You Are Someone's Altar escrita por EVE


Capítulo 2
Once There Was a Fool and He Made His Prayer


Notas iniciais do capítulo

Título do capítulo: "The Vampire" - Rudyard Kipling



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/781429/chapter/2

Os corredores vazios e enfeitados com tons avermelhados a sufocavam e adentrando a grande porta de madeira envernizada, ela encontrou Hunson em seu cômodo luxuoso. O homem ostentava uma postura relaxada, na mão direita a taça de vinho jazia suave, enquanto os dedos da esquerda acompanhavam as linhas da leitura. As decorações datavam épocas passadas, pelas quais o homem já viveu. Tapeçarias da Babilônia, quadros renascentistas e livros, muitos livros. E assim como Marceline, ele não era um exímio amante da luz, logo necessitava somente daquele feixe que guiava a sua leitura. Ele retirou seu olhar atento das palavras para Marceline e prontamente surgiu o sorriso educado em seus lábios. 

— Ouça – ordenou e recitou cuidadosamente cada palavra – "Por quem seus séculos passarão a ter importância? Por quem valerá os castigos, as feridas e as prisões? Pela pura, pela casta, pela insana e seus pecados? Ora, os segundos e as horas serão supridos por lembranças com sua dama imaculada em seus melhores momentos? Não tenha tanta certeza, oh amável senhora, se em seu âmago os bons sentimentos são de pouca duração e descartados. Aquela que você se propôs amar assim também será. Inútil, acredite.” 

E ela compreendeu. Hunson fechou lentamente o livro. 

— Lembra de sua infância? – pergunta com um sorriso. 

— Muito vagamente. 

— Eu me lembro. Por exemplo, quando você quebrava qualquer relicário precioso das pitonisas, responsabilizava seus irmãos, os ventos do Leste, até mesmo a deusa. E agora? Eu encaro a mesma criança. Quantos séculos serão necessários para você amadurecer, pequena garota. — Enquanto, em suas mãos há o sagrado e digno, você desperdiça sua liberdade. 

— Esse é o nosso problema? 

— Sim, é uma questão totalmente universal: O que fazer com essa tal liberdade? 

— Não seja poético. 

— Você me responde se há poesia em se retirar de seu posto para se encontrar com uma antiga amante em um lugar como aquele, expor sua nova discípula às suas ações vergonhosas! – Ele aproximou-se dela, havia o incêndio no olhar que foi se extinguindo calmamente, ele passou as mãos pelo terno, cabelos, reconstruindo novamente sua polidez. 

— Pensamentos impuros têm rodeado você, eles são responsáveis pelos seus deslizes e você sabe as consequências. – Hunson diz em tom quase nobre, acariciando os cabelos pretos de Marceline. — Mas, eu serei misericordioso e benevolente, desconsiderando a sua incrível preferência por punições. — Anunciou com um olhar compreensivo crível para qualquer espectador. — Eu estou com bom pressentimento dos tempos que suas novas pupilas proporcionarão. 

Certamente, ela também desejava. 

*** 

"Sou homem, nada do que é humano me é estranho" - Terêncio 

Os momentos se demoram naquelas paredes, como os passos de um ancião, vagarosos e guardando para si somente os fragmentos das vidas que ali transitavam, principalmente da jovem sacerdotisa. 

Nunca houve humanidade nela, porém o que era humano, não lhe era indiferente. 

Ela era paciente e tinha sua visão atenta aos pequenos gestos da moça de fala tranquila. Ela acompanhava sua presença, seu odor e suas histórias, na tentativa de descobrir as nuances cinzas de outro alguém, enquanto isso, seu espírito fatigado buscava descansar. A atenção minuciosa da sacerdotisa para com a mais nova cativa de Hunson, era semelhante à da jovem com as plantas do jardim. 

Ela interrompia sua leitura, quando há longe surgia a melodia curta de um assobio e então, ela comportava-se de igual modo ao silêncio para observar os toques cuidadosos da jovem nas pétalas das rosas mestiças, tal como a sua natureza, e levando de vez em quando uma rosa consigo. E a leitora procurava nesses gestos a humanidade ou falhas nela própria. 

Ela seguiu nas tentativas de acompanhar a rotina da jovem, contudo certo dia encontrou-se desacompanhada. 

Somente Fionna apareceu como o ser silencioso que era, sentou-se próxima à leitora e percebeu a inquietação da mulher e seus constantes olhares para o canteiro de rosas. 

Apesar do conforto do silêncio compartilhado, a mulher mais velha não conteve suas reações. E sorriu. Fionna acompanhou as mudanças, as ações tão juvenis e ainda nada dizia. 

Mas, as visitas ao jardim não cessaram, e Fionna percebeu, que a prudência necessitava fazer-se presente. Ela retornou ao jardim e encontrou Marceline sentada com o seu livro na mesma página de dias atrás, ela seguiu o olhar suave quase sem vigor da leitora, eles encontravam-se no canteiro de flores. Sem surpresa alguma. 

— Não espere que somente a existência de um só diminuirá os seus castigos e natureza ou tornará seus monstros mais dóceis e agradáveis. — Ela aconselhou mesmo sabendo do peso das palavras para Marceline, mas continuou, — Não creia em mais um movimento fatídico do destino, esse deus falso e egoísta. Diante de sua própria narrativa e nos intervalos dos séculos não aprendera, não? Você já fora trovador, romântico, realista e agora tolo!? — Perguntou, enquanto Marceline recusava em silêncio. — Novamente, você está esquecendo-se de todos os incômodos que interrompem o arrebatamento de qualquer paixão, minha querida amiga. 

Fionna terminou o seu discurso e ela escolheu o silêncio. 

*** 

Nas horas comuns, o palácio era tomado pela escuridão, não tomado, por que essa já lhe pertencia, para somente para seres como a jovem se adequarem a percorrer pelos corredores sufocantes do castelo. 

E em um desses caminhos, ela encontrou a casa de banho, local amplo com grandes piscinas de águas termais com propriedades relaxantes. 

No centro do local, havia uma mulher de cabelos pretos na grande banheira, com os olhos fechados e mãos sobre o corpo que se movimentavam absurdamente lentas sobre a sua nudez. As pequenas gotas d'água caminhando pelo vale dos seios ou sobre os pequenos símbolos nas costelas. E a jovem ali permaneceu silenciosa na entrada, entre o calor, o aroma dos sais de banho, a fumaça, a baixa luminosidade e o repentino aumento da sua temperatura corporal. 

—O que meu passarinho perdeu? — Sussurrou a alta mulher ao seu ouvido, assustando-a. 

Suas sobrancelhas se levantaram em interrogação e depois se acalmaram, diante do repentino abalo da garota. 

— Então, somente mais um adepto ao pequeno espetáculo de exibicionismo de minha irmã. 

—Irmã? 

—Aos nossos termos, passarinho. Aos nossos termos. E você ainda não respondeu minha pergunta. 

— Eu estava caminhando. 

Fionna observou atentamente o semblante de Bonnibel e suspirou. Ela tocou em um dos ombros de Bonnie e andou para longe da entrada da casa de banho. 

— Nesse lugar há tantos segredos, querida, e eu recomendo que você não se torne um, principalmente com a “minha irmã”. — disse Fionna em tom calmo enfatizando as visualmente as aspas. — Vocês não me enganam, reconheço seu olhar e é recíproco, posso afirmar, entretanto...— ela não deu continuidade as palavras esperando que a moça compreendesse. 

A jovem somente baixou o olhar e assentiu. 

Fionna era a principal confidente da sacerdotisa, encobrindo seus escassos casos com outras mulheres, porém, esse caso era diferente. 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

"Nobody saw it coming, but the little red devil in me"
Sinner's Prayer - Lady Gaga



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "You Are Someone's Altar" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.