Namjoon e Hoseok já imaginavam que poderiam encontrar Taehyung em uma situação semelhante à de Seokjin. Porém, não imaginavam a gravidade da situação até que finalmente se encontraram com o rapaz no grande salão onde o Jung havia se encontrado com Jimin e Yoongi, onde o rapaz estava tendo uma crise psicótica.

Kim Taehyung não conseguia criar conexão em sua fala, balbuciando apenas palavras sem nexo enquanto andava de um lado para o outro, as lágrimas escorrendo dos olhos delineados que estavam arregalados naquele momento ao mesmo tempo em que os dedos seguravam, firmes, os cabelos pretos, em seguida as mãos tapando os ouvidos como se quisesse deixar de ouvir alguma coisa.

Os dois se entreolharam, mas foi Namjoon quem se aproximou de Taehyung, que naquele momento estava apoiado sobre o piano com o corpo trêmulo. O Kim mais alto esticou uma das mãos para tocar o seu ombro levemente.

— Taehyung, não é? – Disse em um tom de voz baixo, vendo o rapaz à sua frente ter um espasmo surpreso, os olhos arregalados encarando o outro.

— Você... É... – Disse pausadamente, o que fez o outro sorrir de canto.

— Kim Namjoon. E aquele ali é Jung Hoseok. – Apontou com o dedo para um Jung que estava se aproximando com cautela agora.

— Prazer. – Hoseok comentou, acenando levemente quando estava a uma distância considerável. – Estamos aqui para te ajudar, não é Namjoon?

O mais alto piscou algumas vezes, como quem estivesse confuso com aquela pergunta e o Jung apenas respirou fundo, rolando os olhos antes de voltar toda a sua atenção para o rapaz em crise.

No entanto, não esperava que Taehyung trincasse os dentes de repente e, em um movimento rápido, empurrasse Namjoon com as duas mãos para que tivesse espaço o suficiente para se afastar do piano, até mesmo soltando um grunhido em ameaça quando os olhos, agora raivosos e agressivos, foram voltados para os dois.

— Vocês não vão me pegar... Eu sei o que querem... – Taehyung apontou para Hoseok com o indicador. – Você quer me tirar dele... Mas você não vai conseguir!

— Dele? – O Jung franziu o cenho brevemente, confuso.

— Jungkook. – Namjoon concluiu, sem desviar os olhos do rapaz. – É a única pessoa que ele tem contato aqui dentro. É óbvio que está falando do Jungkook-ie.

— Não o chame assim! – Taehyung praticamente gritou aquelas palavras, o olhar agressivo caindo em Namjoon agora. – Apenas eu posso chamá-lo assim! Eu!

Hoseok pensou em repreender Namjoon pelo comentário, porém mudou completamente de ideia quando viu o olhar do rapaz ao seu lado brilhar de repente com aquilo, seguido por um sorriso que começou a crescer aos poucos em seus lábios, precedendo uma risada alta que deixou o Jung e Taehyung confusos de imediato.

— De que tem tanto medo, huh? – Comentou, aproximando-se em passos lentos de Taehyung, que foi andando de costas na medida em que o Kim mais velho se aproximava. – Você precisa tanto assim de seu querido Kookie-ah?

— Eu... Eu...

— Para com isso, Namjoon! – Hoseok finalmente se pronunciou, segurando o rapaz pelo pulso, que voltou o olhar para si mais uma vez. – Você não está ajudando assim.

— Jung Hoseok. – Disse, o tom de voz mais grave, completamente diferente do tom zombeteiro que estava usando com Taehyung, que aproveitou aquele momento para escapar da atenção de Namjoon, correndo para fora do salão. – Não acho que seja crime se divertir um pouco.

— É isso o que você entende como diversão?! Caralho olha o estado do garoto! – Estava usando um tom de voz mais alto do que o costume, o que de certa forma fez o Kim se surpreender brevemente, erguendo uma de suas sobrancelhas. – Nós estávamos procurando por ele apenas para ver como ele estava!

— E nós vimos. Ele está piradinho. – Riu de canto, ignorando completamente o olhar repreensivo de Hoseok para si. – Se tudo isso tiver algum tipo de ligação, o estado dele apenas vai piorar com o passar das horas, até ele entrar em um estado de completa loucura.

— É isso o que me preocupa... – Mordeu o lábio inferior. – Eu fico pensando quem vai ser o próximo a aparecer nos meus sonhos essa noite. Na verdade eu já estou ficando apavorado de voltar a dormir.

— Do que está falando? Você precisa dormir. – Namjoon cruzou os braços, voltando os olhos agora cerrados para o mais baixo.

— Você não acha que se eu sair daquele quarto as coisas podem voltar ao normal? Pense comigo, isso tudo só começou a acontecer porque alguém começou a usar aquele quarto. Se toda essa loucura com a Reila for verdade, talvez ela apenas queira me expulsar de lá.

Namjoon parou para pensar por breves momentos, fitando um ponto qualquer do salão enquanto ponderava se aquilo podia, de alguma forma, fazer sentido, enquanto era observado por um Hoseok levemente ansioso. Por mais que tivesse medo de Namjoon e que ele fosse naturalmente ameaçador, precisava reconhecer o seu intelecto. Kim Namjoon sempre foi muito inteligente e havia percebido isso desde o primeiro dia em que dividiu o quarto com ele.

— Nada mais faz sentido nessa porcaria de história. – Ele respondeu, finalmente tirando o Jung de seus pensamentos. – Mas pense comigo. Você acha que a Reila iria devolver a sanidade do Jin e do Taehyung se você sair do quarto? Simples assim?

— Eu não sei, por isso estou perguntando! – Hoseok fez um bico e Namjoon rolou os olhos.

— Só pensa no que você ouviu no último sonho que você teve seu idiota! Aquelas frases não foram ditas por acaso. – O Kim mordeu o lábio inferior, pensativo mais uma vez. – Eu fico pensando se elas não teriam ligação com os desenhos que você disse...

— E o que você sugere? – Perguntou, arrependendo-se logo em seguida pelo sorriso que o outro lhe lançou.

— Que tenhamos uma noite juntos.

[...]

Se uma palavra pudesse definir o que Jung Hoseok estaria sentindo naquele momento, ela seria: Desconforto. Estava deitado de barriga para cima em um dos lados de sua cama, o corpo extremamente tenso enquanto sentia o homem se acomodar confortavelmente ao seu lado.

Não que dividir o mesmo quarto com Namjoon fosse uma novidade, mas quando o rapaz lhe propôs que dormissem juntos dentro do quarto de azulejos, sequer passou pela sua cabeça que seria naquela situação.

— Pode ficar tranquilo, Jung Hoseok. Eu não mordo. – O Kim se virou de lado, ajeitando-se para ficar de frente para o rapaz tenso. – Quer dizer, a menos que você queira ser mordido...

— Namjoon, essa situação já está estranha o suficiente. Por favor, não a deixe ainda pior! – Reclamou, arrancando uma risada divertida do mais alto.

Os dois então suspiraram pesadamente e Hoseok observou quando Namjoon fechou os olhos, a expressão dura dando lugar à uma mais relaxada. Permitiu-se encarar o rapaz melhor dessa vez, até mesmo virando-se de lado para ficar de frente para ele. Os cabelos pretos do Kim estavam espalhados pelo rosto em formato de coração, impecavelmente lisos e que cobriam parte de seus olhos. Era a primeira vez que Hoseok via Namjoon daquele jeito, afinal era a primeira vez que estavam dividindo a mesma cama, e precisava admitir que aquele homem de personalidade e atitudes peculiares tinha a sua beleza quando não estava sendo assustador aos seus olhos.

— Uma foto dura mais, sabia? Pode tirar, eu deixo.

E então todo aquele encanto inicial caiu por terra e Hoseok fez uma carranca quando o outro abriu um sorriso debochado.

— Você é um idiota, Kim Namjoon. – Ele comentou, o outro abrindo os olhos e os piscando diversas vezes.

— Pelo menos esse idiota aqui está quebrando o gelo. – Sorriu brevemente, porém aquele foi diferente. Não era o mesmo sorriso irritante ou assustador que estava acostumado a ver. Na verdade para Hoseok aquele era um tipo de sorriso extremamente confortável e espontâneo. – Mas agora é sério. Você não precisa ter medo de mim Hoseok. Eu não vou machucar você.

O Jung suspirou.

— É um pouco difícil acreditar nisso, porque, bem. – Mordeu o lábio inferior, pensando nas palavras que usaria naquele momento. Porém Namjoon o cortou com um suspiro.

— Sabe por que eu estou com o Jin? Além do que eu te disse mais cedo, claro. – O Kim se virou de barriga para cima, colocando um dos braços atrás da cabeça e encarando o teto escuro, com os olhos de Hoseok sobre si. – Ele foi a primeira pessoa que não me julgou depois de saber o que eu fiz, o que foi um pouco engraçado no começo.

— Como assim? – Hoseok ergueu uma das sobrancelhas, ouvindo o mais alto suspirar outra vez.

— Quando você mata alguém, independente do motivo, você está fadado a ser julgado pelo resto da sua vida. – Começou, sem desviar o olhar do teto. – Não que isso realmente me incomodasse, eu sempre fui julgado a minha vida inteira. Quando eu fui condenado a vir para cá eu já esperava viver anos solitários com as pessoas querendo distância de mim. Mas não foi isso o que aconteceu, e tudo foi graças ao Jin. – Namjoon fez uma pausa para rir, como se a lembrança daqueles dias fossem uma grande comédia. Porém, não era uma risada de deboche. – Ele me disse que não se importava com o que havia acontecido no passado, mas sim com o que aconteceria daquele dia em diante. Foi muito estranho ouvir isso... Não sei se consegue me entender.

— Consigo. Quer dizer, não acho que seja da mesma forma ou intensidade, mas eu entendo. – Hoseok comentou, atraindo os olhos escuros de Namjoon para si. – A minha história não é tão complexa quanto a de muitos aqui e eu acredito que não passei nem por metade do que você e o Jin passaram na vida, mas... Eu sempre fui sozinho, e ninguém conseguia me entender, até que eu conheci Min Jee. – Namjoon observou um sorriso iluminado brotar nos lábios de Hoseok. – Assim como o Jin ela foi a única pessoa que não me julgou pelo meu passado e me acolheu quando eu mais precisava.

O olhar dos rapazes se encontrou por breves segundos, Namjoon extremamente atento a cada palavra que saía dos lábios de Hoseok, enquanto o rapaz engolia em seco por conta da situação. O Jung não estava mais desconfortável, e aquele terror que sentia do Kim estava desaparecendo conforme percebia que tinham algumas coisas em comum.

E então, o momento foi cortado por um pesado suspiro de Namjoon, que levou o dedo indicador à bochecha de Hoseok, acariciando-a levemente.

— Cuidado para não confundir gratidão com amor, Jung Hoseok. – As palavras do Kim acabaram pegando o Jung desprevenido.

— Por que diz isso? – Perguntou, franzindo o cenho em confusão.

— Porque apesar de tudo o que o Jin fez por mim, eu tenho plena convicção de que eu não o amo, mas que tenho uma gratidão e um carinho imensuráveis. – Respondeu simplista, o que pareceu confundir ainda mais Hoseok. – Isso não muda o fato de estarmos juntos, de eu querer estar com ele e de que ele é especial e precioso para mim. Mas é importante que você seja realista. Um relacionamento não precisa necessariamente de amor para sobreviver, ele é um conjunto de fatores e ações que ajudam a construir a relação. Mas... – Acariciou novamente o rosto dele, e então afastou a mão. – O perigo surge quando você aposta tudo apenas movido pelo sentimento. A vitória pode ser grande, mas a derrota é maior ainda.

Hoseok estava em choque, tanto que seus olhos estavam arregalados enquanto encaravam Kim Namjoon. Podia esperar qualquer coisa dele, menos aquele momento de divagação filosófica sobre amor e relacionamentos. Jung Hoseok já sabia que o Kim era um homem de muita inteligência, mas não imaginava que fosse tanto.

— Você é o mesmo cara que foi condenado por matar os pais? Eu não consigo mais acreditar nisso. – Comentou, e então o sorriso irritante voltou a brotar nos lábios de Namjoon.

— Está conhecendo o Namjoon intelectual que foi preso no meio do doutorado. Meus parabéns pelo privilégio. – Comentou, recebendo um leve empurrão do Jung, que acabou rindo daquilo também. – Pelo visto está mais confortável com minha presença aqui.

— Realmente. – Respondeu Hoseok, ainda com um sorriso nos lábios finos. – Por que você não foi legal assim comigo quando eu estava no seu quarto?

— Estava te testando. – Namjoon voltou a fechar os olhos, ainda de barriga para cima. – Ainda peguei leve com você. Jin sofreu comigo assim que eu cheguei.

Hoseok riu nasalmente, ainda de frente para Namjoon, porém fechando os olhos também.

— Essa é uma história para outro dia? – Perguntou.

— Com certeza. Agora vamos dormir. – Disse um tanto ríspido.

— Bem vindo de volta. – O Jung comentou debochado, recebendo um chute na canela como resposta. – Ai caralho!

— Cala a boca e vai dormir. Temos trabalho a fazer. – Falou ainda em seu tom ríspido, arrancando uma risada de Hoseok.

— Você tem certeza de que isso vai funcionar?

Namjoon suspirou pesadamente, por breves momentos arrependendo-se por ter sido legal com o Jung.

— Não, mas não custa nada tentar. – Abriu os olhos um tanto agressivos para Hoseok. – Podemos, por favor, dormir?

— Sim, desculpa. – Hoseok respondeu ainda com um sorriso no rosto, e então Namjoon finalmente fechou os olhos.

O Jung estava começando a achar que não seria uma má ideia passar mais tempo ao lado de Kim Namjoon. E admitia que de certa forma Seokjin tinha razão, não fazia sentido julgar as pessoas pelos erros cometidos no passado. Aquela conversa havia sido muito produtiva aos seus olhos, e apenas instigou ainda mais a sua curiosidade sobre o Kim.

Ficou um tempo acordado ainda, alternando o olhar entre o teto escuro e o rosto do homem ao seu lado, que aparentemente já ressonava em seu sono tranquilo. Não fazia ideia do que poderia encontrar quando finalmente fechasse os olhos e se encontrasse sonhando mais uma vez. Talvez Namjoon estivesse lá para ajuda-lo, talvez estivesse sozinho. Talvez Namjoon fosse preso e quando acordasse pudesse encontrar uma pessoa completamente diferente ao seu lado, o que o preocupava em demasia.

E foi com os pensamentos em Namjoon que Hoseok adormeceu naquela noite, ao mesmo tempo em que se preparava psicologicamente para o sonho que estava por vir.