Modus Operandi: Dias Negros de Ocultgard escrita por Nemo, WSU


Capítulo 15
Mergulho a Tales




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Se não tenho motivos para estar vivo… por que então continuar?” — Bravell.

 

Sem ter como resistir a influência de Negativo, Tales estava ajoelhado na densa escuridão, o único ponto luminoso no alto, era o brilho de uma pequena centelha, sua promessa.

Procurou adiar a dor, procurou fugir, sabia que havia algo errado, aquela ordem era errada, aos poucos foi sendo engolido pelo chão abaixo de si que já não era mais sólido e sim fluido.

Mergulhou no mar do inconsciente e se deixou levar para o fundo de braços abertos, quanto mais fundo se descia, mais esquecidas eram às memórias e mais seus sentimentos afloravam. Sinto que estou ignorando muita coisa… e já não posso mais ignorar, faz parte de mim…

As memórias apareciam dentro de fragmentos e ele logo encontrou o que procurava.

 

 

Midgard (terra), 2016, localização desconhecida

 

O vento soprava com ligeira força naquela tarde fazendo balançar o verde dos pastos, e a superfície do açude, onde um adolescente e um jovem pescavam ou melhor brigavam.

— Por que você sempre cutuca minha testa? — questionou um garoto visivelmente irritado.

— Porque, você fica fofinho. — O rapaz riu para o garoto nervoso a sua frente. — Afinal os baixinhos tendem a ficar nervosinhos.

— Baixinho é o… — Novamente, um toque na testa com o dedo indicador e médio, seguido por um grande sorriso:

— E porque você me conhece, sou o idiota que você adora, como poderia ser diferente sem minhas loucuras?

Consegui arrancar uma gargalhada do garoto. E isso era incrível para o jovem Tales, usando um boné preto, roupas mais simples e descalço, segurando a vara com a mão esquerda.

Geralmente, as pessoas tendem a achar um saco ter uma família, existem pessoas babacas ou idiotas em grande parte delas. Algumas vezes até a mais legal pode dar alguma dor de cabeça.

Mas ainda sim… algumas pessoas, valem a dor de cabeça, justamente por que ninguém é perfeito, errar faz parte de ser humano e talvez seja por isso que é interessante perdoar.

— Bem tampinha, acho que é melhor voltarmos para casa. — falou ele para o garoto de cabelos negros e ondulados, claramente estava provocando.

— Você que é um poste! O que você fez para ficar assim?

— Comi direito os vegetais, dormi as nove, tudo o que é saudável. — rebateu ele divertido. Eu odeio vegetais, aqui é leite e carne! E dormir as nove? Eu fico até as onze lendo.

— Por que está com essa cara? — questionou Hugo, a respeito da expressão matreira de Tales.

— Só estava lembrando de umas coisas. — mentiu ele, Hugo, percebeu e riu junto, estar com seu irmão mais velho sempre rendia boas risadas, ele era bobo, mas também conseguia ser sério quando desejava.

— Por que as pessoas discutem Tales? Por que elas brigam? — questionou o garoto do nada. Mas o rapaz, tinha uma suspeita, gostaria de tranquilizar seu irmão. Ao mesmo tempo algo mordicou seu anzol, e ele puxou, exibindo um peixe de tamanho médio.

— Essa é uma pergunta muito vaga e profunda. — Tales, coçou a cabeça, enquanto retirava o peixe do anzol — Eu poderia te dar respostas vagas… e pouco precisas, mas…

Escolheu bem as palavras que ia usar, estava encolhido vinha pensando muito sobre a vida:

— Você não vai entender bem agora, mas quando ficar mais velho. — Ele olhou profundamente, nos olhos verdes de Hugo — Nós vivemos apegados aquilo que temos como correto e verdadeiro e definimos nossas ideias e ideais como realidade.

Ele deu uma pausa procurando simplificar mais e relacionar com um exemplo existente:

— Cada um cria sua realidade baseado nisso, defendendo com unhas e dentes, ou nem tanto… tem os passivos. — disse ele brincalhão, tudo para que Hugo captasse melhor a mensagem e deixasse de ter medo das discussões dos pais — As pessoas brigam e discutem, para reafirmar suas crenças, ou para mostrar superioridade, é tipo uma disputa e quem ganha “está certo”, ficando com a moral da história.

— Você vai fritar o cérebro dele, Tales. — disse a irmã do meio, se aproximando por trás. — E outra, se for assim então até as escrotices são válidas? — Vestia um short jeans e uma camisa com uma caveira no centro.

— O que é correto? O que é falso? A realidade de muitos pode ser uma mera miragem vaga, ou uma prisão que os mantém na ignorância, ou um caminho… — Ele mirou no reflexo da água — Então no fim das contas… todos vivem em seus próprios mundos? Segundo suas próprias perspectivas de realidade? É até reconfortante, não acham? Cada um vive como acredita… — Ele sorriu no final, pois ambos os irmãos sussurraram um fraco:

— Sim.

— Isso é bem profundo… — observou Ana, ajeitando o cabelo, ela odiava estar desarrumada — De onde vem essas suas ideias loucas?

— Dos livros e da minha infância… por que, sempre procurei uma resposta para uma pergunta minha, uma resposta que não me machucasse muito. — Hugo pensou em perguntar que pergunta seria essa, mas Ana tapou sua boca para que ele percebesse, o aspecto cinzento e entristecido de seu irmão, perguntar só pioraria as coisas.

Por que, eles não me amam?” Ana se lembrou da coisa que sempre cortou seu coração. Tales era o primogênito, deveria ser o orgulho da família, isso se um acidente não tivesse acontecido, ele nascendo prematuro, com uma vida frágil e imperfeito em muitos aspectos. O casal de pais desistiu dele, o entregando a seus avós paternos, por serem inexperientes.

Mas a inexperiência não justificava o fato de terem deixado ele de lado, até aquele presente momento, sendo que ele sempre se importou conosco. Sempre moveu céus e terras para presenteá-los, agradá-los para ser correspondido… e eles não moveram um único dedo… Pensou Ana, consigo mesma.

Ela tinha crescido com eles até os cinco anos, até que seus pais se divorciaram, sua mãe se casou novamente e o pai fez o mesmo, praticamente no mesmo ano, nascia Hugo. E desde então, ela com seus dezesseis e ele com seus onze anos.

Eles dois tiveram o amor dos pais, coisa que ele nunca teve, Tales sempre sentiu falta disso e por muito tempo guardou sentimentos negativos dos dois, mas agora, era outra pessoa. Apesar de jamais ter conhecido esse amor, ele tinha os avós, o tio, além de ter conhecido pessoas que simpatizaram com ele, que o ajudaram em seus inúmeros problemas mesmo com a realidade dizendo que acabava ali.

— Mas e então qual o sonho de vocês meninos? — questionou ela tentando mudar o tom da situação.

— Eu quero ser policial, como o nosso pai. — disse Hugo animado. Tales, permaneceu em silêncio.

— Isso é muito legal Hugo! — disse ela — Quero ser enfermeira, sabe sempre me vi fazendo esse tipo de coisa. E você Tales, já se decidiu?

— Honestamente, cogitei essas possibilidades, mas para ser policial, bombeiro ou um soldado… é impossível com a coluna que tenho. E ainda que quisesse ser médico ou derivados, minha coordenação motora me impede. — disse ele puxando a vara mais uma vez com um peixe nela.

— Eu só queria ajudar, como me ajudaram e fazer isso de um jeito que vocês se orgulhassem de mim. — puxou a vara e desta vez, colocou-a no chão.

— Como um herói? — questionou Hugo impressionado com o desejo de seu irmão.

— Tales, isso é imaturo, mas eu já me orgulho de você! — disse Ana, colocando a mão em seu ombro, Hugo, fez o mesmo. — Eu não ligo se é na linha de frente ou não, sei que você vai dar um jeito de fazer o que gosta, você gosta disso certo, não é por outro motivo, não é?

— Me sinto útil quando ajudo alguém… me conforta e me realiza, porque me dá um propósito consistente. — disse ele ainda de costas — Por isso entre as poucas opções que me restaram, serei professor, justamente porque ensinar, não está distante de ajudar alguém.

— Mas você nos promete uma coisa? — questionou Hugo.

— E o que seria? — Ele questionou.

— Que sempre vai olhar por mim? — Foi a pergunta de Hugo.

— E por mim também! — esbravejou Ana.

Ele apenas sorriu e apontou o polegar para si mesmo em um ato de confiança e orgulho.

— Sempre! — E depois complementou se virando para eles e tocando a testa dos dois, como tinha feito outrora — Meus anões!

— Teu nariz, seu poste! — A garota empurrou seu peito de súbito, levando-o a um tombo nada aconchegante no açude.

 

 

 

Alguns minutos depois

 

— O que aconteceu com você? — questionou uma “idosa” de avental, na realidade tanto ela como o avô estavam bem conservados, pareciam ser quarentões.

— Fui atacado por uma piranha.... — disse Tales, todo enlameado.

— Mas não tem piranha ali. — disse o avô do rapaz, sentado à mesa com uma revista de agropecuária.

— Agora tem…

A irmã de Tales, chegou igualmente suja de barro, com as roupas encharcadas.

— Mas o que está acontecendo aqui? — questionou a avó sem compreender a situação.

— Seu moleque maldito… — disse batendo os dentes — Você me puxou para dentro da água…

O idoso gargalhou, agora tinha entendido tudo. A avó por sua vez, olhou para eles com cara de poucos amigos, os dois engoliram em seco, Hugo, por sua vez se acomodou ao lado do avô.

— Tomem banho, Ana você vai primeiro, depois vocês dois vão lavar essas roupas e limpar o chão que estão sujando! — ameaçou ela, complementando incisiva — E eu espero não ouvir reclamações sobre isso…

Me danei, mas não sozinho. Pensou Tales, logo depois questionando para Hugo:

— Eu trouxe as varas, você trouxe os peixes certo?

— Esqueci! — O garoto bateu a mão na testa, fazendo menção de voltar até lá, mas seu irmão fez o sinal de pare com a mão esquerda

— Eu vou e volto mais rápido!

Dizendo isso desapareceu pela porta, livrando-se de um sermão, e livrando Hugo, de algo semelhante. No fim, os dois idosos se entreolharam e sorriram, conheciam muito bem o neto que tinham. E no seu interior lamentavam.

 

 

 

Ainda naquela tarde

 

Após o banho e algumas arrumações, o trio saiu rumo a mercearia deveriam comprar mistura para a janta, afinal Ana e Hugo, vinham raramente ficar com os avós, embora Tales visitasse ambos sempre que pudesse.

Hugo com a mesma roupa de mais cedo: short azul, camisa dos Transformers e sandálias pretas. Ana, com uma jaqueta bege, calça jeans, tênis branco e um boné de aba reta. E por fim Tales de calça jeans, tênis desgastado e uma camisa de mangas compridas preta.

Na ocasião ele carregava Hugo no cangote, não era uma caminhada longa, e Hugo nem era tão pesado, contudo o rapaz começava a sentir a dificuldade de carregá-lo, mas não se entregando, conseguiu deixá-lo na frente do mercado, afinal para ele:

Eu quase não tenho oportunidades como essa, então que ao menos seja memorável. Por fim esticou-se na tentativa de aliviar a dor. Ana, seguia na frente dos dois, perto do banco onde alguns bêbados estavam sentados. Um deles esticou a mão assim que ela passou, mas um insólito tapa desviou a trajetória.

— Nem mesmo ouse! — O mais velho dos três falou entre os dentes.

— Ou vai fazer o que? — O homem se levantou, não tinha bebido muito, estava praticamente são, já que bebia para mascarar o quão degenerado era.

— Ele não vai fazer nada, mas se encostar um dedo em qualquer um dos meus sobrinhos, aí EU vou fazer algo. — falou o tio dos três, virando a esquina do bar. — Seu palhaço!

Toda a coragem súbita do homem e seu orgulho ferido, desapareceu de imediato, comprar uma briga com Evandro, era um mal negócio. Sem perder tempo pós o rabo entre as pernas e disparou na direção oposta.

Evandro era um homem trabalhador no auge da força física, alto, encorpado, vestia uma camisa xadrez, um chapéu marrom, calças jeans preta e um par de botinas.

— Sujeito sem vergonha. — comentou o dono da mercearia, surgindo de dentro do estabelecimento, logo depois se dirigindo aos “companheiros” dele — O próximo de vocês que convidar ele para beber aqui, pode tratar de procurar outro lugar também!

O tio dos três se aproximou dos sobrinhos, com seu chapéu de couro marrom na cabeça.

— A “mãe” pediu para avisar que estamos sem feijão, é da marca Taquari. — falou para Tales — Se aquele vagabundo mexer com você de novo, meta um soco bem forte na cara dele, não se contenha não.

O rapaz assentiu, mas por dentro se amaldiçoou sabia que se dependesse dele, não poderia fazer nada, já Evando continuou seu trabalho. O dono do mercado puxou assunto com ele, enquanto seus irmãos compravam doces.

— Desculpe por aquele imprestável, não vai se repetir.

— Eu sei, seu João, como vai a Amanda? — Ele tentou desviar do assunto, sabia que seus irmãos ainda estavam um pouco abalados pelo calor do momento.

— Ela está estudando no quarto, anda lendo muito. — comentou o homem — E agradeço a sua boa influência.

— Isso não é nada, a maior parte do mérito é dela. — Ele agradeceu e se dirigiu ao balcão, onde os doces estavam.

— E aí, escolheram o que vão pegar?

— Doce de leite! — Os dois falaram em um quase uníssono. Ele franziu o cenho e disse desaprovador:

— Seus frescos, bolachão é muito melhor! De combo dá até para tomar com café e leite!

— Você é um viciado em café e leite, então faz muito sentido. — disse uma voz conhecida por ele, seu melhor amigo Rodrigo. — E aí, você está legal?

— Tô ótimo, o que faz aqui? — indagou ele.

— Estava indo te visitar, para discutirmos a organização da festa de formatura, tentei te ligar várias vezes, mas você deixa seu telefone no silencioso e… — Ele olhou para os dois jovens atrás de Tales e questionou curioso:

— Esses são seus irmãos? Cara eles são exatamente como você me descreveu! — Se dirigiu a eles, estendendo a mão. — Ele vive falando muito de vocês, é um prazer conhecê-los!

Por fim, compraram a encomenda e os quatro saiam do estabelecimento, Rodrigo convidou para irem em seu carro.

— Por essas coisas que eu gostaria de ser nascido rico. — cochichou Tales para si mesmo, diante da caminhonete 4x4 a sua frente.

— E já tenho carta. — Ele disse orgulhoso, se dirigindo para o carro. Enquanto uma motoqueira estacionava.

— Viu, você podia ser como ele. — disse Ana o cutucando com o cotovelo.

— Eu sou pobre… dá não. — falou desanimado.

— Particularmente, prefiro você assim. — A motoqueira retirou o capacete, revelando uma garota de cabelos negros e longos, olhos castanhos com iluminados por um sorriso amável.

— Imaginei que seria interessante, termos uma opinião feminina. — falou Rodrigo, rindo do desespero do amigo, afinal ele sempre ficava nervoso quando ela estava por perto. Nesse momento estava vermelho como um pimentão.

Rod, por que você gosta de ferrar comigo? Pensou ele, tentando olhar para algum ponto aleatório.

— Ela é sua… — questionou Hugo, sentindo Ana beliscar — Aí!

— É uma amiga do nosso irmão, agora vamos entrar nesse carro… — Ela foi levando, Hugo para o carro, afinal, Ana sabia dos sentimentos do irmão, era sua consultora amorosa. Enquanto Rod cumprimentava a recém-chegada:

— Você anda bonita como sempre. — disse ele cortês — O que tem feito?

— Estudando para o Enem, e cantado na igreja da minha comunidade. — Ela recolheu uma mecha negra para trás.

— Ela canta muito bem… — complementou Tales.

— Mas como é que você faz para ir à comunidade dela? São quase dez quilômetros, e você não tem carro. — questionou Rod, curioso.

— A pé. — falou ele — Eu gosto mais de lá do que aqui, as pessoas são outras, fora que a mesa de confraternização é maior e melhor. — Os colegas riram juntos. De repente a costumeira e fatídica dor preencheu seu corpo novamente, Tales levou a mão na boca e segurou sua tosse o quanto pode.

Agora não droga… estava tão divertido”. Ele pensou, sentindo a dor no peito. Rodrigo e Renata, se preocuparam de imediato:

— Você está bem? — questionou Rod. Tales demorou um pouco para recobrar o fôlego:

— É minha alergia a poeira, podem ir na frente, vou ao banheiro. — Ele disse com certa dificuldade no começo, mas gradativamente a voz voltou ao normal. A casa de Tales de fato, não era longe do mercado, pois a comunidade não era grande.

Entrou no banheiro da mercearia e trancou a porta, deixou que a crise tomasse conta, segurou o peito na vá tentativa de diminuir a dor, quando viu que ia tossir, colocou ambas as mãos na boca. Seus sentidos iam sumindo à medida que tossia, mas teimou se mantendo em pé, por fim encarando a si mesmo no espelho.

Das suas mãos vertiam um sangue rubro, também dos cantos da boca, tinha emagrecido um pouco, mas poucos reparariam nisso, afinal já era magro, começou a tremer, mas não pela dor, era medo, medo de ir. Sua vontade mais profunda era chorar e se deixar levar, mas sabia que não poderia.

Vinha escondendo sua condição a dois anos, já era julgado e chamado de coisas horríveis pelas pessoas do mesmo bairro. Por isso pensava tanto sobre o que era realidade, ria sempre que podia e queria ser um herói, se apegando tanto aos seus sonhos e ideais. Desejava ao menos ser lembrando de uma forma boa pelos irmãos. E ao mesmo tempo enganar o medo dentro de si, evitando também que as poucas pessoas que o consideravam, o olhassem como todos os outros:

Pena… por toda minha vida, me subestimaram… não preciso disso, só quero ser tratado como um cara normal, sem o maldito olhar frio como se eu nem existisse… quero amor isso é pedir demais?

Seus olhos lagrimejavam, enquanto buscava o vidro de remédio em seu bolso, apanhou o frasco, mediu a quantidade adequada do paliativo e tomou num gole só.

Sua doença era decorrente de seus problemas respiratórios e com a imunidade baixa que sempre possuiu, um tipo peculiar de vasculite se manifestou, era autoimune, o prognostico de vida, era de cinco anos se tivesse sorte viveria por mais dois ou três.

Naquele momento se lembrava da sua infeliz vida, do quanto era maltratado, por não se encaixar nos conceitos de “adequado”, daquela sociedade, onde seu jeito de ser era considerado o de um bobo imaturo, onde seus gostos pelo cinema e literatura, não eram coisas de “macho”… mas era pior quando sugeriam que ele tinha problemas mentais, por todos os outros fatores já listados e suas limitações físicas.

Odiava isso, cerrou os punhos ensanguentados se olhando no espelho, e pensou com calma, tentando seguir dali com um sorriso no rosto:

Essa é a minha realidade, e não importa como… vou seguir em frente, enquanto viver. Seu aspecto frágil e desanimado, recobrou um pouco da antiga força, em um sutil sorriso acalorado ao imaginar que ainda poderia existir alguma esperança. No fim das contas… não dá para evitar as coisas que se admira”.

 

 

 

Presente mentalmente

 

Ainda no mar do inconsciente, contemplou a penumbra acima de si e viu sua luz se reacender, mais forte e poderosa do que antes, contudo havia uma última memória que gostaria de sentir. Não foi trabalhoso encontrá-la, foi só virar o rosto e se defrontou, com o dia mais doloroso, sua morte.

Eu não vou te perdoar Guardyhan, mas eu quero te agradecer…

 

 

Ocultgard, 500

 

Na mesma sala em que a fórmula tinha sido testada, a treze anos atrás, uma equipe de Guardiões, Hafnyr, Fyndr e Guardyhan, se reuniam para o experimento número dois, criar: O Draghard, o assassino perfeito, um soldado fantasma.

Tales estava amordaçado e semiconsciente numa cama, via e percebia os rostos ao seu redor, estava apavorado, mas não tinha forças para continuar lutando. Os analgésicos eram fortes, pois estava no fim, a doença estava na fase final, logo morreria.

— Não temos mais tempo para conjecturas! — falou Guardyhan exaltado — Estamos perdendo a cobaia número dois, é agora, ou nunca!

— Mas não terminamos de pensar nas proporções, do Valkgard… isso pode matá-lo, ou transformá-lo numa abominação que talvez nem você consiga controlar. — falou Hafnyr — Seu poder não é ilimitado, só o fato de você aprimorar algo vivo, vai te deixar decaído, reservar algo ao acaso…

— Eu já tenho um molde! — disse Guardyhan, liberando sua aura azulada e elétrica por volta de si. Todos se afastaram curiosos, um molde? O que ele queria dizer com isso? O Draghard seria baseado em alguém? — E ele vai com todas as especificações!

— Me desculpe.... — murmurou Guardyhan colocando ambas as mãos sobre o peito do rapaz.

— Isso é perigoso, você pode se ap.... — falou Fyndr já percebendo quem o Deus tinha em mente, mas foi inútil, a energia azulada, se espalhou pelo corpo do rapaz, de imediato foi como um choque que se espalhava do peito para o resto do corpo. Em intervalos de cinco segundos, a dor só aumentava a cada choque, e então veio a sensação de queimar de dentro para fora, a energia azulada internalizada, agora emanava dele, ficando cada vez mais forte, ele tentou gritar, mas a dor era tanta que seu coração parou.

— Para viver, é preciso morrer. — falou Guardyhan, fazendo de tudo para trazê-lo de volta.

A luminosidade da aura de Guardyhan aumentou até se tornar impossível de ver ambos, ouviam o barulho dos ossos estalando e o grito de fúria e agonia do Valkgard. A aura antes azulada, foi para uma cor mais escura, sendo negra por poucos momentos, então assumindo a cor escarlate, pôr fim a marca dos impuros apareceu em seu ombro direito:

Inicialmente, era apenas uma mancha escura e sem forma definida, mas foi se dividindo em grossas linhas negras, desenhando um losango. No processo as partes superiores direita e inferior esquerda se quebraram e deslizaram em direções opostas, ficando como saliências estreitas. O que se manteve foi o centro, alongado e triangular nas pontas.

O significado por trás da marca? Abominação.

 

Presente

 

A luz ardeu mais forte do que antes, reafirmando seu sofrimento e sua segunda chance, Tales se reergueu em sua própria mente, expulsando toda a má influência de Negativo, expurgando-o dali. Este voltou a realidade, sem compreender o que havia acontecido.

— Mas…

— Você estava certo sobre tudo Anazak, não sei se mereço perdão, e sim… fui fraco. Mas… foi me dada uma segunda chance, como a você também… — A aura do rapaz foi aparecendo em tons suaves, enquanto ele observava o soco de Bravell, sendo parado pelo caminhante.

— Como você, abraçarei a oportunidade, e diferentemente de você… vou dar o meu melhor. — A cada segundo, Anazak, odiava mais Tales, eles eram a imagem refletida um do outro, tiveram oportunidades igualmente parecidas, só escolheram caminhos diferentes, mesmo possuindo promessas, um se escondeu sob desculpas e outro ascendeu guiado pelo sonho.


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