De pedra e vidro escrita por Beatrice Vitanuova


Capítulo 2
O inesperado




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I.

Assim que teve condições, retomou seus afazeres. Procurava aparentar equilíbrio, ainda que fosse apenas na aparência. Sentia vergonha o tempo todo. Quem não a conhecesse, não perceberia que estava sofrendo. Continuava disciplinada. Treinava com Podrick diariamente por duas horas. Sansa a incumbira de recriar a guarda permanente de Winterfell. Estavam selecionando novas pessoas para treinar. Podrick de vez em quando a olhava de esguelha, mas não encontrava nada de concreto para se preocupar. Ele andava sempre perto dela, falando pouco, mas se fazendo presente. Brienne se apegava ao dever. Nos dias que se seguiram, trabalhou duro. Quando se deitava estava extenuada, com o corpo dolorido e cheio de hematomas. O cansaço era uma bênção. A rotina a amparava.

Não tocou mais no nome de  Jaime Lannister. Quando alguém se referia a ele em sua presença, ficava quieta. Ele era como uma dor crônica que esperamos pacientemente que vá embora. Sua atitude era  tão discreta e impessoal naquele momento, que ela parecia ter recuperado sua antiga forma. O orgulho e a decência impunham que agisse assim. Mas, desde que ele partira, ela mentalmente acompanhava o trajeto de Jaime Lannister pela Estrada Real. Já devia ter chegado. Sabia que ele estava se arriscando terrivelmente. Cersei era uma sempre uma ameaça latente, mas era Daenerys Targaryen que lhe dava um mau pressentimento. Já havia conhecido pessoas como ela. Pessoas que se colocavam como o centro de tudo, sem capacidade de sair de si mesmas e entender os outros. Ela matara o pai e o irmão de Sam Tarly porque haviam se recusado a lhe prestar vassalagem. Brienne até entendia que havia sido uma decisão de guerra. Mas ela os queimara vivos para mostrar poder. Daenerys se negara a dar-lhes uma morte misericordiosa. Ela gostava de dar exemplos... Exemplos que inibiam qualquer resistência.

Durante permanência da rainha em Winterfell, Lorde Snow olhava repetidamente para Sam Tarly, temendo que ele pudesse externar tristeza ou rancor pela rainha. Ela percebera, Sansa percebera, o próprio Sam percebera. Todos deviam entender as atitudes de Daenerys dentro do contexto da guerra. Mas a jovem Targaryen se sentira irritada com a presença de Jaime, porque ele matara o pai dela, o rei louco que queria incinerar King’s Landing  com o fogo verde. Era egocêntrica. Havia uma evidente tensão entre ela e Sansa. Porém, sabendo do apoio irrestrito de Jon Snow  à rainha, Sansa se fechara. 

A essa altura ele já deveria ter chegado. Sansa aguardava um corvo com notícias do Sul. Temia por Jon e por Arya -que partira com Sandor Clegane. Sansa tinha medo. Tinha quase certeza de que Arya iria atrás de Cersei. E Cersei devia estar sendo muito bem guardada. Quando os seus saíam de Winterfell ela se sentia impotente. Perdera o pai, a mãe e Robb. Aqueles dias estavam sendo dias de pesar.

II.

Brienne ouviu uma batida na porta. Era Zara. Usava uma roupa de lã cinzenta, remendada, mas muito limpa. Apresentava a mesma fisionomia gentil da primeira vez. Ficou aborrecida, pois desde que ela a examinara, Brienne não conseguira ainda decidir o que fazer.

—Lady Sansa pediu-me que viesse vê-la. Como está?

—Bem, como pode ver.-falou um tanto secamente,

—A senhora precisa de alguma coisa?

Ela havia evitado pensar naquilo, mas Zara e Sansa tinham razão em se preocupar. Se estivesse esperando um filho seria um transtorno. Sua família era muito escrupulosa nesses assuntos. E ela tinha consciência de que Jaime não voltaria nunca mais. E mesmo que voltasse um dia, as palavras que ele lhe dissera haviam criado um abismo intransponível. Ela não conseguia imaginar nada que ele pudesse dizer ou fazer que pudesse consertar aquele estrago. Jaime fizera uma coisa maravilhosa ao ordená-la cavaleira. Era uma realização pessoal que ele lhe proporcionara. Ele ousara romper a tradição para lhe fazer justiça, aquilo ela nunca esqueceria. Colocar aquela espada em seus ombros havia sido prova de apreço, de reconhecimento e de respeito por ela. Ou pelo menos era o que ela havia achado. Apesar de amá-lo, nunca ousara esperar nenhum contato físico. Ele a honrara, a trouxera para perto de si e depois não conseguira ficar ao lado dela. Ela não era boa o bastante. Amor e desejo genuínos, não substituíam a beleza e a ciência das artes do amor. Tinha sido tola. Aquela credulidade a envergonhava. Respirou fundo e disse o que lhe pareceu mais certo.

— Vou tomar o chá. Pode ser amanhã à noite.

Mais de duas semanas tinham se passado desde que ele partira. Não havia o que esperar. Não havia como ter um filho de alguém que não a queria. Ela teria amado o filho de Jaime Lannister, mas aquilo a prenderia a ele pelo resto da vida. E o que dizer à criança? Seu filho seria um bastardo. Se Cersei vencesse e descobrisse aquela situação, sua vida e a do bebê não valeriam nada.

Zara saiu. Brienne de Tarth ficou sentada na cama, a cama onde se abandonara a ele. Cobriu o rosto com as mãos. Sua cabeça estava doendo.

III.

Na manhã seguinte, estava treinando com Podrick quando Maeve veio chamá-la, muito aflita. 

Encontraram Sansa ao lado de Bran e Lord Royce, no salão principal. Havia uma tira  de pergaminho aberta sobre a mesa. 

—O que houve, Sansa?

Sansa parecia petrificada. Lord Royce respondeu em seu lugar.

—Um corvo com más notícias. Daenerys Targaryen destruiu King's Landing com fogo. A rainha Cersei e Sor Jaime morreram nos escombros da fortaleza. Lorde Tyrion foi preso a mando da  rainha.

Brienne sufocou um soluço. Sentiu-se mal. Uma opressão no peito. Correu para o próprio quarto. Deitou-se encolhida na cama. Não conseguia chorar. Só pensava na morte horrível que ele havia tido. Pelo menos ele morrera com ela, a única mulher que ele amara. Naquela momento não sentia nada que não fosse tristeza. Era um fim horrível. Não desejaria uma coisa dessas para seu pior inimigo. Então ela nunca mais o veria. Estava realmente acabado. O mundo parecia ter perdido toda a cor. Teve uma sensação estranha. Apalpou a coberta da cama. Estava úmida. Seu sangue descera. Não precisaria mais tomar aquele horrível caminho.


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