Amor e acaso escrita por Madame Pontmercy


Capítulo 4
A crescente lista de atividades de Miss Darcy


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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— Fico feliz que conhecerá a cidade com Miss Heywood, adoraria acompanhá-las, mas infelizmente tenho dois cães de guardas que não me permitem fazer nada – explanou Elizabeth encarando intensamente os primos que apenas riram do apelido.

— Se serve consolo, você se livrou do almoço na casa de Lady Denham – reclamou Georgiana rindo.

— Ouvi diversas menções elogiosas à Lady Denham, não há motivo para tal reclamação, eu certamente ficarei contente em visitá-la quando for devidamente convidado – comentou coronel Fitzwilliam com seu usual otimismo.

— Eu não tenho qualquer pressa, sabemos bem como são essas senhoras espirituosas dotadas de grande fortuna – apontou Eloise.

— Já nos basta termos que lidar com Lady Catherine, certamente não há razão para nos apressar a mais uma sequência de excelentes opiniões inquestionáveis – ironizou Lizzie.

Com passar do tempo Lady Catherine aceitou que Elizabeth era Mrs. Darcy e deveria ser tratada como parente, no entanto, isto não era sinônimo de boa convivência. Por mais que a jovem segurasse os comentários controversos, em geral as visitas à Rosings terminavam em infinitas declarações indelicadas sobre como deve ser o comportamento da senhora de Pemberley.

— Bom, preciso me retirar, ainda pegarei minha pasta para encontrar Miss Heywood, com licença.

— Por que precisaria de uma pasta para passear? – indagou Eloise.

Georgiana imediatamente teve que elaborar uma mentira para omitir a visita ao Mr. Stringer, embora contrariasse sua natureza sincera e não se tratasse de nada errado, não era uma boa ideia que seus familiares soubessem que visitaria um homem desconhecido, mesmo que fosse acompanhada e por uma causa louvável. Na verdade, sua família não aprovaria qualquer contato com quem suspeitasse ser um golpista interessado em sua herança, especialmente após o incidente com George Wickham.

— Eu prometi que mostraria meu desenho – respondeu a moça ocultando o destinatário.

Não tardou muito, Charlotte chegou em Sea House e, após cumprimentar a todos, as duas jovens seguiram para a residência de Mr. Stringer. Durante o curto trajeto ela continuou a atualização de Georgiana sobre Sanditon, o evento mais próximo era o casamento de Miss Esther Denham, uma moça decidida e aparentemente arrogante num primeiro momento, no entanto, esconde seu jeito sensível e adorável através de maneiras frias e reservadas. Ela se casaria com Lord Babington que parece ser um homem muito atencioso e não se importou com o mau comportamento de seu meio irmão, Sir Edward Denham, que fez um escândalo no baile anual de verão ao insinuar que teria um caso amoroso com Esther. Contudo, a tentativa de manchar a reputação da moça foi mal sucedida, Lady Denham a apoiou e expulsou Sir Edward de Sanditon House.

— Vamos torcer para ele tenha lido minha missiva sobre a nossa visita e esteja em casa – disse Charlotte batendo na porta de uma casa humilde de pedra que não devia ter mais de dois quartos.

— Bom dia, Miss Heywood, estou bem, não precisa se preocupar... – informou James Stringer enquanto abria a porta, deparando-se também com um par de olhos safira o encarando com uma expressão confusa.

— Bom, Mr. Stringer, se olhasse sua caixa de correio saberia que nós viríamos em busca de opinião e dicas sobre desenho – repreendeu a jovem morena.

— Não pretendíamos incomodá-lo, podemos voltar num momento mais apropriado – amenizou Georgiana que sentia uma intrusa diante do constrangimento do rapaz.

— De forma alguma, é um prazer recebê-las, por favor, entrem.

As duas moças adentraram o pequeno cômodo que mesclava cozinha e sala, um ambiente completamente diferente do que Georgiana estava acostumada, relembrou como ela era privilegiada em relação à maioria do Reino Unido, inclusive àqueles possuem talentos inatos. Independente da simplicidade da residência, era notável para a jovem herdeira que local se encontrava abandonado, sentiu que aquela desordem refletia o estado de espírito do morador e, observando a fisionomia dele por alguns segundos, ela percebeu que o quanto estava abatido.

— Então o que as senhoritas precisam? – perguntou encabulado, apontando para as cadeiras para que se sentassem.

Miss Darcy comentou que estava desenhando a fachada de Sea House e precisava de consultoria para aprimorar seu esboço, então pensei que o senhor poderia ajudá-la – inventou Charlotte.

— Posso tentar – respondeu James com um leve sorriso – imaginei que optaria pela paisagem natural, Miss Darcy.

— Infelizmente, não tive oportunidade de observar as falésias que prometi desenhar.

— Uma pena. Então, onde está seu desenho urbano?

Miss Darcy timidamente entregou a pasta, o sorriso de James ao recebê-la aqueceu o coração da moça, porém não tornou mais fácil se submeter ao crivo de alguém capaz de avaliar propriamente seu desenho.

— Sua arte é estupenda, Miss Darcy! – exclamou Charlotte ao observar o papel exposto na mesa.

— De fato é uma obra-prima, a senhorita é muito talentosa como eu suspeitei assim que analisou meus projetos – observou James sem mais nenhum resquício do olhar abatido.

— Agradeço muito os elogios, mas certamente deve ter algo para melhorar.

— Bom, como um retrato de prédio está perfeito, no entanto, como projeto arquitetônico não daria certo por ter sido feito à mão livre, é a única crítica cabível ao seu trabalho encantador.

— Eu não faço ideia de como usar os instrumentos para retratar as dimensões proporcionais de um prédio.

— Tenho certeza de que Mr. Stringer adoraria ensiná-la, Miss Darcy – sugeriu Miss Heywood, deixando-o sem alternativas.

— Seria uma honra, Miss Darcy – disse James um pouco sem graça pela clara pressão vinda de Charlotte, cujo objetivo de se intrometer em sua rotina finalmente fora cumprido. Georgiana agradeceu e se fez de desentendida para não lidar com o clima constrangedor no qual estava indevidamente inserida.

Diante da iminente aula de desenho, Miss Heywood pediu licença para uma rápida visita à Miss Lambe que se encontrava indisposta, visto que não faria sentido ser instruída sobre uma arte que não possuía talento e tinha plena confiança na boa índole de Mr. Stringer. Em seguida, Georgiana ouviu a explicação sobre a função dos instrumentos para calcular e elaborar um projeto arquitetônico.

— Confesso que não consegui memorizar todas as informações que me explicou, mal me lembro dos nomes das ferramentas – ruborizou a moça.

— É humanamente impossível aprender tudo de uma vez, apenas queria te dar ideia de sobre o funcionamento geral e descobrir seu excelente grau de conhecimento matemático, fundamental para um projeto seguro e bem-sucedido. Assim, amanhã podemos começar com o básico.

— Agradeço muito a boa vontade e o convite, Mr. Stringer. E peço perdão pela intromissão por termos vindo sem ter sido convidadas.

— Não há o que desculpar, não me ofendi pelas suas maneiras, até mesmo recebi uma missiva sobre a visita – suavizou rindo e continuou – perdoe-me pela forma que a recebi, pensei que era somente Miss Heywood na porta.

— Não tem problema, mas poderia ser mais gentil com ela já que se importa muito com os amigos, conseguiu encaixar de última hora uma visita à residência de Miss Lambe num dia cheio de compromissos. Embora seja tão dedicada àqueles que estão num período difícil, acredito que Miss Heywood também esteja precisando de bons amigos que a anime e não fechem a porta em seu rosto.

— Eu não quis ser grosseiro com Miss Heywood – surpreendeu-se James com a repreensão – Parece que a senhorita é uma vidente, ela ultimamente precisa de apoio, mas receio que não tenha se aberto o suficiente para que um amigo a ajude, além disso não acho que eu conseguiria ser um bom amigo no momento, provavelmente deve ter ouvido o motivo e por isso se dispôs a vir com Miss Heywood.

— Sim, eu soube da razão de seu sofrimento, lamento muito... Mas não se trata um mero pretexto, estou realmente interessada em sua opinião profissional – admitiu Georgiana encarando o chão.

— Fico feliz por ver que é sincera, seria bastante incômodo fingirmos que não sabemos o que de fato está acontecendo – disse Mr. Stringer com um amplo sorriso – Apesar da senhorita ter embarcado nas incessantes tentativas de nossa cara Miss Heywood, inclusive ela deveria entrar na sua lista de pessoas a serem animadas, me sinto lisonjeado pelo seu reconhecimento.

— Demorei muito? – perguntou Charlotte exasperada enquanto entrava rapidamente na casa.

— Acredito que não, mas devemos ir para não nos atrasarmos para a visita à Sanditon House – informou Georgiana após olhar seu relógio de bolso.

As duas moças se despediram de Mr. Stringer com a promessa das aulas continuarem, assim partiram para encontrar Mr. e Mrs. Parker e seguirem ao almoço com Lady Denham, orgulhosas por conseguirem ultrapassar a barreira de isolamento na qual o próprio James se mantinha.

O caminho percorria uma estrada de pedras através dos campos que cobriam as falésias, aquele era o lugar em que Georgiana queria estar desde que chegou aos arredores da cidade e já se imaginava sentada na areia da praia de costas para o mar com seu material de desenho, mal ouviu o que Miss Heywood e Mrs. Parker conversavam. Da elevação onde estava podia avistar um bosque que envolvia a suntuosa Sanditon House, a qual o tamanho e esplendor não perdiam em nada para Rosings, espero a insensibilidade da proprietária perca para Lady Catherine, pensou Georgiana.

Os convidados foram muito bem recebidos pelos empregados de Sanditon House, no entanto, Miss Darcy duvidou que a anfitriã seria tão cordial ao ouvir a senhora idosa já reclamando do retorno de seu investimento na cidade logo após anunciarem os nomes dos convidados.

— Boa tarde, minha cara Lady Denham, fico alegre em vê-la bem disposta, e Miss Denham, espero que os preparativos do casamento estejam indo bem – explanou Mr. Parker com ar afetado.

— Deixe de conversa mole, quero saber como vai a recuperação de Sanditon – resmungou a idosa, provocando o riso abafado de Miss Denham, uma moça esbelta de porte elegante, cabelos ruivos e pele alva levemente salpicada de sardas.

— Muito promissora, meu irmão Sidney está fazendo avanços em Londres. Aliás, hoje temos a ilustre companhia da Miss Darcy de Pemberley, sua família recentemente alugou Sea House para temporada – apresentou Georgiana como se fosse a comprovação do retorno do investimento, o que a deixou ruborizada de constrangimento.

— Ora, a família Darcy chega à cidade e ninguém me informa nada? – indignou-se Lady Denham – Chegue mais perto, minha querida, vamos ver se a senhorita se parece com a adorável Lady Anne, que Deus a tenha.

— A senhora conheceu minha mãe?

— Sim, era uma mulher extraordinária e uma das poucas na Grã-Bretanha que conseguia ser doce sem ser tola, a senhorita certamente herdou sua beleza delicada, espero que a inteligência também. De qualquer forma, acredito conseguirá um excelente casamento aqui.

— Agradeço sua gentileza, todavia, não estou interessada em matrimônio no momento, estou aqui pela exuberância do local.

— Então mais uma para se juntar ao excelente grupo despreocupado de Miss Heywood – comentou com gargalhadas – por sinal, onde está ela?

— Estou aqui, Lady Denham – respondeu Charlotte com sorriso complacente.

— Senti falta de suas visitas, minha cara, espero que venha mais vezes e traga Miss Darcy.

Após a anfitriã cumprimentar Mrs. Parker com cordialidade, o grupo seguiu para o almoço. Enquanto Miss Denham trocava amenidades com Charlotte, o interesse de Lady Denham era Georgiana para alívio dos Parker que se livraram do constante questionamento sobre o desempenho do investimento na modernização de Sanditon.

— Por que não tenho ouvido falar da senhorita, Miss Darcy? – perguntou Lady Denham com ar de censura.

— Como assim? – retribuiu Georgiana surpresa.

— Sempre ouvimos falar sobre as moças solteiras de grande fortuna, nem sempre é interessante, na verdade, geralmente é entediante. Mas nunca ouvi nem nenhuma menção sobre a senhorita, até pouco tempo nem me recordava que Lady Anne teve uma filha.

— Bom, eu não costumo frequentar os eventos da alta sociedade londrina – gaguejou Miss Darcy timidamente diante da afiada sinceridade da idosa.

— Aparentemente não frequenta qualquer sociedade, minha cara. É um desperdício que uma jovem bem nascida dotada de beleza fique trancada em casa, seu irmão não a permite sair?

— De forma alguma, ele é muito zeloso, mas jamais me impediu de fazer nada.

— Ora, não vejo motivo para estar escondida, apenas sua aparência lembra sua mãe porque ela era o centro das atenções dos eventos, não havia quem não tivesse ouvido falar dela na época que debutou – declarou Lady Denham ante o silêncio constrangido de sua interlocutora, voltou a atenção para Charlotte.

Miss Heywood entretinha Lady Denham com suas opiniões destemidas na sala de estar e a senhora alfinetava Mr. Parker sempre que possível, Esther Denham tentou estabelecer o mínimo de conversa com Georgiana.

— O que está achando de Sanditon, Miss Darcy?

— Uma cidade encantadora que combina muito bem a vida urbana com a beleza do interior.

— Certamente, a curta distância de Londres também é um grande atrativo, caso a senhorita sinta falta da capital.

— Lamento decepcioná-la, Miss Denham, mas somente viajo para capital quando não consigo evitar.

— É uma pena, me mudarei para Londres em breve e seria ótimo reconhecer um rosto amigável lá.

— Fico honrada por sua consideração – respondeu polidamente Georgiana sem entender muito bem a intenção da deslumbrante Miss Denham, não lhe pareceu que ela pretendia estabelecer amizade mantendo aquele ar soberbo, contudo, seu pensamento foi rapidamente interrompido pela voz estridente da anfitriã.

Miss Darcy, espero que a senhorita leve meu humilde convite a sua família para chá da tarde aqui em Sanditon House amanhã.

— Será um prazer, Lady Denham – respondeu receosa que fosse alvo de mais um interrogatório.

Todavia, aparentemente o interesse da anfitriã pela moça desapareceu, deixando Georgiana indecisa se achava aquilo bom ou ruim, por um lado era bom não ser questionada de forma voraz, em contrapartida estava incomodada por ser considerada desinteressante, especialmente quando comparada a sua mãe.

Quando a visita terminou, os convidados voltaram para a cidade andando pela mesma estrada que cortava a relva baixa das falésias. Charlotte continuava a atualização sobre os habitantes de Sanditon comentando sobre Miss Lambe e as companheiras fúteis de seu internato, todavia, Georgiana estava distraída com a beleza do lugar e mal ouvia uma palavra.

— Este é local que a senhorita pretende desenhar, não é? Perdoe-me por tagarelar demais, Miss Darcy.

— Eu que devo peço desculpas por estar desatenta, normalmente sou uma boa ouvinte. Porém, é impossível não ficar impressionada com essa paisagem, nunca admirei tanto a combinação de terra e mar como agora.

— Sendo assim, temos que descer na praia para admirarmos melhor – sugeriu Charlotte obtendo um intenso sorriso de sua interlocutora.

Após comunicar o pequeno desvio no caminho aos Parker, as duas jovens desceram em direção do mar e, quando saíram do campo de visão, ambas correram com a maresia acariciando seus rostos no vento até chegarem à praia para apreciar a musa inspiradora de Georgiana.

 

 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha gostado, fique à vontade para comentar :)



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