O seu léxico escrita por Astraeus


Capítulo 4
Capítulo III




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Vogar

vo.gar

deslocar-se sobre a água, navegar

escorregar suavemente, deslizar

andar sem rumo, vaguear

— E então, o que você está escondendo de mim, Malfoy? — Harry perguntou, os dois andando por Hogsmeade, indo em direção até a casa dos gritos. Por que Draco escolhera aquele lugar para um encontro, Harry não conseguia entender, mas não questionava as decisões do loiro. 

— Muitas coisas, Potter. — Disse ele. — Do que exatamente você quer saber?

— Por que você está tão desesperado em fazer com que eu me encontre com os seus pais daqui a duas semanas?

— É o meu prazo para dar uma razão boa o suficiente para eu não me casar com Astoria. — Disse ele. — Eu vou estar saindo do armário e te apresentando como meu namorado para eles. 

Harry revirou os olhos. É claro que Malfoy estava escondendo alguma coisa dele. — Por que não me disse isso antes? — Harry perguntou, um tanto irritado. 

— Eu tinha que fazer você assinar o contrato primeiro, vai que isso te assustaria. Eu estava desesperado, Potter. Eu estou desesperado. 

— Se casar não é tão ruim assim, Malfoy. E divórcio é algo que existe. — Disse Harry. — Sabe, nós, ingleses, inventamos o divórcio. 

— Me impressiona que você saiba história. 

— Me impressiona que ninguém tenha te assassinado ainda. 

Os dois caminharam em silêncio por algum tempo, até que chegaram perto de uma mata que ficava a alguns metros da Casa dos Gritos. Draco ofereceu sua mão para Harry, que revirou os olhos, mas a aceitou. Os dois andaram em direção ao pequeno bosque, e Harry ficava mais e mais curioso sobre onde eles estavam indo a cada passo que eles davam, a cada centímetro que Draco o puxava para dentro do souto.

Draco virava esquerdas e direitas como se conhecesse a brenha como a palma de sua mão. Aquilo era um tanto quanto suspeito, se você perguntasse a Harry. 

Logo, eles chegaram a uma clareira circular, com um pequeno lago em seu centro, congelado por causa da época do ano. Draco soltou a mão de Harry, sentando-se perto da margem da lagoa. 

O moreno o seguiu, sentando-se ao lado dele. 

— Esse é nosso segundo encontro. — Disse Draco. — Você tem alguma pergunta?

Naquele momento, Harry percebeu que Draco não tinha muita experiência com encontros. — Claro. — Ele disse. — Por que me trouxe aqui?

Draco deu de ombros. — É bonito, é perto de Hogwarts e eu gosto daqui. É afastado, poucos sabem da existência desse lugar. — Disse ele. — Próxima pergunta. 

Harry deu uma risadinha. — Isso não é um jogo de perguntas ou respostas, ou uma entrevista de emprego. Relaxe. 

Draco se virou para Harry com os olhos semicerrados, a ideia de um rubor plantada em sua face. — Eu não estou nervoso. 

— Parece. — Harry sorriu, zombeteiro. 

Os dois ficaram calados por alguns segundos. O moreno percebeu que Draco realmente não tinha a menor ideia do que estava fazendo ali. — Temos que nos conhecer, não temos? — Disse Draco. — Pessoas fazem perguntas em encontros. 

— Vamos jogar vinte e uma perguntas, que tal? Eu te faço vinte e uma perguntas, você me faz vinte e uma perguntas. — Disse Harry, tentando deixar as coisas mais fáceis para o loiro. 

Lhe dava certa pena ver que Draco estava tão desorientado e desesperado. Aquele não era o Malfoy com o qual estava acostumado. 

Estava acostumado com o Malfoy cheio de si, arrogante, zombeteiro. Com o Malfoy inteligente, aplicado, ambicioso. Estava até acostumado com  o Malfoy arrependido, cabisbaixo. Era incrível como apenas uma pessoa podia ter tantas facetas diferentes. 

— Ok, você pode começar. — Disse ele. 

— Como achou esse lugar? 

— Eu estava a vogar por Hogsmeade no sexto ano, procurando algum lugar afastado onde eu pudesse só ter uma folga de tudo que estava acontecendo. — Ele deu de ombros. — Eu acabei encontrando esse lugar, enquanto eu andava sem rumo. Foi um acidente feliz. — Ele suspirou, lembrando-se de tudo que vivera naquele ano. Fora um porre. — Minha vez, por que você, o menino-que-sobreviveu, continua sozinho? Ninguém te quis, Potter?

— Eu namorei com a Gina por algum tempo. — Disse ele. — Demorou um pouco, mas eu logo percebi que não combinávamos muito. Teve também a Cho. Quando ela superou o Cedrico e eu terminei com a Gina, ficamos algumas vezes, mas… só não encaixava, sabe? E eu não estou desesperado para encontrar alguém, ao contrário de certas pessoas. 

— A vida é curta, Potter. — Disse Draco. — Daqui a alguns anos você vai querer encontrar alguém. 

— Malfoy, se for para ser, será; é isso que eu acho. — Ele deu de ombros. — Agora, minha vez. Eu fui a sua primeira opção para se livrar de Astoria?

Draco balançou a cabeça negativamente. — Não. Minha primeira opção foi Blaise, mas ele está compromissado. Pansy seria uma boa opção, mas isso não atingiria todas as expectativas, já que eu queria me assumir para a minha família e me livrar do casamento ao mesmo tempo. — Disse ele. — Goyle… Bem, Goyle não foi nem uma opção, devo admitir. 

Harry não pôde segurar um riso. Não conseguia imaginar Malfoy e Goyle em um relacionamento. A ideia era cômica demais para seu cérebro aguentar. 

— Eu tenho poucos amigos, Potter. Quando Astoria resolveu me ajudar e me disse que conhecia uma mulher no trabalho que queria juntar seu amigo com alguém, eu aceitei. — Disse ele, dando de ombros. — Quando eu descobri que essa mulher era a Granger, eu imaginei que fosse você, mas, como eu já disse, eu estou em uma situação em que eu não posso ser exigente. 

— Eu não tinha juntado os pontos. Não sabia que você e Astoria eram parentes. 

— Não me impressiona. — Ele disse, bufando. — Minha vez. Por que você aceitou a minha proposta? Não é como se fosse realmente útil para você.

Harry deu de ombros. — Eu não queria te deixar na mão. — Disse ele. — Eu não imagino como deve ser ter que esconder quem você é para os seus pais, mas eu acho que deve ser doloroso. 

Draco iria soltar um comentário sarcástico, mas então ele percebeu o que aquelas palavras significavam. “Eu não sei como deve ser ter que esconder quem você é para os seus pais, já que eu não tenho pais.” Como Draco poderia fazer piada depois de uma daquelas?

— Qual é o seu maior arrependimento na vida? — Perguntou Harry, fazendo com que Draco revirasse os olhos. Agora ele queria ser profundo? — Lembre-se que você não pode mentir para mim. 

— Meu maior arrependimento é ter meu pai como modelo na infância. — Draco suspirou. — Se eu soubesse o quanto ele estava errado e o tamanho do sofrimento em que aquilo me colocaria… Eu nunca teria o dado ouvidos. — Ele disse. Então, se virando para Harry, ele perguntou: — Você gosta de ser quem você é, o menino-que-sobreviveu, o Eleito, herói do mundo bruxo e tal?

— Bem. Eu devo admitir que detesto a atenção. Mas eu acho que eu não desejaria isso para ninguém. — Ele disse, dando de ombros. — Então eu acho que tenho que me conformar. E você, gosta de ser quem você é?

— Acho que ninguém realmente gosta. — Ele suspirou, olhando para suas mãos que descansavam em seu colo. — Qual é a sua lembrança do patrono?

— Uau, que pergunta profunda, Malfoy. Não sabia que tinha tanto interesse assim em mim. — Disse ele. — É a minha mãe. A única lembrança que eu tenho dela. Nem sei se é real. — Ele riu, sem-graça. — E a sua?

— Nunca tive que conjurar um. — Ele deu de ombros. 

— Nunca teve curiosidade? — Harry perguntou, fazendo Draco franzir o cenho. 

— Eu tenho mais coisas para fazer, Potter. — Ele revirou os olhos. — Qual é o seu patrono?

— Um veado. — Disse Harry.

— Combina com você. — Draco riu. 

— Por que a pergunta?

— Estava lendo um pouco sobre patronos outro dia. Pelo que eu me lembre, o veado simboliza um certo equilíbrio interno, mas também pode significar que você é uma pessoa que julga muito os outros. — Disse Draco. — Você escolhe um grupo para si e afasta os outros. Você tem uma capacidade de liderança natural, assim como opiniões fortes. 

— Não quer aproveitar e ler as minhas folhas de chá? — Harry riu, fazendo com que Draco torcesse o nariz. 

— Eu detestava adivinhação. Aquela mulher era louca. — Disse ele. — Sem contar que adivinhação não possui nenhum embasamento. 

Harry simplesmente revirou os olhos. — Qual é o seu bicho-papão? — Ele perguntou. 

Draco se virou, arqueando as sobrancelhas. — É sério isso? Bem, eu nunca descobri, já que alguém fez com que o professor parasse a aula no nosso terceiro ano. — Disse ele. — Na época? Provavelmente seria meu pai. Hoje, já não tenho tanta certeza. O seu continua sendo um dementador?

— Sim. Eu achei que ele mudaria depois da guerra, mas continua sendo um dementador. — Harry sorriu. — E o seu patrono, o que você acha que seria? — Harry perguntou. — Não, melhor ainda, quer descobrir qual seria o seu patrono? Eu te ensino. 

Draco o encarou por alguns segundos, até dar de ombros. — Não é como se eu estivesse desesperado para saber, Potter. — Ele disse. — Que tal deixarmos isso para, sei lá, o próximo encontro?

— Oh, então eu consegui um próximo encontro? — Harry ergueu as sobrancelhas sugestivamente. — Você sabe muito bem o que as pessoas dizem sobre terceiros encontros. 

— Não era você que tinha dito que não ia transar comigo, Potter? — Draco sorriu malicioso. — Já mudou de ideia?

— Eu acho engraçado que você esteja tão desesperado assim para me levar para a cama. É algum tipo de desejo reprimido? — Harry riu, fazendo com que Draco soltasse um risinho, também. 

Harry esperava, honestamente, uma coisa completamente diferente. Ele não esperava que aquele segundo encontro tivesse cara de segundo encontro; esperava que Draco fosse mais profissional, frio, direto, mas ao invés disso ele estava agindo como uma pessoa normal. 

Aquilo era interessante. 

Era interessante porque por mais que a guerra tivesse acabado, Harry e Draco não conseguiam passar muito tempo conversando sem se insultarem, por mais que o moreno tentasse ser civilizado. Claro, eles não saíam aos socos no meio da rua como faziam nos corredores de Hogwarts - principalmente durante seu oitavo ano - mas o veneno que soltavam um para o outro ainda era considerável. 

— Quando você descobriu que era bissexual? — Perguntou Draco. 

— No quarto ano. — Disse Harry. — Durante o torneio tribruxo. Aquela foi a minha ascensão LGBT. Você não faz ideia do crush imenso que eu tinha pelo…

— Cedrico? — Draco adivinhou. — Por favor, Potter, metade da escola achava que vocês dois estavam tendo um caso. 

Harry estava surpreso. Era sério, aquilo? 

— Como eu disse, Potter, você é um livro aberto. — Disse o loiro, revirando os olhos diante da incredulidade do outro. 

O moreno decidiu ignorar aquilo, e perguntou: — E você, quando descobriu que era gay?

— No terceiro ano. — Disse ele. 

— Ah, é? Quem te fez descobrir?

— Isso não importa. E eu acho que eu preferiria não te contar toda a minha vida, Potter. Privacidade ainda deve existir em um relacionamento. — Draco disse, cruzando os braços. — Minha vez: você disse que você e a Gina não funcionaram, mas o que realmente fez com que vocês dois terminassem?

— Isso não é da sua conta. — Harry disse, fechando a cara. 

— Oh, parece que eu encostei numa ferida. — Draco riu. — Foi porque você é ruim de cama, ou o quê?

— Por que você é tão obcecado com a minha vida sexual? Quer fazer parte dela, é? — Harry bufou, a ideia de um sorriso estampado em seus lábios. 

— Eca, eu não. Isso não estava no contrato. 

— Não por falta de vontade sua. — Harry riu, feliz de que tinha conseguido perturbar Malfoy o suficiente para fazê-lo esquecer de sua pergunta inicial. — E mesmo se estivesse no contrato, eu teria tirado dali. Não ia querer ir para cama com você. Vai saber aonde essa bunda já passou. 

Malfoy ergueu uma sobrancelha. — O que está insinuando?

Harry simplesmente lançou-lhe um sorriso maroto. Draco decidiu ignorar aquela afronta e simplesmente revirou os olhos. — Vamos, eu não quero mais brincar, e aqui está gelado demais. 

— A ideia foi sua, criatura. — Harry disse, se levantando. 

— Eu não esperava que estaria tão frio assim! — Ele exclamou, segurando a mão de Harry novamente. 

Aquilo era estranho. Mesmo os dois usando luvas, Harry ainda conseguia sentir o calor da mão de Draco na sua, coisa que ele nunca se imaginou fazendo. Parecia tudo tão errado, estar lá, de mãos dadas com Draco Malfoy. 

Ele sentiu as mãos do loiro tremendo, e agora que ele percebia, ele parecia estar com frio. 

Harry começou a tirar seu casaco quando percebeu o que estava fazendo. Estava mesmo desistindo de uma peça de roupa quentinha para dar ao estrupício ao seu lado? Estava mesmo dando seu casaco para Draco Malfoy?

Foda-se, ele pensou. Daria seu casaco para Draco. Aquilo era um encontro, não era? Pelo menos os dois não teriam que mentir quando contassem as histórias sobre seus primeiros encontros, não é mesmo? Imagine só:

“Ah, e quando eu tremi de frio Harry me deu seu casaco. Foi tão romântico.”

Sentiu vontade de vomitar ao imaginar a voz de Malfoy dizendo aquelas palavras, mas pôde esconder bem. O loiro, vendo que o casaco estava sendo oferecido a ele, nada disse, e apenas o aceitou. 

— Que desperdício. — Draco murmurou após suspirar, chamando a atenção de Harry. — Esse lugar lindo, com essa atmosfera romântica e essas perguntas combinariam muito mais com quaisquer outras pessoas. Mas somos somente nós dois. Que desperdício de um segundo encontro adorável. 

Harry riu. 

É. Que desperdício de um segundo encontro adorável. 


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