O Senador Rebelde escrita por André Tornado


Capítulo 20
A subir e a descer




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Heskey conheceu o astromec que era o cúmplice do seu defensor e, em última análise, do seu salvador. E que, em jeito de resumo que fecharia aquela jornada incrível, tinha contribuído para o sucesso da sua prestação na arena. Era uma unidade R2 que os aguardava junto à nave do rapaz. Estava inquieta e debitava uma barulheira enorme que alertaria uma patrulha de stormtroopers, se porventura existisse uma guarnição imperial na vizinhança, se o som da arena não abafasse os seus apitos loucos e estridentes. Saltitava sobre os dois apoios metálicos e fazia girar a sua cúpula prateada e azul como se fosse entrar em curto-circuito.

O caminho até ali fora curto. A nave estava junto a outras na vasta planície onde se situava o recinto dos jogos e passava despercebida no meio de todas as sucatas estacionadas naquele terreno onde se improvisava um espaçoporto. Havia naves de todos os modelos, desde cargueiros, caças modificados, transportadores individuais e coletivos, veículos de assalto e camuflagem.

A nave que o levaria em breve para longe de Pesak não era o típico vaivém que levava passageiros, os quais ele estava habituado a usar durante as suas missões no Senado. Analisou-o brevemente e concluiu que se tratava de um veículo de carga, equipado com um único canhão laser lateral e uma carlinga espaçosa, situada na proa, com espaço para piloto, copiloto e mais dois passageiros. Apesar das modificações que disfarçavam a sua proveniência, identificou-a como sendo do modelo YT-450, de fabrico corelliano. Na popa situava-se o amplo compartimento para acondicionamento de mercadorias. Era uma nave pesada e lenta.

— Sim, Artoo! Estamos prontos para partir e vamos fazê-lo de imediato – explicou o rapaz tentando acalmar o robot que se desdobrava numa série de silvos.

— Este é o teu androide? – indagou Heskey, arqueando as sobrancelhas. Achou-o demasiado agitado para uma máquina. Estava, notoriamente, a comunicar qualquer coisa de imprescindível que não se relacionava com o funcionamento mecânico da nave.

O rapaz fez um gesto com o braço, para o calar.

— Sim, foi ele que nos salvou na arena. Já percebi, Artoo… Espera um pouco. O meu androide, Artoo Detoo.

— Como foi que nos salvou?! – perguntou em descrédito.

O rapaz deu duas pancadas leves na cúpula do astromec que, ato contínuo, parou de girar e finalmente se silenciou.

— Ele tem um compartimento secreto. Guardei aí o sabre de luz. Na arena, quando vi onde ele estava, nas bancadas, fiz-lhe o sinal combinado e ele ejetou o sabre de luz. Apanhei-o e… pronto, tu sabes o que aconteceu, estavas ao meu lado.

— O sabre de luz fez a diferença, admito.

— Bem. Jogámos o jogo deles e ganhámos. Somos livres.

— Preferia nunca o ter jogado.

— Não tínhamos opção de escolha.

— O que está o androide a tentar dizer?

O rapaz encolheu os ombros, numa tentativa de relevar a gravidade da situação, mas Heskey percebeu que ele estava apreensivo e que se movia com um evidente nervosismo. Fez descer a rampa que abriu, ao mesmo tempo, a escotilha de retaguarda por onde se entrava no cargueiro. O androide acionou um terceiro apoio e pôs-se a rolar rampa acima, voltando aos apitos. Eram agora num tom jocoso. Heskey achou graça ao autómato – parecia temperamental.

— Diz que devemos sair de Pesak o mais rapidamente possível. Antes que mudem de ideias – respondeu o rapaz subindo atrás do androide.

Ele também os seguiu.

— Podem mudar de ideias… em relação à nossa liberdade?

— Nunca se sabe! E se o anfitrião decidir que fizemos batota por causa do sabre de luz? Anula a decisão e veem buscar-nos…

— Sabem onde está a tua nave?

— Ainda temos isto.

Heskey reparou no emblema pregado à sua roupa, na zona do peito. O losango que tinha uma coloração esbatida, a tender para o vermelho. Ele estava ferido. Naquele momento em que a adrenalina se esvaía e ele começava a sentir frio e sede, lembrou-se que tinha o tornozelo dilacerado pelo disco que guardava na bota. Arrancou o losango da sua blusa e atirou-o para o deserto que ficava no exterior. O rapaz achou o gesto dramático, mas acabou por fazer o mesmo. O seu emblema continuava dourado e refulgente.

— Agora já não nos apanham – sentenciou com uma careta.

— Talvez…

— Colocaram algum dispositivo de identificação na nave, que lhes vai permitir perseguir-nos? Não quero ter surpresas durante a nossa viagem, miúdo…

— Descansa. Sou um bom piloto, vamos conseguir sair de Pesak. E não existe nenhum dispositivo na nave, o Artoo certificou-se disso. Não foi, Artoo?

O astromec respondeu com um apito curto e estridente.

— Ah… um bom piloto…

— O melhor da Orla Exterior!

O rapaz fechou a rampa escolhendo o botão certo no painel interior. Esfregou as mãos uma na outra. O androide estacionou junto das pernas dele, com apitos mais suaves. Heskey cruzou os braços e pediu, aborrecido:

— Agora já posso saber como te chamas?

Um sorriso franco iluminou o rosto do jovem.

— O meu nome é Luke Skywalker e faço já o esclarecimento. Não consigo apenas contactar a Aliança. Eu estou com a Aliança. Vou levar-te até a uma das nossas bases secretas, pois tens algo que é nosso e que precisas de entregar em mãos seguras.

— Os planos dos compressores roubados por Lishma.

— Exatamente, senador.

— Não sou mais senador. Usa o meu nome, por favor.

— Muito bem, Heskey… Não terás um nome próprio, não? Fica estranho estar a chamar-te sempre pelo teu nome de família.

— Heskey é o suficiente, meu rapaz.

— E agora que sabes o meu nome podes deixar de me tratar assim.

— Rapaz…

— Luke também é suficiente. Vamos passar muito tempo juntos, sabes? A base secreta está num lugar escondido e não convém haver muitas movimentações nesse quadrante da galáxia para não atrair as sondas imperiais.

— O quê? – indignou-se Heskey e levantou a voz, mesmo que isso lhe custasse as derradeiras energias que o mantinham de pé e consciente:  – Quer dizer que terei de ficar uns tempos nessa base da Aliança? Não pode ser! Não, nem pensar!... Tenho de regressar a casa. Preciso de acertar contas com quem me fez isto.

— Acho que vai ficar para depois, senad… Heskey. Lamento, mas tenho instruções para te levar até Leia. Até à princesa Leia, de Alderaan – emendou. O androide piou ao seu lado.

A sua fúria esbateu-se ao escutar aquele nome.

— A princesa Leia está nessa base secreta?

— Sim. Conheces a princesa?

— Claro que sim. Era muito amigo do pai dela, Bail Organa de Alderaan.

— Está bem. – O rapaz assentiu. De seguida, perguntou-lhe: – Onde estão os planos dos compressores dos TIE?

— Presumo que não me vais levar contigo até que eu te mostre que tenho efetivamente os planos.

— Acertaste.

— Pensei que éramos amigos e que a confiança era mútua.

O rapaz sorriu-lhe e o androide apitou num tom de sarcasmo. Definitivamente, aquele robot era temperamental. Começava a achar-lhe muita graça. Preferia ter um androide espirituoso e cheio de personalidade àquele mono cinzentão e deferente que era Jotassete. De repente, sentiu falta do seu androide… a fadiga estava a baralhar-lhe as ideias. Resolveu terminar com a farsa, ou nunca mais sairiam de Pesak e ele não poderia descansar. Suspirou.

— Descansa. O disco está na minha bota.

— Céus! – espantou-se o rapaz. – Estiveste a correr de um lado para o outro naquela arena a fugir dos nwarr. O disco ainda está inteiro?

— O disco está. Quanto ao meu tornozelo… duvido.

— Por isso o losango indicava que estavas ferido. Vem comigo.

Luke puxou-o sem cerimónias para o interior da nave. O ferimento começou, pela primeira vez, a doer-lhe a sério e ele gemeu com a ferroada que experimentou na perna. Foi a coxear, com o pé fora do chão, aos pulinhos, arrastado pelo rapaz, o androide atrás deles, aos pios e silvos. Foi atirado para cima de uma mesa comprida e estreita que acompanhava um banco embutido na parede, com os estofos rasgados e manchados.

— Mais cuidado comigo, rapaz!

— Tira a bota, por favor – pediu Luke enquanto abria um armário por cima do banco.

As suas mãos hesitaram quando ele agarrou na bota pela sola. Num primeiro movimento, feito com cuidado, a dor foi excruciante e ele cerrou os dentes para não gritar. Fechou os olhos com tanta força que os sentiu a lacrimejar. Fez algumas respirações superficiais e, num sacão, arrancou a bota. Foi como se lhe tivessem separado o pé da perna com uma lâmina aguçada. Espetou o queixo para o teto da nave e urrou, de lábios colados e dentes apertados. Para não cair, apoiou as mãos na mesa. Os braços tremiam-lhe tanto como gelatina.

— Isto está feio…

Sentiu outro golpe e abriu os olhos. Luke tinha acabado de tirar o disco que se cravava na carne. Urrou outra vez. E mais outra quando o desinfetante lhe foi aplicado na ferida que sangrava. O rapaz retirou ligaduras da caixa de primeiros socorros que tinha ido buscar ao armário, fez um penso apressado.

— Não te calces. Tens aí um ferimento bastante profundo – explicou enquanto fixava as ligaduras com uma banda elástica. – Espalhei um pouco de bacta, mas não tenho o necessário para te curar e apressar a cicatrização sem marcas. Na base temos uma enfermaria bem apetrechada, lá vão tratar melhor de ti. Assim que chegarmos vais cuidar dessa ferida. Em princípio não vai infetar durante a viagem.

— Sinto-me muito melhor – murmurou ele. Levou uma mão à testa e massajou a têmpora esquerda. Começava a sentir-se tonto. – Obrigado.

— De nada, meu amigo. Agora, temos de partir.

Sem outras delongas, Luke deixou a caixa aberta na mesa e dirigiu-se para a carlinga. Pediu ao androide que se ligasse ao navegador e que lhe fosse dando as leituras. Chamou-o, dizendo que ele devia ocupar o banco do passageiro. Levava o disco ensanguentado na mão. Olhou-o, reparou que estava sujo e limpou-o nas calças.

A carlinga era apertada, mas Heskey, naquela fase, não estava preocupado com confortos. Sentou-se na cadeira que ficava nas costas daquela que pertencia ao copiloto, lugar que estava vazio, pois Luke era o único que iria aos comandos do cargueiro. Apertou o cinto. As suas mãos continuavam a tremer e mal conseguia focar os dedos. Tinha vontade de vomitar. Engoliu a pouca saliva que reuniu na boca.

— Por acaso, não tens nada que se beba?...

— Quando sairmos da atmosfera do planeta. Espera mais um pouco.

— Não tens sede, rapaz?

— É Luke, Heskey. Sim, tenho. Mas há prioridades.

— Não vais desmaiar por falta de desidratação?

— Espero que não!

— Não deves. Eu não sei pilotar uma nave. Nunca pilotei nada na vida.

Viu-o a enfiar o disco numa ranhura da consola. Num monitor aceso surgiram linhas de código que ele não se preocupou em verificar. Ligou os motores da nave, empurrando vários interruptores, a mão esquerda na manete. O zumbido ecoou no interior da cabina e deixou-o ainda mais zonzo. Heskey recostou-se e quis dormir.

Bem, a sua missão de salvar os planos estava concluída. No entanto, em vez de sentir uma alegria exultante por ter conseguido iludir o esquema sórdido montado por Omonda para o desacreditar, humilhar e até matar, estava a sentir-se desfeito e enfermo. Não era uma vitória saborosa ou sequer levemente excitante. Talvez comemorasse na base da Aliança, ou talvez nessa altura já lhe tivesse passado a vontade de comemorar o que quer que fosse.

Um solavanco maior fê-lo despertar desses pensamentos deprimentes. Pigarreou e ajeitou-se melhor na cadeira. O ardor no tornozelo estava a passar, a perna não latejava tão pronunciadamente, conseguia arejar os pulmões com respirações cada vez mais profundas. Ao olhar para a paisagem exterior descobriu o negro infinito do espaço pontilhado por milhares de estrelas, a mancha de uma nebulosa. Tinham saído de Pesak sem qualquer problema adicional.

Um cantil surgiu-lhe à frente do nariz.

— O que é isto? Se for menos do que whisky corelliano vou ficar desiludido.

— Vais ficar desiludido, Heskey – respondeu-lhe Luke, entregando-lhe o cantil e regressando à cadeira de piloto. Voltou-se para a consola e mexeu nalgumas alavancas ao seu lado esquerdo – É apenas água.

— Água…

— Isso foi uma pergunta? Continuas com a mesma mania de nunca colocares as perguntas com a entoação correta. Sim é água. O líquido mais precioso que podes encontrar no deserto. Podia ser chá de fygre, também. Outro líquido precioso no planeta onde vivi toda a minha vida.

Destapou o cantil e emborcou-o. De nada lhe valia pôr-se com esquisitices. A água estava quente, não se importou. Foi com um prazer inconfesso que sentiu o líquido escorrer-lhe pela garganta abaixo.

— Onde viveste toda a tua vida? – perguntou, limpando a boca com as costas da mão. Voltou a tapar o cantil, embora estivesse vazio.

— Tatooine.

— Não posso dizer que conheça.

— Ninguém conhece Tatooine – disse o rapaz, ressentido. – E aqueles que conhecem… querem esquecê-lo rapidamente.

— É tão agradável como Pesak?

— São parecidos, sim. – E o rapaz riu-se.

— Obrigado pela informação. Assim saberei que devo evitar Tatooine.

— De nada, Heskey.

Fez rodar a sua cadeira e encarou-o.

— O Artoo confirma que o disco é verdadeiro.

— Pois claro que o disco é verdadeiro! Não passei por todos estes dissabores, envenenado, raptado, vendido como escravo para ir jogar um desporto imbecil com uns animais enfurecidos, quase a ficar com um pé decepado, para que o disco não fosse verdadeiro!

— Aqueles que te raptaram em Corulag podiam ter encontrado o disco e trocado por um falso, na tua viagem até Pesak. Estiveste inconsciente, não foi?

Heskey acalmou-se. Inquiriu, com genuína preocupação:

— O gotal que conseguiu estes planos… Sabes o que é feito dele?

— Sei, claro. Foi o gotal que deu o alerta sobre os planos dos compressores. Lishma, não é o seu nome? Nunca me cheguei a cruzar pessoalmente com ele, seguiu para outra base rebelde depois de ter fugido de Corulag. Quando aí chegou, depois de ter escapado de uma perseguição feita por caças TIE, contou que te tinha confiado o disco e que deviam tentar encontrar-te, pois ele desconfiava de que não estavas numa situação confortável. Foi assim que se desencadeou a operação que me levou ao encontro contigo, em Pesak.

— Ah, estou a ver. Foi Lishma que acabou por me ajudar, já que eu o ajudei.

As suas contas com o gotal estavam saldadas, pensou, com um sentimento de alívio e de gratidão. Valera a pena o sacrifício… em parte, pensou a seguir, com ressentimento e enfado. Pois que agora se via no exílio, privado de regressar a casa, condenado a passar uma boa temporada num qualquer buraco da galáxia numa base rebelde.

Pensou em Onca e em Jotassete. Estariam bem, ou experimentavam dificuldades por trabalharem para si? Quando chegasse à base rebelde iria assegurar-se de que em Corulag tudo ficaria calmo e que não recaíam suspeitas adicionais sobre a sua casa. Faria como se tudo tivesse sido apenas de sua autoria – se o ithoriano já não estivesse a agir dessa forma. Ou talvez Omonda não pretendesse publicidade e escondesse a realidade dos factos, como sucedia com as notícias embaraçosas para o Império.

No navegador da nave acenderam-se duas luzes que piscavam alternadamente. Luke empurrou uma alavanca prateada e, na carlinga, as estrelas alongaram-se criando riscos brancos no firmamento. O cargueiro entrava no modo de hipervelocidade. O astromec lançou uma série de apitos que o rapaz confirmou, ao inserir e verificar novos dados no computador de bordo. Trocaram algumas palavras, o piloto e o androide e parecia que Pesak tinha efetivamente passado à história. Conseguiram escapar.

Heskey desapertou o cinto, levantou-se da cadeira, pousou o cantil no assento.

— Então, como já sabemos que toda esta infeliz história teve um final feliz, vou descansar. Como não sou piloto, serei um estorvo e acredito que prescindes da minha companhia nas próximas horas. A minha conversa poderá ser bastante aborrecida.

— És sempre assim? – quis saber Luke, curioso, espreitando-o.

— Assim, como?

— Intratável… Nem sequer expressaste alegria por saberes que o teu amigo estava bem e em segurança.

Talvez não o tivesse feito, mas pensara-o e para ele, bastava.

— Escuta, precisas de mim na carlinga? Não, também achei que não… Reparei que o banco ali dos fundos é bastante confortável e estou a necessitar com urgência de um sono para elevar os meus níveis de intratabilidade.

— Ok, vai lá dormir… – concedeu Luke abanando uma mão e voltando-se novamente para a consola de pilotagem.

Ele sacudiu os ombros. Ao passar pelo astromec deitou-lhe uma olhadela, mas a unidade R2 não apitou, nem silvou, nem soltou um rangido que fosse. Apenas rodou a cúpula, seguindo os seus passos com o seu sensor de movimento. Haveria de ser hilariante colocá-lo a interagir com a sua unidade J7, o escárnio contra o pragmatismo. A cabeça doeu-lhe e ele fez o cérebro parar de raciocinar. Estendeu-se no banco, entrelaçou os dedos por cima do externo, teve o cuidado de deixar a perna com o curativo elevada, dobrada pelo joelho e apoiada no encosto. Ainda sentia uma ligeira dor, mas era cada vez menor. Focou-se nos batimentos do seu coração e adormeceu.

Despertou sobressaltado com um solavanco que se seguira a um ruído alto, como uma explosão. Tentou apoiar-se no banco para se sentar, mas outro embate, que fez a nave oscilar, derrubou-o e ele foi parar ao chão, de bruços. Bateu com o queixo na chaparia e mordeu a língua. Praguejou num resmungo.

Um berro do rapaz fez-lhe disparar o coração.

— Artoo! Transfere mais energia para os escudos defletores traseiros!

Estavam a ser atacados e o cargueiro sacudia-se como se a fuselagem se fosse desintegrar. Heskey rastejou, para ultrapassar a mesa e assim que se conseguiu colocar em pé dirigiu-se à carlinga, apoiando-se nas paredes, para não ser novamente derrubado. Luke passou apressado por ele, no sentido contrário. Olhou para a janela panorâmica da carlinga e notou o brilho verde das explosões.

— O que é que se passa?

— Caças TIE!

Um calafrio arrefeceu-o.

— O Império? Mas por que motivo o Império está a atacar-nos? Sou um senador imperial e…

— Perfeito! – ironizou Luke e abria uma escotilha no meio do chão. – Esquece que alguma vez foste um senador, acabaste de entrar na guerra civil ao lado dos rebeldes. Tiveste, na tua posse, planos roubados ao Império que estás a entregar à Aliança. Deixaste de estar do lado deles! E é por isso que nos estão a atacar.

— Estão a atacar esta nave que pertence à Aliança. Acontece que estou aqui dentro! – rebateu ele, zangado. – E como foi que os TIE nos encontraram? Não estávamos a viajar à velocidade da luz?

— O Artoo detetou uma pequena avaria nos estabilizadores e tivemos de abrandar até à velocidade subluz. Caímos no meio de uma patrulha de rotina do Império. Identificaram a nossa nave como inimiga, pois não tinha o código oficial para atravessar este setor e pronto, foi assim que aconteceu. Agora, temos de eliminá-los para retomar a nossa viagem!

A escotilha bateu no chão provocando um eco metálico. Uma cintura iluminou-se na entrada de um poço que revelou um tubo estreito equipado com uma escada, onde cabia um homem.

— Entra! – ordenou o rapaz, agitado.

— Entro? Entro para onde?

— Lá em baixo estão os comandos do canhão. Vais disparar contra os TIE.

Apontou um dedo a si próprio.

— Eu? Nunca disparei um canhão na vida, nem sei como…

— Basta carregares no botão vermelho quando o caça estiver no centro da mira eletrónica. É muito fácil.

— Por que motivo não vais tu? Ou o teu androide?

— O Artoo não cabe aí, para além de não ser capaz de movimentar os comandos com a destreza necessária. E eu tenho de pilotar a nave!! – gritou Luke, cada vez mais impaciente. – Não vamos conseguir fugir aos TIE no piloto automático. Tenho de ir pilotar! Não te disse que sou o melhor piloto da galáxia?!

O astromec ligava um apêndice tubular a um terminal do computador, que girava loucamente, para a esquerda e para a direita. Os seus apitos formavam uma cadeia ininterrupta e ele achou que estivesse a ser insultado – mas também podia ser a pressão de tudo aquilo a fazê-lo imaginar coisas.

— E também bastante modesto.

Um rebentamento fez o cargueiro estremecer brutalmente. Heskey teve de apoiar o pé ferido no chão para não cair, abriu os braços e nessa posição recuperou o equilíbrio. Luke dirigiu-se numa corrida à carlinga, onde se atirou para a cadeira do piloto. Carregou em botões e interruptores, puxou alavancas, a nave deu uma guinada para a direita. Heskey escorregou para esse lado, sem ter onde se agarrar. O cantil rebolava por ali, num clangor irritante.

— Artoo! O que se passa com os escudos defletores?! Tenho aqui o alarme de que estamos com problemas no circuito de alimentação do combustível! Heskey, vai para o canhão!

O androide piava no que se assemelhava a um estado de pânico.

Era impossível evitar aquela tarefa. Respirou fundo, engolindo o seu orgulho e desceu pelo poço, saltitando cada degrau das escadas.

Um cargueiro contra caças TIE, tecnologicamente mais adaptados a um combate aéreo e as probabilidades estavam obviamente contra o seu veículo.

Sentou-se na cadeira, apertou o cinto. Por uma pequena janela entreviu o canhão laser, tão minúsculo, solitário, inofensivo e ineficaz, situado a estibordo. Ligou o computador e num monitor azul surgiu uma mira circular, riscada por linhas que se juntavam no centro. Agarrou-se ao comando, retirando com o polegar a pequena tampa que exibiu o botão vermelho que usaria para disparar. Estava desconfortável e zangado – talvez fosse a condição ideal para entrar naquele combate.

A cadeira era fixa, eram os controlos que se moviam com o canhão. A mira apitava e quando recebia informação do objeto que se pretendia fixar, para dirigir o tiro e destruir o alvo, o apito convertia-se numa única linha de som.

Um caça TIE passou diante da janela e da mira. Depois outro. E um terceiro.

O ataque tornou-se concreto, com todos os perigos associados. Três caças do Império contra um cargueiro vagaroso. Heskey humedeceu os lábios, fechou os olhos e tomou consciência de que iria disparar uma arma pela primeira vez, na sua vida. Bem, como o rapaz afirmara, estavam no meio de uma guerra e seria quase impossível que se esquivasse a esse infame desígnio.

A nave subia e descia, em manobras quase impossíveis. Ele sentia os balanços que o atiravam contra a cadeira, magoando-lhe as costelas. Pressionou o botão uma primeira vez, a medo. Depois percebeu melhor como se fazia e deixou de desperdiçar tiros laser, pois as munições não abundavam, dizia-lhe um mostrador do seu lado esquerdo.

Abateu o primeiro caça TIE ajudado pela sorte. Quando se apercebeu do que fizera, havia uma nuvem branca e brilhante, a despedir faúlhas, na janela pequena por onde podia ver o que acontecia no espaço. A alegria foi tão excitante, que ele se encheu de motivação para perseguir a sua segunda presa. No fim de contas, era também a sua vida que estava em jogo.

Realmente, Luke Skywalker era um piloto magnífico. Esgueirava-se por entre o par de caças inimigos num bailado perfeito, aproveitando todas as capacidades limitadas do cargueiro, cuja chaparia chiava por todo o lado, já que não fora desenhada para aquelas acrobacias. O androide auxiliava-o, mas o mérito e a perícia eram todos para o piloto.

Segundo TIE e ele socou o ar, feliz por ter conseguido a proeza.

A subir e a descer, a nave rodopiava, travava e acelerava. Luke estava a empurrar o TIE para o flanco onde se situava o canhão. O caça disparava os seus tiros verdes e já cheirava a queimado ali dentro. Heskey rosnou, agarrou o comando com as duas mãos e enviou uma sucessão de vários raios laser. O último apanhou uma das asas do TIE que perdeu a navegabilidade e começou a girar descontrolado. Desapareceu da janela e da mira.

O grito de Luke saiu pelo altifalante ao lado da mira.

— Vencemos! Pela Força, vencemos!

Heskey limpou a testa suada com a manga da blusa. Murmurou:

— Sim. Vencemos…


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
Nas planícies geladas.



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