Amor e acaso escrita por Madame Pontmercy


Capítulo 3
A lúgubre Miss Heywood


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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As refeições foram mais silenciosas que o normal, o clima estava tenso demais para desenvolver uma boa conversa e nada que foi dito conseguiu chamar atenção de Georgiana, estava absorta no desconforto de esconder algo tão importante do irmão e no receio de Elizabeth perder o bebê novamente.

Na primeira oportunidade Miss Darcy foi para o quarto se esconder até que tivessem que ir ao chá da tarde promovido pela Mrs. Parker, sentou-se diante da escrivaninha na esperança de que desenhar a distrairia do medo da cunhada não sobreviver à gravidez e da culpa por enganar o irmão. Ao tocar o lápis de carvão no papel, notou que não poderia começar pelas belas falésias que havia planejado, dado que não tinha memorizado o suficiente para reproduzi-las, James Stringer terá que esperar um pouco, pensou Georgiana com um leve sorriso ao lembrar do encontro com o simpático desenhista.

Por fim, chegou à conclusão de que Sea House provavelmente era melhor opção e logo começou os traços, a concentração exigida em reproduzir detalhes da fachada conseguiu abster Georgiana de qualquer pensamento tornando-a alheia à passagem do tempo. Ficou satisfeita com o esboço do retrato, não se importou por não captar a elegância e imponência da construção uma vez que seria necessário observar o prédio para conceder fino acabamento.

O som de batida na porta a trouxe de volta para a realidade, na sequência entrou Elizabeth com expressão ansiosa.

— Desculpe atrapalhá-la, mas você ainda não desceu e em breve partiremos para a residência de Mr. Parker.

— Não há problema algum, estava distraída desenhando e não vi a hora passar, vou só lavar o carvão das mãos e estarei pronta – disse Georgiana enquanto se levantava em direção à bacia d'água no canto do quarto, ainda sentindo a sensação de tranquilidade decorrente da dedicação àquele desenho.

— Georgiana... eu sei que está muito desconfortável em esconder algo do Will, peço perdão pela angústia que lhe causo, não te pediria algo assim se não fosse extremamente importante para mim – confessou Elizabeth, porém Miss Darcy apenas continuou lavando as mãos sem saber o que responder – Acha que estou sendo demasiadamente egoísta?

— De forma alguma, não posso imaginar o sofrimento que passou para que chegasse a essa decisão – rapidamente Georgiana se virou para dissuadi-la – De fato, me sinto desconfortável, todavia, com o tempo me acostumarei e tudo ficará bem quando você puder dar a boa notícia ao meu irmão – respondeu com sinceridade, apesar de ocultar a preocupação com a saúde dela, e obteve um sorriso fraco da cunhada.

Em menos de 5 minutos de caminhada os inquilinos de Sea House chegaram à residência provisória de Mr. Parker, sendo recebidos com uma recepção calorosa do anfitrião, acompanhado pela esposa, quatro crianças com o mesmo cabelo loiro de Mrs. Parker e uma jovem com sorriso amigável, cabelos e olhos castanhos e de idade semelhante à Georgiana. Imediatamente Miss Darcy teve certeza que aquela era a remetente da carta, mal conseguiu conter a animação quando a apresentação da moça confirmou sua suposição: era Charlotte Heywood!

Enquanto esperavam que a mesa do chá estivesse preparada os convidados foram acomodados na elegante sala de estar, cuja decoração detinha o mesmo bom gosto do alojamento da família Darcy. Naturalmente as mulheres casadas formaram um grupo de conversa e os homens se dirigiram ao escritório, restando as duas moças olhando para suas próprias mãos em silêncio.

Georgiana gostaria de iniciar uma conversa como conseguira com Mr. Stringer, no entanto, não sabia qual assunto introduzir e, apesar de ter a sensação de conhecê-la, não sabia nada sobre seus gostos e opiniões, além de não ter superado completamente a dificuldade de socializar com desconhecidos. Alguns minutos se passaram e nenhuma palavra foi trocada entre elas, este silêncio embaraçoso estava provocando angústia à Miss Darcy, bem como frustração ao perceber que não saiu de sua zona de conforto como pensava ter auferido. Respirou fundo e decidiu falar sobre um assunto aleatório rogando para que a conversa evoluísse normalmente.

Miss Heywood, já desfrutou do banho de mar?

— Sim, e a senhorita? – retribuiu Charlotte sem real interesse na resposta, na verdade, não estava interessada em nada que a vida lhe pudesse oferecer naquele local, estava contando os dias para que pudesse voltar para sua casa e não ser sociável ao passo que se sentia tão triste.

— Ainda não tive oportunidade, cheguei a Sanditon há poucos dias. Infelizmente, minha cunhada e prima estão ocupadas demais e me encontro sem companhia para essa atividade, adoraria se a senhorita pudesse me acompanhar.

— Receio que devo partir em breve, Miss Darcy, mas fico honrada com o convite – respondeu Charlotte de forma amável tentando fugir de qualquer oportunidade de socializar.

— Se estiver ainda na cidade nos próximos dias, renovarei o convite, ouvi dizer que o mar renova nossos ânimos e às vezes é exatamente o que precisamos – replicou Georgiana com o objetivo de sensibilizar o coração partido da moça, obtendo a resposta positiva com um sorriso tímido de Charlotte.

Em seguida foi anunciado que o chá estava posto, todos se dirigiram aos fundos da propriedade para um pequeno jardim com um belo gramado cercado por moita alta e um canteiro de flores delicadas, ali as conversas se limitaram às amenidades com perspectiva de um próspero laço de amizade. Razão pela qual Mr. Parker insistiu que o acompanhassem numa visita à Sanditon House no dia seguinte para conhecer a figura mais importante da cidade, coronel Fitzwilliam sabiamente conseguiu se esquivar da possibilidade passa impressão deselegante para Lady Denham ao visitá-la sem um convite expresso, sugerindo que a prima acompanhasse Miss Heywood para a alegria de Georgiana.

— Tem previsão do retorno de seu irmão, Mr. Parker? – indagou coronel Fitzwilliam animadamente.

— Talvez em menos de uma semana, ele está bastante ocupado com os preparativos de seu casamento com a adorável Mrs. Campion, porém, acredito que não deve demorar para chegar à cidade por conta do casamento de seu amigo Lord Babington e Miss Denham.

Georgiana observou que Miss Heywood abaixar a cabeça e se concentrar em seu prato, a situação embaraçosa também constrangeu Miss Darcy que conhecia os bastidores daquele desconforto, motivo pelo qual resolveu arriscar e estabelecer conversa com propósito de evitar que Charlotte ouvisse mais uma menção a Sidney Parker.

— Gosta de desenho, Miss Heywood? – indagou se sentindo uma tola por não pensar em algo melhor.

— Só posso dizer que sou uma apreciadora, não tenho talento para essa arte.

— Também sou uma apreciadora, embora ouse tentar um pouco, inclusive tive oportunidade de ver alguns desenhos magníficos de James Stringer que espero que sejam contratados por Mr. Parker – disse Georgiana torcendo para que o assunto engatasse ao apelar para alguém que ela conhece.

— Não imaginaria que a senhorita conhece Mr. Stringer, seu trabalho é realmente esplêndido, uma parte significativa das reformas de Sanditon foi auxiliada por seus projetos, uma pena que ele apenas trabalhe na construção empreendida por Mr. Parker – respondeu Charlotte disposta a conversar – Desde que me tornei hóspede da família Parker, me ofereci para organizar a papelada das empreitadas e tive a sorte de admirar muitos desses projetos arquitetônicos.

— Sanditon tem sorte de ter tantas boas ideias e pessoas com coragem de pô-las em prática, venho de um condado predominantemente rural que não costuma ter muitas mudanças – confirmou Georgiana surpresa com a melhora do humor de Miss Heywood.

— Eu também venho do campo, apesar de gostar muito dos bosques e das oportunidades de caçar, a paisagem urbana tem seu encanto, especialmente a agitação social das cidades – disse Miss Heywood rindo.

— Impossível negar – Miss Darcy se juntou à risada – Todavia, estou mais inclinada a apreciar arquitetura e beleza natural de Sanditon.

— Bom, pretendo voltar para casa após o casamento da sobrinha de Lady Denham, mas nesse ínterim seria um prazer ajudá-la a conhecer a cidade.

Em pouquíssimo tempo Miss Heywood a atualizou sobre as principais coisas que deveriam saber começando pelos habitantes mais próximos, a influente família Parker, além das quatro crianças, também era composta pelos três irmãos solteiros de Tom Parker, Arthur e Diana Parker eram pessoas alegres que se preocupavam demais com a possibilidade de ficarem doentes, e Sidney Parker, limitou-se a dizer que era alguém muito dedicado à família e guardião da órfã rica, Miss Georgiana Lambe, amiga querida de Charlotte. Informou que a chegada de Miss Lambe provocou certo estranhamento na sociedade local por conta de sua origem afrodescendente, porém isso passou e ela é bem recebida em todo lugar assim como qualquer herdeira de grande fortuna.

— Young Stringer também é um amigo querido, uma pessoa talentosa de coração muito bom e geralmente alegre, apesar de ultimamente parecer abatido.

— O que houve? – perguntou Georgiana curiosa com a tragédia mencionada na carta.

— Não sei se soube que a antiga residência de Mr. Parker sucumbiu num incêndio enquanto todos estavam no dia do baile de verão, Old Stringer queria terminar seu trabalho na reforma do prédio o mais possível, deve ter se descuidado com as velas e não conseguiu sair do local. Quando soubemos do fogo era tarde demais, ele assistiu tudo ser consumido pelas chamas sem poder ajudar o pai.

— Que terrível...

— Ainda não me costumei de chamá-lo de Mr. Stringer, era assim que o pai era chamado por todos e sua morte está muito recente. Não o conhece há muito tempo, não é?

— Não, esbarrei nele ontem e derrubei seus projetos sem querer, não consegui conter a curiosidade e acabei pedindo para vê-los.

— Me surpreende que tenha conseguido conversar com ele, o luto não somente o deixou triste, mas também o isolou.

— Ele realmente me pareceu triste, no entanto, não poderia imaginar a gravidade do motivo. Pretende visitá-lo? – assentiu Charlotte – Mr. Stringer ficou animado de conversar sobre desenhos e comecei a trabalhar no esboço da fachada de Sea House, eu poderia acompanhá-la e pedir que me dê dicas para aprimorar o retrato, quem sabe o anima.

— É uma excelente ideia. Tenho tentado ajudar, mas fui bastante ineficaz, pode ser funcione distraí-lo com algo que adora e será bom para ele exercer alguma atividade, acho que a paralisação das obras o deixou mais isolado e inerte em casa.

— Podemos ir amanhã antes de seguirmos para Sanditon House.

— Então temos que ir cedo, não vai querer chegar atrasada e ouvir o que Lady Denham terá a dizer – declarou divertidamente Charlotte para suavizar o assunto.

Miss Heywood informou que Lady Denham é uma idosa viúva bastante rica, conhecida por ser direta e sincera de forma que nem sempre é delicada com sentimentos alheios, apesar disso considerava a senhora uma boa pessoa. Além disso, ela é a principal sócia do projeto ambicioso de modernização da cidade promovido por Mr. Parker e não escondia de ninguém a insatisfação com os prejuízos decorrentes do incêndio.

Mais tarde os convidados se despediram e voltaram muito satisfeitos com a visita, certamente o assunto do jantar foi o chá da tarde na casa dos Parker, como se esperava coronel Fitzwilliam elogiou bastante Mr. Parker, Elizabeth e Eloise concordaram que Mrs. Parker era muito amável e inteligente, contudo, apenas Mrs. Fitzwilliam julgou Miss Heywood um pouco apática. Em vista disso, Georgiana defendeu a moça utilizando a desculpa de que ela estaria com enxaqueca e ainda qualificou Charlotte como adorável e bem educada, que teve a consideração de os prestigiar mesmo em condições adversas.

Antes de dormir, Miss Darcy finalizou seu esboço para apresentar ao pobre Mr. Stringer com atípica animação, estava muito orgulhosa de si mesma por ter sido ousada e conseguido estabelecer conversas com desconhecidos, embora sentisse que Charlotte Heywood não era uma desconhecida e James Stringer fosse agradável demais para ser um estranho.


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Notas finais do capítulo

Até logo!



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