Shadow escrita por Course


Capítulo 2
I - Abandonada


Notas iniciais do capítulo

Eu pretendo não levar muito tempo para postar os capítulos, então vocês não ficarão muito tempo sem nenhuma atualização.

Entretanto, posso levar um tempo a mais algumas vezes para melhorar a escrita, modificar alguma parte do enredo ou, simplesmente, reescrever tudo.

Aproveitem o capítulo a seguir!



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Abandonada

Eu sabia que era errado, que, na visão aparente da minha família, era extremamente inapropriado e indecente, mas, ainda sim, não conseguia me conter. Principalmente quando Dem lançava-me olhares furtivos no salão principal, ousando desafiar-me a quebrar, mais uma vez, as regras impostas meses atrás por meus pais.

Mas cá estou eu, esgueirando-me por um dos aposentos menos frequentados, na companhia quente de um dos guardas da minha família, permitindo que ele se deleita com meu sangue após termos mais um momento que quase nos levava a um outro patamar.

― Felix hoje quase a pegou. ― A voz de Dem notoriamente ainda estava aveludada, apesar de já estar distante do corte pequeno e discreto que eu fizera abaixo do meu ombro, dando-lhe a liberdade para se alimentar de meu sangue.

Sua cabeça repousava na parede, enquanto eu ainda estava montada em suas pernas esticadas no chão da sala do calabouço vazio e escuro que usávamos vez ou outra para nossos encontros. Para Dem, o meu sangue era mais do que um simples alimento. Em sua explicação, ele afirmava que era quase um bálsamo para os desejos que aflorávamos em seu corpo quando estávamos juntos, mas, não podíamos ir além.

― Se ele nos pegar, talvez possamos o convidar para se divertir também. ― Sussurrei, enquanto brincava com a gola de sua camisa aberta e deixava um sorriso malicioso escapar de meus lábios.

Eu não era esse tipo de garota, mas o que eu vislumbrava nas reações dele praticamente forçavam-me a tomar esse tipo de atitude. Neste dia, a mão gelada de Demetri voou em direção ao meu pulso, interrompendo meus movimentos instantaneamente e me forçando a olhar em direção aos seus globos tão vermelhos quanto o vestido que eu usava.

― Não sou adepto a dividir o que é meu, Eve.

Eu não deveria gostar, contudo, sentia-me poderosa quando pegava Demetri reclamando-me como exclusivamente sua. Principalmente após a recusa de meu pai Carlisle a permitir que continuássemos juntos antes da minha mudança oficial para a condição vampírica, mesmo que se aproximasse cada dia mais da data marcada.

― Eu sei que não. ― Meu sorriso continuava em minha bochecha, apesar da carranca expressiva em seu rosto ― Você sabe que eu também não aprovo dividir o que é meu, Demetri.

Seus dedos relaxaram em meu punho e permitiu que deslizasse por meu antebraço, rumo a manga de meu ombro fora do lugar que, agora, abaixo de meu busto, permitia que meus seios respirassem ar puro, livres do corpete apertado que outrora o modelava. Puxando o tecido para cima, ele deu-me o sinal de que nosso momento precisava ser interrompido, como, infelizmente, sempre acontecia.

Forcei meus joelhos para erguer meu corpo, apoiando-me na parede e terminei o trabalho dele, colocando o tecido corretamente sob meus ombros e virando-me de costas para Dexter, que já se colocara de pé, num movimento rápido, e ajudava-me, laçando o corpete e o prendendo, com um laço ao final, de forma firme e segura.

Quando pensei em me virar em sua direção, fui interrompida ao observá-lo, próximo a porta de saída, do outro lado da sala.

Sem qualquer palavra, ele a abriu e afastou-se num outro piscar de olhos, deixando-me sozinha.

Não era um comportamento incomum para ele, mas não significava que eu conseguia suprimir os sentimentos de abandono logo após perceber que eu estava sozinha em uma sala suja e escura. De certo modo, eu sabia que a remota possibilidade de Felix se unir a nós em nossos encontros o incomodou drasticamente. Demetri nutria certo rancor com minha amizade inocente com Felix, pois sabia que o mais forte dos guardas possuía uma espécie de sentimento em formação por mim. Por mais que eu explicasse que era apenas devido ao fato de eu ser a filha de uma das maiores representações de liderança ali e por isso havia o encanto nascendo em Felix, Demetri não aceitava ou concordava com meus raros momentos de socialização com o outro.

Forcei-me a engolir o aglomerado de sensações negativas que crescia em meu peito só de imaginar que poderia passar por mais umas das crises de ciúmes cansativas e as suas investidas em me ignorar completamente, e segui o caminho rumo aos corredores oeste da fortaleza.

Enquanto vagueava sem rumo, peguei-me, novamente, fazendo planos para meu último dia antes de transcender para o mundo vampírico. Definitivamente, aproveitaria para apreciar a rua e o Sol com liberdade espontânea, claro. Além de solicitar o melhor buffet, com todas as minhas comidas prediletas e, decerto, forcaria meus pais a me acompanharem, saboreando mais ainda suas feições de nojo para o que eu comia, enquanto me acompanhavam com suas taças de seus alimentos naturais. Ao anoitecer, antes da cerimônia, ficaria com Demetri e, uma última vez, lhe presentearia com meu sangue. Os planos eram tão em evidência e vívidos, que sequer imaginaria que ainda faltava uma longa semana para que meu pai mordesse meu pescoço e levasse consigo minha condição humana. É claro que ainda não sabia qual dos dois o faria, mas pouco me importava. Meu único pedido era para que um dos dois me presenteasse com a nova vida, contragosto ao meu tio Caius e Demetri, já que ambos almejavam igualmente por terem a chance de provarem meu sangue, cada um, certamente, recheados de seus próprios motivos.

― Perambulando pelos corredores sozinha de novo, Eve? ― A voz sórdida de Sulpicia soou pelo corredor, dando-me a sensação de ouvi-la ecoar por toda a fortaleza Volturi ― Quase não dá para notar que você estava, mais uma vez, esfregando-se em Demetri no calabouço.

Virei meu corpo levemente, sentindo meu vestido balançar com meus movimentos, enquanto direcionava minha visão à mulher de cabelos tão claros quanto a prata e um desprezo notável em suas feições.

― Seguindo-me pelos corredores de novo, Sulpicia? ― Retribui sua fala, reorganizando-a afim de provoca-la ― Se tivesse ficado calada, eu não teria percebido que você mantém seu complô com o tio Caius com seus planos de destruição da minha vida.

― Definitivamente, eu poderia cortar sua língua pela audácia de suas palavras, garota.

― E meu pai a mataria por tal feito. ― Rebati, incapaz de deixar escapar um sorriso só de imaginar o que ele faria à ela.

― Carlisle jamais faria mal a qualquer um aqui dentro. ― Sulpicia deu um passo em minha direção, ameaçadoramente, permitindo que suas feições permitissem que eu visualizasse toda sua ira hostil retraída na sua musculatura esbranquiçada.

― Eu não disse que seria Carlisle. ― Cruzei minhas mãos em frente ao meu corpo e deixei que descansassem na base de minha barriga, de forma preguiçosa ― Se me der licença, eu devo ir para o salão principal onde, com certeza, serei bem-vinda.

Voltei-me de costas para ela, permitindo que meu cabelo voasse no ar, feito uma cascata escura, enquanto caminhava para longe dela que, agora, dissipou sua raiva facial, deixando a indignação tomar a frente.

― Você jamais conseguirá colocar Aro contra mim. ― Foram as últimas palavras dela, antes de ver um borrão passar a minha frente e desaparecer ao fim do corredor.

O fato de Sulpicia ter me encontrado no corredor fora apenas um acaso e eu tinha total noção disso. Jamais, nenhum vampiro, ao longo de minha existência, conseguia me rastrear com facilidade, ainda que eu estivesse apenas perambulando pelos corredores da fortaleza. Mesmo que ela gostasse de levar a fama por nosso encontro e eu permitisse isso por breves instantes, ambas sabíamos que nosso esbarrão fora apenas um acaso. E este efeito que eu possuía para me resguardar de qualquer atitude dos vampiros expandia-se para todos os outros efeitos causadores da transformação vampírica, como o poder de meu pai, Aro, de ler todos os pensamentos, desejos, vislumbres de vida e momentos vividos com um simples tocar de mãos, por exemplo. A sua frustração quando tentava domar meus pensamentos contra minha vontade era, no mínimo, respeitável. Claro que eu sofri algumas punições por minha tentativa de manter minha vida e pensamentos exclusivos à minha cabeça, mas sempre tive ajuda de meu pai Carlisle para proteger-me de qualquer punição agressiva demais. Não que, de fato, meu pai Aro tentasse algo assustador para me punir, já que nós dois tínhamos uma ligação extraordinária, especial e secreta, mas, ainda sim, Carlisle sempre esteve ao meu lado para os amparos, se necessário.

Pensar nos dois, fez-me refletir sobre a vida miserável de Sulpicia na fortaleza Volturi, desde a chegada de meu pai Carlisle e sua permanência em nosso território. Eu não vivenciei os piores momentos da relação Sulpicia-Aro-Carlisle, mas meu tio Marcus, em um dos raros momentos de conversas privadas, revelou-me que Sulpicia me desprezava exatamente porque minha presença ali era o motivo da permanência de meu pai Carlisle em nossa casa. E ela, como fora anteriormente a parceira principal do líder maior, foi motivo de piada por não conseguir cativar a atenção por tempo o suficiente de meu pai Aro. A história era que, no momento em que ficou impossível permanecer na surdina a relação entre meus pais, Carlisle optou por afastar-se, temendo que Sulpicia provocasse uma rebelião ou qualquer coisa do tipo para afastá-los ou desgastar o poder de Aro. E, no dia final da tomada de decisão da liberação dele, eu surgi em um quarto qualquer, chorando de fome e fui resgatada pelo lindo e loiro vampiro que, hoje, eu chamo de pai.

Eu amava o fato de ser um dos laços que unia ambos os homens mais importantes da minha vida, principalmente por saber que meu pai Carlisle, tendo a opção de abandonar a fortaleza e viver sua vida de forma livre, optou por ficar e cuidar de mim, tornando-me sua filha e compartilhando minha guarda, educação e afeto com Aro. Aos dezessete anos, eu vivenciava a melhor experiência humana possível, apesar de jamais saber o que os humanos consideravam como melhor, já que os únicos de minha, até então, raça, que eu conhecia, eram os personagens rotineiros e revezáveis que rondavam a nossa volta, promovendo a limpeza e realizando os trabalhos simples e sujos solicitados por minha família e a guarda.

Eu estava me aproximando dos corredores extremo-leste, quando pude ouvir, atrás das portas fechadas do que eu já sabia ser o aposento de meus pais, o que parecia ser o meio de uma discussão.

E você a deixará aqui, sem nem ao menos pensar na repercussão que terá em sua vida? ― Era Aro grunhindo, claramente revoltado com alguém ― Depois de todos esses anos, persiste nesta ideia ilógica de abandonar o nosso estilo de vida?

Ela poderá vir comigo, se assim desejar. Mas, entenda, Aro, não há mais o que ser feito. Minha decisão já foi tomada e Marcus e Caius aprovaram-na. Eu tenho permissão para ir. ― As palavras pertenciam a Carlisle, mas eu não queria tê-las ouvido.

Uma penumbra terrível instaurou-se em meu coração e senti meu mundo ruir debaixo de meus pés. Ele ia nos abandonar.

Você não tirará Eve de mim. ― Em resposta, Aro pareceu lançar algo no quarto e causar um estrondo alto no momento em que o objeto se chocou com a porta de madeira.

Ela em breve será adulta o suficiente para decidir com quem ficará. ― Carlisle não parecia agressivo neste momento ou em qualquer outro, apenas autoritário e ciente do que falava a cada instante.

Eve ficará com os Volturi. Ela é minha filha.

― Nossa filha, você quis dizer.

Você quer ir e nos deixar? Ótimo! Mas Eve ficará aqui. Caso contrário... ― A cada instante sua voz parecia mais baixa e cruel, forçando-me a me aproximar da porta e tentar ouvir o que quer que fosse a ameaça que ele faria ao Carlisle, contudo, fora impossível ouvir o restante da frase, causando-me um tremor por todo o corpo só de imaginar o que havia sido dito.

Você não faria isso. ― Pude ouvir, mesmo baixo, Carlisle pronunciar as palavras, com relutância e temor.

Havia Aro ameaçado a vida de Carlisle? E, desde quando, os dois brigavam com tanto afinco? Quando foi que Carlisle decidiu nos deixar, a ponto de obter a permissão da liderança de Marcus de Caius? Por que ele iria me abandonar, tão perto da minha transformação? Eu havia feito algo de errado? Eu havia falhado com meus pais?

Antes de cogitar refletir sobre qualquer resposta, fui pega de surpresa quando uma das grandes portas a minha frente fora aberta e observei Carlisle sair, segurando em uma das mãos uma mala grande.

Definitivamente, ambos fomos pegos de surpresa ali e notei uma dor tremenda cortar seus olhos enquanto ele me observava atentamente.

― Você vai nos deixar... ― Num sussurro dolorido, permiti que as palavras escapassem de meus lábios.

― Sinto muito, querida, mas não há mais nada para mim aqui.

A dor que suas palavras me causaram foram grandes demais para que eu pudesse suportar silenciosamente. Sentindo as lágrimas jorrarem de meus olhos, fui capaz de unir forças para rebatê-lo.

Eu ainda estou aqui, papai. Sua filha. Eu. ― Lancei meus pés para frente e forcei meus braços a moldarem um abraço entorno de seu tronco duro e gelado ― Por favor, não nos deixe!

Um beijo breve brotou no topo de minha cabeça, antes que eu pudesse senti-lo fazer movimentos para me afastar dele.

― Quando me instalar fixamente, enviarei a você uma carta para que possa me visitar. Prometo que sempre manterei contato. Você já é uma mulher, Eve, e precisa se preparar para decisões difíceis e adultas. Sua era de infância já passou.

Apesar de sentir um leve frescor por acreditar que ele me enviaria notícias e ainda me queria em sua vida, senti-me traída por não ser capaz de mantê-lo por perto e que minha presença não era mais o suficiente para fazê-lo ficar. Ele me amava, mas não o suficiente.

Embora o brilho em seus olhos estivesse ali, claramente revelando que choraria se fosse capaz, Carlisle permitiu-se me encarar apenas mais uma vez, antes de começar a caminhar para longe, carregando consigo sua bagagem e parte do meu coração.

Vi-o partir, chorando todas as dores possíveis ao lado de meu pai Aro, que agora acomodava-se ao meu lado, sem me oferecer um abraço, um afago ou um ombro para que eu chorasse, incapaz de me mover um centímetro sequer para interromper seu partir.

E ali, naquele instante, aprendi a dura lição de que, nem sempre, seremos capazes de manter o que amamos para nós, mesmo que lutemos, mesmo que choremos e sofremos. Algumas coisas foram, simplesmente, feitas para partir.

 


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Notas finais do capítulo

Ah, eu queria não ter que separar Eve do Carlisle, mas há uma explicação sombria para o fato dele ter optado por mantê-la com os Volturi.
O que vocês imaginam que seja?



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