Projekt FORSH escrita por Raquel Severini


Capítulo 3
Capítulo III: Katz und maus


Notas iniciais do capítulo

Sejam bem-vindos!!
O que estão achando da história até aqui? As intrigas e conspirações estão apenas começando haha

Algumas curiosidades:
— O fuso-horário entre Alemanha e Coreia do Sul é de 7hr. A coreia está 7 horas a frente da Alemanha (asiáticos, fazer o que)
— Todos os capítulos são intercalados entre a Tayla e o Dosakyo, sem exceções!
— Todos os capítulos narrados pela Tayla tem título em alemão
— Todos os capítulos narrados pelo Dosakyo tem título em coreano

Dicionário dos nomes
— O nome Tayla se pronuncia TÁY-LA
— O nome Dosakyo se pronuncia DO-SÁ-KYO
— O apelido Kyo se pronuncia KYÔ

Sem mais delongas, aproveitem o capítulo!



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III. Gato e Rato

24/01/2046, Hamburgo, 11:21am.

Eu estava caminhando por um longo corredor, ouvindo o som da minha própria respiração. Os gritos e aplausos pareciam longínquos, como se viessem de outra dimensão. Meu treinador, um homem baixo e de rosto gentil, molhou minha cabeça com uma garrafa d’água fresca.

— Acabe com ele, Dosakyo. – Deu dois tapinhas em meu ombro e um empurrão suave para me encorajar a seguir em frente.

Fui subitamente tragado pela euforia da multidão. Flashes e aplausos irromperam assim que a plateia me viu andando em direção ao tatame. Um cameraman me acompanhou, seguido da voz do narrador e um painel com informações no telão. Lia-se: Peso médio masculino – 68kg a 80kg. E abaixo os resultados das lutas anteriores.

— Representando a Coreia do Sul, de colete e capacete vermelho, o bicampeão mundial de taekwondo da categoria até 80kg, Dosakyo Komei! – O narrador introduziu. Assim que os gritos e aplausos diminuíram, a voz continuou: – Representando a Grécia, de colete e capacete azul, fazendo sua estreia na disputa pela medalha de ouro, Aleksander Dimitriou!

Tanto eu quanto o adversário caminhamos até o centro do tatame, onde nos cumprimentamos em frente ao juiz e a bancada: uma reverência curta de ambas as partes, seguida de um aperto de mão rápido. Após colocarmos os capacetes, uma pausa tensa se seguiu, até que o árbitro se afastou e disse: 

— Prontos? Lutem!

Tayla abriu os olhos, encarando o teto esbranquiçado de seu quarto. Ela chegara tão exausta na noite anterior que dormira sem nem mesmo se lembrar de deitar-se na cama. Sem toda a adrenalina percorrendo suas veias, finalmente sentiu dores pelo corpo.

Levantou-se lentamente, soltando lamúrias pesarosas. Seu apartamento ficava em um pequeno bairro, em Hamburgo. Era composto por dois quartos, sala, cozinha e banheiro nada luxuosos, porém bem organizados. Tayla arrastou-se à toalete, inclinada como uma idosa corcunda. Despiu-se em frente a um espelho de corpo inteiro, soltando resmungos. Um hematoma enorme cobria-lhe as costas quase completamente, causado pelo impacto contra uma das janelas do avião. Havia pequenos estilhaços de vidro ainda alojados em seu rosto, os quais ela retirou com uma pinça de maneira delicada.

Por fim, Tayla abriu a torneira da banheira e esperou-a encher, entrando em seguida. Submergiu na água quente afim de acalmar os nervos, porém ao fechar os olhos, sentiu que estava se afogando. Tentou se levantar, mas era como se um peso a impedisse. Debateu-se de maneira frenética, com líquido entrando em seus pulmões através da sua boca e nariz. Arranhou as bordas de cerâmica da banheira, lutando contra uma força invisível. Por fim, conseguiu emergir, caindo sobre o chão gelado enquanto tossia, sem fôlego.

Tremendo e assustada e assustada, vestiu o roupão de banho e caminhou até a cozinha, com um pressentimento terrível. Estaria ficando louca? As experiências vividas nos últimos dias estavam começando a lhe fazer pensar que sim. Acendeu o fogão e colocou a chaleira sob um dos bocais para esquentar água. Enquanto esperava, Tayla sentou-se no sofá e ligou a TV no canal de notícias. Um correspondente internacional aparecia em pé, em frente a uma pequena casa de estilo oriental. A foto de um homem asiático destacava-se no alto da tela. Ele possuía cabelos negros na altura dos olhos, rosto fino e bem delineado e pequenas marcas de nascença salpicadas no queixo e bochechas. 

— Estamos ao vivo em frente à casa de Dosakyo Komei, um ex-campeão olímpico de Taekwondo famoso, que está desaparecido desde a madrugada de ontem. Vizinhos fizeram denúncias a polícia após ouvirem barulhos suspeitos vindos da residência. Policiais encontraram uma poça de sangue em frente a porta e confirmaram que pertence a Dosakyo. Ainda não há mais informações sobre o que aconteceu ou seu paradeiro.

Tayla sentiu que seu coração estava prestes a explodir. Com falta de ar e a beira de uma crise de pânico, ela caiu de joelhos, abraçando o próprio corpo. Como? Como era possível? Como sonhara com um homem que não conhecia? Como sabia que ele era um campeão de taekwondo, sem nunca o ter visto antes? Sua mente parecia presa em um looping de perguntas sem respostas. Foi então que a chaleira apitou, tirando-a de seus devaneios.

Tayla apagou o fogão e serviu-se de uma caneca de chá, correndo até o segundo quarto do apartamento, que usava como escritório. Ligou o notebook, esperando de maneira impaciente enquanto sua tela se acendia. Abriu o navegador às pressas, digitando “Dosakyo Komei” em um site de buscas. Inúmeros resultados apareceram. Fotos, vídeos e uma descrição completa no CECS (Centro Esportivo da Coreia do Sul). Tayla clicou em um vídeo que datava dois anos atrás, sentindo suas certezas se estilhaçarem como vidro. Na legenda, lia-se: Dosakyo Komei x Aleksander Dimitriou (Final, Olímpiadas - Suíça, 2044).

A mulher levou as mãos ao rosto, em desespero. Como aquilo estava acontecendo? Seria possível que ela tivesse assistido ao vídeo em algum momento e se esquecera? O sentimento terrível que vinha experenciando ao longo da manhã apoderou-se de vez de sua mente, tomando conta de todos os seus nervos e articulações. Suíça. 2044. Era o mesmo ano em que ela havia se ferido gravemente em combate. O mesmo ano, o mesmo país. Com calafrios, Tayla pressionou uma tecla para continuar assistindo ao vídeo.

Foi uma disputa acirrada entre ambos. O placar estava empatado na rodada final e tanto Dosakyo quanto Aleksander pareciam relutantes em ir para cima. Naquele momento, qualquer erro poderia lhes custar a medalha de ouro. Tayla observou, com o coração apertado. Ela torcia para Dosakyo vencer, para silenciar de vez suas dúvidas sobre tudo o que estava acontecendo, mas ele não ganhou. Os dois trocaram golpes, defendendo o colete e esquivando-se de chutes e socos um do outro. Por fim, Aleksander encaixou um chute giratório em alta velocidade, atingindo a cabeça de Dosakyo. Seu capacete foi arremessado para longe e ele caiu no tatame, inconsciente. O juiz declarou vitória para o grego, mas percebeu que havia algo errado. Dosakyo não se levantou, nem mesmo após a equipe médica acudi-lo. O técnico sul coreano correu em direção ao tatame, gritando e então o vídeo terminou.

Com lágrimas nos olhos, Tayla preparou-se para sua última pesquisa. Seus dedos estavam trêmulos, mas ela se obrigou a continuar. Com pesar, digitou: Dosakyo Komei sofre lesão e apertou a tecla de entrada. Nos resultados, lia-se: “Bicampeão mundial de Taekwondo sofre lesão grave na cabeça”. “Dosakyo Komei é internado em estado grave com lesão cerebral”, entre outros.

Tayla deixou o corpo afundar na cadeira, com a visão falhando. O que estava acontecendo? Teriam ambos sido vítimas de um acontecimento psíquico paranormal que os deixou, de alguma forma, conectados? Colocando as angústias de lado, ela se levantou e caminhou até o quadro digital, em um dos cantos do cômodo. Ligou-o, inserindo uma senha de sete dígitos e começou a trabalhar. Primeiro fixou uma foto sua e outra de Dosakyo em cantos opostos. Embaixo escreveu todas as informações que havia descoberto, montando uma espécie de linha do tempo. O resultado final:

Tayla A. Chroe

23/12/2044 – Ferida em combate
Localização – Stadt Schaffhausen (Fronteira entre Alemanha e Suíça)
Período de recuperação – Três meses
Instituição de hospitalização – HMFAA (Hospital Militar das Forças Armadas da Alemanha)
Primeira experiência psíquica – 23/01/2046
Localização: Hamburgo
Efeitos: Ganho de habilidade psicomotora involuntário – Conexão mental?
Segunda experiência psíquica – 24/01/2046
Localização: Hamburgo
Efeitos: Sensação de afogamento - ?   

Dosakyo Komei

23/12/2044 – Trauma severo na cabeça
Localização – Zurique
Período de recuperação – Dois meses
Instituição de hospitalização – HGZ (Hospital Geral de Zurique)
Primeira experiência psíquica – Desconhecido
Localização – Desconhecido

 

Tayla encarou o quadro durante horas a fio, questionando a si mesma sobre como tudo aquilo estava interligado. Parando para avaliar, nem todas as informações dispostas podiam ser confirmadas. Ela passara três meses em coma e acordara no Hospital Militar das Forças Armadas, mas nunca havia perguntado se sofrera transferências ao longo da internação. Assim como no caso de Dosakyo, os relatos médicos disponíveis eram vagos. Tayla não podia descartar a possibilidade de ambos terem frequentado a mesma instituição hospitalar durante certo período de tempo para, posteriormente, sofrerem transferências aos respectivos hospitais nos quais acordaram do estado de coma. 
Para responder a essas perguntas, Tayla precisava investigar a lacuna de três meses, desde sua internação até sua alta. Se ela e Dosakyo estivessem envolvidos em algum tipo de experimento do governo, o hospital poderia falsificar os prontuários com um estalar de dedos. Logo, como ela podia comprovar seus questionamentos? Chegando a um beco sem saída, Tayla decidiu que precisava encontrar Dosakyo e lhe interrogar.
Este era o segundo problema. Dosakyo havia desaparecido durante a madrugada, em circunstâncias desconhecidas. Mais dúvidas ocuparam a mente de Tayla, preenchendo-a totalmente de incertezas e receios. E se ele houvesse sido sequestrado por descobrir algo que não devia? E se decidiram silenciá-lo? Com as paranoias crescendo em seu interior, ela se levantou e observou a rua através de uma fresta na cortina do escritório.
O pequeno bairro suburbano parecia tranquilo. A padaria do outro lado da pista estava cheia, como era comum em uma manhã de trabalho. No mercado ao lado, algumas pessoas faziam compras para o almoço, com nada a suspeitar. Ao olhar para a banca de jornais na esquina, Tayla sentiu um arrepio. Um homem estava de pé, lendo as notícias do dia com um copo de café em uma das mãos. Ele observava as janelas do apartamento dela ocasionalmente e murmurava de maneira quase imperceptível em seguida. Um pouco a frente, uma vã negra estava estacionada atrás de uma árvore, quase como se não quisesse ser notada.

Tayla estava à beira de uma crise de pânico, pensando em ligar para a polícia, quando se deu conta de algo terrível: seu celular poderia estar grampeado, assim como os demais aparelhos da casa. Se isso fosse verdade, os homens lá fora já teriam conhecimento de sua rápida pesquisa a respeito de Dosakyo. Sentindo-se tonta, Tayla agarrou sua carteira e o aparelho telefônico e caminhou até o corredor externo do apartamento.

Parou em frente a porta de sua vizinha, Filipa, uma stripper loira de vinte e nove anos. Bateu rapidamente, esperando durante dez minutos até que ela atendesse. Uma fresta da porta se abriu até o limite do trinco e, através dela, Tayla observou metade do rosto da vizinha, que parecia irritada.

— Tayla? O que foi? Você sabe que horas são? – Sua voz parecia cansada e restos de uma maquiagem pesada ainda ocupava seus olhos.

— Desculpe, Filipa, é importante! Por favor! – Tayla implorou, desesperada.

A porta se fechou e após alguns segundos Tayla ouviu o barulho do trinco sendo puxado. A mulher abriu passagem para ela, dando de ombros.

— É bom que seja. – Replicou. – Trabalhei até tarde ontem e você está atrapalhando meu sono.

Tayla entrou e se acomodou no sofá desgastado da sala, com uma Filipa curiosa a sua frente.

— E então? – A stripper indagou. – O que foi?

— Tem mais alguém aqui? – Questionou Tayla, antes de mais nada.

— Pelos infernos, Tayla! Estou cansada demais para fazer hora extra. – Bradou ela, ferozmente.

— Desculpe. – Replicou a outra. – Preciso de um favor.

— Um favor? – Filipa ergueu uma sobrancelha perfeitamente alinhada.

Tayla se ajeitou no sofá e encarou-a de maneira séria.

— Quanto você ganha por noite?

— Céus... – Filipa suspirou, convencendo-se a encarar aquilo como uma pegadinha. – Cem, cento e cinquenta euros... depende do movimento.

— Pois bem... eu lhe pagarei duzentos euros se você aceitar se passar por mim hoje. – Tayla disse, entregando-lhe as notas de maneira desesperada.

— Espere! Espere um pouco, Tayla. O que está acontecendo? – Questionou a mulher, encarando-a com uma expressão confusa.

— Por favor, é importante! – Implorou ela. – Por favor!

Filipa se jogou no sofá, pensativa. Uma longa pausa se estendeu até que, por fim, ela disse:

— Está bem. O que preciso fazer?

Mais tarde, naquele mesmo dia, Tayla observou discretamente enquanto Filipa atravessava a rua. Ela vestia suas roupas e usava óculos escuros. As duas tinham a mesma altura e a mesma cor de cabelo. Contanto que ela não olhasse diretamente para os perseguidores, eles não conseguiriam dizer que aquela não era Tayla.

Como esperado, assim que Filipa se afastou o suficiente, a vã negra a seguiu, mantendo-se a uma distância segura. O homem parado em frente a banca de jornal jogou seu copo de café no lixo e sumiu entre as ruas. Naquele momento, Tayla teve certeza: o jogo de gato e rato estava apenas começando.


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Notas finais do capítulo

Deixem opiniões, dúvidas ou sintam-se à vontade para bolar teorias da conspiração nos comentários! muahaha



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