Sad Beautiful Tragic escrita por saintprongs


Capítulo 2
Capítulo 1




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Haviam algumas coisas que toda a sociedade inglesa sabia sobre Godric’s Hollow. Primeiro, seu cemitério era um dos mais antigos do mundo, assim como sua Igreja. Segundo, os melhores bailes eram realizados naquela cidade. E o principal: a família Potter era a mais rica e influente da região, com seu marquesado tendo sido concedido quase ao mesmo tempo que a Coroa Inglesa havia surgido.

O que muitos não sabiam era o ódio aterrador que o Marquês Fleamont Potter sentia pela família de comerciantes, e recentemente barões, que havia se mudado para Godric’s Hollow há pouco: os Evans. Há alguns anos o patriarca daquela família, o barão John Evans desrespeitara profundamente Fleamont, arruinando um assunto importante do poderoso nobre e desde então o ódio mútuo entre ambas famílias se instalou.

Apesar de viverem no mesmo lugar, evitavam-se e fingiam que o outro não existia. E isto funcionara por anos perfeitamente bem. Até que Lily Evans colocou seus olhos em James Potter pela primeira vez.

Lily era realmente diferente das outras jovens de sua época, por mais clichê que isso possa soar. Sua mãe sempre quis garantir que suas filhas obtivessem a melhor educação possível, contratando sempre as melhores tutoras. Ela via seu pai viajar pelo mundo trabalhando, trazendo pequenos souvenirs e memórias para ela e se apaixonou pelo mundo. Queria aproveitar cada segundo possível de sua vida e tomar o que era seu por direito: o mundo.

Mas ainda assim era 1860. A sociedade não permitia que uma mulher fosse dona de si e vivesse sua própria vida. Então seu pai sempre reforçou para Lily e sua irmã Petúnia a necessidade de um bom casamento. 

Petúnia já tinha 20 anos e nenhum pretendente além de Vernon Dursley, herdeiro de um açougue na cidade que jurava que em breve receberia o título de visconde. Lily estava no auge de seus 19 anos e tinha todos os pretendentes do mundo aos seus pés devido à sua beleza extraordinária e à pessoa espetacular que era, sendo um prazer estar em sua companhia.

E Petúnia invejava a irmã por isso desde sua infância. Lily sempre tinha a atenção de todos, desde seus pais e os empregados da casa até os mais cobiçados solteiros europeus, e ainda assim recusava todas as ofertas de casamento. Eram inseparáveis durante a infância, mas desde que as preocupações com quem o papai iria carregar no colo para colocar para dormir na cama foram substituídas pela preocupação de quem iria se casar melhor, os sentimentos negativos de Petúnia relativos à Lily só cresciam.

As condições que colocaram James e Lily no caminho um do outro eram, de certa forma, peculiares. Eram séries de pequenos detalhes que pareciam irrelevantes, mas quando você olhava para a imagem inteira, poderia ser visto apenas como uma armação do destino ou outro joguete de Deus com duas almas mortais. Ou ainda, você pode ver que tudo que aconteceu, apesar de serem coincidências fascinantes, aconteceu por puro livre arbítrio daqueles dois.

O objetivo de vida de Lily havia se tornado conhecer a França. Caminhar pelas ruas de Paris, conhecer o povo que ali vivia, aproveitar tudo que aquele país tinha para lhe oferecer. Queria sentar em sua varanda e pintar as paisagens que veria, o povo, o céu, queria eternizar cada memória que tinha. Sonhava com a arte da pintura mas o pai nunca permitiu que ela tivesse aulas disso, deixando-a frustrada por quase uma vida inteira

Assim, após tanto ouvir a filha insistir e aproveitar as viagens constantes do marido ao exterior e consequentemente o pouco tempo que ele passava em casa, Mary Evans encontrou um professor particular para ensinar pintura para a filha. 

E é neste momento que a história dos dois heróis românticos por fim se entrelaça.

James não gostava de ser um Potter. Amava seus pais, amava seu poder e amava seu dinheiro, mas não amava suas responsabilidades, não amava seu título à ser herdado de marquês. Não amava ter que se contentar com uma vida de nobreza e cuidando de assuntos como comércio e terras. Não amava ficar preso em Godric’s Hollow até sua morte devido ao seu março. Não amava o fato de não poder seguir seu sonho de morar em Paris e ser um renomado pintor. Não amava ter a obrigação de casar e ainda mais com alguma mulher que ele não amaria, tudo para produzir herdeiros e assim passar o seu título adiante.

Então ele delegou de tudo isso pelo máximo que pode. Convenceu seus pais de que fazer faculdade em Paris era sua melhor escolha. Deixou Sirius, seu melhor amigo, aos cuidados de seus pais e resolvendo toda a burocracia que a vida de James deveria ser. Lutou pela sua liberdade e pelo direito de mandar em si mesmo até o fim de sua vida. Mas então, em seu aniversário de 22 anos, Fleamont Potter fora até Paris buscar seu filho pelas orelhas para obrigá-lo a assumir a vida com a qual tinha deveres e obrigações. 

Não pense que James não lutou contra isso; lutou e conseguiu o mínimo de seus desejos: viveria afastado da enorme Mansão Potter em um pequeno chalé. Ainda teria que cuidar de todas suas obrigações como herdeiro do março Potter, isto era fato. Ainda precisaria frequentar a casa de seus pais, ir em reuniões intermináveis e entediantes com seu pai, mas poderia cuidar da maioria de seus deveres no conforto e privacidade do chalé que escolheu. A única regra maior era: se casaria em breve e assim que arranjasse uma noiva satisfatória, retornaria para a Mansão Potter e assumiria oficialmente seu título de direito.

James odiava tudo isso mas era tolerável. De alguma forma, sabia que nunca assumiria as responsabilidades totais de ser um Potter e sabia que nunca se casaria da maneira que seus pais desejavam. Ele não poderia estar mais correto.

Devido aos anos longe da Inglaterra e aos milagres da puberdade, James era irreconhecível para a sociedade inglesa, passava facilmente por qualquer um que desejasse ser. Os cabelos rebeldes e impossíveis de se arrumar característicos dos Potter eram muito bem escondidos por Fleamont, logo, era um fator fenótipo que permitia James a passar despercebido pelas ruas. 

E estes mesmos anos longe da Inglaterra impediram James de saber o ódio incalculável que seu pai sentia da família Evans. A privacidade e orgulho de John Evans o impediram de contar para sua família sobre seus maiores inimigos, a família Potter.

Naquela manhã de quarta feira na qual Mary Evans abriu as portas de sua casa para James Potter entrar e chamou Lily para suas aulas de pintura, não poderia imaginar que estava selando o destino trágico de sua filha mais nova.

A decisão de James de dar aulas de pintura foi repentina, apenas pensou que era uma forma de ganhar um dinheiro que fosse apenas seu sobre o qual não teria que prestar contas ao seu pai. E a maneira de encontrou Mary Evans era outra coincidência enorme do destino, outra parte da trama cruel que se fechava sobre o jovem casal. Estava pintando a Igreja, sentado parcialmente escondido pelas árvores que rodeavam a catedral, quando Mary chegou por trás dele, assustando-o.

ー É uma pintura impressionante, o senhor tem muito talento.

ー Obrigada, senhora. É só um rascunho, por enquanto. ーafirmou o jovem sobressaltado e indo recolher o pincel que derrubara no chão devido o susto.

ーMesmo sendo um rascunho é realmente belo. Perdoe-me por ser tão obtusa, mas teria interesse em dar aulas? Minha filha mais nova tem muito interesse pelas artes e acredito que se aprendesse com alguém tão talentoso como o senhor, poderia alcançar grande potencial.

James estava surpreso. Era incrível como há pouco tinha começado a pensar que precisava de alguma atividade para ganhar um dinheiro que fosse seu próprio, ganho por seu mérito. E ainda poderia praticar sua paixão mais ativamente.

ーNa realidade, eu teria sim, senhora.

ーAh, perfeito! Minha filha ficará radiante. Diga-me, as quartas feiras pela manhã são boas para o senhor? ー James assentiu com a cabeça. ー Ótimo. Podemos discutir o pagamento após sua aula com minha filha. Foi o maior dos prazeres lhe conhecer, senhor…?

ーPotter. James Potter.

ーUm prazer conhecê-lo, senhor Potter. Tem alguma relação com a família Potter da cidade?

Por algum motivo que não soube identificar, James sempre soube que seria a melhor decisão negar suas origens. Aquela mulher claramente não sabia muito sobre a família Potter e ele poderia se aproveitar disso.

ーNão, senhora. Na realidade, acabei de retornar de Paris. Potter é um sobrenome um tanto quanto comum.

ーQuantas coincidências! Minha filha sonha em conhecer Paris. Imagino que seja Deus colocando um professor tão competente no caminho dela. 

ーDesculpe, a senhora não me disse seu nome.

ーBaronesa Mary Evans. E a filha para a qual você dará aula se chama Lily Evans. Minha casa é aquela ali, apenas alguns metros daqui da Igreja. Te espero às oito da manhã. ー virou-se para ir embora, mas antes disso dando um adeus final. ーObrigada, senhor Potter. Minha filha ficará muito feliz. 

Assim, na quarta feira seguinte pontualmente às oito da manhã, James Potter bateu na porta da residência dos Evans com todo o seu material de pintura em mãos, sendo recebido pela empregada da casa.

ーO senhor deve ser o professor. Entre, por favor, já vou chamar a senhorita Evans.

Ele assentiu com um sorriso e seguiu ela até a sala de estar da casa, onde teria sua aula com a senhorita. A casa era ricamente decorada com tons suaves e claros, que traziam muita luz para o ambiente. Havia uma parede lotada de livros, o que o deixou feliz. Casas com tantos livros eram especialmente raras. Enquanto analisava os títulos ali presentes, ouviu a voz de Mary atrás dele e som de passos descendo as escadas.

ーProfessor Potter, que bom que veio. Gostaria que conhecesse minha filha, Lily.

Quando aceitou dar as aulas, James imaginou que estaria dando aulas para uma criança, ou pelo menos para uma jovem que estava entrando em sua adolescência. Mas ao ver a mulher que o esperava ao pé da escadaria, ficou sem ar.

Ela era bela de uma maneira inexplicável. Tinha longos cabelos ruivos que caiam harmoniosamente pelas suas costas, afastados de seu rosto. Rosto este que era o mais lindo que já viu em toda sua vida. Os traços eram delicados mas ele tinha certeza que aqueles olhos verdes que encaravam-o tão intensamente seriam capazes de trazer sua ruína. Ele não poderia estar mais correto.

Conhecer ela foi a sensação mais arrebatadora que já sentiu. Diversos sentimentos o inundavam, mas o mais forte de todos além da atração era a sensação de reconhecimento. Tinha certeza que já a conhecia.

Inconscientemente, se moveu até a jovem, sem nunca tirar seus olhos castanhos dos dela e beijou sua mão. A pele clara era macia e os dedos delicados, sem quaisquer calos; sinais de uma mulher privilegiada que foi criada com todo cuidado do mundo.

ーÉ um prazer conhecê-la, senhorita. ーa voz de James parecia distante para ele.

ーO prazer é meu, professor.

Quando sua mãe disse que havia achado um professor para lhe dar aulas, Lily havia imagino algum velho senhor. Ficou entusiasmada com a notícia, é claro, mas ainda assim, suas expectativas foram completamente quebradas.

Sentiu seu coração acelerar mesmo quando o viu de costas, admirando a vasta biblioteca dos Evans. E quando James se virou, Lily sentiu sua vida inteira mudar. Ali, na sua frente, estava o homem mais lindo que existia. Alto como um homem deveria ser, os cabelos castanhos e brilhantes revoltosos em sua cabeça eram inacreditavelmente charmosos. Seu rosto era forte e delicado ao mesmo tempo, com traços marcantes como seu nariz levemente torto e seus castanhos olhos bondosos, que pareciam puxar ela para ele. 

Essa atração entre os dois existia em todos os níveis possíveis e foi o que a fez andar até ele e estender sua mão para ele a beijar. Ver aquele homem se curvar diante dela e sentir seus lábios no dorso de sua mão tiraram seu fôlego.

ーPor acaso nos conhecemos? Tenho certeza de que já vi a senhorita antes.

Sim, ela sentia a mesma coisa desde que seus olhos encontraram os dele. Ela o conhecia.

ーSinto a mesma coisa, mas não sei dizer de onde, professor.

ーJá esteve em Paris? Passei os últimos anos lá, podemos ter nos encontrado alguma vez.

Ele duvidava disso pois tinha certeza de que seria incapaz de esquecer aquela mulher se a tivesse encontrado alguma vez antes.

ーÉ meu sonho conhecer Paris, mas nunca tive a oportunidade de ir.

ーTenho certeza de que a senhorita terá esta oportunidade. Amará a cidade, sinto que ela combina com você.

Quando Lily sorriu involuntariamente em resposta às palavras gentis de James, o rapaz teve certeza de que aquela era a mulher de sua vida.

ーEspero mesmo poder ir para lá. Mas me diga, já esteve em Hogsmeade? Morávamos lá há alguns anos, nos mudamos apenas recentemente.

ーReceio que nunca fui para lá também.

Antes que Lily pudesse responder, Mary interrompeu os dois jovens. Estavam tão centrados um no outro que esqueceram que não estavam sozinhos ali.

ーVejo que vocês parecem se dar bem, muito bom. Vou deixá-los para começarem a lição e daqui a pouco Dobby poderá trazer um chá para vocês. ー virou-se para James, que quando se lembrou que haviam outras pessoas na sala afastou-se de Lily. ーProfessor, podemos discutir o pagamento no final da aula, certo?

O jovem professor assentiu com a cabeça e por fim os dois foram deixados sozinhos na iluminada sala que parecia brilhar com toda a energia que havia entre eles. Percebendo que encarava a ruiva há mais tempo do que o socialmente aceito, James começou a se mover e pegar os materiais de pintura para ela.

ーEntão, senhorita Evans, já pintou antes?

ーProfissionalmente desse jeito não, apenas quando criança. O senhor sabe como é, apenas rabiscos infantis. ーo sorriso que ela abriu devido à todas aquelas memórias era arrebatador e fazia ele ter mais certeza a cada segundo de que ela era a mais bela criatura que já pisou na terra. ーDevo avisar ao professor que tenho certeza de que não possuo talento algum.

Em poucos minutos em sua presença, Lily já havia percebido que James possuía os olhos mais intensos e bondosos que já vira e um sorriso fácil que parecia iluminar o mundo cada vez que abria. Seu coração parecia parar uma batida sempre que sabia que ela falou algo que causou aquele sorriso.

ーPosso assegurar para a senhorita de que tenho certeza de que possui talento para diversas coisas e sei que a pintura deve estar entre elas, só precisa explorar mais essa arte.

Ao ver as bochechas da mulher à sua frente ficarem no mais belo tom de rosa à sua frente, James soube que precisaria pintar ela de todos os jeitos possíveis. Ele soube que precisava dela de todos os jeitos possíveis.

ーPois bem, senhorita Evans, o que você sabe sobre pintura?

ーCreio que sei o básico, pelo menos. Quer dizer, suponho que não sou nenhuma idiota e sei pegar em um grafite, em pincéis e manusear a tinta.

Havia fugido completamente das regras de etiqueta da sociedade, mas Lily não se importava. O riso fácil e contagiante do professor fez o coração de Lily parar mais uma vez. Viraria um hábito ele fazer o coração dela parar. Até que parasse, por causa de James, para não bater novamente nunca mais.

ーEu tenho certeza de que a senhorita não está nem perto de ser idiota…

ーO senhor parece ter muitas certezas…

ーMas pintura tem muito mais a ver com sentimentos. Com sentir algo tão intensamente que você sente a necessidade de colocar aquilo em uma tela. ーestar na companhia de Lily era um prazer imenso e apesar dele ter continuado sua explicação, não pode deixar de sorrir ao ouvir o comentário dela. Pois ele tinha muitas certezas sim, e uma delas era que iria se apaixonar por Lily Evans, isto é, se já não estivesse apaixonado. ーDiga-me, senhorita Evans, o que faz você sentir tão intensamente que lhe faz querer passar tudo aquilo para uma tela?

Você, pensou Lily. James Potter em poucos minutos que estava em sua presença já a fizera sentir mais do que seus 19 anos de vida. Estar perto dele era como finalmente estar de fato viva. Queria passar para a tela tudo que estava sentindo: aquele sentimento de reconhecimento,  a atração que jamais sentira por qualquer outra pessoa, a maneira como seu coração parecia tão completo ao olhar ele que poderia explodir, e os tantos outros sentimentos que não conseguia definir. Queria pintar cada detalhe daquele rosto tão lindo que a analisava tão intensamente.

Naquele pequeno infinito no qual se encaravam enquanto Lily pensava em uma resposta adequada, ela não pode evitar concluir que iria amar James, se já não o amasse, apesar de ter acabado de conhecê-lo.

ーAcho que não precisamos começar com algo tão intenso no começo, perdoe-me. ーJames quebrou o silêncio sem jeito, após tanto encarar e se perder nos olhos verdes de Evans. ー Por que não desenha algo simples, a primeira coisa que vier à sua cabeça? Apenas para eu avaliar suas habilidades.

Como poderia fazer isto se tudo que estava na mente de Lily, insistentemente, era o professor Potter? Frustrada, vasculhou sua mente até achar algo seguro para desenhar e decidiu colocar na tela seu animal favorito: um cervo.

Enquanto deixava sua aluna desenhar o que havia requisitado, James não conseguiu não a admirar e se atentar a cada detalhe. Uma pequena mecha do cabelo ruivo escapava para seu rosto, emoldurando-o. Haviam pequenas e fracas sardas castanhas distribuídas por seu rosto. Quando se concentrava tinha a mania de morder os lábios, tornando-os vívidos e cheios de cor. Por vezes segurava o pincel com a boca, mas não parecia tola fazendo isto. Havia uma pequena cicatriz na parte direita de sua mandíbula, sendo que o resto da cicatriz era escondida por seu cabelo. Cabelo este que não era liso ou cacheado; em alguns trechos ele conseguia ver pequenos cachos se formando, em outros haviam largas ondas, enquanto sua raíz parecia lisa. 

Lily Evans era cheia de pequenos detalhes e James Potter passaria o resto de sua vida tentando os memorizar e descobrir cada vez mais coisas sobre sua aluna.

 ーAcho que terminei, professor.

James foi para o lado de sua aluna para analisar o desenho que ela fizera e não conseguiu evitar ficar perdido ao sentir o cheiro dela. Por maior que fosse a ironia, Lily cheirava à lírios recém colhidos. Ao ver o que ela escolheu para desenhar, viu-se obrigado a sorrir.

Enquanto o professor analisava seu desenho, Lily decidiu roubar este pequeno momento de distração dele para o observar atentamente. De perto era possível ver algumas imperfeições, e como em um paradoxo, estas conseguiam o fazer mais belo ainda.

O nariz torto tinha uma pequena cicatriz do lado esquerdo e era longo, com a ponte irregular. Os cabelos pareciam uma bagunça impossível de ser organizada. Apesar de sua aparente pouca idade, algumas pequenas rugas formavam-se no canto de seus olhos quando sorria. Apenas do lado esquerdo revelava-se uma covinha quando sorria. 

Ele era mais lindo do que tudo no universo. O cheiro amadeirado dele enchia seus pulmões e parecia sufocar seu coração. Lily desejava lembrar cada detalhe dele para que fosse seu para sempre, até o fim de seus dias.

ーO que levou a senhorita a escolher um cervo? ーquestionou maravilhado por ela ter desenhado seu animal preferido.

ーSempre foram meus animais preferidos. Perto de minha casa em Hogsmeade tinham vários, mas aqui ainda não vi nenhum.

ーTambém são os meus. Perto de onde moro há vários deles, passam sempre por lá. É incrível estar trabalhando, olhar para fora e ver um deles passando ou simplesmente deitado em seu quintal.

ーEu adoraria ver.

ーA senhorita irá ver sim, perto de minha casa há uma iluminação natural fascinante, seria ótimo que a senhorita treinasse isto lá.ーsorriu virando-se para olhar em seus olhos. Estavam próximos e a presença dela era inebriante. ーPossui muito talento como imaginei, senhorita Evans. Anatomia é especialmente complicada de desenhar, mas ainda assim o fez com quase maestria. Eu diria que para uma iniciante é espetacular o que conseguiu fazer. Apenas alguns problemas com iluminação, dimensões e profundidade, mas também muito fáceis de corrigir. É uma artista nata, Lily Evans.

Os dois sorriam. Era fácil estar com James como nunca fora com qualquer outra pessoa. Ver o sorriso de Lily e sentir seu olhar no dele era indescritível. 

ーJá terminaram?

A suave voz de Mary os despertou de seu pequeno universo. A matriarca dos Evans trazia consigo a bandeja de chá que comentou e sorria para os dois jovens.

Agora que James tinha memorizado cada possível detalhe de Lily, era visível a semelhança entre ela e sua mãe. Apesar de os cabelos de Mary serem loiro escuros com alguns fios cinzas começando a aparecer, possuíam o mesmo delicado nariz e os mesmos belos olhos. James conseguia imaginar o quão bela Lily continuaria sendo ao envelhecer só de observar sua mãe. 

ーDe certo que sim, senhora Evans. Como imaginei, sua filha possui muito talento.

O sorriso tímido de Lily e suas bochechas coradas eram a visão do paraíso, pensou James. Queria ter a habilidade de captar esses pequenos momentos de maneira instantânea para guardá-los consigo para sempre. Não confiava que sua memória poderia fazer jus à perfeição de cada sorriso de Lily Evans para sempre.

ーO senhor Potter é muito gentil e um ótimo professor. Será fácil ficar melhor na pintura sob sua tutoria. ーfoi a vez de Lily de arrancar um sorriso gentil e sincero de seu professor. Era a melhor das recompensas. 

ーFilha, isso está realmente maravilhoso! Ah, eu sabia que você era talentosa. ーEnquanto o jovem casal estava preso nos olhos um do outro alheios ao mundo, Mary foi observar a tela que sua filha havia pintado.

ーEu também achei maravilhoso, sra. Evans. Como disse para a srta. Evans, conheço um lugar esplendoroso onde há vários cervos, boa iluminação, pretendo levar sua filha lá para treinar isso.

Ao dizer isto, James se aproveitou da distração de Mary e deu uma piscadela para Lily. Naquele segundo Lily teve certeza de que ele ainda a mataria.

ーUma ótima ideia, tenho de concordar. ーMary suspirou tirando seus olhos da tela e finalmente olhando para o professor. ーEntão, precisamos conversar sobre seu pagamento. Tenho certeza de que cinquenta libras por aula parece razoável, mas podemos negociar…

ーPor favor não, sra. Evans. Eu não faço isso pelo dinheiro, e sim pelo prazer de ensinar.

ーMas é um ultraje que o senhor venha aqui e…

ーNão é necessário, realmente. Mas se insiste tanto, cinquenta libras mensalmente, sendo que darei duas aulas por semana para a srta. Evans me parece justo.

ーO senhor parece não se preocupar com dinheiro nem tempo, sr. Potter. Por acaso vem de uma família abastada? ーquestionou Lily, atraindo novamente a atenção do professor para si. Mas era intrigante um homem como aquele, em idade de pagar um dote de casamento e iniciar uma família não se preocupar com dinheiro. Além de que ele havia estudado em Paris, seus materiais de pintura pareciam da maior qualidade assim como seu terno. Lily ligou os pontos e percebeu que James era sim rico.

Sua mãe havia lhe dito o nome e sobrenome do professor antes e quando Lily questionou se ele tinha relações com os Potter de Godric’s Hollow, ela lhe dissera que não. Mas agora parecia óbvio que James mentiu. Ele era o herdeiro de Fleamont Potter sobre o qual corriam inúmeras fofocas na cidade. O futuro marquês. Aquele que ninguém havia visto ainda pois fugia de cada evento social e não se deixava ser visto, cujo o fenótipo ninguém parecia conhecer.

James era um Potter, e não qualquer Potter, mas O Potter. Apesar de John Evans ter uma política severa de não discutir negócios com sua esposa, não significava que Lily não conseguia extrair alguma informação do pai, principalmente quando o mesmo estava estressado e havia começado a beber. E Lily ouvira diversas vezes o pai amaldiçoar até a última geração dos Potter, usava até mesmo palavras de baixo calão para se referir àquela família.

O sangue de Lily gelou. Seu pai já não era a pessoa mais satisfeita do mundo com o interesse de Lily relativo à pintura, por qualquer que fosse o motivo. Se soubesse que sua filha estivesse tendo aulas com o filho de seu maior inimigo era capaz de ter um acesso de raiva. Pior, se soubesse que sua filha estava apaixonada por um Potter, era capaz de matar alguém.

ーSenhorita Evans, está tudo bem? Me parece um tanto quanto pálida.

A voz de James despertou Lily de seu devaneio. Ele havia a observado lentamente perder a cor e arregalar os olhos para ele nos últimos segundos. Como desejava saber o que se passava naquela astuta mente. A preocupação transparecia em seus olhos verdes, deixando-o alerta.

ーEstá tudo ótimo, sr. Potter. Mas olhe as horas! Vai se atrasar para aquele compromisso que comentou que tinha agora. Eu posso lhe acompanhar até o portão.

A cabeça do professor estava a mil por hora tentando compreender o que Lily estava fazendo. Decidiu desistir de compreender e só seguir a jovem. 

ーLily, não seja indelicada, o professor sequer tomou o chá e nem combinamos quando será sua próxima aula. ーRose interrompeu enquanto o professor guardava seus materiais de pintura.

ーPerdoe-me, sra. Evans, lembrei-me de um compromisso urgente que tenho hoje. Mas tomaremos chá em minha próxima visita. E penso que sexta feira parece um bom dia para nossa próxima lição.

ーNão! ーexclamou Lily exasperada. Sabia que seu pai voltaria para casa na quinta feira pela noite e só iria embora na segunda feira. Não podia deixar seu pai saber sobre James. Ela tinha certeza de que ele a obrigaria a parar as aulas de pintura e principalmente, nunca mais deixaria Lily chegar perto de James. O conhecia há poucas horas mas apenas o pensamento de ser impedida de ver ele parecia tenebroso. ーAcho que podemos mudar nossas aulas para as terças e quintas de manhã, se o professor não se incomodar.

Eram dias ruins para James, geralmente trabalhava com seu pai nestes horários. Mas nada importava, se essa era a condição para ver Lily, arrumaria um jeito, trabalharia aos fins de semana com seu pai, não importava; nada importava além da ruiva à sua frente.

ーSim, eu posso vir nestes dias. ーfalou encarando intensamente Lily, então virando-se para se despedir de Rose. ーMuito obrigada por tudo, sra. Evans, e perdoe-me por ser tão rude e ir embora assim. Dou minha palavra de que honrarei esse chá em breve.

A sra. Evans deu um sorriso reconfortante para o rapaz.

ーEu que agradeço, professor. Vejo o senhor semana que vem, então. Lily te acompanhará até lá fora.

Dando um último sorriso galanteador para a senhora, James seguiu Lily até a porta, fascinado com a forma que seus cabelos balançavam ao seu caminhar e como o seu cheiro parecia deixar um rastro pelo caminho.

ーFoi um prazer, senhorita E…

ーO senhor é James Potter.

James piscou por alguns instantes, confuso.

ーEsse é meu nome.

A garota à sua frente revirou os olhos. Ela era linda mesmo impaciente.

ーEu quis dizer que você é James Potter, filho de Fleamont Potter, o primogênito e herdeiro da família Potter. O sir James Potter, futuro marquês.

Ela conseguiu ver ele engolir em seco, o que só comprovou sua teoria.

ーComo a senhorita sabe?

ーBem, não é óbvio? Não é qualquer um que pode pagar para estudar em Paris e por todos estes materiais caros.

O professor não conseguia compreender onde ela estava chegando com tudo aquilo ou qual era o problema.

ーSrta. Evans, tem algo de errado com o fato de ser um Potter?

ーSim! Tem tudo de errado. Você sabia que nossos pais se odeiam, sir Potter?
Ele arqueou as sobrancelhas, surpreso. Imaginava que se seu pai odiasse alguém, anunciaria aos quatro ventos tal sentimento.

ーNão tinha ideia. Mas isso será algum impedimento para nós? ーele engasgou por um segundo percebendo o que acabou de falar ーQuer dizer, algum impedimento para nossas aulas, srta. Evans?

ーMas não é óbvio? Meu pai me mataria se soubesse que estou tendo aulas com o senhor.

Parecia que o coração de James estava sendo esmagado com aquela rejeição, o que era uma besteira, já que ele nunca expressara nenhum sentimento romântico por ela e não tinham nenhum compromisso neste sentido; pelo amor de Deus, eles haviam se encontrado apenas há algumas horas atrás. Então por que se sentia tão mal com as palavras que diria a seguir?

ーOra, não quero criar nenhuma intriga familiar, então acho que devemos cancelar nossas aulas…

ーNão! ーLily percebeu que havia agarrado o braço de seu professor ao dizer isto e rapidamente o soltou, mas isto não apagou o choque do rosto de ambos. Respirou fundo e continuou sua fala, tentando manter a compostura. ーEu… eu realmente quero continuar nossas lições, professor. É importante para mim. Quero continuar vendo o senhor. Então tudo que peço é só para que fique longe de meu pai. Não deixe que ele saiba quem é. 

James engoliu em seco. Não queria se precipitar ou se iludir, mas ouvir Lily dizer que queria continuar o vendo era como se pudesse finalmente respirar. Seu coração batia alegremente em seu peito em resposta.

ーTudo bem. Manterei um perfil discreto. ーcom o impulso de tocar nela uma última vez, pegou sua mão sem luva e plantou um beijo final em seu dorso. Apesar do gesto simples, ambos sentiram a profundidade escondida por detrás daquilo. James ergueu os olhos para os de Lily, que o encarava intensamente, como se quisesse lhe dizer algo apenas pelo olhar. ーFoi um prazer lhe conhecer, srta. Evans. Ou, quem sabe, reencontrar-lhe. Aguardo nossa próxima lição.

Antes que Lily conseguisse dizer algo, James havia ido. E com ele, parecia que parte de seu coração também havia ido embora.

 

Diário de Lily Evans

 

02 de abril de 1860

 

Certa vez escutei uma frase que me parecia um exagero. Mas hoje, sinto que devo repetí-la como se fosse minha pois compartilho dos mesmos sentimentos.
“Hoje conheci o amor de minha vida. Por ele irei viver e morrer até o fim dos dias”.

Quando conheci o professor James Potter, tive certeza de que, de alguma forma, já o conhecia faz tempo. Minha alma reconheceu a dele. De repente fazia sentido como nenhum outro homem jamais conseguiu captar minha atenção.

Sinto que sou uma tola por falar essas coisas sobre um homem que “conheci” apenas hoje. Mas juro que cada segundo perto dele parecia como se eu estivesse respirando pela primeira vez. 

Além de sua perceptível beleza física, é possível perceber como sua alma é bela. Meu maior desejo é conhecer ele cada vez mais a fundo.

Infelizmente, sei de que certa forma qualquer relação entre nós, mesmo a de professor e aluna, será dificultada pelo ódio de meu pai para com a família Potter. Sei que terei de manter tudo isso como segredo até meu pai entender que James não é responsável pelas atitudes de seu pai.

Aguardo ansiosamente para ver o professor novamente na próxima semana, para olhar em seus bondosos olhos novamente.

Por Deus, é patético como soo como uma tola apaixonada. Talvez seja essa a sina de meu amor.


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