A Bruxa Forasteira escrita por Lilien


Capítulo 3
3 — Armamento


Notas iniciais do capítulo

* Cafeteria temática onde as garçonetes atendem usando roupas de empregada francesa e tratam os clientes como "mestres".



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Dois anos se passaram desde que Tahine começou a morar na casa da família Fuchihana. Quando menos percebeu, Tahine já não mais chorava todos os dias, e já conversava casualmente com as pessoas que moravam na mesma casa. Neste momento, ela já havia completado treze anos de idade. Seu desempenho escolar e seu aprendizado estavam indo bem, e ela não fugia mais de casa, até porque também temia estar sendo procurada pelo pai ou por alguém enviado por ele. Por passar mais tempo de casa, sua musculatura diminuía um pouco por necessitar menos de esforço para mover a cadeira de rodas. Em uma tarde, após chegar da escola, encontrou seus três primos vestindo roupas incomuns combinando. Cada um estava usando um vestido preto que ia até as coxas, de mangas longas, com bordas e avental brancos e rendados, um laço preto no peito, e um acessório na cabeça. Eram característicos vestidos de empregadas francesas.
Tahine ficou impressionada. Adorou aqueles vestidos, achou-os lindos, e estava querendo vestir um também. — Vocês estão muito lindas vestidas assim! — Ela disse com brilho nos olhos marrons claros. — Por que estão assim?
A mãe dos três se aproximou, sorrindo levemente — Eles estarão inaugurando um maid café* como os de Akihabara. É tudo ideia das crianças, eu estou apenas ajudando-as um pouco.
Tahine sabia que os três irmãos gostavam de RPG, e já jogou com eles. O que a supreendeu é que eles tenham transformado um hobby em trabalho. — Então, vocês foram a Akihabara e não me chamaram? Hmph… — Disse de cabeça baixa, mas brincando. Sabia que, na verdade, eles não saíram de viagem recentemente.
— Fomos há mais ou menos cinco anos atrás. Você não estava aqui na época... — Quem falou foi Satomi, a irmã do meio, uma jovem alta de 16 anos, de cabelos dourados e curtos como os de sua mãe. — Pois se estivesse, levá-la-íamos. ...A propósito, acho que podemos ir de novo no final deste ano, e você virá com a gente.
Já conhecendo um pouco do que é Akihabara, Tahine ficou bastante feliz, como uma criança do ocidente ouvindo dizer que seria levada para um enorme parque temático famoso internacionalmente. — Tudo bem, obrigada! — E voltou sua atenção para as roupas. — E, vocês já começaram a trabalhar?
O mais velho, Shirou, de 18 anos, olhos e cabelos médios prateados, respondeu: — Ainda estamos ensaiando nossas falas e fechando contrato com algumas pessoas para nos ajudarem. O local já está pronto e decorado — e fica aqui do lado de casa — e também temos uma cozinha! Mas os cozinheiros ainda estão por vir. — A figura que disse é um garoto vestido de maid, como as suas duas irmãs mais novas. A pele era macia e fina o suficiente para que o vestido ficasse bem nele. Ele tinha uma voz consideravelmente masculina para alguém que trabalharia fingindo ser uma garota, mas não parecia incomodado. Na verdade, estava com um sorriso no rosto, pois afinal, foi ele que teve a ideia de realizar um maid café nas proximidades, e é ele que lidera o projeto.
— Eu posso me vestir como vocês e trabalhar junto com vocês?! — De tão animada, ela se esqueceu de que não podia ficar de pé como seus primos. Na verdade, se esqueceu que isso era um requisito para o serviço. Queria fazer o que eles faziam, mesmo que precisasse trabalhar de cadeira de rodas.
Eles apenas responderam que não, e explicaram o que ela já sabia. A pré-adolescente já esperava por isso, então não ficou tão entristecida.
...Mas sendo tão persistente, ela não iria desistir. Foi quando se lembrou de que tinha posse de um milhão de ienes. Aliás, apenas 880.000 ienes agora, já como comprou um smartphone recentemente. Ainda assim, com 880.000 ienes é possível comprar próteses. Próteses para as duas pernas custam cerca de trinta mil ienes, de acordo com as pesquisas de Tahine pela internet em seu novo smartphone. Tinha dinheiro o suficiente para comprar mais de vinte pares dessas, mas não podia comprar de imediato, pois as próteses são fabricadas sob medida. Ela então pesquisou mais a fundo, procurando próteses que fossem melhor que as genéricas, pois queria algo especial e surpreendente.
De repente ela chegou ao ponto de desejar próteses voadoras.
Há, no Japão, uma montadora de carros que passou os últimos longos anos estudando o desenvolvimento de carros voadores, os quais já estão no mercado faz um tempo e muitas pessoas já possuem, circulando pelas ruas.
Mas há dois enormes problemas:
Primeiro: são carros, não próteses.
Segundo: o preço estimativo de um carro voador é de… 35.000.000 de ienes… Tudo o que a garota tem é 880.000 ienes. Pernas voadoras provavelmente custariam muito mais que isso.
Pesquisando mais especificamente, ela descobriu uma cadeira de rodas robótica que pode se transformar em próteses. Parecia ser o equipamento perfeito para Tahine, e o preço era de apenas 1.500.000 ienes. Ela poderia obtê-lo, se conseguisse mais 620.000 ienes. Mas isso é muito dinheiro, e já é impossível conseguir essa quantia tão de repente…
Então Tahine iria, no dia seguinte, tentar conversar com sua tia para que pudesse, de algum modo, conseguir uma cadeira de rodas voadora.

Demorou bastante para que Tahine conseguisse explicar bem e convencer a tia. Mas ela concordou em ajudá-la.
— Espera, como você conseguiu um milhão de ienes? Isso é muito dinheiro para uma criança ter! — Os olhos estavam bem abertos, em surpresa.
— É dinheiro do meu pai. Ele é político, não lembra?
— Ah, é? Tudo bem, então... — Ela tentou parecer menos assustada, e resolveu não fazer mais perguntas, apesar de parecer que tinha várias dúvidas em relação a isso. — Bom, isso facilita as coisas. E, enfim, a primeira coisa que você quer é uma cadeira de rodas que pode se transformar em próteses, não é? — Por fim, a tia estava comovida com a vontade da pré-adolescente de trabalhar como uma maid, tanto que resolveu apoiá-la. — Essa parte é fácil. Mahiro, o meu marido, que é mecânico, pode fazer uma para você usando apenas uma cadeira de rodas comum.
— Sério?! — Tahine já sabia que o senhor Fuchihana trabalhava era um mecânico, mas não sabia que ele poderia fazer algo tão incrível.
— Mas eu recomendo que usemos uma cadeira de rodas nova, ao invés dessa sua. Ela já está bem desgastada…

Para que pudesse continuar seu objetivo, Tahine comprou uma cadeira de rodas por 40.000 ienes no shopping. Dias depois, pagou 10.000 de gorjeta para o tio. Tahine havia antes oferecido uma quantia maior, mas ele insistia em recusar tanto dinheiro, pedindo para que ela não se preocupasse, dizendo que ela não devia nada. Mas Tahine é boa com as palavras, e conseguiu fazer com que ele aceitasse um pouco.

Passaram-se dois meses, e Tahine já tinha uma cadeira de rodas que também eram próteses, e ela já poderia ficar de pé trabalhar como uma maid. O próximo passo seria entrar em contato com a montadora de carros para tentar convencê-los de instalarem a tecnologia deles na nova cadeira de rodas de Tahine, a 「Wheelpower」, com menos de 830.000 ienes. ...Ou um pouco mais que isso, já como sua família pode ajudá-la.
Apenas o que tornava as coisas difíceis era que, como ela nunca tinha andado antes em toda a sua vida, tinha dificuldade em se adaptar a usar as pernas robóticas, então esperaria um tempo antes que pudesse voar.
Tahine passou vários dias de sua vida praticando a andar, e prometeu que começaria a trabalhar no ano seguinte. Porém, sentia dor ao pensar demais na condição em que estava andando, pois lembrava que ela se tornou deficiente por culpa do pai.
Apesar de parecer feliz nos últimos anos, a pré-adolescente ainda tinha ódio por uma pessoa, e impiedosamente queria fazê-lo pagar pelos seus pecados.

— - - - -

Poucos meses se passaram, e o natal também já passou. Faltavam poucos dias para terminar o ano, e Tahine finalmente, como desejava, foi à cidade de Tokyo com seus primos. Dessa vez, os tios não foram, pois não se interessaram muito pelas atrações, e Shirou, o primo mais velho de Tahine, já era maior de idade, então podia se responsabilizar para levar as outras.
Eles foram a Tokyo não apenas para irem a Akihabara, mas também para primeiro participarem de uma grande feira de doujinshi, que aconteceria naquele tempo do ano.
A feira tratava principalmente de trabalhos dos fãs de jogos e animes modernos que eram populares no Japão. Tahine não comprou nada na feira, pois apenas tinha ido pela experiência e para tirar fotos com cosplayers. Mas ainda viu muitas coisas interessantes, e pensou em voltar de novo no próximo ano.
Já em Akihabara, não era tão lotado quanto no evento, mas ainda haviam muitas pessoas nas ruas porque muitas participavam da grande feira e decidiam visitar outros lugares de Tokyo, especialmente aquele bairro, como Tahine e seus primos fizeram, pois Akihabara atendia também aos gostos das pessoas que frequentavam o evento.

Já estava bem tarde, de noite, e os quatro caminhavam juntos pelas ruas do bairro popular. Tahine parou ali dentro de uma loja de importados para comprar algo por que se interessou.
— Uma… Pistola de sal? Por quê? — Disse meio curiosa Satomi, a irmã do meio entre os primos, para Tahine.
A mais nova respondeu rindo baixinho. — Eu irei trabalhar em um restaurante, então insetos desagradáveis vão aparecer para tentar acabar com a nossa reputação! Preciso estar preparada para impedi-los!
Satomi riu. — Você é fofa, Tahine-chan. Mas... É uma cafeteria, não um restaurante. De qualquer modo, você quer trabalhar como uma maid tanto assim?
Essa garota não desiste tão fácil. É ambiciosa o suficiente para persistir até conseguir algo que quer. Para tentar se acostumar a ficar de pé para estar apta a trabalhar como uma maid, Tahine havia tentado ativar o modo de próteses algumas vezes durante a viagem, mas como ainda não era acostumada a se mover rápido, preferiu usar a força dos braços sobre as rodas em maior parte do tempo. E ela sempre podia trocar entre ficar de pé ou sentada sempre que quisesse, usar as próteses ou as rodas, sem sair da cadeira. Esse veículo era bastante conveniente, e ela ainda queria que o veículo pudesse voar, para ser mais conveniente.
...E assim como a cadeira de rodas, também queria que a pistola de sal fosse modificada. Uma modificação decente talvez seria… Alterá-la para que outros projéteis além de sal pudessem ser usados. Ou alterar a mola da pistola, para que os tiros sejam mais fortes e mais precisos, mas de modo que seja uma modificação segura.

Isso porque no Japão o porte de armas de fogo é proibido. Na verdade, elas até foram banidas, por questões de segurança. Todas as armas de fogo legais (pois há exceções) dentro do país são usadas apenas por militares e policiais em alta patente, e toda a circulação dessas é rastreada e controlada pelo governo. Em caso de porte de armas não autorizadas de fora do país ou fabricadas ilegalmente, uma pena severa é aplicada. Então Tahine apenas precisava fazer uma arma que não fosse forte o suficiente para causar danos graves nas pessoas, ela pensava.
Mas se for para matar o meu pai, não acho que preciso de regras... Seus pensamentos se tornavam cada vez mais doentios.

— As moças vestidas de empregadas francesas são tão fofas, e agem de forma tão graciosa no serviço… — Tahine respondeu, olhando para uma maid além da janela de uma cafeteria temática ao lado, e depois voltou-se para Satomi. — Vocês ficam muito fofas vestindo o vestido de empregada! Ainda mais o Shirou!
— V-você acha? Ahahahah… Obrigado. — Shirou, surpreso, respondeu de repente. Não havia prestado muito bem atenção no que Tahine havia falado com Satomi, pois ele estava ocupado ensinando algo para Shiori, sua irmã mais nova, de cabelos loiros platinados, que tinha a mesma idade que Tahine. Shirou e Shiori estavam andando atrás de Tahine e Satomi, segurando celulares em suas mãos, aparentemente jogando algum dos jogos populares que eram bastante mencionados na feira de doujinshi.

Para Tahine, foi apenas isso. E foi um excelente dia. Ela já foi a várias feiras, mas nunca em uma tão grande. Mesmo assim, tudo o que ela fazia em feiras era observar as coisas e atrações, e tentar entender um pouco sobre o que se tratava. Entretanto, essa feira foi mais interessante, pois ela se sentiu parte do público alvo da feira, e já era familiarizada com várias coisas que viu. Apenas não gastou mais dinheiro porque estava pensando em economizar para tunar sua cadeira de rodas.
Agora, já era madrugada do dia seguinte, e eles precisavam voltar logo para casa.


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Notas finais do capítulo

Feliz Halloween a todos!
O próximo capítulo virá na segunda-feira.



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