Fight Like A Girl escrita por Carly


Capítulo 2
Jisoo, a garota de ouro.




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Quando você respira pesado, mesmo que eu não entenda a profundidade disso, está tudo bem, eu vou te abraçar. Obrigada por trabalhar duro — Lee Hi

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Capítulo 2 — Jisoo é a garota de ouro

Kim Jisoo

 

A sala em estilo vitoriano encontrava-se preenchida pela melodia doce de um piano antigo. O cômodo que o abrigava tinha proporções colossais com janelas altas de vidro, paredes proeminentes e telhado projetado em abóbada estrelada. A decoração tinha tons carregados de vermelho e dourado, os móveis eram bem detalhados e ornamentados; Poltronas capitonê, prateleiras de madeiras lotadas de livros e um grande lustre pendendo do teto.

 No canto mais afastado, logo em baixo da pintura a óleo da família Kim, ficava o piano branco do séculos XIX comprado diretamente de um conde frânces. Sobre o banquinho acolchoado logo em sua frente, sentava-se uma garota magra, pálida, de rosto comprido e olhos redondos tristes chamada Kim Jisoo, a garota de ouro da Rolling Academy.

Os seus dedos alvos corriam pelas teclas do piano inundando a sala com a melancolia de uma canção antiga. Aos poucos, a voz aguda como uma fada se juntou a sinfonia trazendo um ar ainda mais desanimado para o cômodo já inundado pela melancolia. Hoje era o aniversário de 18 anos da pianista, mas ela estava completamente sozinha em uma mansão gigantesca com mais de 20 cômodos e 30 empregados. Sua única companheira era a música que ela tocava habilidosamente.

— Can't run from myself — Jisoo cantava baixinho, em um tom quase inaudível e muito semelhante a um sussurro. Mas, ainda que altura do cântico fosse baixo, a altura era o suficiente para sentir o pesar contido nele; o pesar de uma alma que sofre em silêncio e que guarda todas as suas angústias para si. — There's nowhere to hide​.

Anotou a pequena composição no caderno de arame posto em cima da tampa do piano em uma letra perfeitamente desenhada e então voltou as teclas do piano, tentando conectar a letra a uma melodia. Contudo, seus dedos cansados cometem um erro ao tocar um Dó ao invés de um Dó sustenido e a garota parece transtornada consigo mesma. Os seus cotovelos caíram sobre as teclas provocando um cacofonia momentânea e ela encosta a testa sobre a madeira do instrumento parecendo exausta.

 Suspira pesado, deixando todo o ar que preenchia os seus pulmões saírem pela sua boca e tomar o ar a sua volta. Estava cansada pelas noites e mais noites de estudo sem fim, pela pressão da perfeição e as milhares de outras coisas que o título de "garota de ouro" levava consigo. A sua cabeça dóia tanto, seus músculos queriam arrego e seu coração estava solitário.

Jisoo devia ser a melhor aluna da sua escola, a campeã estadual de tênis, a pianista mais talentosa, a filha perfeita e ainda por cima está sempre linda não importando a hora ou a ocasião. Todos achavam que ela tinha sorte por conseguir ter tudo isso, mas havia controvérsias. Ninguém nunca se lembrava das expectativas que ela carregava nas costas ou de como as pessoas se afastavam dela por inveja ou se aproximavam por interesse em seu dinheiro ou em aumentar sua visibilidade para os olheiros das faculdades nacionais e internacionais que sempre rondavam Jisoo oferecendo vagas.

Ela ergueu a cabeça, respirou fundo e voltou ao início da música. Verificando dessa vez as notas na partitura a sua frente antes de recomeçar a canção. Ao reiniciar, parecia que os seus dedos já sabiam o caminho a percorrer entre aquelas teclas pretas e brancas e não cometeram nenhum erro. Foi perfeito, exatamente como deveria ser, como todos esperavam que a garota de ouro fizesse.

— Senhorita Kim?

A garota fecha subitamente o caderno e o esconde dentro do vestido. O coração parece prestes a quebrar sua caixa torácica com a força dos batimentos. Mas então logo suspira de alívio. Na porta, estava apenas a velha empregada chamando pela sua jovem senhora. Por um breve momento, Jisoo imaginou que fosse sua mãe.

A senhora Kim nunca estava em casa, mas controlava tudo o que a filha fazia ou deixava de fazer. Agendava a sua vida para que ela fosse a menina perfeita para poder ser o seu troféu. Ela apenas tolerava Jisoo "perder tempo" tocando piano, pois era algo que engrandecia seu currículo. Mas compor? Era impensável.

— O Jantar já está servido. — Informou a empregada.

— E os meus pais? Eles já chegaram? — Jisoo indagou. Sua voz também parecia cansada ao sair de sua boca pintada de gloss.

— Ainda não — Fala sem jeito e a menina volta a encarar a parede desanimada. O quadro da família pendurado em sua frente parecia um recordação antiga de um tempo que não voltaria.  — Mas acho que chegarão em breve. 

Os seus pais eram donos de uma empresa importante e sempre estavam ocupados demais. Nunca paravam em casa e quando paravam, sempre estavam atendendo telefonemas ou respondendo E-mails. Jisoo nunca tinha as suas atenções por inteiro e ela não era o tipo de garota que se metia em problemas para chamar a atenção. A garota de ouro apenas aceitava tudo que lhe era oferecido, doesse ou não, e sorria, afinal, tudo deveria ser perfeito e pessoas perfeitas não reclamam ou ficam tristes.

— Eu vou esperá-los na mesa. Eles devem estar em um congestionamento. — Ela falou, mas não acreditava realmente nas suas próprias palavras. Estava somente tentando ser positiva.

Jisoo se levantou. Ela havia se arrumado toda para recepcionar os seus pais naquela noite. TInha até mesmo usado o vestido preto rodado e de manga buffante que a sua mãe tanto adorava, mas que deixava a garota parecendo uma boneca de pano dos século XX.  

— Não precisa se curvar tanto quando os meus pais não estiverem. — Ela falou ao passar ao lado da empregada que já deveria passar da casa dos 60. — Pense nas suas costas.

A mulher confirmou com a cabeça e voltou a ficar erguida enquanto a garota passava ao seu lado, sumindo pelos corredores. Jisoo andou pela casa enorme, seus sapatos anabelas preto faziam barulho ao se encontrar com o chão e ecoavam pela casa vazia com um padrão.

Demorou um pouco para chegar até a sala de jantar, afinal, o casarão merecia o titulo de Casarão e Jisoo não sentia pressa em chegar em lugar nenhum. Os móveis do local parecia muito com a da sala que Jisoo saira; móveis caros com padrões antigos. Ela sentou-se na mesa de mogno de 20 lugares cheia de comidas em pratos finos e bem organizados. 

Olhou para o bolo cheio de glacê que ela havia encomendado no Buffet que o pai adorava, pois era o único que vendia um bolo sem glúten com um sabor razoável e suspirou. Haviam 6 empregados em sua volta prontos para servi-la, mas ela apenas encarava o alimento sem vontade de provar nada. 

As pessoas sempre associam a tristeza como uma consequência. Você fala "Estou triste" e logo em seguida vem a pergunta "Porque? O que aconteceu?". Por isso não era de se estranhar que a pobre menina procurasse um porque para a melancolia que a atacava todos os dias e tirava as suas forças. Mas logo ela, que tinha o QI de 128 e a resposta para tudo na ponta da língua, não sabia o porque. Ela tinha tudo então porque sentia que não tinha nada? Estava rodeada de pessoas então porque se sentia tão sozinha?

Quase 30 minutos depois, um dos empregados entrou correndo pela sala com o telefone fixo em mãos, o corpo rechonchudo bailando entre os móveis;

— É a sua mãe — Explicou.

Jisoo pegou o telefone empolgada e o colocou na orelha.

— Mãe, você...? — Tinha um sorriso enorme nos lábios finos.

— O ranking do mês saiu? — Ela cortou.

— Sim. Eu sou a número 1 novamente. — Respondeu rápido, queria trocar logo de assunto e perguntar sobre que horas eles chegariam.

— Como esperado. — Respondeu seca.

— Mas onde você e o papai estão? Eu estou esperando vocês...que barulho foi esse?

 — Foi um avião. Eu e seu pai precisamos ir para Argélia para fechar um negócio. Você pode jantar sozinha hoje? — Os ombros de Jisoo cairam e sua expressão voltou a se tornar triste —  Prometo que amanhã eu pego você na escola e almoçamos juntas. O que acha? Depois podemos fazer as suas inscrições para as faculdades

— será divertido... — Mentiu. A sua voz parecia triste. Os seus pais trabalhavam demais, estavam sempre ocupados tentando da-lhe tudo que eles não tiveram. Era um esforço plausível na teoria, mas eles acabavam esquecendo de da-lhe o principal.

— Eu tenho que ir agora.  — A mãe falou se despedindo.

— Mãe, você não esqueceu de algo? 

— Do que? 

Jisoo ficou em silêncio. Sua mãe não havia simplesmente abandonado-a em seu aniversário, ela nem sequer havia lembrado. A garota não sabia o que era pior.

— Nada.

— Irei desligar. Estude bastante!

— Eu sempre estudo.

Jisoo desligou o celular e deixou o braço cair inerte ao lado do corpo. Seus olhos haviam perdido o brilho e se tornaram completamente opacos. Sua respiração voltou a ficar pesada. Ela sabia o que aquele aperto no peito significava, estava preste a chorar.

Ela inspirou para segurar as lágrimas. Não podia chorar, não na frente de outras pessoas ao menos. Ela ergueu a sua postura e fingiu que estava tudo bem.

— Partam o bolo entre vocês e os outros empregados, se sobrar algo, levem para as suas família. Podem comer o jantar também, façam a festa — Ela disse aos empregados — Espero que ao menos hoje alguém termine feliz.

Os empregados assentiram com a cabeça.

O quarto de Jisoo ficava no primeiro andar da casa e tinha um ar neoclassico com móveis de linhas rígidas e depuradas. Nas prateleiras, ficavam expostos os centenas de prêmios estudantis, medalhas e livros de brochura que a menina juntara ao longo dos anos. Ela se deitou na cama, esperando que o cansaço a fizesse dormi, mas a sua mente elétrica não permitiu. Logo, ela optou em ler um dos livros de leitura obrigatória para o vestibular, apesar de a prova do dia seguinte ser física.

Ela não tinha cabeça para números agora e ela já havia estudado como uma louca nos outros dias, os seus conteúdos estavam em dia e ela sabia que bastava uma revisada pela manhã para que tirasse outro 10. Ela se deu um descanso hoje.

Sentou-se na janela, verificou se havia chegado alguma mensagem de parabéns pelo seu aniversário no seu celular, mas não havia nada em nenhuma rede social. Todos haviam esquecido e não era como se ela esperasse que algum dos bajuladores que a cercavam lembrassem, mas ela esperava que ao menos aquela pessoa a enviasse algo.

Suspirou e olhou para a rua através da janela, nem mesmo "Guerra e Paz" estava conseguindo a distrair. Jisoo Morava em uma das ruas mais caras de Gangnam e todas as casas em sua volta eram verdadeiras mansões multimilionárias com piscinas olímpicas, quadras esportivas e centenas de metros quadrados de jardim. Dobrando a esquina, dois serviçais riam e pareciam contentes um com os outros. 

Jisoo sorriu. Ao menos alguém estava se divertindo no dia do seu aniversário. Ela olhou para o céu que parecia nublado e escondia o brilho lua.

Seu celular brilha e ela pega rapidamente ansiosa por ser uma mensagem de parabéns. 

"Jisoo, você conseguiu responder a questão 21 da atividade de física?"

"Não, eu estava ocupada organizando o meu aniversário"

"Que azar ter o aniversário antes de um teste importante. Você pode responder a questão agora?"

Jisoo jogou o telefone sobre o acolchoado, o que diabos aquelas pessoas achavam que ela era? Uma máquina? Nem para ao menos da-lhe os parabéns antes de fazer exigências.

A tela do seu celular voltou a brilhar: 

"Você vai responder? Eu estou precisando, Soo"

Jisoo inspirou. O que a garota de ouro faria naquela situação?

"Mande-me uma foto da questão."

"Eu te amo, Soo"

A imagem da pergunta chegou alguns segundos depois, Jisoo apenas passou o olho na questão e a resolveu mentalmente e enviou a resposta. A garota não enviou obrigado após consegui o que queria.

A morena voltou a olhar para a janela. Os mesmos serviçais agora corriam de uma garoa que começava a cair

 Ela abre a janela em quilhotina, coloca as mãos para fora e pega as gotas em seus dedos pálidos. Quando criança, ela amava tomar banho de chuva, mas agora, quando crescida, seria ridículo sair na chuva para se banhar. 

Ela inspirou, a boca começou a tremer e o peito a apertar. Mal havia percebido, mas as lágrimas já escorriam pela face comprida. Quando está chovendo, tudo fica mais triste, doloroso e o choro que ela sempre conseguia segurar, transbordava. Não havia nada que magoava mais do que aniversários e nada que desse mais vontade de chorar do que a chuva.

E no final do dia, a menina de ouro era feita de vidro e estava prestes à quebrar.


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