Minguante escrita por JennyMNZ


Capítulo 2
This Isn't Working


Notas iniciais do capítulo

Vamos todos lembrar que antes das purpurinas e nuvens de algodão doce vem o drama. Não sei viver sem drama.

Aproveitem o drama.



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Lutar é difícil, Hae Soo logo descobre. Mas essa descoberta só vem até ela um longo tempo depois dela proclamar sua decisão ao Rei.

Quando as palavras dela saem de sua boca – palavras belas e bem pensadas, para quebrar qualquer resistência que ela sabia que ele já começara a erguer – ela tenta sorrir e mostrar confiança, tenta fingir que seus ombros e seus joelhos não estão prestes a ceder, tentar garantir a ele que ela vai ficar bem, que eles vão ficar bem, mas ela sabe que ele ainda não se convenceu.

Ele está surpreso e com um pouco de esperança, mas não convencido.

Isso apenas serve de incentivo para ela ficar, só para provar a ele que ela está certa.

— Tem certeza que é uma boa ideia? — A voz dele carrega uma preocupação profunda e é assim que ela descobre que ele não é que ele não esteja convencido, ele está preocupado.

Mesmo nesse tipo de situação, ele está preocupado com ela, ele está colocando o bem-estar dela antes de tudo, e ela sente sua decisão ganhar mais força. Ela não pode deixá-lo, nem mesmo se ele decidir expulsá-la.

Porque ela sabe que o instante que ela o deixar para trás, a melancolia vai apenas crescer ao ponto de tomar a sua vida. Ela vai ficar mais vazia do que está agora, e não haverá jeito de consertar os danos quando isso acontecer. 

E se, ao ficar, ela conseguir salvar pelo menos uma fração do que eles tiveram uma vez, ela poderá morrer feliz.

Eu tenho que contar para ele logo... Me desculpe, Pyeha, mas mesmo que eu tenha prometido ficar, eu não posso ficar por muito tempo.

Mas por agora, ela não vai focar no futuro triste; o presente já é devastador o bastante. Agora ela só vai focar na recuperação deles.

— Acho que já provei que minhas decisões geralmente não são boas ideias. — Ela sorri, tentando animar o clima para ele; para eles.

— Soo-yah...

— Talvez não seja uma boa ideia, Pyeha. — Ela se recusa a deixar o sorriso desaparecer, — Mas é o que eu quero fazer. Então por favor, não me deixe lutar sozinha.

— Não vou deixar. — E é a vez dele sorrir. Um sorriso minúsculo e quase imperceptível, mas que está lá, e ela se sente mais forte só de vê-lo. Ainda é um espectro do que costumava ser, mas saber que foi ela quem o deixou alegre, mesmo que só um pouquinho, é o bastante para ela.     

Vai ficar tudo bem. Nós vamos ficar bem.

 

 

Ela se sente mais leve depois que eles se separam, o peso sobre ela desapareceu por um tempo. Mas depois de alguns segundos caminhando sozinha pelos corredores do palácio, ela está sufocando novamente.

Quando ela entra no seu pequeno quarto, o coração dela é uma pedra afundando nas profundezas do oceano, e ela sente náuseas mais uma vez.

Até o ar nesse lugar é venenoso.

Ela podia pedir que alguém limpasse seu quarto. Ela podia pedir a ele um novo quarto em uma parte diferente do palácio. Ela não precisa entrar e arrumar suas coisas completamente sozinha. Mas se ela quer lutar por eles, ela sente que precisa superar tudo o que há entre eles, e é assim que ela vai começar.

Ela abre o baú e começa a arrumar seus pertences pessoais. E ela também tenta não pensar que na última vez em que fizera isso, Chae Ryung estava ao seu lado.

O primeiro item que ela tira é uma flecha, e ela a segura com força.

Quando ela estava arrumando suas coisas na noite anterior, aquela flecha foi o que desaparecera com sua decisão de partir. Ela lembra quando a segurou com força algumas horas mais cedo, quando todas as memórias dele arriscando a vida por ela inundaram sua mente e ela se sentiu mais culpada do que nunca. Ela também se lembra de quando ela se recordou de todas as coisas simples que ele costumava fazer – às vezes só para fazer ela sorrir um pouquinho – que significaram tudo na hora.

E então uma onda de memórias diferente a acertou. As de quando ela esteve disposta a fazer qualquer coisa para ajudá-lo, para que ele não sofresse.

Ela se lembrou de quando ela arriscou a ira do falecido rei Jeongjong para vê-lo depois de se ferir com a flecha, quando ela escondeu o 10º Príncipe para que ele não fosse forçado a matar o irmão, quando ela o segurou e não deixou que ele destruísse as pedras de oração em sua raiva. Quando ela cobriu a sua cicatriz e ele trouxe a chuva.

Ela nunca havia parado para pensar se suas ações teriam algum impacto no futuro. Nunca pensara demais nos paradoxos que envolviam sua estranha viagem no tempo. Depois de falhar em retornar para o Século XXI, ela aceitou as coisas como eram e simplesmente tentou dar seu melhor para continuar viva.

Mas quando ela estava finalmente à sós e com tempo de sobra para especulações sem sentido, ela ficava imaginando todos os possíveis cenários que poderiam acontecer. Se ela voltasse para o seu tempo, algo teria mudado? A falta de conhecimento dela da história de Goryeo a frustrava mais do que nunca.

Foi por minha causa? Todos os conflitos entre os príncipes. A ascensão dele ao trono. Foi por minha causa? Se eu não tivesse vindo para o passado e coberto a cicatriz dele, essas coisas teriam acontecido?

Se eu não tivesse vindo para o passado e coberto a cicatriz dele, ele viveria o resto de sua vida como um cão raivoso preso a uma coleira? 

Ele seria amado? 

Ele seria entendido?

A arrumação já tinha sido esquecida. Tudo o que restava era a flecha em suas mãos e as memórias das ações deles. (E também tinha a presença dele atrás dela, mas ela estava tentando ao máximo ignorar o efeito que queimava nela.)

Eu fui trazida para cá só para ele? Para que ele fosse quem é hoje? Para que ele fosse rei?

Talvez fosse verdade. Talvez o destino tivesse feito um esforço extra para juntá-los ao ponto de arrastá-la para um milênio diferente do que tinha nascido. Talvez tudo o que acontecera na vida dela fora uma preparação para o momento em que eles se encontrassem e tentassem apagar suas cicatrizes.

Aquilo soava um pouco ridículo e ela quase riu, mas então ela se lembrou de que sua própria presença naquele palácio seria considerada ridícula também, e continuou a criar hipóteses.

Então e agora?

O conhecimento que ela tinha sobre a vida de Gwangjong era limitado, mas ela tinha um bom resumo impregnado na sua mente desde criança. Ele sempre fora descrito como um homem perverso e de coração frio, que não pensou duas vezes antes de matar seus súditos e seus irmãos.

Um tirano sanguinário, eles o chamavam. Um menino solitário, Soo sabia.

(Um menino que matara pessoas, de temperamento irritadiço e difícil de se aproximar, mas um menino assim mesmo.)

Se eu for embora, a história vai mudar? E se eu ficar? Minha partida vai ser o que desencadeia tudo, que nem minha maquiagem?

Quando ela começou a considerar a possibilidade de ficar, ela soube que tinha tornado as coisas mais difíceis. Porque desde o início da estranha amizade entre eles, ela via nele uma pessoa que precisava de ajuda. E como aquele garotinho que quase tinha se afogado no mundo moderno em Seoul, ela pulou de vez na vida dele, sem se importar com as consequências. Sem saber que depois de abraçá-lo uma vez, ele precisaria que ela o abraçasse para sempre.

Ele precisava dela, e ela não podia deixá-lo.

Ele precisa de você, Hae Soo. 

E você sabe que também precisa dele.

Ela volta para o presente, na mesma posição que estava na noite anterior, quando decidiu ficar. A flecha repousa fria nas suas mãos, e sua respiração é instável.

Ele precisa dela, e ela precisa dele. Mas só porque ela tem bons motivos, não torna as coisas mais fáceis. Só porque ele também está lutando, não deixa tudo certo.

Ela aperta as mãos em volta da flecha e respira fundo.

Isso é por você e por ele, Go Hajin. Lute pelas coisas boas que vocês dois merecem.

Ela segura as lágrimas e volta para o baú.

 

 

A primeira vez que Hae Soo vê Gwangjong depois de sua decisão de ficar é um acidente.

Não que eles estivessem se evitando, dessa vez. Ele estava muito ocupado com seus deveres reais para poder vê-la, e à noite ela estava muito cansada para esperar por ele. Antes ela queria se forçar a continuar acordada, mas ele enviou um recado, insistindo que ela dormisse e descansasse, por conta da sua saúde.

Seus dias, no entanto, não são mais ociosos. O Rei a permitiu que retomasse algumas atividades no Damiwon, mesmo sem que ela voltasse a ser uma dama da corte. Então ela supervisiona os novos pratos e as novas misturas de chá, ensina e treina as novas meninas que logo substituirão os cargos das antigas, e as antigas que receberão novas tarefas no palácio. Ela também decide ensinar algumas delas a ler, já que ela se lembra da constante frustração que sentia quando era iletrada, e se alegra em ajudá-las a ter uma vida melhor num lugar como o palácio.

Ela faz sabão, e encontra um pouco de alívio por ter a mente repleta de assuntos cotidianos.

À noite, no entanto, a mente dela se enche de melancolia mais uma vez. E às vezes ela chora até. Ela cria o hábito de contar todas as coisas boas que aconteceram com ela durante o dia, e tenta não se sentir triste demais. Na maioria das vezes ela falha.

Quando ela acorda, ela pede notícias da família de Chae Ryung a Choi Ji Mong. E apesar do que o Rei possa pensar, ele conta tudo a ela. Ele tenta impedi-la, mas não consegue fazê-la parar de ajudá-los de todas as formas que eles precisem.

Ela se sente em paz quando ajuda os outros. Então ela ensina as damas da corte a ler e escrever, ela ajuda as meninas a criarem pratos e doces para os convidados do Damiwon. Ela cuida de Baek Ah, e faz companhia a ele durante o seu luto. Ela manda sabão para o 14º Príncipe, e espera que ele esteja bem onde quer que esteja.

O trabalho é um alívio, mas um alívio temporário. Assim como a dor nas suas juntas de quando ela trabalhava como lavadeira. Assim como as bênçãos que ela se força a contar durante a noite.

Ela não está melhorando, só está se distraindo.

Ela se sente em paz quando ajuda os outros, mas ela se sentiria melhor se outros a ajudassem.

Poderia ser pior, Hae Soo. Você poderia estar pior.

Ela diz a si mesma pelo que está lutando para poder se levantar pela manhã.

Ela prepara as refeições do Rei, embora ninguém peça, ninguém ordene, ninguém lhe dê permissão. Ela só começa a prepará-las, e ela tem certeza de que todos no palácio sabem o quanto o Rei a favorece quando ninguém a impede. 

Ela não sabe se ele está ciente que está comendo a comida dela, mas ela não se importa muito. Ela se sente feliz de saber que ele está comendo, e se sente um pouco mais próxima dele ao fazer isso, então ela não para.

Depois disso, ela começa a preparar os banhos dele também, saindo do recinto imediatamente. Não porque ela está evitando ele, claro que não. Ela só precisa conferir os sabões que deixou secando em outro quarto. Ela podia vê-lo... qualquer outra hora.

Ela não tem pressa ao escolher as ervas para o banho dele, tentando adivinhar se ele precisa de algo mais relaxante e calmante, ou algo mais revigorante para deixá-lo acordado, talvez algo medicinal para melhorar a saúde dele.

Um dia ela demora demais para preparar a mistura perfeita, e quando começa a se retirar, ela dá de cara com o Rei em seus robes de baixo.

Ela fica parada por um tempo, até que percebe que a dama de corte designada para acompanhar o Rei durante o banho se curvou, então ela a imita depois de um instante de confusão.

— Você chegou, Pyeha.

Ela o ouve rir baixinho e deseja que eles estivessem a sós, para que ela pudesse dar um sermão sobre se divertir às custas dos outros. O que ela faz, no entanto, é endireitar o corpo e tentar não sorrir depois de ouvi-lo se divertindo.

O Rei limpa a garganta, olhos ainda fixos nos dela.

— Recebi instruções para tomar um banho de infusão de ervas de vez em quando, — ele diz como se quisesse puxar conversa, e ela se sente mais do que feliz em seguir a iniciativa dele. 

— Faz bem em seguir essas instruções, — ela diz com uma voz animada, — As ervas vão fortalecer seu sistema imunológico e relaxar os músculos doloridos. — Ele sorri e se aproxima dela, e ela lamenta que ele ainda tenha que manter seu robe fechado na presença de outras pessoas, mas decide não deixar que isso atrapalhe seu momento furtivo de paz.

— Mas existem métodos melhores para relaxar músculos doloridos. — Ela encolhe por dentro e torce para que a dama da corte presente não ouça a insinuação na fala dele, ou que se ela perceber, que ela seja uma das quietas e não vá sair falando para todo mundo no palácio. 

— É uma pena que nenhum deles esteja disponível no momento, então terá que se contentar com o banho, Pyeha. — Ela ergue uma sobrancelha, implorando que ele pare de envergonhá-la e que entre logo do banho, o que ele prontamente aceita e ela se prepare para partir.

Ela queria poder ficar, mas vê-lo entrar na água, mesmo que seja numa piscina diferente, traz memórias e inseguranças que ela não precisa lembrar. Ele parece ver a incerteza e acena lentamente, sorrindo para reconfortá-la.

Ela sorri de volta, aliviada, e não pode evitar se parabenizar por ter decidido ficar.

Ela vai conseguir.

 

 

Ela não vai conseguir.

Por um tempo as coisas continuam estagnadas, e ela teme que eles vão ficar assim para sempre, sem piorar, mas sem nunca conseguir nenhum progresso.

Algumas vezes eles cruzam seus caminhos ou andam por lugares que sabem que o outro vai estar – pelo menos ela faz isso, ela ainda precisa confirmar suas suspeitas que ele também faz – esperando roubar um olhar, talvez um sorriso para ganhar confiança. 

Algumas vezes eles conversam, e às vezes eles conseguem fazer o outro sorrir. Algumas vezes eles pensam que tudo vai ficar bem. Algumas vezes eles quase podem – quase! – esquecer das coisas que aconteceram e das paredes em volta e entre eles. 

Algumas vezes as coisas entre eles ficam desconfortáveis, e eles só conseguem manter um tom de civilidade com o outro. 

E algumas vezes eles brigam. 

Ela nunca sabe como essas vezes acabam acontecendo, nem mesmo como pôr um fim a elas antes que eles vão longe demais para se arrepender depois. Ela só sabe que essas vezes acontecem, e que elas são as que mais a machucam. 

Porque são nessas vezes que ela se sente fraca, incapaz de mudar coisa alguma, só mais uma espectadora dos últimos tristes eventos de uma tragédia. Ela treme ao pensar em “últimos” e “tragédia”, mas é assim que as coisas estão entre eles agora, e o que está acontecendo agora é uma dessas vezes.

— Talvez fosse bom pra mim! — Mais uma vez, ela não sabe como essa conversa virou uma discussão. Ela nem sequer percebe que eles estão brigando por algo até ela erguer a voz. 

(Ou até ele fazer uma carranca por conta de algo que ela tenha dito. Ou até ela parar para perceber que as posturas deles estão um pouco agressivas e um pouco defensivas ao mesmo tempo. Ou até um deles sair de vez, encolerizado e irritado.)

— Não vou permitir que Jung retorne só porque você se sente solitária, — ele refuta o último argumento dela, depois de uma série de outros argumentos que ela levantara para convencê-lo a revogar o exílio de seu irmão, mesmo depois dele ter dito para que não tocasse no assunto de novo.

— Então você vai fazer as pessoas que eu amo morrer ou ir embora para eu não ter outra opção além de você? — As palavras dela são cruéis, mesmo para ela, mas no calor do momento, ela não consegue se fazer importar. 

— É isso o que acha que estou fazendo? — Ele também está com muita raiva para se magoar com a suposição dela, mas ainda fica indignado. 

— É o que parece.

— Então você pensa que sou manipulador... — Ele sacode a cabeça, cético. 

— Determinado, — ela corrige a fala dele, não tão irritada ao ponto de dizer que ele é algo inferior ao que realmente é, — Esqueceu que você já ameaçou matar pessoas por minha causa antes?

— Você achou que eu realmente faria isso?

— Sim.

— É por isso que nunca me contou quem era ele? — Ele muda o assunto completamente ao se lembrar do dia que ela o rejeitou pela primeira vez na praia, — Até agora você sempre teve medo que eu achasse que ele ia tirá-la de mim e que eu ia matá-lo?

— Não foi  por isso.

— Então você está basicamente dizendo que eu sou um animal.

— Não estou. — A raiva dela esfria quando ela vê um breve sinal de dor nos olhos dele. 

— Não? Então porque estava com medo de mim antes que eu a levasse para a praia naquele dia? Por que me mandou ir embora?

— Isso foi há muito tempo.

— Mas você fez a mesma coisa ainda ontem, — ele faz referência a um outro não tão bom momento que eles tiveram no dia anterior.

— Porque eu queria ficar só.

— Quer ficar só agora? Posso providenciar isso!

— Pyeha... — ela tenta impedi-lo de ir embora, mas ele congela pouco antes de sair e suspira.

— Você disse que ia lutar por nós, mas por que está sempre brigando comigo?

Isso basta para atiçar a ira dela mais uma vez. 

— Então você quer que eu ignore todas as vezes que você fizer algo que eu não goste? Eu não posso expressar minha opinião? Eu não posso ter minhas convicções?

— Não é isso.

— Não? Então o que é? Porque você quer tanto deixar o 14º Príncipe longe do palácio?

— Porque você quer tanto que ele volte? — Ele se vira e olha-a diretamente nos olhos. 

— Acho que já lhe dei motivos o suficiente.

— Mas nenhum deles é o verdadeiro, é?

Ela engole a saliva e tenta ficar firme enquanto ele a encara. 

— Eu quis dizer o que disse.

— Mas tem mais alguma coisa.

— E quanto a você, então? — Ela se desvia da pergunta e a redireciona para ele — Você vive dizendo que ele não pode voltar porque os ministros o veriam como fraco se revogasse o exílio, mas a verdade é que você ainda está ressentido porque sua mãe amava mais ele, não é?

Há um silêncio depois disso, e não pela primeira vez (nem a última, provavelmente) ela se arrepende do que disse assim que as palavras saem de sua boca. 

Ele não desvia o olhar, mas o efeito das palavras dela é evidente nele. 

Ela tenta dizer algo que possa recuperar o dano que ela causou, mas ele fala mais rápido, sua voz baixa e fria. 

— Eu lembro que uma vez você foi a única pessoa que podia me entender. Acho que isso é trabalho demais pra você agora.

— Pyeha... Eu não...

— Você quis dizer o que disse.

— Eu quis dizer que...

— Responsabilize-se por suas palavras, Hae Soo. Elas ferem mais que flechas.

Ele então a deixa sozinha, que nem ela havia pedido, e ela se sente infeliz mais uma vez. 

 

 

Eles se evitam depois disso. Pelo menos propositalmente dessa vez.

Ela não sabe o que dizer se vê-lo, e parece que ele não vai querer ouvir mesmo, então eles passam mais tempo sozinhos no palácio, e ela tenta usar esse tempo para tentar melhorar. Mas toda vez que ela fecha os olhos, o rosto dele volta na sua mente, e ela se pergunta se eles vão conseguir se recuperar um dia, ou se vão viver assim até o coração dela ceder. 

Ela tenta se afogar no trabalho, como ela tinha feito no Gyobang. Eàs vezes ela tenta se afogar no álcool, como ela teria feito se estivesse no mundo moderno. Mas parece que a angústia a deixa sempre na superfície, e ela sempre fica flutuando na água, à mercê das ondas ruidosas. 

Um dia ela está passeando pelo jardim, tentando encontrar um lado positivo na gaiola que ela se obrigou a viver, quando o vê. 

Ele está no mesmo pequeno mirante que o falecido rei estava quando atirou uma flecha contra ela, e ela tenta afastar aquela lembrança. 

Ao invés disso, ela foca o olhar nele, olhando à frente na direção do lago, e ela acredita que pode adivinhar no que ele está pensando. Ela se lembra de quando passou quase três anos vindo para esse mesmo lago para acalentar todas as boas memórias dele (ela ignora as ruins). 

Então ela decide que eles já se evitaram por tempo demais e se aproxima dele. 

Ele não dá sinais de que percebeu que ela chegou perto, mas ela sabe que ele está ciente de sua presença. Soo fica ao lado dele em silêncio, também olhando para o lado, uma distância de um metro entre eles. Eles ficam um longo tempo em silêncio, longo o bastante para ela ficar incomodada e ser a primeira a quebrá-lo. 

— Me desculpe pelo que disse no outro dia. — É tudo o que ela tem a oferecer para ele.

— Não precisa se desculpar.

— Mas eu quero. Não gosto de dizer coisas que magoam os outros.

— Mesmo que seja a verdade? — Ele não desvia o olhar do lago por um segundo, e ela também não.

— É possível dizer a verdade sem magoar alguém. — Ela já sabe disso há muito tempo, ela tentou viver com essa convicção, mas ela sabe que nada vai poder justificar o que ela disse, — Eu sei que está com raiva...

— Não estou com raiva.

— Não? — A surpresa é tanta que ela vira a cabeça de vez e olha para ele. 

Ele está com os olhos fechados, como se estivesse perdido em pensamentos, e por um momento ela teme que ele a esteja ignorando mais uma vez, até que ele fala calmamente. 

— Não podemos continuar brigando assim, — Ele explica brandamente, — Isto é, se quisermos que as coisas voltem a ser como eram antes. — Ela consegue sentir a última porção de esperança na pergunta que ele não chega a fazer.

— Talvez elas não possam. Talvez isso seja o que o palácio faz, envenena todas as relações ao ponto de deixá-las irreparáveis.

— Você disse que não ia mudar.

— Eu não mudei. As circunstâncias à minha volta mudaram, minhas responsabilidades mudaram, minhas prioridades mudaram. — Ela engole em seco, a conversa indo para um caminho diferente do que ela esperava, — Minhas opções mudaram.

Ele respira fundo, entendendo o que ela quer dizer, e reconhecendo o mesmo padrão se repetir nele mesmo. 

— Por que sempre damos um passo pra frente, e depois dois para trás?

Ela desvia o olhar dele, voltando os olhos para o lago na frente deles.

— Você quem deveria me dizer isso, Pyeha. — Ela já desistiu de encontrar uma resposta. 

— Toda vez que você olha para mim, você vê um monstro. — A voz dele não carrega emoção alguma.

— Não. Não é isso.

— Toda vez que você olha para mim, você vê o homem que causou a morte de Chae Ryung. 

— Sim. Mas não é isso.

— Então o que é?

— Eu não sei, — ela responde angustiada, — É difícil de explicar.

— Não deveria ser.

Ela reúne sua coragem e tenta resumir todos os eventos que vinham acontecendo desde que ele se tornou rei, que começaram a construir, lentamente, uma parede entre eles com uma única sentença.

— Você está virando outra pessoa. — Ela tenta não chorar. — O trono continua a te afastar de mim, e eu temo que você mude um dia.

— Não é assim que funciona.

— Eu já vi muita gente mudar, Pyeha. O falecido rei Hyejong ficou louco, o 8º Príncipe cobiçou o trono, Chae Ryung cometeu traição, Woo Hee pulou da muralha... — A voz dela falha e ela para de falar.

— Talvez eles não tenham mudado. Talvez você só não os tivesse conhecido de verdade. 

A teimosia dele nunca deixaria que ela o convencesse dos perigos da sua posição para o caráter dele, e ela sabe disso. Ela se lembra de quando Oh Sanggung tinha dito a ela que ela não poderia mudar ninguém, e ela tinha esperado que o mesmo se aplicasse ao trono. No entanto, ela não consegue pôr as inseguranças de lado depois de tanto tempo de discórdia entre eles.

— Eu conheço você de verdade?

A pergunta paira no ar por um tempo, até que ele responde à pergunta dela com outra pergunta.

— Você ainda me ama?

Ela se pergunta se ele sabe que, à essa altura, ela não poderia jamais deixar de amá-lo.

— Sim. Mas amor não é o bastante.

— Não, não é.

— Então amor não é o que precisamos, — ela proclama a verdade que eles vinham tentando evitar, mesmo que o machuque, mesmo que a machuque. Nessa situação, não há como a verdade não machucar nenhum deles.

Ele então a deixa sozinha, embora dessa vez ela não tenha pedido, e na verdade esperava que ele não o fizesse. E ela se sente melancólica mais uma vez, mesmo que a visão das costas dele se afastando dela tenha se tornado familiar para ela.

É aí que Hae Soo descobre. Lutar é difícil.


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Notas finais do capítulo

Título do capítulo vem da letra de NF, link para os curiosos musicais -> https://youtu.be/II48_l3iOHw
e que basicamente me fez encher a história com crises emocionais.

Opiniões são bem-vindas.
Elogios sempre aceitos.
Críticas apreciadas.

:)



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