O despertar da Herdeira escrita por Course


Capítulo 3
II - O que há em um nome


Notas iniciais do capítulo

Olá, leitores queridos!

Mais um capítulo fresquinho saindo do forno, para complementar o anterior.

Espero que curtam essa amizade nova que está se formando e preciso dizer que um dos meus personagens favoritos aparecerá neste capítulo.



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O que há em um nome

 

 

Dois pequenos seres surgiram em nossa frente, rindo bem alto de nosso susto.

Um deles era um anão com cabelos e barba negras, portando de um colete e calça de couro, junto de uma camisa branca esfarrapada que cobria seus braços pequenos. Carregava o que parecia ser uma mochila de pano pesada, contendo utensílios importantes para ele, já que estava bem amarrada em seu corpo. Uma grande mecha acinzentada marcava parte de seu bigode, bem como a extensão de sua barba que caia em sua barriga arredondada. Ao seu lado, havia um texugo negro com duas manchas brancas nas laterais de seu rosto, seguindo uma trilha até o fim do pescoço e uma ao topo do cabeça. Ele estava de pé em suas patas traseiras e parecia tentar conter as lágrimas que escapavam de seus olhos de tanto rir de nós.

― Vejam ele, como ficou assustado! ― O texugo tentava proferir entre pequenos bufares de ar entre as risadas, enquanto o outro ao seu lado prosseguia roncando alto de forma desgrenhada e desrespeitosa.

Um suspiro pesado era audível de Caspian, que aos poucos tirou a mão de perto de mim e relaxou seus músculos.

― São vocês, é claro. ― Resmungou o rapaz ao meu lado antes de se voltar para mim ― Fique tranquila, são amigos. Esses são Nikabrik e Caça-trufas. Foram deles que te falei há pouco.

Tentei não parecer tão surpresa por sentir em meu subconsciente que a simples aparição de um anão e texugo falante não me são tão surpreendentes assim, então simplesmente acenei com a cabeça e forcei um breve sorriso.

― Olhe só, Caspian! ― O Texugo deixou escapar um arfar em surpresa ― Veja quem você encontrou na floresta.

O olhar do anão endureceu quando finalmente ele me encarou e percebi que havia algo de errado comigo.

― Sim, essa é a... ― O rapaz deixou a frase morrer no meio do caminho, olhando-me interrogativamente.

Encarei os três que aguardavam por um complemento à frase de Caspian e senti a falta de ar voltar e meus pulmões arderem.

― Eu sou... hm... ― Encarei o chão esverdeado, buscando algum sinal de luz ou qualquer outra interrupção capaz de me ajudar em um momento como esse.

― Caspian, quem é ela? ― o anão questionou furtivamente e de forma grosseira ― É uma telmarina?

― Ora, bolas, Nikabrik, não vê que ela não é humana? Ela é uma fada! ― Novamente o animal tornou a falar e surpreender-me com sua revelação ― Perdoe meu amigo, senhorita. Faz anos que não vemos nenhum de sua espécie em nossa floresta. Achamos até que foram extintos por conta do domínio dos telmarinos. Bom, eu sou o Caça-trufas, como o Caspian ali me apresentou. Estou a seu dispor. ― Fazendo uma breve mesura, aproximou-se um pouco mais de nós, afim de fechar um círculo formado por um estranho grupo de quatro.

Eu poderia realmente fingir que prestei muita atenção no que ele dissera, contudo, após sua revelação bombástica, tudo o que eu queria fazer era sair correndo e me esconder deste mundo estranho.

― Esse é o momento em que ela deveria dizer seu nome, não acham? ― Nikabrik grosseiramente prosseguiu.

O jeito como ele deixava a palavra ela escapar de seus lábios me parecia muito familiar. Havia uma forma peculiar na sua expressão de palavras, diferente de Caça-trufas e Caspian e eu sentia-me mais próxima do seu linguajar do que o dos outros. Ela em sua boca soava como Ella e isso causava calafrios em minha espinha, como se eu reconhecesse o som daquela palavra de algum lugar.

Seria esse meu nome? Ella?

― Ela é assim mesmo, um pouco tímida no início. ― Caspian cortou-me de meus pensamentos ― Eu salvei sua vida e não ganhei nem mesmo um obrigado.

Encarei-o por um breve instante, percebendo que havia realmente cometido um erro com o rapaz mais cedo, entretanto, eu possuía uma justificativa.

― Eu achei que você fosse um dos soldados telmarinos. ― Defendi-me prontamente.

― Ah, nós também, senhorita. ― Caça-trufas concordou comigo, lançando-me um sorriso afetuoso ― Mas fique tranquila quanto à estima deste jovem rapaz. Apesar de ser um telmarino, ao que nos aparenta, possui boas intenções com nosso povo.

― Ele contou que pretende se reunir com o conselho amanhã a noite. ― Revelei olhando mais amistosamente para o texugo.

― Oh, sim! Falando nisso, Caspian, conseguiu recolher as pedras na beira do rio para ascendermos nossa fogueira de pernoite? ―  Texugo então voltou-se ao rapaz ao meu lado.

― Claro. ― ele concordou prontamente, retirando do bolso de sua calça duas pedras arredondadas ― Foi logo assim que encontrei a segunda que a vi caindo na cachoeira.

― Oh, céus! ― Caça-trufas virou-se completamente para mim, analisando-me milimetricamente ― Foi uma queda muito alta, senhorita. Por acaso se feriu ou...

― Só estou um pouco fraca. ― Decidi cortar seus esforços e preocupações.

― Há um corte no braço dela. ― Notou Nikabrik enquanto sentava-se em uma pedra disposta ao nosso redor.

― Deixe-me ver isso, sim? E, enquanto isso, Nikabrik e Caspian prosseguirão juntando os galhos para nossa fogueira. ― O texugo ofereceu sua pequena mão para que eu a pegasse e assim o fiz, confiando em meus instintos que garantiam-me que o Caça-trufas era amigável.

Ele guiou-me por uma trilha pequena na floresta, até nos depararmos com uma clareira já com alguns galhos no centro do gramado ali presente.

Ele sentou-se próximo ao que parecia ser sua mochila e sinalizou para que eu o acompanhasse.

― Sabe, não fique zangada com Nikabrik. Anões negros não confiam muito nas fadas, se é que me entende.

― Não, eu não entendo. ― Fui sincera e espontânea ao deixar as palavras escaparem enquanto olhava curiosa para meu novo aliado.

― Bom, é que... Nikabrik fez parte da antiga Nárnia e, bem... ele sabe das histórias dos ataques telmarinos ao nosso povo e que os faes simplesmente nos abandonaram depois do desaparecimento de sua princesa e dos reis e rainhas de Nárnia.

Algo naquela história me incomodava, mas eu não sabia bem o quê.

Ele aproximou-se de meu braço ferido com um pequeno tecido branco com algum líquido que ele despejou. Apalpou a ferida, limpando o sangue seco e, em seguida, colocou sua mão apoiada, ainda com o pano, na ferida, enquanto enrolava uma longa tira em torno de meu braço.

― Mas, só de saber que temos uma de seu povo indo se reunir conosco na clareira no grande conselho... Uau! Isso é tão bom de se saber. Quantos vocês são? Imagino que não sejam tantos atualmente, a não ser que tenham descoberto uma forma de viver depois que o Jardim das Montanhas Altas fora atacado.

Eu não fazia ideia de nada do que Caça-trufas falava e sabia que a dor de cabeça que surgiu em mim era devido à grande pressão que eu estava fazendo para formular alguma ligação de suas palavras com a minha realidade.

Olhei para o animal ao meu lado que me encarava ternamente, aguardando que eu respondesse a sua indagação.

― Talvez você seja como Nikabrik e não confie muito nos outros, não é mesmo? ― Gentilmente, ele deu um laço no tecido em meu braço, para firmá-lo sem seu apoio e voltou-se a sentar-se ao meu lado ― Não há o que temer conosco, senhorita, isso eu posso garantir. Não somos como os animais irracionais que talvez a senhorita tenha encontrado na floresta. Nós ainda mantemos nossa essência narniana. E Caspian, apesar de um telmarino, é um bravo guerreiro que veio nos salvar.

― Caça-trufas... ― comecei, deixando meus olhos caírem para minhas mãos que agora repousavam sob o tecido de meu vestido ― Se eu lhe contasse um segredo, você conseguiria guardar tão fundo em sua alma e não contaria para mais ninguém? ― Indaguei, sem coragem para encará-lo novamente.

― Claro que sim, donzela. Guardaria com minha vida seu segredo. Palavra de honra. ― Ele garantiu.

E era esse o momento. Eu sentia em meu coração uma conexão com aquele pequeno ser ao meu lado e sentia que suas doces e ternas palavras não eram para me causar medo ou frustração.

― Há dois dias, eu despertei na floresta, no que parecia ser um ninho, repleto de flores e borboletas ao meu entorno. Não consigo lembrar de nada antes disso. Absolutamente nada. Vim buscando uma forma de descobrir quem eu sou ou, até mesmo, o que eu sou, mas... ― suspirei, frustrada ― Não consigo recordar de nada, até o momento em que acordei. Se não fosse você a me falar que faço parte do reino das fadas, não saberia me distinguir dos homens como Caspian.

― Oh... ― Ele deixou escapar, inicialmente ― Bem. Isso explica a cara de pânico que você fez quando perguntamos o seu nome. ― Ele sorriu, terno.

― Eu acho que meu nome é Ella. ― Contei, por fim ― Quando Nikabrik fala ela, eu encontro algo em comum em seu sotaque com o Ella.

Nikabrik demorava para pronunciar o L na palavra e, por este motivo, eu sentia que Ella e eu tínhamos algo em comum.

― Bom, então a chamaremos assim até que possamos descobrir seu nome verdadeiro, sim? ― Ele repousou uma de suas pequenas mãos em cima das minhas e olhou-me ainda esbanjando afeto ― Talvez, no conselho, realmente encontremos algum dos Fae e, assim, ele poderá nos ajudar com seu problema.

― Só, por favor, não conte à Caspian. ― Sussurrei, suplicante.

― Sim, você tem minha palavra. ― Afiançou novamente.

Não tivemos tempo para conversar mais sobre o assunto, pois Nikabrik e Caspian logo retornaram de sua curta expedição com galhos em seus braços que foram depositados ao centro, junto dos outros.

― A noite estará fria, então seria bom conseguirmos conservar o máximo que pudermos do uso da fogueira. ― o texugo ergueu seu pequeno corpo, afastando-se de mim enquanto seguia até as costas do anão e retirava de lá alguns materiais.

― Está se sentindo melhor? ― Caspian sentou-se ao meu lado, enquanto retirava um pequeno cantil da lateral de seu corpo e bebericava o líquido que continha dentro.

― Acho que só preciso descansar um pouco e logo estarei recuperada totalmente. ― Assegurei-lhe, tentando não soar grosseira.

― Bem, Nikabrik e eu começamos a sugerir alguns nomes para você, já que não nos conta o seu. ― O rapaz sorria apenas com os olhos enquanto falava ― Obviamente o que eu sugeri foi menos ofensivo que o anão, mas...

― Ella. ―  Cortei-o antes de vê-lo continuar ― Meu nome é Ella.

Já que eu iria mentir para o telmarino sobre os meus segredos mais ocultos, por que não acrescentar mais uma mentira à lista?

Ella. ― Ele parecia testar a palavra em seus lábios e a forma como se mexeram enquanto me chamava, feito um sussurro, fez um arrepio percorrer meus braços ― É um nome bonito.

― Bom, não tão pomposo quanto Caspian X, filho de Caspian IX. ― Deixei um sorriso fugir de meus lábios enquanto aproveitava a deixa para zombar de seu passado sem más intenções.

Caspian também permitiu-me contemplar um grande sorriso seu enquanto me olhava, animado com nossa socialização.

― Então, Ella, você pode me dizer o que os faes pretendem ao lhe enviar à reunião narniana?

― Não antes que você me conte seu discurso para convencer os líderes na clareira de lutarem ao seu lado. ― Resolvi investir, incapaz de pensar em algo mais inteligente para responder sua indagação.

Ele suspirou e pousou ambos os braços em seus joelhos encolhidos na frente de seu peito. Ele segurava uma das folhas que arrancou do gramado e começou a girá-la em seus dedos enquanto colocava-se a pensar.

― Eu acho que quero dizer algo realmente inspirador, entende? O povo de Nárnia sofreu com a repressão de Telmar por tempo demais e meu tio só aumentará essa destruição em grande escala, acabando com tudo que vir e achar ameaçador. Os telmarinos não tiveram a mesma chance que eu tive de crescer ouvindo as histórias maravilhosas dessa terra. Pra ser sincero, até dois dias, eu achava que tudo isso não passava apenas de uma lenda.

― Dois dias? ― O tempo que ao que ele se referiu chamou minha atenção imediatamente.

― Sim, foi há dois dias que encontrei Caça-trufas e Nikabrik na floresta. ― Ele confirmou.

― É muita coisa para assimilar. ― Resolvi me limitar a dizer.

― Como se um novo mundo tivesse surgido diante de meus olhos.

Por algum motivo, suas palavras e a forma cálida como ele usou para expressar-se causaram um acalento em mim, fazendo-me sentir empática com sua situação, apesar de sentir em meu interior que a minha era a menos favorável.

Ficamos os dois ali, então, aproveitando o murmuro tranquilo da discussão entre Nikabrik e Caça-trufas enquanto o céu escurecia. Ao tardar, a fogueira foi ascendida e o texugo compartilhou conosco o alimento que trouxera para a viagem: um pão fofo, embalado em folhas de bananeiras. De alguma forma, ele sabia que aquela seria a primeira das minhas refeições ao longo dos dois dias em que permaneci de pé, então, abrindo mão de sua parte, entregou-me dizendo que estava cheio do que havia comido mais cedo antes de partirem nessa aventura com Caspian. Não pude agradecer verbalmente, temendo expressar-me demais e deixar que os nossos outros companheiros de viagem desconfiados de algo sobre mim, mas fiz o meu máximo para lhe lançar, por meu olhar, um terno agradecimento.

Ao fim, Caspian organizou-se com o anão para fazerem a vigia pela noite, temendo que os guardas telmarinos no pegassem desprevenidos no entardecer. Enquanto isso, Caça-trufas me acompanhava, usando um pouco das grandes camadas de tecido de meu vestido como travesseiro e apoiados no chão, repousávamos e conversávamos sobre as estrelas brilhantes no céu até que eu finalmente caí no sono, tomada pela exaustão dos dias.


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Notas finais do capítulo

Quem está curtindo a amizade da Ella com o Caça-trufas? Ele é um amor de texugo, não é mesmo?
E o Nikabrik, todo agressivo... O que será que se passa na cabeça desse anão?


Aguardo vocês nos reviews.

Beijos e até o próximo capítulo!



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