era bem mais complexo do que imaginava e do que havia vivenciado como príncipe.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado ^-^



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