Assim que nossa visitante saiu fui atrás de Holmes e o encontrei já sentado em sua poltrona acendendo o cachimbo. Ele parecia pensativo.

— O que foi aquilo, Holmes? – despejei de uma vez, sem maiores rodeios. – Não entendi por que não estamos fazendo nossas malas agora mesmo e seguindo para Bedford para pegar esse salafrário capaz de aterrorizar uma viúva com uma criança.

— Acalme-se, meu caro Watson. Não estamos fazendo isso, simplesmente pelo fato de que não tenho a intenção de deixá-la ainda mais tensa do que ela já está. Não sou médico como você, meu amigo, mas acredito que se contasse o que penso, ainda mais sem ter absoluta certeza, seria perigoso para ela.

— Como assim? Não estou entendendo mais nada. Quer dizer que o que disse a ela é mentira?

— Não exatamente. Pode ser verdade, porém temo que a situação seja mais grave e que a Sra. Edwards possa estar realmente correndo perigo. Se a polícia de Bedford não for tão incompetente como imagino, mesmo que não descubra quem é esse comprador, ou se é que ele realmente tem algo a ver com a história, eles enviarão policiais até a casa dela e inibirão a ação de quem quer que seja a pessoa que visita sua casa durante as noites, dando-lhe alguma tranquilidade até chegarmos.

— Quer dizer que nós iremos até lá?

— Mas é obvio que sim. Algo me diz que existe algo escondido naquela casa e alguém está tentando encontrar. Deve ser muito valioso para que se arrisquem dessa forma.

— Acha que alguém deseja matá-la?

— Não creio, mas sua condição delicada pode lhe trazer problemas mais graves. Você é o médico aqui. Não acha que a tensão que ela vem passando somada a um possível grande susto não poderia leva-la à morte?

— É verdade. Mesmo que muitos achem que a expressão “morrer de susto” seja exagerada, ela pode ser bem real para pessoas que sofrem de arritmia cardíaca. Um grande susto libera uma descarga de adrenalina que provoca, entre outros efeitos, a elevação da pressão arterial, o aumento do fluxo sanguíneo nos músculos e a aceleração dos batimentos cardíacos. Para uma pessoa saudável, isso não é grande problema, mas para um cardíaco, isso pode levar a um infarto ou até a morte.

— Então, como eu disse, não achei prudente contar sobre minha outra suspeita.

— E qual seria ela?

— A de que o Doutor Edwards não sofreu um simples acidente, ele foi assassinado.

— Deus do céu! De onde você tirou essa ideia, Holmes?

— Da matéria no jornal sobre sua morte. Lembrei-me de que achei tudo muito estranho quando a li. A matéria foi bastante vaga, mas dizia que o médico tinha caído da escada e quebrado o pescoço enquanto corria para atender a uma emergência. Bom, eu não costumo ver cardiologistas correndo por hospitais. Médicos emergencistas talvez, mas cardiologistas dificilmente. E mesmo que esse tenha realmente sido o caso, o local onde o jovem médico caiu, indica que ele estava indo exatamente ao lado oposto da sala de atendimento de emergências, se bem me lembro da planta do hospital.

— Tem razão, a reportagem dizia que ele tinha caído próximo a Enfermaria 2, se não me falha a memória, e ela fica na Ala Leste enquanto a sala de emergências é na Ala Oeste, bem perto da entrada da West Smithfield. Eu fiz minha residência lá e conheço bem o lugar.

— A sua memória está certíssima. Foi exatamente isso que dizia a reportagem, Watson.

— Devemos ir à Scotland Yard?

— De nada adiantaria, porque como tudo foi declarado como um acidente, não houve uma investigação e com certeza não há nada sobre o caso, acredito que nem mesmo foi feita uma autópsia para confirmar a causa da morte. Com tantas testemunhas do ocorrido, não foi preciso de autópsia. Nosso primeiro passo é ir até o hospital, porém não podemos chamar a atenção.

— O que estamos esperando então?  Vamos logo Holmes!